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Segurança de alimentos e as redes sociais: como se proteger da desinformação?

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Em um passado nada distante, durante a pandemia, vivemos mudanças de comportamentos em nível mundial sob muitos aspectos. Dentre as principais mudanças, destacaram-se o aumento do consumo de alimentos caseiros, nos primeiros meses da quarentena. Com isso, foram redobrados os cuidados na higienização dos alimentos que colocávamos em casa, pois estávamos insuflados pela apreensão de uma possível transmissão de doenças virais por estes alimentos.

Olhando pelo lado da segurança de alimentos, aumentou a preocupação de consumir alimentos seguros, conforme artigo escrito no jornal da USP ainda em 2020.

No entanto, após a passagem da pandemia, herdamos muitos “especialistas” de redes sociais disseminando informações incorretas que nada têm a ver com utilidade pública. Não que este tipo de desinformação tenha ocorrido somente após a pandemia, podemos ver que este assunto já foi abordado aqui no blog: Mitos sobre alimentos nas redes sociais e Sensacionalismo x realidade.

Mas atualmente não é difícil se deparar com um áudio ou vídeo do amigo da tia, que encaminhou para o primo e tem certeza de que veio de uma fonte confiável, um “shorts” do YouTube ou um “reels” do Instagram. Vídeos nas redes sociais trazem soluções milagrosas para conter a contaminação do alimento, depreciando a segurança de algum produto de uma marca famosa, ou ainda os queridinhos do momento, sobre aumento de imunidade a partir do consumo de certos tipos de alimentos e temperos.

É o caso de um vídeo que orienta a não consumir partes de frutas cortadas de uma fruta contaminada por fungos, porque tal consumo estaria associado à ocorrência de candidíase.

Também há uma publicação sobre a necessidade de se ferver água para coar um café gourmet, com intuito de “eliminar os germes” e consequentemente eliminar a acidez que estes trazem aos grãos de café, inclusive citando grandes marcas de cafés tradicionais, colocando em xeque a segurança destes produtos. Existe ainda “a volta dos que não foram”, falando sobre a quantidade de perninhas de baratas que podem estar nos alimentos, ou ainda a velha mentira da embalagem de leite reprocessada, que por incrível que pareça, nunca sai de cena.

Nessas horas, certificações de reconhecimento internacional, auditorias, cursos de capacitação de toda uma empresa, trabalho de equipes de segurança de alimentos, e todos os controles rigorosos na produção de alimentos seguros podem perder a força a ponto de a marca/produto sofrer impactos na venda.

E fica a pergunta: as empresas estão preparadas para mitigar este tipo de desinformação e entregar uma melhor informação ao consumidor?

A meu ver, profissionais da área de segurança de alimentos precisam e devem trabalhar em conjunto com as áreas de atendimento ao cliente a fim de disseminar informações confiáveis, além de capacitar as partes interessadas e direcionar a correta busca por informação segura. Esta busca pode ser, por exemplo,  pela Biblioteca de Alimentos ; cartilhas da ANVISA; sites do MAPA, EMPRAPA, artigos científicos e todos aquelas fontes que possam trazer clareza e entendimento.

Você saberia dizer como o setor de comunicação e atendimento ao consumidor de sua empresa vem se preparando para trabalhar de forma a multiplicar informações de fontes seguras sobre a segurança de alimentos?

Fábia Carolina Lavoyer Llorente é graduada e mestre em engenharia de alimentos, especialista em segurança de alimentos, coordenadora da ESA e analista da Garantia da Qualidade.

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Como construir uma carreira de sucesso em segurança de alimentos

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A segurança dos alimentos é um componente essencial da saúde pública e uma área que oferece carreiras desafiadoras e gratificantes. Diante do aumento da conscientização global sobre os perigos associados à contaminação de alimentos, observa-se uma demanda crescente por profissionais especializados nesse campo.  Mas o que é necessário para construir uma carreira de sucesso nesta área?

Em 2016, Ana Claudia Frota publicou um artigo neste blog que aborda a relevância da escolha inicial de emprego na carreira em segurança dos alimentos. Utilizando uma pesquisa da USP como base, ela enfatiza que as decisões no início da carreira são importantes para o futuro profissional. Com uma experiência de quase 15 anos na área, Frota salienta a importância de entender os desafios e responsabilidades envolvidos.

Segundo o Codex Alimentarius, a segurança dos alimentos busca evitar alimentos que possam causar dano ao consumidor, sendo essencial que sejam isentos de contaminações biológicas, físicas e químicas. Assim, os profissionais podem atuar em várias frentes, desde a revisão de especificações até a gestão de sistemas, destacando a importância de habilidades como comunicação, persistência e atualização contínua nos avanços do campo. A figura abaixo busca ilustrar essas possibilidades.

Este artigo retoma esta temática reunindo as perspectivas de especialistas renomados na área, que escrevem para este blog, construindo uma narrativa integrada que ilustra a multiplicidade de abordagens necessárias para a excelência profissional na área de segurança dos alimentos.

Daniel Bouzas Savia destaca que para melhorar o que já existe em segurança dos alimentos é importante o trabalho conjunto entre diferentes áreas do conhecimento. Ele diferencia o trabalho interdisciplinar do multidisciplinar, explicando que no interdisciplinar, as várias especialidades trabalham juntas de forma integrada, combinando seus conhecimentos para enfrentar os desafios de maneira completa e eficaz.

Palova Dieter Marques aponta a necessidade de imersão prática no setor alimentício, sugerindo que a experiência adquirida através de estágios ou empregos específicos na área constitui uma alavanca para o desenvolvimento profissional. A permanente atualização sobre regulamentações e inovações do setor, segundo Marques, é um pilar para a atuação eficaz, incentivando também a interação mediante consultorias, auditorias e participação ativa em eventos do ramo.

Aline Rezende contribui para o diálogo enfatizando a valorização do conhecimento continuado. A diversidade de cursos e treinamentos, inclusive aqueles de curta duração, emerge como fonte inestimável de insights aplicáveis. Rezende destaca, ainda, a importância da atualização constante por meio de plataformas digitais e a necessidade de habilidades gerenciais complementares às técnicas, como gestão de custos e liderança, fundamentais para a interlocução com níveis estratégicos de gestão.

Por sua vez, Marco Túlio Bertolino enfoca a resiliência como atributo indispensável ao profissional da área. A habilidade de persistir diante dos obstáculos, adaptando-se para implementar sistemas de gestão da qualidade, mesmo sem pleno apoio institucional, é, para Bertolino, um exercício de construção de uma cultura de qualidade e de reconhecimento do valor estratégico da segurança dos alimentos.

Cíntia Malagutti e Talita Andrade, ampliando o escopo da discussão, ressaltam a importância da prática reflexiva e do compartilhamento de conhecimento dentro das equipes. Andrade, especificamente, sugere a análise de casos de mercado e a simulação de inspeções sanitárias como metodologias de aprendizado ativo, enquanto Malagutti realça a relevância da construção de redes profissionais e do comprometimento ético como alicerces para a atuação na segurança dos alimentos.

A carreira em segurança dos alimentos, como bem ilustrado pelos insights de Ana Claudia Frota e complementado pelas opiniões de outros especialistas renomados, é uma jornada de aprendizado contínuo, colaboração interdisciplinar e adaptação às inovações e regulamentações do setor. As contribuições dos especialistas abordam a importância da integração de conhecimentos, da imersão prática, da atualização constante, da resiliência, da prática reflexiva e do comprometimento ético para alcançar a excelência na área.

Para os profissionais que aspiram a construir ou aprimorar suas carreiras em segurança dos alimentos, algumas dicas finais podem ser extraídas das lições desses especialistas:

  • Busque formação interdisciplinar: entenda que a segurança dos alimentos não se limita a uma única área de conhecimento. Aprofunde-se em disciplinas relacionadas, como microbiologia, química, engenharia de alimentos e direito sanitário.
  • Ganhe experiência prática: engaje-se em estágios, empregos ou projetos que ofereçam a oportunidade de aplicar conhecimentos teóricos em contextos reais de produção, controle de qualidade e gestão de segurança dos alimentos.
  • Mantenha-se atualizado: dedique-se à educação continuada, participando de cursos, workshops e seminários. As inovações tecnológicas e as mudanças nas regulamentações do setor alimentício são constantes, e manter-se informado é essencial.
  • Desenvolva habilidades complementares: além do conhecimento técnico, aprimore habilidades gerenciais, de comunicação, liderança e negociação. Essas competências são importantes para a interação eficaz com equipes multidisciplinares e para a tomada de decisões estratégicas.
  • Cultive a resiliência: enfrente os desafios com determinação, buscando soluções inovadoras e adaptativas para implementar e manter sistemas de gestão da qualidade, mesmo diante de obstáculos.
  • Promova o compartilhamento de conhecimento: colabore com colegas de trabalho e participe ativamente de comunidades profissionais. A troca de experiências e a discussão de casos reais são fundamentais para o desenvolvimento coletivo e a solução de problemas complexos.
  • Comprometa-se com a ética profissional: a integridade e o compromisso com a segurança dos consumidores devem ser os pilares da sua atuação na área.

Adotando essas recomendações, os especialistas não somente impulsionaram suas trajetórias profissionais, mas também fomentaram o progresso na área de segurança dos alimentos, essencial para o sustento da saúde coletiva e qualidade de vida. O empenho em se aperfeiçoar e inovar marca a distinção dos líderes no setor, equipando-os para superar desafios atuais e emergentes.

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É seguro consumir pratos regionais, como tacacá e maniçoba?

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“Eu vou tomar um tacacá, dançar, curtir, ficar de boa”, esse é um trecho de uma música que viralizou recentemente da cantora paraense Joelma. Mas afinal, o que é “tacacá”?

Essa pergunta é muito fácil de ser respondida por mim, que sou conterrâneo da famosa cantora e que tomo tacacá desde pequenininho. Porém, a grande maioria dos brasileiros não faz sequer ideia do que seja. Não à toa muita gente foi atrás do que significa essa palavra em sites de buscas.

Aliás, nós aqui do Brasil somos privilegiados pela variedade gastronômica do país, tão vasto quanto nosso território: tacacá, maniçoba, acarajé, cuxá, guariroba, buchada de bode, sarapatel, vatapá, etc. Mas a pergunta é: os alimentos e pratos regionais são seguros para serem consumidos? Atendem as legislações específicas sobre produção de alimentos? A questão é complexa na prática.

Em se tratando de legislações, podemos ver os esforços das atualizações para acompanhar as mudanças da atualidade com pesquisas, descobertas científicas e novos produtos sendo desenvolvidos (como visto no post Socorro!!! Mudanças na legislação da ANVISA – Confira o que mudou).  E normas oficiais não se discutem, se cumprem.

Mas alguns casos específicos dão um verdadeiro “nó na cuca”. Como exemplo, temos a maniva que é a folha moída de mandioca (Manihot esculenta Crantz) que na culinária paraense é ingrediente principal de um dos pratos mais apreciados na região, a maniçoba. A maniva deve ser cozinhada por ao menos sete dias (isso mesmo, você não leu errado: SETE dias!). A folha da mandioca possui um alto teor de ácido cianídrico, ou seja, o veneno cianeto, que precisa desse tempo de cozimento para ser eliminado e assim, tornar o alimento seguro ao consumo humano. Essa iguaria gastronômica desafia os consumidores pelo tempo e cuidados com o preparo.

Sabemos que na produção de alimentos, todo cuidado é pouco. Até mesmo os alimentos que muita gente acredita serem inofensivos, como os rotulados de artesanais, podem causar danos incalculáveis  se houver falhas em sua produção: Molho pesto artesanal causou tetraplegia por botulismo em Brasília.

Além dos pratos regionais com suas peculiaridades, também existe algo que tem virado tendência mundial e não demorará muito para se expandir pelo Brasil: é o consumo de insetos como alimentos, assunto esse que também já foi tratado algumas vezes no blog:  Inseto como alimento: o início e Análise de risco da entomofagia no mercado brasileiro de alimentos. 

Os fabricantes de alimentos, os órgãos e autoridades que criam as normas e fiscalizam seu respectivo cumprimento precisam dar garantias de que todos os alimentos que chegam aos consumidores sejam considerados seguros para consumo, incluindo alimentos industrializados, refeições e também os alimentos regionais. Afinal, nós não queremos ficar doentes, queremos sim “tomar um tacacá e ficar de boa”.

José Gonçalves de Miranda Junior é tecnólogo agroindustrial de alimentos (Universidade do Estado do Pará), pós-graduado em Engenharia de Alimentos – Desenvolvimento de Produtos (Instituto Mauá de Tecnologia), especialista em Segurança de Alimentos e auditor líder em FSSC 22000

Imagem: Agência Pará

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Leptospirose – onde entra a segurança de alimentos?

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Semana passada a grande mídia veiculou uma matéria sobre um homem que quase morreu de leptospirose após comer mangas que pegou no acostamento de uma estrada no interior de São Paulo.

O caso

Um motorista de caminhão, durante uma de suas viagens, parou no acostamento de uma estrada no interior de São Paulo, em local próximo a São José do Rio Preto. Recolheu algumas mangas que estavam caídas, descascou duas com os próprios dentes, comeu ali mesmo e levou outras para casa.

Dias depois começou a sentir dores no corpo, teve febre alta, imaginou que seria uma gripe, medicou-se, mas o quadro não apresentava melhora. Chegou a ser internado em estado grave até que um dos médicos pensou em leptospirose, e então concluiu-se que as mangas poderiam ser o alimento causador do quadro infeccioso.

O que sabemos sobre a leptospirose?

A leptospirose é uma doença infecciosa causada pela bactéria Leptospira. Essa bactéria pode estar presente na urina de alguns animais, sendo o rato um dos principais.

O homem ou os animais domésticos podem se infectar quando água contaminada com urina de rato penetra através de mucosas ou pele com lesões ou mesmo pela pele íntegra que fique em contato prolongado com água contaminada.

Por isso, situações de enchentes costumam ser relacionadas à infecção e casos de leptospirose.

O período de incubação, ou seja, tempo entre a infecção até o momento em que a pessoa apresenta os primeiros sintomas, pode variar de 1 a 30 dias e normalmente ocorre entre 7 a 14 dias. As manifestações clínicas variam desde formas assintomáticas até quadros graves. São divididas em duas fases: fase precoce e fase tardia.

Quais são os sintomas?

Os principais da fase precoce são: febre, dor de cabeça, dor muscular e falta de apetite. Por esses sintomas, o quadro é facilmente confundido com um resfriado ou gripe. Também podem ocorrer diarreia, dor nas articulações, alterações oculares.

Em aproximadamente 15% dos casos, a evolução pode ocasionar manifestações graves, como a chamada síndrome de Well (que parece ter sido o caso do homem noticiado nos últimos dias) onde há acometimento dos rins, chegando a insuficiência renal, hemorragia e quadro pulmonar grave, inclusive com risco de morte.

Prevenção

Muitos já devem ter ouvido que latas de refrigerante, cerveja ou outros itens enlatados precisam ser lavados e higienizados antes de abertos, porque podem ter tido contato com urina de rato nos depósitos onde ficaram armazenadas.

As pessoas que residem em áreas com piores condições sanitárias, caso tenham passado por enchentes, e apresentem quadros parecidos com resfriado, costumam ser medicadas já pensando em um possível quadro de leptospirose.

E onde entra a segurança de alimentos, nesse caso do consumo de manga ou em outras situações de contágio?

Podemos pensar nos cuidados como apenas consuma água tratada, lave bem os vegetais e alimentos que serão consumidos crus. O que aconteceu nesse relato, inclusive, poderia ter sido evitado com essa simples prática. Outros cuidados são: deixar a caixa de água tampada, usar botas de borracha se precisar entrar em áreas de inundação, deixar as lixeiras tampadas para evitar acesso de roedores, mas me parece um contrassenso solicitar que latas de refrigerante, cervejas e outros alimentos enlatados sejam lavadas, uma vez que, se pensarmos em controle de pragas em indústrias ou depósitos de alimentos, a presença de ratos não deveria acontecer.

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Alimento artesanal X alimento industrializado

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Recentemente aqui no blog li um artigo  sobre os riscos microbiológicos em queijos artesanais, no qual se faz uso de uma boa pesquisa e de sólidas referências científicas, porém o que mais me surpreendeu foram alguns comentários atacando o “mensageiro” (os autores do artigo) pelo texto, por alertar que no alimento artesanal podem existir riscos potenciais.

Nos comentários alguns insistiam ingenuamente que se é “artesanal” é bom, enquanto ao mesmo tempo, baseados num senso conspiracionista, insinuavam que se é alimento industrializado é ruim, como se a indústria de alimentos fosse uma vilã perversa.

Entre os argumentos favorecendo os produtos artesanais havia os clássicos, como “meu avô viveu mais de 90 anos porque não comia produtos industrializados”. Este argumento é facilmente refutado, pois no geral, nos últimos 50 anos a idade média da população brasileira subiu de 57 para 75,5 anos, ao mesmo tempo em que o consumo de alimentos industrializados cresceu vertiginosamente.

Não é a primeira vez que me deparo com tal visão distorcida. Um exemplo é a “verdade” na cabeça de muitos que frango de granja cresce e engorda rapidamente porque recebe hormônios, uma falácia difícil de desmentir devido ao quanto essa crença já se solidificou na crendice popular, coisa que tentei fazer no artigo “Quanto de hormônio há no frango que você come?“. Repito, frango não é tratado com hormônio!

Outro caso é quando se fala de alimentos transgênicos. Muitos sequer entendem exatamente o que sejam alimentos transgênicos, mas os condenam veementemente, sendo que já se consomem alimentos transgênicos há quase 3 décadas e todos os medos que eram alardeados na ocasião do desenvolvimento e liberação desta tecnologia para o consumo nunca se concretizaram, como tratado no artigo “Devo considerar transgênicos como perigo?”

A tecnologia de plantas transgênicas já é utilizada desde a década de 1990, permitindo ganhos de produtividade no campo e redução de custos, devido, por exemplo, a permitir um uso menor de herbicidas. Ao mesmo tempo, não existem evidências de que seu consumo cause algum malefício à saúde humana.

Outro caso emblemático refere-se à questão da produção agrícola convencional versus orgânica. O uso de defensivos agrícolas, como os chamados “agrotóxicos”, pode ser um problema, sobretudo quando usados fora da técnica, sem receituário de agrônomos competentes, portanto usando produtos não permitidos para a cultura, em sobredosagens ou sem respeitar prazos de carência entre aplicação e colheita, porém, se usados corretamente, são seguros como visto no artigo “Alimentos não orgânicos são seguros?“.

Fonte: Sindiveg – Importância e reflexos da proteção de cultivos no Brasil.

Justamente o uso correto de defensivos agrícolas aliados à tecnologia é o que nos permite a produção em alta escala da chamada agricultura de precisão, fundamental para alimentar a humanidade, sem contar que faz do Brazil um player estratégico para a segurança alimentar mundial, pois ocupando apenas  apenas 7,6% de nosso território com lavouras, nos posicionamos como líder na produção e exportação de soja e de milho, o maior produtor de cana-de-açúcar e de café, o 4° maior produtor de feijão e 3° maior de frutas, além de outros exemplos. Portanto, o Brasil ajuda a alimentar boa parte dos 8 bilhões de habitantes do planeta.

Quem menos quer utilizar defensivos agrícolas, ou agrotóxicos se preferir, são os próprios agricultores, e por um simples motivo: são caros e encarecem os custos de produção. Por isso, a agricultura de precisão faz seu uso somente quando realmente necessário, usando moléculas seguras e aprovadas, na dosagem mínima que permita sua efetividade e respeitando os prazos de carência entre aplicação e colheita, portanto, fazendo seu uso seguro.

Já sobre os alimentos orgânicos, claro que é interessante termos alimentos com técnicas de produção que dispensam o uso de defensivos agrícolas, por outro lado também há riscos, especialmente casos de contaminações com patógenos que já levaram consumidores à morte, como o surto com espinafre na Califórnia e brotos de soja na Alemanha, exemplos citados no artigo “Uma estrela do “Hall da Fama” dos patógenos: Escherichia coli O157:H7“, ou seja, tal qual a produção convencional, a orgânica também tem seus riscos, e em ambos os casos, o que se requer é conhecimento e a prática correta de técnicas para prevenir estes riscos.

Adubação orgânica com esterco, se não estiver devidamente estabilizado, pode ser um potencial foco de contaminação por patógenos.

Citando um caso grave com alimentos artesanais, há o relato comovente de Doralice Goes que fala de sua maratona para sobreviver ao botulismo após comer um molho pesto artesanal, tema que foi tratado no artigo “Também errei como consumidora” e no artigo “Molho pesto artesanal causou tetraplegia por botulismo em Brasília“.

O fato é que seja artesanal ou industrializado, a responsabilidade dos produtores de alimentos é a mesma: garantir que aquilo que chega ao consumidor é seguro, portanto livre de contaminantes químicos, físicos e microbiológicos.

Garantir alimentos seguros requer esforços de toda a cadeia produtiva, incluindo adquirir conhecimento sobre riscos potenciais nos produtos, aplicar técnicas apropriadas, controlar e monitorar processos.

A higiene pessoal, procedimentos de limpeza e higienização, práticas para controle de pragas, boas práticas agrícolas e de manufatura, rastreabilidade e mapeamento e controle de pontos críticos, entre outros requisitos de gestão devem fazer parte das rotinas diárias dos produtores de alimentos, sejam estes pequenos, médios ou grandes.

Sempre vale a pena ressaltar que insumos como os conservantes, aditivos, estabilizantes e os coadjuvantes de fabricação utilizados pela indústria passam por testes diversos antes de sua aprovação como ingredientes pelos órgãos competentes como o FDA (Food and Drug Administration) e a ANVISA (Agência Nacional de Vigilência Sanitária), e claro, como já dizia Paracelso no século XVI com muita sabedoria: “A diferença entre o veneno e o remédio é a dose”.

Quando bem usadas, as tecnologias de insumos alimentícios permitem estabilidade e prolongam a shelf-life dos alimentos e assim facilitam os trâmites da cadeia logística que abastece milhões de bocas em todos os recantos do país e do mundo.

Também vale a pena ressaltar que por trás das grandes corporações produtoras de alimentos há diversos stakeholders, entre eles acionistas que prezam por seus investimentos. Eles desejam que as indústrias sejam perenes e vendam cada vez mais, e para isso, é conditio sine qua non que seus produtos sejam seguros, para se manterem longe de escândalos e indenizações, e justamente por isso, organizam-se em iniciativas como o GFSI  (Global Food Safety Initiative) para propor regras de segurança dos alimentos a serem seguidas em toda a cadeia produtiva.

A indústria de alimentos, para defesa de suas marcas, portanto também por motivos econômicos, é a maior interessada na produção segura de alimentos. Em razão disto, investe milhões em estudos, análises, tecnologias, auditorias e certificações em food safety e incentiva e influencia fornecedores a fazerem o mesmo.

Logicamente alimentos artesanais são bem-vindos. Eles têm importância nos hábitos alimentares regionais, por fazer parte da cultura de determinados grupos sociais e étnicos, sem se esquecer de sua real importância por movimentar toda a economia das regiões onde são produzidos, desde a produção primária, processamento, distribuição e comercialização. Portanto, ninguém é inimigo dos produtos artesanais, mas assim como se cobra corretamente da indústria, também se deve cobrar regras na produção artesanal, por um simples motivo: garantir a saúde pública.

Ao leigo até é permitido ter o vício de tomar partido apaixonadamente entre o alimento industrializado e o artesanal, pois ele não detém todo o conhecimento para um bom julgamento. Já o profissional de segurança dos alimentos precisa se informar, ter uma visão limpa e sem deturpações e abandonar esta dicotomia.

A discussão precisa amadurecer e deixar de lado as paixões, fugir do maniqueísmo, pois não se trata de uma questão de alimento artesanal X industrial, afinal, existem riscos em ambos os casos. Portanto, devem ser identificados e controlados. Em segurança de alimentos, discutir os problemas de forma aberta e clara permite que todos ganhem, produtores, comerciantes e consumidores.

A produção artesanal de alimentos não pode ser tratada como um tema intocável, imune a críticas, pois isso inibe seu avanço em prol da segurança dos alimentos, e só assim o setor poderá se desenvolver, crescer, se fortalecer e se solidificar como uma opção viável e sem riscos aos consumidores.

Deixe sua opinião, o importante neste tema é termos um debate aberto!

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Feliz Natal e Próspero 2024

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Queridos colunistas, leitores, parceiros e amigos,

Mais 365 dias já se passaram. Neste período tivemos a grande alegria de tê-los aqui em nossa página.

O ano está acabando e chega a hora de refletir sobre nossos aprendizados, nossas conquistas e sentir o espírito do Natal alegrar nossos corações.

Mais do que nunca, esta é uma época para agradecer àqueles que nos permitiram crescer.

É tempo de renovar o sentimento que nos traz forças, inspiração e criatividade, e aproveitar para se conectar com as pessoas que amamos. Por isso, nossa equipe de colunistas estará em recesso no período de 26/12/2023 a 14/01/2024.

Desejamos a vocês, um Natal de amor e esperança! Que 2024 seja um ano incrível e de muitas realizações.

Agradecemos por fazerem parte da nossa família!

Diretoria Food Safety Brazil

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Como transferir conhecimento dentro de uma empresa?

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É provável que você já tenha participado de algum treinamento pago pela empresa onde trabalha, e durante alguma palestra tenha pensado: nossa, essa informação parece muito importante para a pessoa X. Finalizado o treinamento, você voltou às suas atividades corriqueiras e a pessoa X nunca se inteirou do que foi aprendido naquele treinamento.

Estamos falando de Gestão de Conhecimento, que vem do inglês knowledge management.

Para que a gestão de conhecimento aconteça, é necessário um agente que dissemine as informações e que se preocupe com esse processo de disseminação. Aí entra o líder, uma vez que seu papel dentro de uma empresa é fazer a ligação entre a organização e os colaboradores. Então é importante que a disseminação da informação seja algo presente, como parte da cultura da empresa.

Dessa forma a gestão de informação pode ser considerada parte do planejamento estratégico da organização.

E por que isso? Porque é comum que todo o conhecimento adquirido em um treinamento fique restrito à pessoa que o fez. Às vezes, o colaborador treinado o repassa só aos membros da sua própria equipe.

Esse texto vem com a proposta de que essa informação, esse conhecimento circule na empresa.

Já vi relatos em que o colaborador, quando retornava do curso ou treinamento, deveria preparar um relatório sobre os assuntos tratados e repassar ao seu superior. Em outra oportunidade, soube do processo em que uma palestra sobre o tema abordado era marcada para os demais colaboradores e o colaborador treinado a ministrava. Esse procedimento pode não ser confortável para algumas pessoas, aquelas que não se sentem à vontade em fazer apresentações orais.

Pensando a respeito e conversando com uma colega que atua em segurança de alimentos, uma possibilidade de transferência do conhecimento adquirido seria a partir de núcleos.

O que seriam os núcleos?

O colaborador que participou do treinamento faz um meeting com o seu superior e pares e passa os dados, informações e conhecimento adquiridos. Previamente ao meeting, ele faz uma busca sobre o palestrante em redes sociais, busca possíveis artigos, textos ou outro material que quem ministrou o curso já possa ter publicado sobre o assunto.

O superior compila essas informações e os dados adicionais, reflete sobre quem mais na empresa poderia ter interesse nesse conhecimento, passa inicialmente o material didático sobre o curso e pergunta sobre o interesse de um novo meeting a esse novo departamento interessado e ao colaborador treinado. Assim, novos núcleos podem ser atualizados. Esse ciclo pode acontecer mais de uma vez, passando para o superior do próximo departamento que entenda que um terceiro departamento pode se beneficiar com as informações do treinamento.

Em algumas situações, apenas o material didático pode ser suficiente, o que diminui o tempo de novos meetings, mas em outras ocasiões novos departamentos podem ficar interessados em mais detalhes e um novo encontro pode enriquecer.

Essa seria uma forma de disseminar a informação dentro da empresa, de forma interdepartamental.

Sabemos que algumas áreas têm atividades correlatas em relação à segurança de alimentos, como qualidade, P&D, compras, produção, então um treinamento pode ser feito pelo colaborador de um desses setores e o conhecimento de interesse dos outros setores pode ser propagado.

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Inovação e segurança de alimentos – qual a interface?

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Semana passada estive no evento Dairy Vision, onde tendências do mercado lácteo foram apresentadas. Quando pensamos em tendências, a ligação com inovação é direta. E qual a relação inovação e segurança de alimentos?

Fiquei surpresa por não assistir nenhuma palestra que tratasse de qualidade ou segurança de alimentos no setor lácteo. Foi então que percebi que muitos dos assuntos tratados falavam sobre inovações, novas formulações, produtos que se preocupam com a pegada de carbono, direcionados a nichos específicos da população – como população 60+ – e uma pergunta constantemente voltava a minha cabeça: será que esse produto é permitido?

O que seria um produto permitido?

Um produto que atende os requisitos legais.

Certamente as empresas que estavam propondo novas formulações – seja para utilizar um subproduto da cadeia láctea, seja para conseguir produtos mais competitivos do ponto de vista do negócio – tiveram, em algum momento , que submeter esses projetos, fazer reuniões conjuntas com o departamento que faz o papel “regulatório” dentro da empresa. Os caminhos devem ter sido:

– para que esse projeto siga, algumas adequações precisarão ser feitas do ponto de vista legal. Se seguirmos assim, não conseguiremos aprovar esse item junto ao MAPA, ou outro órgão regulador. Ou:

– ok, podemos seguir, é um produto que será aprovado sem qualquer problema ou questionamento, está dentro do que a legislação permite.

Nesses casos acima, possivelmente os ingredientes foram avaliados, por exemplo: os insumos utilizados são permitidos? Os aditivos são permitidos e estão dentro do limite aceitável, a descrição, ou seja, o nome do produto está correto?

Um ponto merece destaque: a rotulagem dos itens. Ela também faz parte do requisito legal, mas vale ser abordada com um pouco mais de detalhes em alguns segmentos, como o de laticínios. Temos a possibilidade de produzir um item, muito similar a outro (normalmente com custo mais alto), mas esse produto mais barato precisa estar rotulado corretamente, para que o consumidor saiba o que está comprando e não compre apenas pela similaridade das embalagens – ou seja, se sinta enganado.

O blog já trouxe dois textos sobre esse assunto:

Requeijão cremoso e a fraude econômica no Brasil

Existe mais de um tipo de requeijão?

Portanto, a segurança de alimentos permeia os eventos de inovação, mesmo quando não é abordada diretamente.

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Segurança de alimentos na sociedade da informação

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A intenção deste artigo é fazer uma primeira abordagem de um tema atual – segurança de alimentos na sociedade da informação – relacionando o acesso à informação e ao conhecimento com a segurança e qualidade dos alimentos que consumimos todos os dias.
Embora os termos sociedade da informação e do conhecimento sejam hoje muito utilizados, a verdade é que estas duas vertentes existem há milênios.
Todos os avanços na área da informação vão desde a transmissão oral do conhecimento (quando a escrita ainda não havia sido desenvolvida) até os dias atuais.
Os livros que formam as bibliotecas são uma forma de acúmulo de informações. A digitalização desta informação é a forma como hoje ela chega até nós com imediatismo através do acesso à Internet.
Ou seja, sempre existiu informação, o que difere é a forma como a armazenamos e os meios pelos quais podemos acessá-la. Mas a informação por si só não gera conhecimento. Outros fatores interferem nesta relação, como educação e comunicação.
Através da comunicação pelas redes como a Internet e outros meios de comunicação, podemos ter acesso à informação que cada um de nós considera relevante ou interessante. No nosso caso particular, como interessados em questões relacionadas com a segurança e qualidade alimentar, algumas das informações relevantes estão ao nosso alcance. Cabe a cada um procurá-las e sobretudo discernir a sua importância e credibilidade de acordo com os conhecimentos previamente adquiridos.
É necessário ter um posicionamento crítico em relação a cada informação para diferenciar o que é verdadeiro do que é falso.
Às vezes há informações distorcidas que parecem verdadeiras e podemos cometer erros involuntários quando queremos comunicá-las a outras pessoas. É preciso comparar diversas fontes e escolher as mais confiáveis. A angústia da insatisfação é o que nos faz buscar as perguntas certas para encontrar informações verdadeiras.
Nós, que atuamos como assessores da indústria alimentícia, em qualquer uma de suas etapas, devemos obter informações da melhor qualidade possível e isso nem sempre é fácil. Nosso blog trabalha com colunistas que buscam a excelência na informação para que ela seja de melhor aproveitamento para os leitores.
Informação não é o mesmo que conhecimento. Quando a informação que acessamos é analisada, bem compreendida, contrastada com outras informações e assimilada, só então ela passa a fazer parte do nosso conhecimento. Quando comunicamos o conhecimento adquirido por meio de uma publicação, ele se torna informação para nossos leitores.
Divulgar informação sobre segurança de alimentos nesta sociedade da informação é uma paixão que envolve aspectos importantes relacionados com a saúde pública; uma ajuda para produtores e consumidores de alimentos.
A questão da segurança de alimentos é multissetorial, envolve diversas disciplinas. O trabalho em equipe com acesso a informações de qualidade é fundamental para o avanço do conhecimento e ao mesmo tempo o conhecimento é a matéria-prima para a inovação.
Mas nem tudo são rosas. Há pedras no caminho que temos de eliminar e uma delas é a chamada fratura digital, porque o acesso à informação ainda não é possível em vários países ou regiões. Isto criou países mais avançados, com equipes de pesquisadores que são geradores de conhecimento, e outros países menos desenvolvidos que são consumidores do conhecimento gerado em outros lugares.
A geração de informação e conhecimento colocados em valor monetário é muito mais benéfica. Daí a importância de aumentar o orçamento para a ciência e tecnologia, seja ela pública ou privada.
A tétrade positiva é: informação-comunicação-conhecimento-inovação. Um círculo virtuoso.

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Intoxicação alimentar por atum contaminado: o que aconteceu?

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No final de agosto foi noticiado um surto de origem alimentar em nove creches da região de Campinas, envolvendo 60 pessoas, entre alunos e funcionários das instituições. Os sintomas aconteceram em julho e após as análises concluiu-se que a causa foi o consumo de atum contendo altos níveis de histamina.

A ANVISA, através da Resolução 3124/2023, solicitou o recolhimento do lote do produto, pela seguinte motivação: “Considerando a ocorrência de surto compatível com intoxicação alimentar por histamina após o consumo do alimento, em Centros de Educação Infantil de Campinas, São Paulo, e a confirmação de contaminação do produto com histamina acima dos limites tolerados pela legislação sanitária, evidenciada pelo RELATÓRIO DE ENSAIO Nº RE-TC 03.105/23, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL.”

Trata-se de um lote fabricado em 8 de maio deste ano, com validade até 8 de maio de 2025.

Segundo informações da Secretaria de Saúde de Campinas, as crianças com sintomas de intoxicação apresentaram manchas vermelhas pelo corpo, coceira e sete delas tiveram diarreia.

O que é a intoxicação por histamina?

Intoxicação por histamina também é chamada de intoxicação pela toxina escombróide.

Atuns e outros peixes da família Scombridae, peixes conhecidos como “escuros”, são susceptíveis à formação de histamina por conterem grandes quantidades de histidina livre no tecido muscular. A transformação da histidina em histamina costuma acontecer pela ação de bactérias contaminantes quando os peixes mortos não são conservados e manuseados de forma adequada. É importante que os peixes sejam refrigerados em curto período após sua morte, para evitar esse aumento na concentração de histamina.

Um fator importante é que a histamina não é eliminada durante os processos de cocção durante a fabricação do atum enlatado.

O Brasil e outros países têm um nível máximo permitido de histamina, que é de 100 ppm no tecido muscular.

A intoxicação assemelha-se clinicamente a uma reação alérgica aguda, com a presença de um ou alguns dos sintomas abaixo elencados:

  • Dormência
  • Formigamento
  • Sensação de queimação na boca
  • Erupções cutâneas no tronco superior
  • Queda de pressão
  • Dor de cabeça
  • Coceira na pele
  • Náusea
  • Vômito
  • Diarreia

O quadro costuma ser leve, desaparecendo em poucas horas, mas há relatos de complicações em crianças, idosos ou pessoas com deficiências imunológicas.

Os cuidados com a matéria-prima adquirida, sempre que possível analisando a presença de possíveis contaminantes que possam causar intoxicação alimentar, e a rápida detecção de alterações no produto, com recolhimento de lotes no mercado, podem evitar esse tipo de ocorrência.

Imagino que a questão da histamina seja um desafio para a indústria de pescado, pois pelo levantamento que fiz, as técnicas empregadas para detecção de histamina em peixes podem ser as de cromatografia, que não estão disponíveis para a grande maioria das indústrias de alimentos, pelo seu alto custo e pela necessidade de qualificação de mão de obra. Existem, porém, testes ELISA que podem ser adquiridos pela indústria. Não tenho a informação de seu custo, mas vale o exercício sobre o custo da análise versus o custo da falha interna. Nesse caso, a detecção da falha internamente poderia evitar o adoecimento daqueles que consumiram esse lote e também a exposição da marca na mídia.

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ATUALIZAÇÃO: Raios X para detecção de corpos estranhos não são considerados irradiadores de alimentos

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O recente post  “Anvisa entende que alimento que passa por raios X deve ser rotulado como irradiado” causou muita polêmica e comentários nas redes sociais, uma vez que esta não era a interpretação de todo o mercado. De acordo com a resposta de um atendente do Anvisa Atende, havia uma associação direta entre um alimento que passou por raio X e um alimento irradiado, implicando em necessidade de rotulagem deste alimento para informar o consumidor.

Entenda a polêmica

Uma empresa, apenas com a finalidade de ter documentado que não precisaria rotular seu produtos que passam por raio X como irradiados, realizou uma consulta formal à Anvisa, pelo canal ANVISA atende, na expectativa de confirmar o entendimento. Eis que a resposta foi contrária ao senso comum, sendo orientada a rotulagem conforme a RDC Nº 21, DE 26 DE JANEIRO DE 2001.

O ponto que deixou brecha ao entendimento é que:

2.1.2. Alimento irradiado
É todo alimento que tenha sido intencionalmente submetido ao processo de irradiação com radiação ionizante

4.2.Fontes de radiação
As fontes de radiação são aquelas autorizadas pela Comissão Nacional de Energia Nuclear, na
conformidade das normas pertinentes, a saber:
a) Isótopos radioativos emissores de radiação gama: Cobalto – 60 e Césio – 137;
b) Raios X gerados por máquinas que trabalham com energias de até 5 MeV; (cinco milhões de eletrovolts)
c) Elétrons gerados por máquinas que trabalham com energias de até 10 MeV.

Não demorou para as manifestações no LinkedIn serem de questionamento. Até marquei a Anvisa para participar do debate. Vejam algumas interações:

A empresa que fez o questionamento recebeu uma semana depois, espontaneamente, uma atualização, conforme abaixo:

Prezado(a) Senhor(a),

Em atenção à sua solicitação, retificamos a resposta do protocolo 2023193394, tendo em vista que a resposta inicialmente informada foi atualizada.

Deste modo, segue abaixo a resposta atualizada do protocolo supracitado:

Equipamentos de raios-x utilizados na indústria de alimentos para detecção de metais (perigos físicos) não são considerados irradiadores de alimentos.

Alimentos irradiados são aqueles processados em equipamentos (raios-x, raios gama, aceleradores de elétrons) com a finalidade de inibir a germinação, reduzir a carga de microrganismos, controlar patógenos ou infestação e/ou estender o prazo de validade de alimentos perecíveis.

Portanto, para àqueles alimentos que passam por raios-x, com a finalidade exclusiva de detectar perigos físicos, não se aplicam as disposições da Resolução – RDC n. 21/2001.

O que podemos aprender com o caso?

Pelo menos eu aprendi que:

Legislação é elaborada por comitês de profissionais que tem expertise e entendimento em um tema. Por melhor que os textos sejam redigidos, sempre poderão trazer ambiguidades e “zonas cinzentas” de entendimento, pois o que é claro para os experts, pode não ser para a maioria.

Os atendentes de plantão do canal de dúvidas podem fazer intepretações simplistas no seu dia a dia, retornando para a sociedade interpretações equivocadas.

A inteligência, o bom senso e a colaboração são a fortaleza dos novos tempos.

Nem sempre é preciso braço de ferro ou tratamentos indelicados para se obter um retorno.

A Anvisa emite atualização para se retratar.

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Cultura de Segurança de Alimentos e Clima Organizacional

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Hoje, quero escrever sobre um assunto que me é muito caro sem ter a pretensão de entrar na área da querida colega Cíntia Malagutti: a cultura de segurança de alimentos e sua conexão direta com o clima organizacional da empresa.

Geralmente, os programas de cultura de segurança de alimentos tomam como pilares os valores e a missão da organização fazendo link com a política da qualidade e seus indicadores de desempenho.

Neste texto quero trazer para reflexão o quanto o clima organizacional afeta positiva ou negativamente a implementação e o fortalecimento de uma cultura voltada para a produção de alimentos seguros e com qualidade.

Para mim, a área de Recursos Humanos (Gestão de Pessoas) é de longe a mais importante de todas as empresas, porque é através dela que são feitas as contratações e é ela a responsável por garantir um programa robusto e adequado de treinamentos, customizado, para cada área da organização, que tem como objetivo final melhorar e desenvolver as competências das pessoas, fazendo disso o alicerce para um plano de carreiras sólido e consistente que valorize o que as pessoas têm de melhor: a sua humanidade.

Sim! Não é possível pensar em uma cultura consolidada e enraizada sem pensar no quanto as pessoas se sentem motivadas, participantes e reconhecidas pelos papeis que desempenham dentro dos processos estabelecidos na empresa.

Mais do que produtos dentro da especificação, o que se deve buscar é um diferencial que só as pessoas podem dar.

Muito se fala sobre propósito, que o da empresa deve servir de inspiração para os colaboradores e que os propósitos deles devem se conectar de maneira única a garantir unicidade nas ações que levam a um ambiente acolhedor e motivador com foco em quem não faz parte direta dele, o cliente.

Muitas organizações utilizam pesquisas, realizadas com frequência variável, para a medição da qualidade do clima organizacional para que, a partir das respostas, sejam elaborados e desenvolvidos planos de ação visando a satisfação de todos (ou quase todos) os seus clientes internos (colaboradores).

Entendo que essa seja uma ferramenta respeitada, mas penso que a melhor ferramenta para uma cultura de felicidade interna seja a sinergia entre as lideranças e o RH porque dessa conexão nascem os mapeamentos de competências. E é a partir desses mapeamentos que são feitas as avaliações que vão nortear premiações e capacitações. Tudo isso, claro, acompanhado do bom e velho feedback, olho no olho, porque apenas com conversas francas e objetivas as pessoas se sentem valorizadas e respeitadas.

Pra finalizar, compartilho uma história que ouvi há muitos anos: um renomado professor, pesquisador e apaixonado pela Qualidade foi visitar a NASA. Ao chegar ao local foi recebido com pompa e levado a conhecer todos os processos considerados importantes para as missões espaciais. Uma a uma, as pessoas apresentavam-se a ele e falavam sobre suas qualificações, experiência e responsabilidades técnicas tão importantes para a Agência Espacial. Durante a visita, ao atravessar um dos hangares, ele viu uma senhora fazendo a limpeza do chão. Observando o trabalho dela, pediu licença aos acompanhantes para fazer algumas perguntas a ela. Todos se olharam e, meio sem entender,  seguiram-no até a mulher. Quando chegou perto, ele apresentou-se e perguntou-lhe o nome e qual era a função dela ali. Ela, com um sorriso no rosto respondeu: “Eu ajudo a levar o homem ao espaço!”. O professor, feliz, teve a certeza de que ela, de todos ali, era realmente quem sabia qual era o objetivo do seu trabalho.

Quando as pessoas sabem qual é a verdadeira função e importância da sua atividade dentro de um processo, ali existe um ambiente que pode ser classificado como um ambiente de cultura consolidada e uniforme.

Por isso, não há como dissociar o clima organizacional de um programa de cultura de qualidade e de segurança de alimentos!

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Não conformidades: o cliente sempre tem razão?

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Um dos requisitos básicos de um bom sistema de gestão da qualidade e de segurança de alimentos é o tratamento de reclamações recebidas de cliente. Elas, na maioria das vezes, são oportunidades únicas de melhorar um produto ou processo e de garantir que um pequeno problema não se torne uma enorme dor de cabeça.

Em geral, gostamos de ser bem atendidos quando temos alguma queixa, mas odiamos receber queixas de outras pessoas.

Quando uma reclamação chega é comum ouvirmos frases do tipo “Esse cliente reclama de tudo”, “Acha que isso é motivo para reclamação?”, “Não temos problemas com outros clientes…”, “Esse contaminante não é nosso” e tantas outras que na verdade são afirmações feitas sem base alguma ou análise profunda do caso.

Sam Walton ensinou que “o cliente nem sempre tem razão, mas se provar que ele está errado, você vai perdê-lo”.

Então, como transformar a insatisfação do cliente em oportunidade para diferenciação do seu produto/serviço/marca?

Os sistemas de gestão dão importância fundamental a processos de Manutenção e Melhoria Contínua de todo o sistema de produção, da chegada da matéria-prima até a entrega no cliente. O tratamento de Não-Conformidades de maneira EFETIVA é fundamental para essa melhoria contínua do sistema e o desempenho do sistema de tratamento de não conformidades depende do envolvimento de toda equipe e também do nível de burocracia implementado.

Muitas empresas adotam um sistema de classificação para as reclamações como “Procedentes” e “Improcedentes”. As primeiras recebem atenção total, já as do segundo tipo ficam numa espécie de “limbo da qualidade”, esquecidas e sem o tratamento e atenção devidos.

As não conformidades “Procedentes” podem ser classificadas como de “Alta Relevância”, quando oferecem risco à saúde do consumidor e de “Baixa Relevância”, quando não oferecem risco à saúde do consumidor.

Nesse post não quero me ater às reclamações consideradas procedentes e, portanto, aquelas que julgamos que são as que “o cliente tem razão”.

Meu foco aqui é fazer uma provocação sobre aquelas reclamações que consideramos serem possível “mimimi” ou oportunidade encontrada pelo cliente para conseguir um desconto no valor do produto.

Em tempos de redes sociais hiperativas e devoradoras de reputações, será que vale a pena correr o risco de um pequeno defeito que foi identificado por um cliente se transformar em um enorme problema que pode se transformar em um “meme” como aquele famoso da bruxa oferecendo suco para a Branca de Neve?

Voltando ao tema burocracia…

O quanto seu modelo de tratamento de não conformidades está sendo eficiente?

Quão rápida é a resposta que você dá quando recebe uma reclamação?

Rapidez não é sinônimo de consistência, mas a demora na resposta pode fazer crer ao seu cliente que ele não é importante para sua empresa. Com isso, ele pode sentir-se disponível para conhecer melhor seu concorrente.

Burocracia leva à perda de fé por parte das pessoas de que algo funciona…

Então, procure incutir nas pessoas do seu time alguns conceitos:

1 – Toda reclamação é importante

2 – Todo cliente é importante

3 – Agilidade na análise significa atenção e respeito a quem está do outro lado do negócio

4 – Toda resposta é melhor que nenhuma resposta

5 – Empatia (verdadeira) ainda é a melhor característica para quem quer resolver problemas

6 – O cliente pode até não ter razão (no seu ponto de vista) mas ele quer ser ouvido e se reclamou é porque confia que você vai entender e atender sua reclamação

7 – Reclamar faz parte do processo e assim como falsos elogios podem levar para o buraco, reclamações atendidas podem fazer sua empresa ser mais respeitada e, principalmente, recomendada para clientes que você talvez nem faça ideia de que gostariam de comprar seu produto.

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A força do consumidor na cadeia produtiva de alimentos

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Por que é importante a formação contínua em segurança de alimentos?

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Você, profissional de alimentos, está cuidando de sua formação contínua?

Muitas vezes ouvimos e repetimos a frase de Hipócrates (considerado o pai da medicina moderna): “Deixe a comida ser o seu alimento e o alimento ser o seu remédio”. Embora esse conceito seja válido desde os tempos da antiga civilização grega e seja aceito tanto por médicos quanto por nutricionistas, é válido pensar que em tempos anteriores a essa civilização, tanto as civilizações sumérias, quanto as babilônicas e as antigas civilizações andinas da América tiveram técnicas muito bem desenvolvidas em culturas alimentares. Além da irrigação,  cultivo e criação de animais para consumo humano, elas também desenvolveram um conceito genérico de segurança de alimentos.

O fato de até agora ter sido encontrado pouco material escrito dessa época não significa que em um futuro próximo ou distante não possam ser encontradas evidências científicas que comprovem a existência dessas “normas” ou costumes associados à segurança de alimentos. Obviamente, séculos se passaram desde aquela época e o treinamento em segurança de alimentos evoluiu até os dias atuais. Durante várias décadas, especialistas de vários ramos da ciência continuaram a fornecer dados cada vez mais documentados sobre este importante tema de interesse para toda a humanidade. A formação contínua dos profissionais e de todo o pessoal envolvido nas tarefas inerentes ao cultivo, extração, transformação, embalagem, transporte e preparação de alimentos em nível industrial, para serviços de alimentação ou mesmo doméstico tem assumido uma relevância considerável para os cuidados de saúde dos consumidores.

Nos últimos cem anos, os avanços nas tecnologias de produção, armazenamento e preservação de alimentos superaram os avanços que poderiam ter ocorrido nos últimos três mil anos de história, mas as mudanças continuam em um ritmo cada vez mais rápido.

O advento do sistema HACCP e as normas que foram surgindo e melhorando continuamente nos obrigaram a tomar os critérios da Formação Contínua como algo estabelecido sem o qual não podemos compreender a segurança de alimentos. O conceito de cultura de segurança dos alimentos é incentivado, levando em consideração o advento da atual globalização que abrange o comércio de alimentos de todas as partes do mundo. Para isso, é preciso desenvolver políticas globais com fundamentação científica, acadêmica e com conceito crítico.

Há alguns séculos, o filósofo Descartes, derrubando muros, questionava todas as coisas e conceitos adquiridos, para diferenciar os verdadeiros dos falsos. Já no século XX, o filósofo francês Jaques Derridá também levanta a ideia de Desconstrução (que não é o mesmo que destruição) para questionar o conhecimento científico e humano em geral e descartar o que não é verdadeiro.

A disrupção da inteligência artificial neste momento é alimentada pelos dados fornecidos pela internet para a formulação de alimentos, inclusive projetando alimentos a partir de cultura de células por meio de um sistema de impressão 3D. O grande problema desse sistema é que o que é publicado na internet nem sempre é verdadeiro e está inter-relacionado com dados falsos. É por isso que é tão importante desenvolver um sistema crítico que nos permita receber, interpretar e distribuir dados certos e verificados aos nossos colegas e colaboradores. Para isso, é necessária a formação contínua dos profissionais de segurança de alimentos.

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Cultura S.A. SEMPRE aderida à Cultura Organizacional

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Muito se fala de cultura organizacional e de alimentos/qualidade em normas de food safety (as reconhecidas pela GFSI) em lei (a europeia, regulamento 382 em 2021), diretrizes do Codex Alimentarius (CXC 1-1969, ver. 2020), programa (food standards Austrália e Nova Zelândia) e política nacional (a chilena, de 2018 – 2030). Mas como as empresas estão desenvolvendo estas diretivas de maneira prática?

Além de diversas referências mundiais, já abordadas aqui, aqui, aqui, aqui, há novas que podem nos guiar:

PAS 320: um guia em elaboração para a cultura de segurança de alimentos, para trazer mais clareza ao processo e caminho na construção e amadurecimento da Cultura de Segurança de Alimentos. Funciona como um orientador prático e foi publicada em Abril de 2023. Baixe aqui.

Guidelines on Food Safety Culture – Food Drink Europe: um guia para a cultura de segurança de alimentos, publicado em Maio de 2023 pelo grupo Food Drink Europe visando fornecer algumas diretrizes gerais, com exemplos práticos e ferramentas para as empresas de alimentos entenderem, implementarem e medirem a sua cultura. Também é possível baixar aqui.

A cultura organizacional ou corporativa são os valores, atitudes e comportamentos compartilhados de uma organização que definem sua identidade e orientam suas ações. Uma cultura de segurança de alimentos, por outro lado, diz respeito à organização interna e, ao contrário da cultura corporativa, não pode ser definida como uma cultura geral. Cada grupo, disciplina, departamento, função, pessoa geralmente tem diferentes tarefas de segurança de alimentos e expectativas atribuídas. É importante defini-las no SGSA da sua empresa, incluindo o Plano de S.A./HACCP.

Desenvolver uma cultura de segurança de alimentos requer um planejamento organizacional cuidadoso, bem como esforços contínuos em treinamento e comunicação. É importante reconhecer que não existe uma solução “tamanho único” para alcançar uma cultura de segurança de alimentos, por isto cada empresa tem seu DNA.

Embora os componentes da cultura de segurança de alimentos sejam subjetivos (percepção), as empresas devem desenvolver ferramentas para mensurá-la objetivamente. Isso pode ajudar a comparar até que ponto a cultura de segurança de alimentos e seus componentes são atendidos na empresa, entre diferentes grupos de funcionários, como por exemplo, operadores versus gerenciamento (liderança de topo), locais diferentes, em contato direto com alimentos ou não ou para avaliar tendências no tempo (reutilizando a mesma ferramenta). Isso pode desencadear ações corretivas, como treinamento adicional de determinados funcionários em alguns ou todos os componentes da cultura de segurança de alimentos, melhoria dos canais de comunicação, investimento em recursos, etc.

Além de pesquisas e questionários, outros métodos para medir a cultura de segurança de alimentos incluem observações de práticas e comportamentos, solicitando informações de indivíduos dentro da organização, bem como avaliações das políticas e procedimentos internos sendo cumpridos, incorporando novas tecnologias e melhores práticas, incentivando os colaboradores a darem feedbacks, incluindo “quase falhas” e sugestões de melhorias, não apenas uma abordagem “de cima para baixo”, mas também “de baixo para cima”.

Outra maneira é “Gap Analysis” versus Performance, comparando os parâmetros críticos. Por exemplo: certificação por terceiros (com/não anunciado), reclamações e desvios internos. Também por Indicadores Chave de Desempenho (KPIs) de segurança de alimentos usando quadro digital ou físico, semelhante ao triângulo EHS (meio ambiente, saúde e segurança), para destacar métricas críticas como dias desde o último recall, número de quase acidentes, incidentes, reclamações e muito mais. Essa abordagem pode ajudar a aumentar a conscientização e criar ocasiões para celebrar conquistas e marcos de segurança de alimentos.

As lições devem ser compartilhadas após um incidente, por exemplo, envolvendo a equipe específica na busca de formas de melhoria, sem medo de relatar problemas, reportar ao indivíduo que relatou o incidente, aos colegas e ao departamento a que pertencem e, em alguns casos, a outros departamentos ou à organização como um todo.

A criação de uma forte cultura de segurança de alimentos requer comprometimento e participação ativa de todos os membros da organização e requer melhoria constante. Ao colocar a cultura de segurança de alimentos como prioridade máxima, reduz-se o risco de doenças transmitidas por alimentos, contaminação cruzada e alergias alimentares, ao mesmo tempo em que constroem a confiança e a fidelidade do consumidor à sua marca. Portanto, garanta que estejam entregando produtos seguros e de alta qualidade aos seus clientes, para garantir o sucesso a longo prazo do seu negócio, perenizando-o.

Imagem: Guidelines on Food Safety Culture – Food Drink Europe

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Perdas e desperdícios de alimentos são foco nas normas de food safety e quality envolvendo as emergências humanitárias

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Todos os beneficiários (incluindo os setores público e privado, sociedade civil, produtores individuais, atacadistas, feiras, sacolões, varejistas e consumidores) devem ter acesso aos alimentos seguros, nutritivos e com padrões de qualidade que atendam às suas expectativas, abordando riscos reais, potenciais e percebidos.

Mas acima de tudo, é preciso acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar (e de alimentos), a melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável que é um dos dezessete objetivos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Há um total de 169 metas, integradas e indivisíveis, sendo a meta 12.3 relevante neste post:

“Até 2030, reduzir pela metade o desperdício de alimentos per capita mundial, nos níveis de varejo e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita”, ou seja, a perspectiva é de redução de perdas também nas fases de produção e processamento, integrantes das cadeias produtivas.

O foco não é apenas nas perdas e nos desperdício nas fases pós-colheita, assim deve-se incluir a mudança do comportamento do consumidor. Quanto mais alimento jogado fora, mais caro ele fica. Um terço dos alimentos produzidos no mundo é desperdiçado anualmente, ao custo de US$ 750 bilhões de acordo com a Agência para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO). 

A Terra abrigará 8,6 bilhões de pessoas em 2030, 9,8 bilhões em 2050 e 11,2 bilhões em 2100, segundo estimativas do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas. Para suprir a crescente demanda, resultante do crescimento da população, o aumento do consumo nos países em desenvolvimento e as mudanças nos padrões de consumo, há a necessidade de maior produção gerando maior pressão sobre recursos naturais escassos, como solo, água, energia e nutrientes e deixando ainda mais nítido um problema social com elevado impacto ambiental: as perdas pós-colheita e o desperdício no final da cadeia de suprimentos.

A magnitude dos números do desperdício (mais de 30% da produção) indica a complexidade de um problema que começa quando o alimento é colhido no campo e depois processado, armazenado e transportado e pela escolha do consumidor final. As proporções das perdas em cada processo são:

– 10% dos alimentos desperdiçados são perdidos nos processos de produção e colheita;

– 50% dos alimentos desperdiçados são perdidos no transporte, manuseio e armazenamento;

– 30% dos alimentos desperdiçados são perdidos na distribuição;

– 10% dos alimentos desperdiçados são perdidos nos supermercados e na casa dos consumidores, tendo como principal fator a validade dos produtos.

Os motivos dos desperdícios vão desde o alto nível de exigência do consumidor até a crescente exigência do consumidor por qualidade. Por consequência também do varejo, tem levado também ao descarte de alimentos, ainda no campo, por não suprir os padrões estéticos exigidos por algumas redes supermercadistas. Por exemplo: o peso e o tamanho até o formato e a coloração ou considerados como “frutos feios”.

Desperdícios de alimentos prejudicam enormemente o meio ambiente, pois boa parte dos agrotóxicos, água, terras, fertilizantes, desmatamento, transporte, gastos de energia e petróleo para a produção de máquinas e combustíveis empregados em todos os processos da agropecuária são utilizados em vão. Isso faz com que seja necessário intensificar ainda mais a produção e, consequentemente, a pressão ao meio ambiente.

No caso de excedentes alimentares, a reutilização dos alimentos na cadeia alimentar humana e, caso os alimentos não estejam em condições para consumo humano, o desvio dos mesmos para a cadeia alimentar animal, poupando recursos que, de outra forma, seriam necessários para produzir ração. Só após, recomenda-se a transformação dos resíduos em energia renovável, mediante incineração ou compostagem e, somente em último caso, a destinação dos mesmos a aterros sanitários nos quais, no processo de degradação, haverá a geração de chorume e gases de efeito estufa.

Grande parte dos desperdícios de alimentos ocorre nos processos de transporte e distribuição, mas o consumidor pode contribuir para a redução, cuidando de não cair nas armadilhas das promoções que costumam ser irresistíveis, no entanto, são as grandes vilãs do consumo consciente. Elas nos estimulam a comprar um número alto de produtos, muitas vezes desnecessários e que acabam se estragando. Ou quem sabe desenvolvendo embalagens menores de acordo com a necessidade de consumo e reinventar a gastronomia do reaproveitamento no restaurante da sua empresa?

Devemos trabalhar além da distribuição de alimentos, as ações educativas permanentes realizando treinamentos, cursos, oficinas e palestras sobre diversos temas com destaque ao tema aproveitamento integral dos alimentos, como folhas, caules, sementes, cascas, raízes. Os objetivos dependem da gestão articulada entre os setores público e privado.

Uma boa dica é a empresa construir uma “Árvore de Perdas” pela Alta Direção tendo a oportunidade de desafiar a organização na busca de resultados surpreendentes por meio de investimentos em pesquisa, melhoria de processos e de infraestrutura, educação e conscientização do consumidor. Por exemplo: via homepage da empresa com dicas sobre como comprar, conservar e cozinhar os alimentos. Confesso que já comecei dando curso de boas práticas alimentares para merendeiras no qual lançamos mão de indicadores culinários (Fator de Correção, Fator de Cocção, Índice de absorção, Densidade) para otimizar os processos de pré-preparo e preparo, maximizando produtividade e minimizando perdas.

Para erradicar a fome faz-se necessário que todos os setores da sociedade participem e façam esforços para reduzir as perdas e desperdícios de alimentos. Então, mensurem quebras operacionais (vencimento, avarias, baixa qualidade dos silos, estradas mal conservadas), erros de inventários, erros administrativos, entre outros. Na distribuição e venda final inclua a questão de evitar descartes por vencimento ou manipulação incorreta, entrando aí varejistas e doação de alimentos não vendidos, mas consumíveis, para a população vulnerável, por exemplo, minimizando a responsabilidade sobre o doador, exceto em caso de negligência grave. Além de ação às instituições socio-assistenciais, como caridade, também para o uso como ração animal ou compostagem agrícola.

Hábitos mais sustentáveis para a sociedade e ajudar ao meio ambiente (o desperdício joga anualmente na atmosfera 3,3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa, terceiro maior volume de emissões que provocam o aquecimento global) e os estabelecimentos do setor alimentício a sanar uma dor tão comum entre as mesmas e que pode angariar enormes prejuízos ao estabelecimento, que é o desperdício de alimentos, este o tema do momento nas normas de S.A.

Como estão se preparando para a cultura de consumo sustentável (aceitação e aquisição de alimentos in natura, que não tenham necessariamente o melhor aspecto (beleza, perfeição na forma, sem danos), mas que conservem suas propriedades nutricionais? Já construíram a sua “árvore de perdas” com os objetivos e as metas de reduções? Monte o seu “desperdiçômetro”!

Afinal, desperdiçar alimentos é um ato imoral, além de estúpido, insensato e caro. A coexistência da fome e dos desperdícios de alimentos é mesmo abominável.  E a nós, os consumidores, fica o convite às mudanças para hábitos alimentares conscientes.

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Cultura na FSSC 22000: alerta de risco e a esperança por um fio

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A FSSC 22000 está de versão nova. Dentro do que já era esperado, a versão 6.0 confirmou as expectativas de trazer para o conjunto de requisitos adicionais o tema Cultura de Segurança de Alimentos. Assim, o que já foi recomendação no passado através de um Guia da GFSI, passa a ser obrigatório também neste esquema de certificação.

E, também seguindo tendência já bastante observada, o requisito possui claro alinhamento com outras Normas, inclusive textual, partindo da definição de Cultura amplamente aceita no universo da Segurança de Alimentos:

“Valores compartilhados, crenças e normas, que afetam o pensamento e o comportamento em Segurança de Alimentos”.

A semelhança, porém, não se limita à definição de Cultura. Fica estabelecida a necessidade do compromisso da Alta Direção em estabelecer, implementar e manter objetivo(s) para a Cultura de Segurança de Alimentos e Qualidade como parte do sistema de gestão. No mínimo, os seguintes elementos devem ser abordados:

?  comunicação;

?  treinamento;

?  feedback e engajamento dos funcionários;

?  medição de desempenho de atividades definidas abrangendo todas as seções da organização com impacto em segurança de alimentos e qualidade.

O(s) objetivo(s) deve(m) ser apoiado(s) por um plano documentado de Cultura de Segurança de Alimentos e Qualidade, com metas e cronogramas, incluídos na análise crítica e nos processos de melhoria contínua do sistema de gestão.

Considerando que o trecho dos dois parágrafos anteriores são um recorte quase literal do novo requisito, é possível que não haja grandes mudanças no cenário atual, conforme o conhecemos.

A Cultura, posta como está, será inserida dentro do contexto da gestão tradicional. Com rigor, comunicação, treinamento e medição de desempenho não são e nunca foram novidades em um sistema de gestão.

Quando a Cultura se torna um requisito, de certa forma, decreta-se a falência das próprias Normas, ainda que pouco se queira admitir isso. Trata-se de um atestado da nossa incompetência em fazer certo até então e joga-se uma luz sobre a esperança de que “agora vai ser diferente”.

O grande fato positivo, talvez, tenha sido adicionar “Qualidade” à Segurança de Alimentos, para que se apoiem e sejam desenvolvidas conjuntamente.

Mas de fato, se não há grandes novidades na abordagem, não há motivos para se esperar que seja diferente agora. Salvo mudança de rota importante, os elementos mencionados acima continuarão sendo tratados em planilhas e documentos, sob o mesmo olhar frio que nunca foi capaz de mudar a cara do nosso setor.

Uma transformação cultural não será feita com mais do mesmo. A Cultura nas organizações surge do senso comum sobre a melhor forma de resolver os problemas do dia a dia. E, embora os documentos da gestão ajudem, eles são apenas parte deste processo. No dia a dia, as pessoas precisam de acompanhamento próximo, de acolhimento, do exemplo das lideranças. E é isso que precisa mudar com urgência. As Normas, mesmo bem intencionadas, não deixam isso suficientemente claro.

Por fim, ainda que se compreenda que, durante a implementação de uma Norma, profissionais da gestão acostumaram-se a ser, via de regra, duros e inflexíveis, lidando com lideranças de topo que apenas querem o certificado por razões comerciais, o resto da história é o que nos trouxe até aqui: arranjos para a auditoria e dificuldades para fazer o certo todos os dias.

Ou preparamos as pessoas para entregarem o melhor delas, através de um trabalho que não é nada técnico, ou continuaremos exigindo dos indivíduos tudo aquilo que eles não podem oferecer. A psicologia positiva, a filosofia e a neurociência são as verdadeiras aliadas nesta jornada de construção de uma Cultura positiva. As planilhas e documentos, tais como os conhecemos hoje não precisam ser extintos, até porque são necessários à gestão. Porém, precisam incluir ações que realmente importam. O tempo de apenas falar sobre comunicação, treinamento e medição de desempenhos já foi. É preciso abrir novos espaços para a mudança. Urgentemente.

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Riscos e oportunidades dos smartphones para a segurança dos alimentos

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Strategy Analytics publicou uma estimativa de que 3,85 bilhões de pessoas possuem smartphones. Considerando que há cerca de 7,9 bilhões de pessoas no planeta Terra, isso significa que 50% de todo o mundo já possui um aparelho destes.

O Brasil é um país cuja população mergulha sem medo nas novas tecnologias. Por aqui, segundo uma pesquisa da FGV, há mais de um smartphone por habitante, pois existem 242 milhões de aparelhos em uso e o País tem pouco mais de 214 milhões de habitantes, de acordo com o IBGE.

Evidente que há pessoas com mais de um aparelho e outras que ainda não o possuem, mas o fato é que a grande maioria dos brasileiros já faz uso dos smartphones como sendo um objeto imprescindível em seu dia a dia.

Quando o homem pisou na Lua em 1969, o computador com o nome de Apollo Guidance Computer (AGC) tinha pouco mais de 4 MB de memória RAM para leitura de dados, além de 72 KB de memória ROM, enquanto um smartphone intermediário atual normalmente tem 4 GB de RAM. Isso significa que um Galaxy J8, por exemplo, tem 4 mil vezes mais capacidade de processamento que o computador da Apollo 11.

Já um iPhone com 512 GB de armazenamento tem o equivalente a 4.398.046.511.104 de bits e isso significa que sua capacidade de processamento é mais de sete milhões de vezes maior que a do AGC.

Estes números servem para mostrar que este aparelhinho que temos em mãos, que se tornou tão banal em nosso cotidiano, possui uma tecnologia muito mais avançada do que a utilizada para chegar na Lua. Claro, isso significa muitas oportunidades para os profissionais da cadeia produtiva de alimentos, mas também muitos desafios, especialmente porque sua chegada foi abrupta e a revolução disruptiva que ele vem causando é gigantesca.

O P O R T U N I D A D E S

Vamos começar pelo copo meio cheio, pois são muitas os benefícios que um smartphone pode trazer aos profissionais da cadeia produtiva de alimentos.

O mais óbvio é a possibilidade de comunicação, facilitando troca de informações, o envio de fotos, vídeos, textos, documentos, áudios gravados, podendo, por exemplo, permitir comunicação de forma rápida, precisa e simples com os membros de uma equipe de Segurança dos Alimentos.

Os smartphones podem conectar também diversos outros stakeholders como clientes, varejistas, distribuidores, transportadores, indústrias, produtores primários etc., tornando muito mais ágil as ações coordenadas, em especial, quando surgem adversidades como numa eventual gestão de crises e recall.

Contudo, o potencial de uso dos smartphones vai muito além da comunicação entre pessoas, permitindo também a comunicação entre homens e máquinas. A partir do uso da Internet das coisas (IoT), com máquinas e equipamentos adotando sensores inteligentes como os de vazão, volume, pH, temperatura, nível, cor, presença, peso e o que mais for imaginável para coletar dados,  pode-se depois remeter estas informações aos usuários que mesmo remotamente terão a possiblidade de monitorar e controlar produtos e processos em tempo real via seus smartphones.

Há diversas outras aplicações úteis dos smartphones nas áreas de vendas de produtos alimentícios, análise de satisfação de clientes, prospecção de mercados, inteligência de mercados e de negócios.

Indo além, como visto no artigo Indústria 4.0, somado ao uso de grandes bancos de dados (Big Datas), Inteligência Artificial (AI) e outras tecnologias emergentes, a indústria nos próximos anos passará por uma transformação profunda e rápida, pois a velocidade com que evolui segue um crescimento em progressão geométrica, e não tenha dúvida, os smartphones são um elo central nisto.

D E S A F I O S

Enxergar os riscos é um exercício importante, pois nos possibilita prever problemas, e como é de se esperar, há também desafios no uso de smartphones para os profissionais da indústria de alimentos.

Vou direto a um dos pontos cruciais: smartphones viciam. Assim, muitos ficam com ele no bolso, mas na primeira oportunidade aproveitam para dar uma olhadinha e alguns cliques navegando em redes sociais, aplicativos, vídeos do YouTube, e espero, também aqui no blog para se informar sobre as novidades em Food Safety, porém este hábito pode trazer riscos.

Por exemplo, suponha que um manipulador de alimentos vai ao banheiro, e naquele momento íntimo de privacidade, aproveita para dar uma clicadinha. Com isso, o ambiente insalubre possibilita contaminação do aparelho, e depois, ao longo do dia, o smartphone será um ponto potencial de contaminação cruzada.

Uma pesquisa publicada pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense coletou amostras nas telas touch screen de smartphones que foram analisadas para determinar a contagem de bactérias aeróbias mesofílicas, enterobactérias, bolores e leveduras, bactérias coliformes totais e bactérias coliformes a 45°C.  Constatou-se que mais de 70% dos aparelhos analisados apresentaram contaminação elevada por bactérias mesófilas aerofílicas e bolores e leveduras, além de 25% por enterobactérias, sendo observada a presença de coliformes a 45°C em 25% dos aparelhos avaliados, como pode ser visto aqui.

Uma outra pesquisa publicada no jornal da Universidade Federal de Goiás indicou a presença de biofilmes bacterianos em smartphones de profissionais de saúde (veja aqui).

Além do evidente risco microbiológico, a distração causada pelo uso dos smartphones em ambientes produtivos pode propiciar erros no controle operacional, na dosagem de insumos, aditivos e ingredientes, no controle de pontos críticos, e com isso, gerar produtos fora da especificação e potencialmente inseguros, e claro, até mesmo acidentes do trabalho.

Outra questão relevante que precisa ser abordada refere-se a Food Defense, especialmente no que se refere à proteção das organizações e suas marcas. Pessoas mal-intencionadas, tendo em mãos câmeras, filmadoras e gravadores que integram os apetrechos de um smartphone, podem criar verdadeiras ciladas, simulando e filmando contaminações que depois podem ser viralizadas em redes sociais com o objetivo em prejudicar determinadas marcas, e aí, até que se explique, o estrago está feito.

Há também, evidentemente, o risco de espionagem industrial ao filmar ou fotografar segredos industriais.

COMO AGIR

O fato posto é que os smartphones já são uma realidade e dificilmente deixarão de ser a curto prazo. Somente deixarão de ser quando forem substituídos por algo ainda melhor e mais prático.

A questão é como devemos agir em relação ao tema, pois ao mesmo tempo que se deve respeitar a individualidade de cada um no uso de seu smartphone, há que se considerar os riscos potenciais de seu uso em ambientes de trabalho para poder preveni-los.

Seguem algumas dicas sobre como lidar com esta questão:

  1. Limite o uso dos smartphones por área e função, mapeando quais atividades desempenhadas podem ou não utilizar os smartphones e em quais ambientes/ locais/ áreas – use um critério de gestão de riscos:
    1. Profissionais que não manipulam matérias-primas, insumos, aditivos e produtos e que precisam smartphone para melhor realizar suas atividades e funções podem ter seu uso autorizado;
    2. Manipuladores diretos de matérias-primas, insumos, aditivos e produtos não devem ter permissão para uso durante horário de trabalho;
    3. Em áreas críticas de manipulação de alimentos, onde o produto, devido às suas características intrínsecas, seja muito susceptível à contaminação, ninguém deve ter autorização de uso dos smartphones;
    4. O ítem anterior também se aplica para áreas onde seja necessária a proteção de tecnologias de produção e propriedade intelectual da organização.
  2. Dentro do tema BPF – Boas Práticas de Fabricação – treine as pessoas sobre os riscos de contaminação cruzada com smartphones e capacite todos sobre como criar uma rotina de limpeza e desinfecção das mãos e dos aparelhos, usando, por exemplo, álcool 70%  ou álcool isopropílico;
  3. O tema uso de smartphones e as regras adotadas pela organização deve ser repassado já em treinamentos de integração com periódicas reciclagens no assunto, fora, é lógico, o monitoramento constante por parte das lideranças;
  4. Para os profissionais que não podem utilizar o smartphone durante o expediente de trabalho, é conveniente que a organização disponibilize armários seguros para sua guarda;
  5. Por fim, fortaleça a Cultura de Segurança dos Alimentos, disseminando um olhar crítico para que todos sejam capazes de perceber os riscos e preveni-los.

Há muito mais a se dizer sobre os riscos e oportunidades que os smartphones podem proporcionar, assim como as formas de lidar com esta questão. Deixe sua contribuição, diga como você age neste tema no seu dia a dia profissional.

Leia também:

O uso de telefones celulares e rádios comunicadores em áreas de produção de alimentos

Aplicativos para smartphones e tablets contribuindo para a segurança dos alimentos

Os impactos da 4ª Revolução Industrial no segmento de alimentos – 1

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Gestão de documentos: burocracia ou agilidade?

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A Gestão de Documentos é o conjunto de processos que garante produção, arquivamento e uso adequado de arquivos e registros. Em outras palavras, gerenciar documentos é otimizar a busca por dados, de forma a torná-la mais fácil, organizada e segura. Desta forma, a gestão de documentos facilita o acesso à informação e permite que ela seja compartilhada de forma mais eficiente entre os diversos setores da empresa.

No entanto, quando pensamos na indústria de alimentos, logo associamos esta gestão com burocracia. Isso se deve ao fato de que essa área é regulamentada por normas que exigem um cuidado especial com os documentos. Para executá-la, não são necessários softwares robustos. O grande diferencial está na veracidade e rastreabilidade das informações, bem como no treinamento das pessoas envolvidas em monitorar o que foi documentado.

Sobre a informação documentada, a ISO 9001 prevê que esta deve assegurar que os documentos estejam disponíveis e adequados para uso, onde e quando for necessário, além de estar protegida suficientemente (por exemplo, contra perda de confidencialidade, uso impróprio ou perda de integridade). Para o controle de informação documentada, a organização deve abordar as seguintes atividades:

  1. distribuição, acesso, recuperação e uso;
  2. armazenamento e preservação, incluindo preservação de legibilidade;
  3. controle de alterações (por exemplo, controle de versão);
  4. retenção e disposição.

A forma como será realizado o controle da informação documentada deve estar descrita, de modo a garantir sua padronização.

A figura abaixo apresenta alguns insights a serem considerados:

A lista mestra é geralmente utilizada para “listar” todos os documentos controlados (registros, programas de autocontrole, procedimentos operacionais padrão, etc.). As informações a serem contempladas nesta lista são: descrição do documento, data de elaboração e revisão, além da quantidade de revisões já realizadas e os motivos, bem como onde este documento está distribuído. Esses dados permitem a rastreabilidade do documento.

Esse controle pode ser realizado tanto de formas mais simplificadas (Excel, Word) como com softwares de gestão de documentos. Cabe ressaltar que quanto mais manual é o processo, maior é a burocracia e a probabilidade de erros. No entanto, quem define qual forma utilizar é a empresa, de acordo com sua necessidade.

Geralmente, os erros encontrados nesta etapa são vinculados à incoerência entre as informações apresentadas no documento (in loco) em relação à lista mestra. Uma forma de auxiliar neste controle seria através de auditoria documental periódica realizada internamente, amostrando alguns documentos e avaliando esse controle, mas como é realizada por amostragem, há margem para erros.

Neste sentido, há uma demanda crescente para utilização de softwares de gestão de documentos, que tornam a probabilidade de erro menor, considerando a robustez de dados passíveis de controle, que podem ser personalizados de acordo com os objetivos da empresa.

São exemplos de software utilizados: Qualiex, qualis, Quali, TOTVS, entre outros. Estes promovem mais produtividade e lucratividade, economia de custos, de espaço, segurança de dados e mais praticidade.

Além disso, um software específico contribui com a restrição de acesso a documentos e facilita a distribuição, mantendo armazenadas todas essas informações. Quanto ao arquivamento destes documentos, devem seguir especificações regulamentadas para cada documento, mas geralmente envolve o dobro do tempo do shelf-life do produto.

Quanto a registros digitais, cabe ressaltar que devem ser planejados de forma que a informação documentada não possa ser alterada após sua inserção. Uma das formas geralmente utilizada é salvar em extensão pdf. Utilizar registros em planilhas Excel que permitem a atualização de dados e verificações não é aconselhável.

Outro aspecto importante que deve ser mapeado é a definição de como será realizada a verificação. Pode ser por meio de assinatura eletrônica do arquivo pdf ou outra forma aceitável pelo órgão fiscalizador.

Um aspecto importante a ser considerado é que as pessoas envolvidas com a documentação dentro da empresa, seja ela um procedimento ou até mesmo um registro a ser preenchido, devem ser treinadas para essa atividade. Descrever isso parece repetitivo, mas há diversas ocorrências em que as não conformidades são apontadas em decorrência de frequências definidas que não estão sendo atendidas e informações em registro que não atendem as descrições contempladas em procedimentos.

Neste sentido, o desafio para tornar essa atividade ágil está em compreender todo o sistema de gestão, atribuir responsabilidades, manter essa informação documentada, avaliada periodicamente e ainda fazer com que todos os envolvidos compreendam sua função/ contribuição para a assertividade deste processo.

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Correção X Prevenção, eis a questão

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Há basicamente duas formas de lidar com a segurança dos alimentos: pela via da correção e pela via da prevenção. Na prevenção, deve-se agir antes e evitar que um problema ocorra; já na correção, espera-se o problema acontecer para só depois agir.

O grupo de prevenção está constantemente melhorando suas práticas de segurança dos alimentos, aprimorando seu planos de HACCP, o treinamento de suas equipes, incluindo o fortalecimento de uma cultura de segurança de alimentos, garantindo a compra de matérias-primas, ingredientes e insumos seguros de fornecedores qualificados, fortalecendo seus programas de pré-requisitos, investimento em seus processos, projetos sanitários, melhorias nas plantas industriais e rotinas para minimizar riscos nos produtos. O grupo de correção espera até que haja uma não conformidade, uma reclamação ou um surto para agir.

Ambas as formas de lidar com a segurança dos alimentos requerem recursos financeiros, sendo que as empresas que têm uma cultura de correção são as famosas apagadoras de incêndio, correndo atrás dos problemas e arcando com os custos de mitigação de danos. Aquelas que agem dentro de uma cultura preventiva investem antes para evitar a ocorrência de problemas posteriores.

Em termos de gerenciamento de gastos, investir para prevenir problemas permite estimar, provisionar e gerenciar os recursos, mas no caso das organizações que esperam para agir depois, nem se trata de um investimento, e sim, de disponibilizar os recursos que forem necessários para mitigar os problemas. Isso pode se tornar bem dramático se houver danos aos consumidores, como em decorrência de processos judiciais ou indenizações, como nos exemplos a seguir:

  1. Chipotle, empresa com sede em Newport Beach na Califórnia, pagou a maior multa da história, de US$ 25 milhões, por ter sido responsabilizada por vários surtos (Salmonella em 2015, E. coli O157 em 2015, Norovírus em 2015/2017 e Clostridium perfringens em 2018) nos quais adoeceram mais de 1100 pessoas, felizmente, sem óbitos;Chipotle Mexican Grill - Wikipedia
  2. Peanut Corporation of America, devido a um surto de Salmonella que levou 714 pessoas a ficarem doentes, cerca de metade crianças. Nove pessoas morreram, 3 executivos foram presos e houve um prejuízo econômico gigantesco, pois a receita anual era de cerca de US$ 25 milhões, mas o custo do surto ultrapassou US$ 1 bilhão. Amendoim é um ingrediente usado em muitos outros produtos: só a Kellogg’s, um dos clientes da Peanut, estima que perdeu de US$ 65 – 70 milhões em produtos que precisaram recolher;Peanut Corporation of America - Wikipedia
  3. Jensen Farms teve problemas com um surto com Listeria, no qual adoeceram 147 pessoas e dessas 33 morreram. Seus donos, os irmãos Eric e Ryan Jenson, tiveram de pagar uma multa de US$ 150.000 cada um, faliram e foram condenados a cinco anos de liberdade condicional e seis meses de prisão domiciliar. Mas não para por aí, pois forneciam para vários players, e com isso, os processos se multiplicaram. Só com o Walmart, tiveram de fazer um acordo por um valor não revelado em 23 ações judiciais envolvendo o surto de Listeria ligado aos melões.

A mentalidade das empresas que se baseiam na lógica de só agir após a ocorrência do problema via uma correção obviamente não é proativa. Isso pode ocorrer por diversos motivos, seja por ignorância dos riscos, por desconhecimento de metodologias preventivas como o HACCP, por mera irresponsabilidade na gestão ou por apostar na probabilidade de que o problema não vai acontecer, literalmente contando com a sorte.

Já aquelas que direcionam suas ações por uma mentalidade em que se usa uma lógica preventiva são bem diferentes, são proativas, pois fazem um investimento inicial, o que a princípio pode parecer um fator oneroso, porém isso tem ROI (Return on Investment) uma vez que previne a geração de produtos não conformes, retrabalho, reclamações pagas, indenizações, recall e perda de imagem, como tratado no artigo “Gestão Estratégica em Food Safety“.

A prevenção em segurança dos alimentos é uma jornada contínua sobre a compreensão de seus muitos riscos e a implementação de procedimentos e processos para minimizar esses riscos.

As empresas que assumem essa responsabilidade implementam procedimentos que previnem riscos, o que inclui implantar, manter  e melhorar programas de GMP, MIP, PCAL, HACCP, e podem ir além, com um bom sistema de gestão em segurança de alimentos como previstos nos protocolos da FSSC 22000, IFS, BRCGS ou SQF, e para validar estas ações, passam por auditorias realizadas por organismos independentes e acreditados.

“A prevenção não é um trabalho de uma pessoa, mas toda a empresa precisa se unir à causa comum de proteger a marca e, mais importante, a vida dos clientes”.

Matt Regusci

Há ainda um outro tipo de empresa: aquela que finge ter uma mentalidade preventiva, inclusive aparentemente investindo em programas de gestão em segurança de alimentos, mas que efetivamente mascaram informações organizando as linhas industriais e registros somente quando vão receber clientes ou auditorias. Neste caso, os investimentos realizados nunca trarão o retorno esperado, e claro, a efetiva proteção dos produtos será bem capenga.

O papel das lideranças é obviamente fundamental para a construção de uma postura proativa de prevenção, tema que foi tratado no artigo “O perfil de líderes que favorecem a Cultura Food Safety “.

No dia a dia das organizações, como se sabe, a busca incessante pela redução de custos e despesas pode se tornar um impedimento para os investimentos iniciais voltados para ações de cunho preventivo, o que requer sempre uma consideração significativa sobre os riscos associados à segurança dos alimentos para incentivar a tomada de decisão. Porém, como visto no artigo “Food Safety agregando valor aos negócios“, ações preventivas são sempre um bom negócio.

A prevenção é a forma eficaz de se evitar os prejuízos decorrentes da correção.

É certo dizer que agir pela mentalidade da prevenção custa dinheiro, porém também é certo afirmar que agir pela mentalidade corretiva custa normalmente mais, pois há que se mitigar os danos causados, sem contar a irresponsabilidade que isto implica sobre a saúde pública.

Sobre este tema e para fortalecer os conceitos, leia também “Correção, ação corretiva e ação preventiva em empresas de alimentos.

E na empresa onde você atua, agem pela mentalidade da prevenção ou da correção? Conte-nos. 

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