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Food Defense, segundo a PAS 96 de 2017 (traduzida)

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Para definir uma sistemática de avaliação dos possíveis perigos aos produtos, ocasionados por contaminações intencionais (atos maliciosos – sabotagem, terrorismo ou vandalismo), e estabelecer as medidas de proteção necessárias para minimizar estes possíveis ataques, identificando, mapeando e determinando a forma de controle do acesso às áreas particularmente vulneráveis ou sensíveis através de uma metodologia de Avaliação de Ameaças e Controle de Pontos Críticos (Treat Assessment and Critical Control Points), a PAS 96, em sua 4ª (atual) edição, é uma ferramenta.  A TACCP é uma das avaliações sistemáticas das ameaças em processos para identificar pontos vulneráveis e a implementação de medidas corretivas para melhorar a resiliência contra ataques maliciosos por indivíduos ou grupos.

Neste guia, aqui traduzido da PAS 96:2017 (PAS significa: processo de desenvolvimento mais rápido do que um completo padrão de consenso britânico; um documento credível, para facilitar o processo de construção de consenso com as partes interessadas; pode ser produzido para especificações do produto, códigos de conduta, diretrizes, vocabulários; é um documento que fornece uma referência para avaliação e tem o potencial a ser desenvolvido para a promoção no processo de padrões formais a nível nacional, europeu ou internacional, ou seja, é um caminho para a produção de normas e introdução ao mercado muito rapidamente, sem o custo e o gasto de tempo de envolver um comitê), aborda a Prevenção Contra Bioterrorismo nas Indústrias de Alimentos, Bebidas e sua Cadeia de Abastecimento. Além de cases históricos, há as origens (as ameaças podem vir de: pessoas sem ligação com a organização, fornecedores e terceiros e alienados ou pessoas com desafeto pessoal), assim como os objetivos de um programa de Food Defense que são:

  • Reduzir a probabilidade de ataques mal-intencionados;
  • Reduzir as consequências de um ataque;
  • Proteger a reputação da organização;
  • Tranquilizar os clientes e público que medidas estão em vigor para proteger os alimentos;
  • Responder às expectativas internacionais, e apoiar o trabalho dos aliados e parceiros comerciais.

Aborda também a identificação das ameaças (letras a seguir) e de agressores (números a seguir):

  1. Contaminação Maliciosa;
  2. Extorsão;
  3. Espionagem;
  4. Crime cibernético.
  1. Extorsionário;
  2. oportunista;
  3. extremista;
  4. indivíduo irracional;
  5. indivíduo descontente;
  6. hacker;
  7. criminoso profissional.

Na Avaliação de Ameaças e Medidas de Controle são considerados locais onde as instalações possam ser invadidas; pontos onde um perigo possa ser intencionalmente introduzido, em especial onde houver exposição de produtos; sistemática de controle de acesso à empresa e aos diferentes setores da empresa e também se deve considerar o histórico de ocorrências quando existente. O foco está nas pessoas, uma vez que os atos maliciosos são sempre iniciados por indivíduos ou grupos com intenção de prejudicar a empresa ou contaminar os produtos propositadamente. Para tal há uma matriz de risco sugerida de proporcionalidade destas medidas de controle:

E a partir do risco, reclassifica-se a medida de proteção, determinando a sensibilidade da área, da seguinte maneira:

  • RISCO BAIXO OU ACEITÁVEL: necessária medida de controle “normal”. A área não é considerada sensível.
  • RISCO ACEITÁVEL: necessária medida de controle “aumentada”. A área pode ser classificada como sensível.
  • RISCO ALTO OU MUITO ALTO: necessária medida de controle “excepcional”. A área é considerada obrigatoriamente sensível.

Nos casos em que o risco for moderado, alto ou muito alto e a área for classificada como sensível, avaliar a necessidade de implementação de novas medidas de proteção, a fim de minimizar as ameaças, incluindo incentivar todos os colaboradores para identificar e reportar qualquer atitude suspeita ou visitantes que estejam circulando pela planta sem estarem acompanhados de um responsável da empresa.

Há que se revisar o estudo sempre que novas ameaças forem identificadas ou se algum ato malicioso efetivamente ocorrer, assim, rever o estudo de gerenciamento de ameaças. Caso um ato malicioso seja identificado de fato, considerar o caso como crise e tratar conforme o procedimento de Gestão de Crises.

Para relembrar tudo o que já discutimos por aqui, pela relevância do tema, acessem também este apanhado a seguir:

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-e-food-fraud-voce-ja-fez-prova-de-acesso-sua-instalacao/

https://foodsafetybrazil.org/traducao-guia-do-fda-que-trata-de-estrategias-de-mitigacao-em-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-em-embalagens-suscetiveis-de-alteracoes/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-garantia-de-qualidade-leite/

https://foodsafetybrazil.org/sabia-que-nova-iso-220002018-inclui-food-fraud-e-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/guia-de-food-defense-da-fssc-22000-em-portugues/

https://foodsafetybrazil.org/auxilio-com-algumas-referencias-sobre-food-defense-e-food-fraud/

https://foodsafetybrazil.org/documentos-orientacao-sobre-defesa-alimentar/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-bioterrorismo-e-biovigilancia-na-industria-de-embalagens/

https://foodsafetybrazil.org/versao-2017-guia-pas-96-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-os-10-mandamentos-na-defesa-dos-alimentos/

https://foodsafetybrazil.org/como-implementar-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-fda-emite-regulamento-final-para-estrategia-de-mitigacao-em-adulteracao-intencional-de-alimentos/

https://foodsafetybrazil.org/treinamentos-de-food-defense-e-consultor-em-servicos-de-alimentacao-em-fortaleza/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-protecting-the-global-food-system-from-intentional-adulteration-neal-fredrickson/

https://foodsafetybrazil.org/dicas-para-elaborar-um-procedimento-de-food-defense-uma-ameaca-real/

https://foodsafetybrazil.org/falhas-em-food-defense-podem-levar-a-nao-conformidades-maiores-em-auditoria-de-seguranca-de-alimentos/

https://foodsafetybrazil.org/painel-sobre-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/material-instrutivo-sobre-food-defense-no-site-do-fda/

https://foodsafetybrazil.org/material-instrutivo-sobre-food-defense-no-site-do-fda/

https://foodsafetybrazil.org/video-sobre-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/a-cerimonia-da-salva-rudimentos-de-food-defense/

https://foodsafetybrazil.org/temas-em-food-defense-controles-de-acesso-a-armazens/

https://foodsafetybrazil.org/food-defense-protecao-contra-a-contaminacao-intencional/

https://foodsafetybrazil.org/crimes-ciberneticos-nas-industrias-alimenticias/

https://foodsafetybrazil.org/os-perigos-da-comidas-delivery/

https://foodsafetybrazil.org/novos-documentos-mitigacao-fraude-defesa-alimentar/

https://foodsafetybrazil.org/orientacao-mitigacao-fraude-alimentar-defesa-alimentar/

https://foodsafetybrazil.org/base-de-dados-de-estrategias-de-mitigacao-da-defesa-alimentar/

https://foodsafetybrazil.org/diretrizes-para-controle-de-acesso/

https://foodsafetybrazil.org/haccp-taccp-vaccp-entenda-a-diferenca-entre-estas-ferramentas/

https://foodsafetybrazil.org/agroterrorismo-uma-ameaca-a-cadeia-de-fornecimento-de-alimentos/

https://foodsafetybrazil.org/novos-documentos-de-orientacao-sobre-mitigacao-de-fraude-alimentar-e-defesa-alimentar-i/

https://foodsafetybrazil.org/pode-existir-ligacao-entre-terrorismo-e-crime-organizado-e-a-industria-de-alimentos/

https://foodsafetybrazil.org/publicacao-do-pas-962014/

https://foodsafetybrazil.org/e-quando-os-generos-alimenticios-funcionam-como-transporte-de-narcoticos-e-para-considerar-como-perigo/

https://foodsafetybrazil.org/bioterrorismo-estamos-preparados/

 

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Dúvida de leitor: vou iniciar a comercialização do molho que sirvo em meu restaurante, e agora?

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Aqui no Food Safety Brazil, o maior objetivo é disseminar conhecimento e alavancar as práticas em Segurança de Alimentos. Por isso, o time de colunistas busca dar muita atenção às dúvidas recebidas de leitores e as transforma em posts. Afinal, uma mesma dúvida pode estar na mente de muitos profissionais de alimentos!

A seguinte dúvida é tema deste post: “sou proprietário de um restaurante japonês. Nós usamos o molho caseiro artesanal feito por nós, trata-se do molho Tare. Estamos querendo envasar esse molho e colocar em alguns estabelecimentos para vender. Você conseguiria me informar se é necessário algum responsável técnico, alguma nutricionista, algum químico, qual profissional eu necessito para fazer a receita para poder envasar e pegar as autorizações necessárias?”.

Há algum tempo, o Food Safety Brazil trouxe informações bastante completas sobre regularização de produtos artesanais em “Produção e comercialização de alimentos artesanais – saiba por onde começar para regularizar seu negócio”. O racional regulatório do texto é totalmente aplicável ao caso do leitor em tela, porém o objetivo deste post é destacar os principais pontos da legislação sanitária para este novo negócio. Não há respostas prontas nas normas para essa mudança no formato da comercialização do molho, entretanto, é possível construir um racional regulatório para a orientação do proprietário do restaurante.

Primeiro ponto. O restaurante é um serviço de alimentação por definição, como previsto na RDC nº 216/2004 da Anvisa “Serviço de alimentação: estabelecimento onde o alimento é manipulado, preparado, armazenado e ou exposto à venda, podendo ou não ser consumido no local”. No entanto, preparar o molho e acondicionar em embalagem para venda em outro estabelecimento caracteriza outra atividade. Importante notar o que traz o artigo 5º inciso I do Decreto nº 7212/2010 que trata do Imposto sobre Produtos Industrializados IPI. Tal Decreto elucida que não é considerada industrialização “o preparo de produtos alimentares, não acondicionados em embalagem de apresentação, em restaurantes e semelhantes, desde que os produtos se destinem a venda direta a consumidor”. O molho do restaurante não será vendido diretamente ao consumidor final, mas sim a outro estabelecimento, portanto, a atividade se torna fabricação de alimentos. Isso impacta na CNAE – Classificação Nacional de Atividade Econômica que passa a ser “10.95-3 Fabricação de especiarias, molhos, temperos e condimentos”, o que por sua vez modifica a licença sanitária do estabelecimento.

Segundo ponto: é imprescindível se atentar às normas de rotulagem pertinentes ao produto. A RDC nº 259/2002 da Anvisa trata da rotulagem geral de alimentos e se aplica a todo alimento que seja comercializado, qualquer que seja sua origem, embalado na ausência do cliente, e pronto para oferta ao consumidor. Eis aqui o molho do restaurante, agora comercializado em outros estabelecimentos! Além desta legislação, outros regulamentos técnicos de rotulagem essenciais para a oferta de alimentos seguros devem ser considerados, tais como, rotulagem nutricional (RDC nº 360/2003), declaração da presença de glúten (Lei nº 10674/2003), declaração da presença de lactose (RDC nº 136/2017) e informação de alergênicos (RDC nº 26/2015), dentre outras.

Terceiro ponto: o molho deve estar de acordo com o regulamento técnico do produto e deve ser regularizado perante o órgão competente. Essa categoria de alimento é regulada pela Anvisa, e a norma pertinente é a RDC nº 276/2005 que trata do REGULAMENTO TÉCNICO PARA ESPECIARIAS, TEMPEROS E MOLHOS. A RDC nº 276/2005 estabelece a identidade e as características mínimas de qualidade dos molhos, incluindo a designação de venda do produto para fins de rotulagem. Os molhos são dispensados de registro conforme a RDC nº 27/2010; trata-se do código 4100042 “Especiarias, temperos e molhos” do Anexo I. Neste caso, para os produtos isentos da obrigatoriedade de registro deve ser feito o comunicado de início de fabricação junto a Vigilância Sanitária local, de acordo com a Resolução nº 23/2000 da Anvisa. Entretanto, há casos em que legislações municipais ou estaduais dispensam o produto da comunicação de início de fabricação de acordo com o grau de risco do alimento, por isso, a recomendação é entrar em contato com Vigilância Sanitária da localidade.

Último ponto: Responsabilidade técnica. Essa é outra dúvida recorrente dos leitores, e por isso, o Food Safety Brazil detalhou o tema em “Quem pode ser Responsável Técnico na área de alimentos?”. A Lei nº 6.437/1977, que trata das infrações sanitárias, prevê penalidades em caso de ausência de responsável técnico habilitado na produção de alimentos. Porém, as normas não estabelecem a qual categoria profissional o responsável técnico deve pertencer. Como tratado no post citado anteriormente, há uma ampla gama de profissionais que podem exercer a responsabilidade técnica em alimentos, tais como engenheiros de alimentos, nutricionistas, tecnólogos e cientistas de alimentos, etc. Em consulta recente do blog à Anvisa, o órgão recomendou entrar em contato com os Conselhos de Classe Profissionais, além dos Órgãos de Vigilância Sanitária local que possuem autonomia para regulamentar o tema. É importante lembrar que, dependendo do estado e do município, a Vigilância Sanitária Municipal pode não exigir um Responsável Técnico, considerando o tipo de empreendimento e o risco sanitário da atividade.

Estes quatro fundamentos regulatórios abordados até aqui são as principais orientações para o início da venda do molho preparado no restaurante por outros estabelecimentos. Nota-se que o arcabouço legal sanitário no Brasil é extenso e complexo, e que a oferta de alimentos seguros é extremamente dependente do atendimento da legislação. O Food Safety Brazil agradece a dúvida enviada pelo leitor e espera ter contribuído para o crescimento do seu negócio!

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Correção, ação corretiva e ação preventiva em empresas de alimentos

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Frequentemente percebo confusão no uso dos termos correção, ação corretiva e ação preventiva, todos estes essenciais na gestão da qualidade e segurança dos alimentos. Por isso, precisam ser perfeitamente compreendidos.

A ISO 9000:2015, que trata dos fundamentos e vocabulário usado como referência para a compreensão da ISO 9001:2015 sobre Sistemas de gestão da qualidade – Requisitos, diz que:

  1. Ação preventiva é uma ação para eliminar a causa de uma potencial não conformidade ou outra situação potencialmente indesejável;
  2. Ação corretiva é uma ação para eliminar a causa de uma não conformidade e prevenir recorrência, considerando ainda que pode existir mais de uma causa para uma não conformidade. Por isso, na ação corretiva se analisa criticamente uma não conformidade, se determinam suas causas, para as quais se implementam ações e se avalia a eficácia das mesmas;
  3. Correção é uma ação para eliminar uma não conformidade identificada, sendo que são tomadas ações para controlar e corrigir um problema, assim como se lidam com as consequências. Uma correção pode ser feita antes de, ou em conjunto com uma ação corretiva, considerando que uma correção pode ser, por exemplo, um retrabalho, reprocesso ou reclassificação.

Resumindo: a ação preventiva é executada para evitar uma ocorrência potencial, portanto, antes mesmo de ela ter ocorrido, enquanto a ação corretiva é para evitar a recorrência de um problema identificado. Já a correção é uma ação sobre uma não conformidade ocorrida para evitar que um produto não conforme ou potencialmente inseguro siga para o cliente ou consumidor, mas sem se preocupar em evitar que o problema volte a ocorrer.

Assim, após acontecer uma não conformidade e realizada de imediato uma correção, julga-se a necessidade de uma ação corretiva, atualizam-se riscos e oportunidades, assim como se fazem mudanças no sistema de gestão da qualidade e de segurança dos alimentos, em planos de HACCP, procedimentos operacionais padronizados, ou onde for necessário.

Sobre as ações corretivas, convém lembrar que de nada adianta abrir registros e boletins se as tratativas são feitas superficialmente e os problemas não são satisfatoriamente sanados.

Empresas que abrem não conformidades apenas com intuito de preencher formulários e gerar burocracia, sem efetivamente tratá-las em sua causa-raiz, não conseguem girar o PDCA que permite evoluir em prol da melhoria contínua. O mais importante, o que realmente interessa numa ação corretiva, é tomar ações capazes de efetivamente evitar recorrências, pois se uma não conformidade se repete, ela não foi tratada eficazmente.

Em todos os casos, deve-se registrar a ocorrência, a ação de correção que foi tomada, considerando que esta deve ser proporcional à magnitude do problema e aos efeitos adversos gerados. Também é importante registrar o responsável por tal ação, que obviamente deve ter autoridade e responsabilidade designada para isso, como visto em RACI.

A ISO 22000:2018 sobre Sistemas de gestão de segurança dos alimentos – Requisitos para qualquer organização na cadeia produtiva de alimentos  define tais termos nas mesmas condições.

Uma correção, no contexto da segurança dos alimentos, inclui o tratamento de produtos potencialmente inseguros, como por exemplo, reprocessamento, processamento posterior e/ ou eliminação das consequências adversas de não conformidades, como destruição, destinação a outro uso ou rotulagem específica, sendo o mais importante, evitar que produtos contaminados ou potencialmente contaminados cheguem aos consumidores.

Vamos a um exemplo lúdico para ajudar na construção do entendimento destes conceitos: imagine que você tem uma vaca num pasto e sua vaca cai num brejo:

  • A correção é tirar a vaca de lá, dar um banho nela, ver se machucou e tratá-la;
  • A ação corretiva é investigar os motivos e razões que levaram a vaca a cair no brejo. Neste caso, vamos supor que é porque ela estava com sede, foi beber água e caiu. Portanto, para evitar que ela volte a cair, temos de cercar o brejo, e mais que isso, providenciar um local para que ela mate sua sede de agora em diante;
  • A ação preventiva seria ter cercado o brejo e instalado um bebedouro para o gado antes da vaca cair, ou mesmo instalar agora no pasto onde há carneiros e eles nunca caíram, mostrando que houve um aprendizado com o caso das vacas.

Vamos analisar mais um caso lúdico para fortalecer o entendimento: agora imagine que ao ir tomar café no trabalho ele frequentemente está muito ruim, cada dia vem de um jeito, muito forte, ou sem açúcar, ou muito doce, ou “chafé”. Ao falar com a copeira, ela explica que cada dia é uma cozinheira que faz ao seu jeito, cada uma compra a marca de café que gosta, que tem até café estragando porque cada uma quer usar só a marca que comprou, e além disso, a garrafa térmica está quebrada.

  • A correção é se desculpar e recolher o café que estiver “imbebível”;
  • A ação corretiva requer a tomada de ações sobre todas as causas levantadas que derivam no problema, para que dali em diante se sirva um café que atenda ao gosto da maioria.

Num plano de HACCP, quando se toma uma ação num PCC para trazer os processos de volta aos limites críticos de controle ou num PPRO para garantir que os critérios de controle sejam atendidos, temos uma correção, pois o objetivo é restabelecer a segurança do processo imediatamente e evitar que um produto não conforme ou potencialmente inseguro siga adiante, mas não há neste momento o intuito de investigar as causas do desvio para evitar que ocorram novamente

Contudo, em alguns casos, quando correções se tornam muito corriqueiras e acabam por atrapalhar as cadências dos processos, e com isso, acabam por aumentar os riscos potenciais, dependendo de sua natureza e escala, então, parte-se também para uma ação corretiva, investigando-se a causa raiz objetivando evitar que novos desvios ocorram.

Por exemplo, num esterilizador, quando sob vazão constante a temperatura mínima necessária para atingir o Fo (letalidade) não é atingida, e se retorna o produto para receber novamente o tratamento térmico ao mesmo tempo em que se eleva a temperatura, temos uma “correção”.

Por outro lado, a “ação corretiva” se faz necessária quando tal evento passa a ocorrer acima de um limite considerado aceitável pela organização, onde conclui-se que é preciso evitar que tais desvios se repitam com frequência, portanto, depende da compreensão de suas causas para que sobre elas se adotem ações.

Por outro lado, se na análise de perigos se identificam riscos potenciais e se tomam medidas evitando sua ocorrência, temos ações preventivas.

Espero que o artigo tenha ajudado a sedimentar estes conceitos tão importantes! Deixe seu comentário, ajude a divulgar conhecimento em segurança dos alimentos!

Referências bibliográficas:

  1. BERTOLINO, M. T. e COUTO, M. Sistemas de Gestão Integrados: ISO 9001 + ISO 14001 + ISO 45001, com foco em resultados. Niterói, SGI-68, 2020;
  2. BERTOLINO, M. T. Gerenciamento da Qualidade na Indústria Alimentícia: Ênfase em Segurança dos Alimentos. Porto Alegre, Ed. ARTMED, 2010.

 

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Movimento Clean Label e seus impactos em Segurança de Alimentos

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Você já deve ter ouvido falar de Clean Label, certo? Afinal esse movimento tem ganhado muita força nos últimos tempos.

No centro do movimento de Clean Label, há uma mudança subjacente nas percepções das pessoas sobre os alimentos e o que eles deveriam ser. Embora ainda não exista legislação a respeito, há basicamente 3 diretrizes de consenso que caracterizam estes produtos:

  • produtos naturais (sem aditivos artificiais e/ou químicos) e/ou minimamente processados,
  • com lista de ingredientes simples/curta,
  • com compostos de nomes conhecidos do consumidor.

Nesse artigo vamos nos ater à primeira diretriz. Visando produzir alimentos mais naturais ou menos processados, muitas indústrias de alimentos têm testado novas formulações e/ou novos processos, como fórmulas sem conservantes ou produtos menos processados, reduzindo ou eliminando etapas como, por exemplo, um tratamento térmico que prolongaria a vida de prateleira desse produto – você já parou para pensar nas implicações disso para a segurança de alimentos?

Quando uma indústria opta por tirar um conservante de uma formulação ou reduzir um processamento, isso pode gerar uma reação em cadeia pois ela passa a cobrar de seus fornecedores uma melhor qualidade das matérias primas, principalmente em termos microbiológicos.

Vamos entender melhor: todos nós sabemos que a qualidade da matéria prima é essencial para a fabricação de um produto seguro, dentro de padrões microbiológicos especificados. A indústria de alimentos, em muitas ocasiões, se responsabiliza por isso – por reduzir contaminantes a níveis aceitáveis. O APPCC é um bom exemplo: quem aqui nunca se deparou com a clássica pergunta “essa etapa foi especificamente projetada para prevenir, eliminar ou reduzir perigos a níveis aceitáveis?” Como fornecedor, que fornece matéria prima a uma indústria de alimentos, há o pensamento de que uma especificação microbiológica pode ser flexibilizada visto que o próximo elo se tornará o responsável pelo controle – a própria ISO 22.000 estabelece essa possibilidade no requisito 7.4.2. Com o Clean Label, não mais!

Ao seguir a tendência de Clean Label, essa responsabilidade é passada (ou dividida) ao elo anterior da cadeia, os fornecedores. Estes passam então a ter a necessidade de implementar (ou pelo menos considerar) uma etapa de inativação ou redução microbiana em seus processos.

Dessa forma, os fornecedores, também indústrias de alimentos, começam a pesquisar formas de garantir matérias primas de “melhor” qualidade, ou seja, formas de descontaminar o produto. É aí que entramos com um outro assunto que está está muito em voga: as tecnologias emergentes. O Food Safety Brazil já trouxe esse tema – veja aqui  e aqui.   Por definição, tecnologias emergentes são aquelas que têm o potencial para criar ou transformar o ambiente de negócios nos próximos 5 a 10 anos e poderão alcançar grande influência econômica, mas que ainda não se consolidaram.

Vamos a um exemplo: farinha de trigo. O processo de fabricação da farinha de trigo é realizado por um moinho de trigo, onde não há nenhuma etapa de inativação microbiana. O trigo, por sua vez, vem do solo, habitat natural de microrganismos. Hoje em dia tem sido testada a utilização de ozônio para descontaminação de farinhas – ozônio é uma tecnologia emergente. Leia mais sobre isso aqui. Outro bom exemplo são os fabricantes de temperos que servem de matéria prima para indústrias de alimentos. Sim, temperos – onde microrganismos patógenos, como a salmonela podem se desenvolver e que alguns ainda insistem em dizer que o “produto é seco e não precisamos nos preocupar”. Tecnologias emergentes como luz pulsada e plasma frio têm sido estudadas pois, além de descontaminar o produto, reduzem o impacto adverso do processamento nas propriedades organolépticas, nutricionais e também funcionais deste produto.

A verdade é que a onda Clean Label vai muito além dos novos hábitos de consumo. Ela apresenta impactos significativos em segurança de alimentos – as indústrias querem atender aos desejos de seus consumidores e para tal precisam criar robustez em seus processos. Do ponto de vista de segurança de alimentos isso é um enorme desafio, mas também é um grande avanço pois chama a responsabilidade para toda a cadeia de fornecimento.

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Guia de 2021: “Alergênicos Inesperados em Alimentos” traduzido

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O Food Safety Brazil mais uma vez traz, em primeira mão, a tradução de um Guia para a Indústria de Alimentos e para nossos leitores. Disponibilizamos agora a tradução do documento de orientação que pode auxiliar em uma abordagem para o manejo, comunicação e rotulagem de alergênicos sobre “Alergênicos Inesperados associados a alimentos, ingredientes, misturas agrícolas e as fraudes alimentares”.

O tema alergênicos é um dos principais neste blog (aqui), seja pela imensa preocupação com consumidores e cases de recalls mundiais, superando de microrganismos patogênicos em alguns países.

Este documento descreve a orientação das melhores práticas da indústria para o gerenciamento de alérgenos, rotulagem de alérgenos e comunicação de alérgenos para a Austrália e a Nova Zelândia, que é coescrito pelo Allergen Bureau e o Australian Food and Grocery Council (AFGC). Está disponível gratuitamente, em inglês, em ambos os sites (aqui).

Este guia revisado, da versão anterior de 2011, fornece à indústria de alimentos uma lista de alimentos, ingredientes e matérias-primas que podem conter alérgenos inesperadamente e uma lista de perguntas que os operadores de empresas de alimentos podem fazer a seus fornecedores que apoiam o processo de análise de risco de alérgenos. Nesta versão a lista foi expandida e atualizada de alimentos, bem como novas informações sobre mistura agrícola, fraude de alimentos e alguns estudos de caso que mostram a complexidade na cadeia de abastecimento, onde alérgenos podem ser incorporados inesperadamente.

Na Tabela 1 deste guia, há ajuda para identificação de alergênicos que podem ocorrer em ingredientes, aditivos e auxiliares de processamento e algumas perguntas para um programa consistente de garantia de fornecedor para cada ingrediente relevante, com informações sobre alergênicos claras e completas, demonstrando a devida diligência.

Na Tabela 2 há auxílio na identificação de misturas de alergênicos que podem estar presentes em culturas ou commodities, incluindo aquelas que passaram por processamento primário e/ou mínimo (tais como classificação, moagem, secagem ou congelamento), assegurando que a resposta a tais questões, como delineado na tabela, seja conhecida, registrada e incluída na análise de risco de alergênicos da commodity ou deve ser capaz de fornecer uma especificação de alergênico considerada para seu cliente, que é encorajado a consultar também esta tabela ao rever suas informações de ingredientes. Aborda ainda as práticas agrícolas e controles de alérgenos na Tabela 3 onde os controles podem ser implementados e as situações em que pode não ter havido, historicamente, nenhum controle identificado. E a Tabela 4 descreve as práticas que podem ser implementadas para controlar e reduzir a extensão de misturas agrícolas de alergênicos com culturas e commodities.

A presença desconhecida de alérgenos que foram deliberadamente adicionados a alimentos e ingredientes com o propósito de substituição, adulteração e ganho econômico é também contemplada neste guia, na Tabela 5.

Finalizando esta leitura que super vale a pena, trazem estudos de casos sobre práticas de rotação de culturas que podem afetar o status de alergênico do ingrediente e a necessidade de compreensão das cadeias de distribuição complexas.

Acesse aqui: Unexpected-Allergens-in-Food-Jan-2021-traduzido

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É conveniente estripar o pescado?

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A evisceração de pescado melhora a segurança desse alimento? A resposta é sim. Tentarei, nestas breves linhas, desenvolver alguns dos fundamentos para justificar essa resposta afirmativa.

Espécies magras: neste grupo de peixes estão aqueles com menos de 2% de gordura. Fazem parte deste grupo o bacalhau, a garoupa, a pescada, o linguado, o tamboril. Em primeiro lugar, é sempre aconselhável eviscerar o peixe magro o mais rápido possível após a sua captura, como forma de manter as condições de frescura por mais tempo em relação ao peixe não eviscerado, prolongando a vida útil do produto fresco. Quer se trate da prática da pesca desportiva, sem reembolso, ou da pesca artesanal ou industrial, o ato de abrir a cavidade abdominal com um corte limpo e higiênico, por meio de uma faca ou com maquinário adequado, retirando as vísceras e lavando a cavidade com água potável ou água do mar limpa, melhora as condições dos peixes como alimento. Se não for possível estripar peixes magros imediatamente após a captura, a melhor opção é mantê-los em local fresco e higiênico, com temperatura abaixo de 10°C e sempre longe da luz solar direta. Qualquer fonte de calor próxima pode afetar irreversivelmente a qualidade e a segurança dos peixes. Em seguida, proceda à sua evisceração o mais rápido possível. A evisceração pode ou não ser acompanhada de corte e separação da cabeça. Em certas ocasiões, é preferível manter a cabeça como forma de apresentação ou como forma de facilitar a identificação da espécie. No entanto, é uma forma muito comum de apresentação os peixes sem cabeças e eviscerados (H&G), Haeded and Gutted pelo seu nome em inglês.

A legislação em alguns países do norte da Europa exige que o peixe seja eviscerado imediatamente após a captura. Na Colômbia, todos os peixes importados devem ser eviscerados anteriormente. No entanto, na África Ocidental, por razões culturais, os consumidores preferem peixes inteiros com entranhas.

Remoção de microrganismos e enzimas – Ao remover as vísceras, também é removido todo o conteúdo estomacal e intestinal, que contém microrganismos, que sem ser necessariamente patogênicos, têm a capacidade de deteriorar a qualidade organoléptica dos peixes. As gônadas (sistema reprodutivo) também são removidas.

A atividade microbiana é responsável pela deterioração da maioria dos produtos de peixe fresco, dependendo da temperatura a que estão expostos, da época do ano, da época de desova, da época de alimentação e das espécies. Porém, ao remover as vísceras e lavar a cavidade abdominal e torácica com água limpa, muitos dos microrganismos que causam deterioração são eliminados.

Eliminar parasitas – Ao eviscerar, parasitas podem estar presentes no aparelho digestivo (estômago, intestinos e fígado) e quando se iniciam os processos bioquímicos post-mortem, podem migrar das vísceras para a musculatura, parte comestível dos peixes. É o caso do conhecido e perigoso parasita Anisakis, entre outros.

Melhora o preço de comercialização – O peixe eviscerado pode melhorar o preço de comercialização, em comparação com o peixe inteiro, para um setor do mercado que o exige. Outra vantagem adicional a este respeito é que a preparação em casa é facilitada.

Otimiza o espaço de armazenamento – Ocupa menos espaço no porão do barco de pesca. Em geral, o peso das vísceras não é uniforme ao longo do ano, dependendo da espécie, do conteúdo estomacal e do ciclo reprodutivo, mas pode atingir em média 10% do peso total dos peixes.

Evisceração e deterioração – A evisceração após a captura tem a vantagem de prolongar a vida útil dos peixes, pois mantém a qualidade organoléptica e sanitária por mais tempo, como já foi explicado, mas deve-se levar em consideração que quando o pescado está em processo de deterioração avançada, estragado, a ação da evisceração não reverte o processo de deterioração.

Espécies gordas: quando se trata de espécies conhecidas como peixes azuis (cavala, anchova, sardinha), com 5% de gordura ou mais,  a evisceração nem sempre melhora as condições de frescor. Em primeiro lugar, eviscerar peixes gordurosos de pequeno porte não é muito conveniente porque é trabalhoso e devido ao alto custo da mão de obra. Também o teor de gordura é exposto à oxidação de lipídios com o consequente processo de ranço.  Devemos ter em mente que o percentual de gordura varia ao longo do ano. Da mesma forma, nessas espécies o conteúdo estomacal e os aspectos fisiológicos reprodutivos (gônadas maduras) têm grande influência. Mesmo assim, pode ser conveniente estripar os peixes que comeram e ficar com o estômago cheio. Nesse caso, há atividade bacteriana e enzimática em pleno desenvolvimento digestivo. Quando ocorre a captura e se inicia a fase post-mortem, essa atividade transcende o trato digestivo e atinge a parede muscular abdominal, causando a autólise clássica. Esse processo deteriora fortemente a parede abdominal, chegando a perfurá-la, o que é conhecido como estouro de barriga, permitindo que as vísceras fiquem expostas para o exterior. Isso causa uma diminuição muito acentuada na qualidade e no rendimento dos filés e um efeito no aspecto sanitário ao expor a carne do peixe a contaminações externas. Independentemente de eviscerado ou não, o peixe fresco deve ser preferencialmente mantido refrigerado a uma temperatura próxima de 0°C. A evisceração é sempre indicada para peixes grandes como o atum, o cação azul e o espadarte.

Em conclusão, considerando apenas estes aspectos, pode-se dizer que a evisceração dos peixes imediatamente após a captura em espécies magras, melhora notavelmente a qualidade sanitária do pescado, suas perspectivas de comercialização, armazenamento e vida de prateleira em benefício de toda a cadeia de valor, da captura à mesa do consumidor. Mas com relação às espécies de peixes gordurosos, a evisceração pode ser conveniente em alguns casos e inconveniente em outros, dependendo dos fatores fisiológicos da espécie. Deve ser avaliado cada caso.

Referências:

http://www.fao.org/3/v7180s/v7180s07.htm

http://www.fao.org/3/v7180s/v7180s05.htm

4 min leituraA evisceração de pescado melhora a segurança desse alimento? A resposta é sim. Tentarei, nestas breves linhas, desenvolver alguns dos fundamentos para justificar essa resposta afirmativa. Espécies magras: neste grupo […]

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Você já conhece a nova legislação da ANVISA sobre Certificação BPF para alimentos?

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Quando o assunto é Boas Práticas de Fabricação (BPF), o Food Safety Brazil não pode ficar de fora. No final de maio, a Anvisa publicou a RDC nº 497/2021 que dispõe sobre os procedimentos administrativos para concessão de Certificação de Boas Práticas de Fabricação e de Certificação de Boas Práticas de Distribuição e/ou Armazenagem. E você, já está por dentro da nova norma? O objetivo desse post é trazer informações sobre o processo regulatório que originou a nova RDC, bem como os principais pontos aplicáveis à indústria de alimentos.

A RDC nº 497/2021 é fruto da Consulta Pública CP nº 805/2020, processo regulatório proveniente do tema transversal 1.7 “Certificação de Boas Práticas de fabricação para produtos sob regime de vigilância sanitária (CBPF)” da Agenda Regulatória da Anvisa 2017-2020. O prazo de contribuições para esta CP ficou aberto de abril a agosto do ano passado. Não foi realizada a etapa de Análise de Impacto Regulatório (AIR), e segundo a Anvisa, a justificativa para dispensa dessa etapa é que este processo de revisão do ato normativa visou exclusivamente à simplificação administrativa, sem alteração de mérito. De acordo com o Termo de Abertura de Processo TAP nº 27/2020, uma das razões que motivou a abertura da CP nº 805/2020 é que a regulamentação anterior (RDC nº 39/2013) não contemplava a categoria de alimentos como passível de Certificação, em especial os palmitos.

O Parecer nº 9/2020/SEI/GGFIS/DIRE4/ANVISA traz esclarecimento sobre a proposta de inclusão da categoria de alimentos como passível de Certificação. Segundo o documento, a Certificação de Boas Práticas para a Fabricação de Palmito foi disposta pela Anvisa na Resolução nº 7/2000, e, embora a RDC nº 39/2013 seja mais recente que essa norma, não incorporou a Certificação desta categoria de produtos. A não incorporação de alimentos no escopo da RDC nº 39/2013 trouxe problemas como a ausência de critérios administrativos para o tratamento das petições, como também ausência de critérios para a renovação destas. Conforme o Parecer da Anvisa, a inclusão da categoria alimentos na proposta de revisão seria restrita a palmito, favorecendo o alinhamento à Resolução nº 7/2000, e proporcionando maior transparência regulatória ao tratamento das petições. Deste modo, o texto da CP nº 805/2020 previa a Certificação BPF apenas para palmito em conserva, no entanto, este texto não foi mantido na versão final da nova norma publicada (RDC nº 497/2021).

Importante notar que a área da Anvisa responsável pelo processo é a Gerência Geral de Fiscalização e Inspeção Sanitária (GGFIS), e não a Gerência Geral de Alimentos (GGALI), por isso é um tema transversal da Agenda. De acordo com a ficha de acompanhamento do tema disponível no site da Agência, outra justificativa para inclusão do tema na Agenda foi a necessidade de simplificação e otimização do processo de certificação das Boas Práticas de Fabricação e de certificação das Boas Práticas de Distribuição e/ou Armazenagem. A Anvisa esclareceu que realizou a modernização do marco regulatório de BPF de medicamentos, e racionalizou os procedimentos operacionais padrões que regem as atividades do sistema nacional de inspeção; portanto, este processo regulatório visa alinhamento às demais normativas e procedimentos vigentes.

A RDC nº 497/2021 entrou em vigor no início de junho e revogou a RDC nº 39/2013. Como mencionado anteriormente, é relevante observar que a Resolução revogada não se aplicava à área de alimentos; por isso a  RDC nº 497/2021 é novidade para os profissionais que atuam em Segurança dos Alimentos. A nova norma institui procedimentos administrativos para a concessão de Certificações de Boas Práticas de Fabricação de Medicamentos, Produtos para Saúde, Cosméticos, Perfumes, Produtos de Higiene Pessoal, Saneantes, Insumos Farmacêuticos Ativos e Alimentos e de Certificações de Boas Práticas de Distribuição e/ou Armazenagem de Medicamentos, Produtos para Saúde e Insumos Farmacêuticos Ativos. Cabe observar que a Certificação para Distribuição e Armazenagem não está prevista para alimentos.

Para entender a aplicabilidade da RDC nº 497/2021 na indústria de alimentos é importante reforçar o que estabelece o parágrafo único do artigo 2º: “A exigibilidade, para seus diferentes fins, do Certificado de Boas Práticas de Fabricação ou do Certificado de Boas Práticas de Distribuição e/ou Armazenagem está disposta em normas específicas da Anvisa e não é tratada nesta Resolução”. Na área de alimentos, conforme a Anvisa colocou nos documentos referentes ao processo regulatório, aqui mencionados anteriormente, tal exigência existe na Resolução nº 7/2000 que dispõe sobre a emissão do Certificado de Boas Práticas de Fabricação e Controle para fins de Autorização para Exportação de palmito em conserva para o Brasil. Diante desse parágrafo e do arcabouço legal aplicável aos alimentos, entende-se que neste momento a Certificação BPF é exigida somente para a categoria de palmitos, o que não é novo para este setor. Por isso, como já citado, a Anvisa justificou a ausência da Análise de Impacto Regulatório (AIR) neste processo de sua Agenda por não se tratar de alteração do mérito da RDC nº 39/2013.

A RDC nº 497/2021 prevê que a concessão de Certificação está condicionada à existência de parecer técnico que ateste que o estabelecimento atende aos requisitos técnicos de BPF. Cabe lembrar que a indústria de alimentos está sujeita aos requisitos da RDC nº 275/2002, e no caso do palmito também da RDC nº 18/1999. De acordo com a nova RDC, a decisão da Anvisa quanto à Certificação será subsidiada por: i. relatório de inspeção emitido pela Anvisa ou pelos órgãos de Vigilância Sanitária locais, ii. Informações sobre inspeções de autoridades regulatórias e de organismos auditores terceiros reconhecidos pela Anvisa, e iii. Relatório de auditoria válido, emitido por organismo auditor terceiro reconhecido pela Anvisa conforme regulamentação específica. A Certificação de Boas Práticas de Fabricação terá duração de dois anos contados a partir de sua publicação no Diário Oficial da União (DOU).

A seção VI da RDC nº 497/2021 é exclusiva sobre a concessão e os critérios para alimentos. Estão previstas duas Certificações para a indústria de alimentos: i. Certificação de BPF para indústria internacional, e ii. Certificação de BPF para indústria no Brasil. O certificado será concedido para cada estabelecimento por linha de produção. No caso do palmito, as linhas de produção são definidas com base na espécie do palmito e no tipo de embalagem do produto. A norma também estabelece que para as diferentes finalidades a que se presta o Certificado de BPF, se faz necessária a emissão de certificados adicionais para diferentes solicitantes de um mesmo estabelecimento fabril, a fim de que seja garantida a avaliação individual dos produtos objeto da certificação. A norma define como solicitante a pessoa jurídica legalmente constituída no Brasil.

Está prevista na RDC nº 497/2021 a divulgação de informação na página eletrônica da Anvisa referente à situação das empresas quanto à Certificação de BPF e ao embasamento legal que motivou a decisão final das petições de Certificação. Esta divulgação será realizada a partir de 1/1/2022.

Estas são as principais informações referentes a RDC nº 497/2021. Apesar da novidade sobre a inclusão da indústria de alimentos no rol da Certificação de BPF pela Anvisa, a partir do texto da legislação e do histórico do processo regulatório, verifica-se que o novo instrumento regulatório atualmente se aplica à categoria de palmitos. E tal exigência de Certificação já se aplicava a este produto antes da publicação da RDC nº 497/2021. É importante que os profissionais de Food Safety fiquem atentos às movimentações regulatórias. Como já relatado aqui no blog em “Você já participou da Consulta Dirigida sobre a Agenda Regulatória 2021-2023 da Anvisa?”,  a revisão da norma de Boas Práticas de Fabricação de Alimentos está na pauta das revisões. Fique de olho na Agenda da Anvisa 2021-2023 e não deixe de participar das futuras discussões!

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Dia Mundial da Segurança de Alimentos na voz dos colunistas do Food Safety Brazil

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Os colunistas deste blog de referência decidiram compartilhar em frases (ou pílulas) de suas autorias, a importância desta data para os profissionais da área de alimentos. A data foi criada na ONU em 2018. Alinhadas com o guia da OPAS para o Dia Mundial da Segurança de Alimentos (aqui), seguem as opiniões de alguns para corroborar com esta data:

“Segurança de alimentos necessita de investimentos em educação (não apenas treinamentos), prestar atenção nos colaboradores, como reagem, sentem e praticam; certamente culminará em grandes chances de não colocar em risco à segurança de alimentos nas empresas, independentemente do porte, para atender bem ao consumidor, preservando sua saúde; começando pelas lideranças, não apenas com foco na operação, que por sua vez deve seguir “regras”, conscientemente. É preciso comunicar cuidadosamente, usando maneiras atuais, ou seja, valorizando sempre os porquês. Reforçar os conceitos positivamente do que está correto, incentivar o apoio mútuo entre as pessoas, criando métricas para medir avanços e promover a melhoria contínua participativa, para que todos possam opinar sobre a cultura e sua (i)maturidade, não buscando apenas performar.” – Cíntia Malagutti

“A qualidade de um artigo ou serviço não é determinada por quem o produz, mas sempre pelo cliente.” – Daniel Bouzas

“Produzir alimentos seguros parece ser simples, mas não é. Como desde sempre “fazemos comida”, este senso comum ficou impregnado em nossa cultura. Investir em prevenção com base em risco tem que ser tão intrínseco quanto calcular o valor do frete, da embalagem ousada e do cachê do influenciador da campanha de marketing.” – Juliane Dias

“Sabemos que não há segurança alimentar sem alimentos seguros. Quando alguém consome um alimento contaminado, fica impossibilitado de realizar até mesmo suas tarefas diárias, seja adulto ou criança.” – Juliana Barbosa

“Insista muito em treinar constantemente sua equipe de segurança dos alimentos. Os exércitos mais respeitados do mundo, como os de Israel e EUA, fazem simulações e treinamentos constantes pois nunca se sabe o dia e a hora em que precisarão entrar em um conflito. Torcemos para que nunca precisem usar sua inteligência e poder de fogo, mas ocorrendo a crise, é extremamente necessário estar preparado para agir de forma rápida, segura e precisa. Assim é com a indústria de alimentos e os defensores da segurança dos alimentos, protegendo o consumidor dos perigos que circundam os alimentos” – Humberto Vinícius Faria da Cunha

“Cozinhar é um ato de amor e está presente em vários momentos e celebrações importantes das nossas vidas. Comemorar a segurança dos alimentos nesta data também é uma forma de amar o próximo ao enaltecer o lindo cuidado com a saúde das pessoas através dos controles de qualidade. Feliz Dia Mundial da Segurança dos Alimentos!” – Luiza Dutra

“É certo que investir em segurança dos alimentos custa dinheiro: garantir que fábricas tenham design sanitário, treinar e conscientizar, manter equipamentos para monitorar ou reduzir riscos etc. Mas também é certo que não investir custa muito mais, pois significa transigir com os riscos, e uma hora isso será um problema, causando danos aos consumidores, se expondo a processos judiciais, imagem negativa, perda de mercado e até falência.” – Marco Túlio Bertolino

“Garantir a Segurança dos Alimentos é um ato de responsabilidade social, porque a verdadeira segurança de alimentos não faz distinção de classe social ou preferências pessoais e deve sempre estar acima do lucro. Além disso, ninguém faz um alimento seguro sozinho e o desenvolvimento do time é fundamental, incrementando o conhecimento e a cultura de todos. Essa é a minha motivação e por isso minha trajetória profissional seguiu nesta direção.” – Sabrina Puls Ferretti

“É importante celebrar o Dia Mundial da Segurança de Alimentos e lembrar que essa é uma matéria multidisciplinar, e baseada em Ciência. Food Safety é sustentada por um amplo e dinâmico leque de disciplinas, que incluem, não só, mas também: Química, Biologia, Nutrição, Processamento e Tecnologia de Alimentos, Engenharia e Legislação. A união destes conhecimentos do campo à mesa é a única forma de garantir alimentos seguros para uma população mundial de 10 bilhões de pessoas em 2050.” – Talita Fernanda Santos Andrade

“Celebrar este dia é um passo diante do trabalho incansável de garantir a segurança dos alimentos ao longo de toda a cadeia. Profissionais e amadores se dedicam diariamente ao estudo, avaliação e prática de medidas que garantem a segurança dos alimentos disponibilizados à comunidade – desde a origem das matérias-primas até a entrega de um alimento seguro, livre de contaminantes na mesa do consumidor final. Cuidar do alimento é carinho, quem se dedica é por amor que o faz! Aproveito para levantar a reflexão: quais cuidados você já tomou hoje para garantir a segurança dos alimentos que você levou para a sua ou para outras famílias?” – Thiago Mendonça de Sousa

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Macrococcus spp.  em alimentos de origem animal

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A história do gênero Macrococcus é relativamente recente, apesar de ser estudado desde o final do século XIX, sendo que seus integrantes eram classificados como pertencentes ao gênero Staphylococcus. Em 1998, pesquisadores propuseram o gênero Macrococcus ao caracterizarem quatro espécies que apresentaram diferenças substanciais em relação à Staphylococcus. Ainda assim, ambos os gêneros podem ser considerados irmãos, pois compartilham determinadas semelhanças genéticas. Essa relação entre macrococos e estafilococos, no entanto, pode apresentar um problema de diagnóstico incorreto, uma vez que testes moleculares de identificação geralmente não são usados. Com isso, muitos macrococos acabam sendo identificados como estafilococos por métodos tradicionais.

O gênero Macrococcus compreende atualmente onze espécies e é representado por cocos Gram-positivos, oxidase-positivos, coagulase-negativos e catalase-positivos, pertencentes à família Staphylococcaceae. Membros do gênero Macrococcus podem ser encontrados na microbiota de diversos animais, sendo, na maioria das vezes, considerados apenas como comensais. No entanto, algumas espécies se sobressaem pelo risco clínico que representam a animais, como por exemplo, Macrococcus canis e Macrococcus bovicus.

Imagem: microscopia eletrônica de varredura da estirpe de Macrococcus caseolyticus.     (Fonte:  Microbiology Research)

Devido a essa associação, alimentos de origem animal, como leite, carne e embutidos, podem ser contaminados com essas bactérias. Existem na literatura alguns relatos destacando a presença do gênero, em alimentos de origem animal e enfatizando sua relevância. Nesse cenário, a espécie Macrococcus caseolyticus é a mais estudada e tem se tornado, recentemente, motivo de preocupação devido à sua capacidade de resistência a antibióticos.

Em uma pesquisa realizada em 2018, na Turquia, por exemplo, foram isoladas dez estirpes de M. caseolyticus provenientes de linguiça fermentada seca (sucuk) e sete delas apresentaram-se resistentes a pelo menos um dos antibióticos testados. Já em um estudo realizado aqui no Brasil em 2020, com leite pasteurizado comercializado na cidade do Rio de Janeiro, os autores foram capazes de detectar a presença de cepas de M. caseolyticus resistentes à penicilina e à tetraciclina.

Recentemente, os macrococos vêm ganhado grande destaque devido à sua comumente encontrada resistência à meticilina. A meticilina foi a primeira penicilina semissintética resistente às penicilinases bacterianas e tem aplicação no tratamento de infecções causadas por cocos aeróbicos Gram-positivos. Micro-organismos resistentes à meticilina também são, geralmente, resistentes a outros antibióticos, como todas as penicilinas, cefalosporinas e carbapenêmicos.

Diversos trabalhos descritos na literatura já relatam a resistência a esse antibiótico em isolados de macrococos provenientes de alimentos de origem animal. Um estudo feito na Inglaterra e no país de Gales isolou e caracterizou estirpes de M. caseolyticus provenientes de leite contido em tanques de armazenamento. Todos os isolados apresentaram resistência à meticilina. No Brasil, estirpes de M. caseolyticus resistentes à meticilina também já foram isoladas de amostras de queijo Minas.

No entanto, a maior implicação da presença de estirpes de Macrococcus sp. resistentes à meticilina associadas a alimentos é o fato de que os genes responsáveis por esse fenótipo podem ser transferidos para patógenos alimentares clássicos que ocupam o mesmo nicho, como é o caso dos estafilococos. Vários estudos destacam que os genes de resistência à meticilina encontrados nas espécies patogênicas de estafilococos foram obtidos das espécies de Macrococcus através de mecanismos de transferência gênica horizontal.

É possível afirmar, portanto, que o gênero Macrococcus, apesar de ser recentemente descoberto e possuir apenas onze espécies até o momento, é objeto de grande preocupação no que diz respeito à patogenicidade em animais e sua capacidade de resistência a antibióticos, que se mostra crescente no decorrer dos anos. Outro aspecto que merece destaque é o fato de este gênero estar presente em alguns alimentos de origem animal que apresentam vasto consumo mundial, como leite e carnes.

Faz-se necessário, portanto, dedicar uma atenção maior a isolados de Macrococcus sp. provenientes de alimentos de origem animal, a fim de que sua presença possa ser notificada com mais eficácia e possa ser localizada a fonte de contaminação, buscando mitigar, desta forma, a transferência de genes de resistência para outras bactérias presentes no alimento.

Autores:  Jessica Bezerra dos Santos1, Carlos Henrique da Silva Cruz1, Gustavo Luis de Paiva Anciens Ramos2 e Janaína dos Santos Nascimento1

1 Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ)

2 Universidade Federal Fluminense (UFF)

Referências  

Resende, J. A., Fontes, C. O., Ferreira-Machado, A. B., Nascimento, T. C., Silva, V. L., Diniz, C. G. Antimicrobial-resistance genetic markers in potentially pathogenic gram positive cocci isolated from Brazilian soft cheese. Journal of Food Science, v. 83, n. 2, p. 377–385, 2018.

Baba, T., Kuwahara-Arai, K., Uchiyama, I., Takeuchi, F., Ito, T., Hiramatsu, K. Complete genome sequence of Macrococcus caseolyticus strain JCSCS5402, [corrected] reflecting the ancestral genome of the human-pathogenic staphylococci. Journal of Bacteriology, v. 191, n. 4, p.1180-1190, 2009.

Genis, B., & Tuncer, Y. Determination of antibiotic susceptibility and decarboxylase activity of coagulase?negative Staphylococcus and Macrococcus caseolyticus strains isolated from fermented Turkish sausage (sucuk). Journal of Food Processing and Preservation, v. 42, n. 1: e13329, 2018.

Gotz, F., Bannerman, T., Schleifer, K. H. The genera Staphylococcus and Macrococcus. In M. Dworkin, S. Falkow, E. Rosenberg, S. Karl-Heinz, & E. Stackebrandt (Eds.), Bacteria: Firmicutes, Cyanobacteria: vol. 4. The Prokaryotes. New York, 2006.

Kloos, W. E., Ballard, D. N., George, C. G., Webster, J. A., Hubner, R. J., Ludwig, W., … Schubert, K. Delimiting the genus Staphylococcus through description of Macrococcus caseolyticus gen. nov., comb. nov. and Macrococcus equipercicus sp. nov., Macrococcus bovicus sp. nov. and Macrococcus carouselicus sp. nov. International Journal of Systematic and Evolutionary Microbiology, v. 48, n. 3, p. 859-877, 1998.

MacFadyen, A. C., Fisher, E. A., Costa, B., Cullen, C., Paterson, G. K. Genome analysis of methicillin resistance in Macrococcus caseolyticus from dairy cattle in England and Wales. Microbial Genomics, v. 4, n. 8: e000191, 2018.

Machado, M. A. A., Ribeiro, W. A., Toledo, V. S., Ramos, G. L.P. A., Vigoder, H. C., Nascimento, J. S. Antibiotic resistance and biofilm production in catalase-positive gram-positive cocci isolated from brazilian pasteurized milk. Journal of Food Quality and Hazards Control, v. 7, n. 2, p. 67-74, 2020.

Mazhar, S., Hill, C., & McAuliffe, O. (2018). The Genus Macrococcus: An insight into its biology, evolution, and relationship with Staphylococcus. In Advances in Applied Microbiology, v. 105, pp. 1-50. Academic Press.

Organji, S. R., Abulreesh, H. H., Elbanna, K., Osman, G. E., Almalki, M. H. Diversity and characterization of Staphylococcus spp. in food and dairy products: a foodstuff safety assessment. Journal of Microbiology, Biotechnology and Food Sciences, v. 10, n. 1, p. 586-593, 2020.

Ramos, G. L. P. A., Vigoder, H. C., Nascimento, J. S. Technological Applications of Macrococcus caseolyticus and its Impact on Food Safety. Current Microbiology, v.78, p.11–16, 2020.

LPSN –  List of Prokaryotic names with Standing in Nomenclature. Macrococcus. Disponível em https://lpsn.dsmz.de/search?word=macrococcus, 2021.  Acesso em 26 abril 2021.

Silva, A.C., Rodrigues, M.X. Silva, N.C.C. Methicillin-resistant Staphylococcus aureus in food and the prevalence in Brazil: a review. Brazilian  Journal of Microbiology, v. 51, p. 347-356, 2020.

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Intolerância à lactose: um relato pessoal

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Um belo dia, há uns 5 anos, do nada, comecei a sentir fortes náuseas e enjoos, vomitava forte, mas não aliviava completamente. Ficava mal cerca de metade do dia e depois passava gradativamente o mal-estar.

Pensava ser um episódio isolado, uma indisposição passageira e não dei importância, porém o problema não sumia e se repetia ao longo dos dias, das semanas, dos meses.

Acreditando poder ser alguma coisa no estômago ou ligada a uma intoxicação ou infecção, e esperando que problema se resolvesse, decidi evitar alguns alimentos mais gordurosos ou que eu considerasse suspeito. Acordava, , então, de manhã e me alimentava daquilo que considerava mais seguro, um cream-cracker com um bom copo de leite puro.

Eu sempre fui um amante do leite e demais produtos lácteos, de acordar e tomar um copão puro e gelado antes das atividades físicas ou de ir para o trabalho, uma delícia. Portanto, jamais desconfiaria de algo que sempre me fez tão bem.

Porém, além dos episódios de náuseas e vômito não passarem, começaram a vir acompanhados de muita dor abdominal, muitos gases que davam dor no peito e eu não me sentia confortável em nenhuma posição, e fora isso, comecei a ter até mesmo diarreia. Aí fiquei preocupado de verdade, fui procurar por um médico, coisa que geralmente os homens procrastinam, o que sei que é errado, mas é da nossa natureza.

O gastroenterologista fez uma série de perguntas sobre minha alimentação, me apalpou de todo jeito na barriga e abdômen, me mandou fazer uma série de exames, mas não descobria nada, foram mais duas consultas depois e ele ficou intrigado que meus exames não tinham nada de anormal, e claro, eu fiquei mais ainda. Ao final, ele me disse para irmos acompanhando e investigando.

Saí da consulta desolado, com medo de ser algo mais sério (a gente pensa o pior) e fui tomar um café com minha esposa para dar uma animada, quando ela disse: “Será que você não está com intolerância à lactose?”. E eu com toda a delicadeza do “Seu Lunga (*)” respondi: “Pensei que você era formada como contadora e não em medicina”.

  • (*) Para quem não conhece, “Seu Lunga” foi um poeta repentista e vendedor de sucata de Juazeiro, que se tornou um personagem atribuído a inúmeras piadas sobre seu temperamento mal humorado e ranzinza, transformando-se em uma figura do folclore nordestino, conhecido pela falta de paciência nas respostas a perguntas cotidianas.

Para justificar minha resposta, eu estava muito preocupado, o médico não havia conseguido me diagnosticar e eu sempre tomei leite, então, como de repente ele poderia começar a me fazer mal? Ao menos, este era o meu pensamento naquela época, justamente por ignorar informações sobre a intolerância à lactose.

Como não custava nada fazer uma experiência, e na verdade, por teimosia de descendente de italiano que sou, queria provar que minha esposa estava errada e dando ouvidos a estas modinhas de youtubers, que isso de intolerância à lactose era bobagem, afinal, como eu, um homem adulto, teria isso que é coisa de bebê, topei fazer um teste.

Depois de mais de um mês sem tomar leite ou derivados, voilá, os sintomas desapareceram e eu me sentia um novo homem.

Novamente tomando um café com minha esposa e ela um cappuccino, ela disse: “Viu, você evitou o leite e seus problemas não apareceram mais, era mesmo intolerância à lactose”. Eu novamente com minha teimosia habitual respondi: “Nada, isso foi uma coincidência, quer ver, vamos trocar, você toma o meu café e eu tomarei o seu cappuccino”.

Resultado de minha ação: foi o tempo de entrar no carro, chegar em casa e já sair vomitando pelo quintal, e tive de ouvir dela: “Viu, eu te disse”. Admiti que sim e agradeci a minha esposa e contadora por ter me diagnosticado.

Este episódio me serviu como uma tradicional prova dos nove, fiquei convencido definitivamente de que o leite estava me fazendo mal.

Aprendi neste dia duas grandes lições: a intolerância à lactose pode sim se manifestar a partir de uma certa idade, no meu caso depois de meus 43 anos, e outra, minha esposa sempre tem razão, ou pelos menos, quase sempre.

Existem testes clínicos que podem diagnosticar a intolerância à lactose:

  1. Teste de tolerância oral que mede a glicemia sanguínea em alguns momentos:  glicemia basal após jejum de 8 horas e glicemia em 30, 60 e 120 minutos após a administração oral de lactose (solução contendo de 2g de lactose/kg até 50g). Visto que a lactose, quando digerida é decomposta em glicose e galactose, em indivíduos que não apresentam intolerância à lactose será observado um aumento da glicose sanguínea em 20mg/dL ou mais em pelo menos um dos intervalos medidos no teste. A elevação de glicemia será menor que 20mg/dL em indivíduos com intolerância à lactose.
  2. Teste de hidrogênio expirado, no qual se avaliam amostras do gás hidrogênio produzido pelas bactérias do cólon que é expirado em alguns momentos: jejum de 12 horas e após o consumo de 25g de solução contendo lactose, sendo essa análise realizada em intervalos de 15 ou 30 minutos. Quando há aumento na quantidade de hidrogênio exalado, em relação ao valor de jejum, o indivíduo é considerado com intolerância à lactose. Devem ser considerados, também, os sintomas manifestados pelo paciente durante a execução do exame.

Confesso que não fiz nenhum destes testes. A prova prática me bastou, comecei a evitar a lactose e o problema sumiu, mas não passei a evitar o leite e seus derivados que adoro, me tornando um consumidor de produtos livres de lactose.

Também ando com lactase sempre por perto, que é a enzima que quebra a lactose conforme a reação a seguir, então, se em algum lugar vou comer algo suspeito de conter lactose, eu tomo um comprimido um pouco antes com bastante água.

Aos poucos fui descobrindo que queijos frescos como frescal, minas e muçarela podem ser um problema para mim, então tenho de procurar os zero lactose, e com isso, frequentar pizzarias se tornou complicado, pois poucas trazem esta opção.

Por outro lado, já os queijos curados como um bom parmesão, um grano padano ou pecorino não me fazem mal, acredito que nestes casos a lactose já esteja em níveis baixos, confesso que nunca estudei a fundo o motivo e me satisfiz com os resultados empíricos, pois são os queijos que mais aprecio.

Minha intolerância à lactose não atrapalha nada em minha vida, e meus amigos em suas festas quando me convidam já dizem, pode comer bolo que fizemos tudo sem lactose para você, isso são amigos de verdade, ou então, não me querem ver fazendo arruaça em seus banheiros.

Pois bem, a intolerância à lactose ocorre quando o organismo não produz mais a lactase, a tal da enzima, que normalmente é produzida pelo intestino delgado, e justamente ela decompõe o açúcar do leite chamado de lactose nos monossacarídeos glicose e galactose.

Quando a lactose chega ao intestino e não sofre ação da enzima lactase, acaba sendo fermentada por bactérias presentes no trato intestinal e é daí que vem a encrenca, pois a fermentação produz ácido láctico e gases, que podem desencadear distensão abdominal e os sintomas que relatei. Além disso, a lactose não quebrada aumenta a atração de água e eletrólitos para a mucosa do intestino, provocando diarreia.

A intolerância à lactose pode ser classificada em três tipos:

  1. Deficiência primária, quando a diminuição de lactase em humanos acontece normalmente com o passar dos anos, sendo um problema gradual e irreversível, que é o meu caso;
  2. Deficiência secundária, neste caso, doenças, processos inflamatórios ou medicamentos são responsáveis por lesionar o intestino e afetar a produção de lactase. Por exemplo, quem tem diabetes ou fez cirurgia bariátrica tem mais chances de ter o problema;
  3. Deficiência congênita, que é mais rara e ocasionada por uma alteração no gene que codifica a lactase. Neste caso, desde bebezinho o problema já surge.

Alguns dados mostram que a prevalência da intolerância à lactose pode variar de acordo com a etnia, abrangendo 90% da população sudeste asiática, de 60 a 80% da população do sul da Europa margeando o Mar Mediterrâneo de onde vieram os Bertolinos de quem descendo e menos de 15% do norte da Europa de onde vieram os Müller que deram origem à minha esposa.

Mas é na África e para os povos originais da América do Sul que a intolerância à lactose encontra predominância, conforme demonstra o mapa com as regiões com maior percentagem de indivíduos com este problema.

Quanto ao fator idade, pode acometer predominantemente pessoas com 50 anos ou mais, tendo uma estimativa de 46% de pessoas com esta intolerância.

A estimativa mundial geral é de que 70% da população sofre de algum nível de intolerância à lactose, a maioria nem sabe por que os sintomas são brandos e passam como uma leve indisposição.

A intolerância à lactose pode ser leve, moderada ou intensa, varia de pessoa para pessoa, dependendo do quanto de lactase o duodeno de casa um produz, e pode ao longo do tempo ir evoluindo da leve até a intensa.

Estes dias fui encomendar um bolo sem lactose e descobri na minha cidade que poucas boleiras ofereciam este tipo de produto. Então, uma delas me explicou que era porque daria muito trabalho ter utensílios isolados específicos só para isso, uma vez que a maior parte dos clientes não pedem bolo sem lactose.

Neste dia foi que percebi que muita gente confunde alergia com intolerância, pois as medidas a que a boleira se referia são necessárias para evitar riscos de alergia, mas não são necessárias para casos de intolerância.

A intolerância à lactose NÃO é uma alergia alimentar, mas uma desordem metabólica na qual a ausência da enzima lactase no intestino determina uma incapacidade na digestão de lactose que é o açúcar do leite, o que pode resultar em sintomas intestinais como distensão abdominal e diarreia que tive.

Esta intolerância geralmente é dose dependente e o indivíduo pode tolerar pequenas doses, como ocorre no meu caso com queijo curados ou se beneficiar dos produtos lácteos que tem zero de lactose.

Na alergia não, a coisa é bem mais complicada, uma vez que não é dose dependente, então o contato com simples traços de produtos derivados de leite pode desencadear uma resposta imunológica adversa ocasionada por uma hipersensibilidade do organismo a proteínas ou outros antígenos, se distinguindo de outras reações adversas aos alimentos por apresentar um mecanismo fisiopatológico que envolve o sistema imunológico, podendo ser mediada pela imunoglobulina E (IgE) ou não.

Especificamente, no caso do leite, o mecanismo imunológico não está ainda plenamente esclarecido, existem diferentes mecanismos que contribuem para a patogênese e há dois principais mecanismos descritos na base desta doença que referem-se a reações mediadas justamente por IgE e não-IgE.

Uma reação alérgica também pode ter consequências bem mais graves que a intolerância, pois além de coceira generalizada, inchaços, tosse, rouquidão, diarreia, dor na barriga, vômitos, aperto no peito com queda da pressão arterial, arritmias cardíacas e colapso vascular, pode causar o chamado choque anafilático, uma grave reação que pode levar ao encerramento da garganta, impedindo a respiração e podendo levar à morte em poucos minutos.

Então minhas caras e queridas boleiras e doceiras, intolerância não é alergia e produzir produtos livres de lactose é muito mais simples do que ter produtos livres do alergênico leite.

Para ter produtos sem lactose e abarcar este grande mercado, não é necessário separar utensílios específicos para evitar a contaminação cruzadas mesmo por traços, mas precisa efetivamente usar ingredientes livres de lactose e manter uma rastreabilidade que garanta este fim.

Para ajudar nisso, atualmente por ser um importante nicho de mercado, já há muita oferta comercial de marcas variadas de produtos como leite, doce de leite, creme de leite, leite condensado, iogurte, requeijão etc, tudo sem lactose, e os preços costumam ser levemente maiores que os tradicionais, o que pode ser repassado a quem procura por este tipo de produto.

Lembrando que há uma obrigatoriedade de informar aos consumidores a presença de lactose nos alimentos, prevista na RDC nº 136/17, tema tratado neste blog no artigo “Quando usar a advertência “contém lactose”?.” Já para declarar que um alimento é livre de lactose, é preciso seguir as determações  da RDC nº 135/17.

Além disso, se um produto tem leite e seus derivados, lembre sempre também dos cuidados com a rotulagem para alergênicos requeridos pela RDC n° 26/15, tema sobre o qual o leitor encontrará respostas esclarecedoras no artigo “Perguntas e respostas práticas sobre rotulagem de alergênicos“.

Para as boleiras e doceiras que pretendem atuar com esta categoria de produtos, definam se querem atender ao público de intolerantes à lactose ou alérgicos ao leite. Se forem atender apenas aos intolerantes à lactose, é importante deixar isso muito claro aos clientes, que um produto zero lactose contém leite e suas proteínas, que podem desencadear alergias a quem sofre do problema, o que não contém é o açúcar do leite, a lactose, que causa o desconforto da intolerância.

Certamente para quem atua com estes produtos, os clientes que são leigos no assunto poderão ficar com muitas dúvidas, espero que este artigo possa ajudar a explicar e esclarecer.

Espero também que vejam que produzir alimentos sem lactose não é tão complicado e tem um público consumidor cativo e carente destes produtos, assim quem sabe poderei frequentar mais pizzarias?

Gostou do artigo?  Ajudou? Também quer contar o seu caso? Escreva aí nos comentários!

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