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Contratos em segurança de alimentos

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Quando pensamos em normas de certificação em segurança de alimentos, a ISO 22000, por exemplo, requer o foco no cliente com atendimento dos requisitos de segurança de alimentos mutuamente acordados através dos contratos. Esse contrato é a forma de comunicação dos requisitos esperados pela empresa que contrata o serviço e é a forma do contratado verificar se consegue ou não cumpri-los.

Hoje meu intuito não é falar sobre a questão jurídica dos contratos, detalhar as cláusulas ou o melhor jeito de redigi-lo, mas sim levantar o questionamento: sua empresa tem os contratos necessários quando o assunto é segurança de alimentos? E os contratos existentes asseguram a empresa e/ou prestador de serviço de que forma? Como esse contrato é redigido? Há um setor jurídico que auxilia? Como é feita a integração das informações técnicas com o jurídico? Quem escreve? Existe algum modelo que possa ajudar? Todas essas perguntas podem aparecer na primeira vez que um contrato for redigido e até mesmo quando e para quais serviços seria necessário.

Já vi contratos que englobam poucas informações e outros tão complexos que eu diria que é bem difícil cumprir integralmente todas as cláusulas.

Pensando em segurança de alimentos, sabemos que existem diversos requisitos legais que precisariam ser cumpridos, alguns específicos dependendo da atividade, outros que podem ser aplicados em alguns segmentos. E a empresa pode optar por um contrato que trata questões comerciais e outro para os requisitos de qualidade e segurança de alimentos, ou ter um único contrato amplo que contemple todos os quesitos.

Vou elencar abaixo o que a prática tem nos trazido enquanto experiência nesse assunto.

  • Quando há um serviço que tem impacto na segurança do alimento produzido, o ideal é firmar um contrato. Pensando no meu segmento, indústria de queijos, posso dar como exemplo transportadoras de leite, transportadora de queijos, controle de pragas, prestadores de serviço que atuem nos setores de qualidade, quando é contratada uma empresa terceira que produzirá produtos com sua marca;
  • Pensando na redação do contrato, entendo que a equipe técnica elenca os pontos que devem ser abordados e depois encaminha para o jurídico da empresa. Caso seja um prestador de serviço que não tem um departamento jurídico como suporte, é importante que quem escreve pense a respeito das penalizações ou implicações quando do não cumprimento de alguma cláusula;
  • Passando para os pontos que devem ser abordados no contrato, alguns tópicos são comuns, como definição de contratado e contratante, identificação dos dois, com dados cadastrais, endereço completo e qual o objetivo do contrato. Aqui é importante escrever de forma resumida o trabalho firmado entre as duas partes
  • Sobre as obrigações das duas partes, se usarmos a transportadora como exemplo, aqui falaremos sobre transportar o produto em veículo próprio, higienizado, mantendo temperatura adequada, etc. Se tivermos um horário de descarga também iremos incluir a informação aqui, entre outros requisitos necessários. E nas obrigações da empresa que contrata o serviço de transporte constará o valor a ser pago, a data do pagamento, como serão feitos os reajustes. Caso seja um contrato para um terceiro produzir um produto com sua marca, teremos uma gama bem maior de informações a incluir, que serão todos os padrões que aquele produto deverá ter, os requisitos legais que deverão ser cumpridos, as análises laboratoriais que serão solicitadas, com que frequência, entre outros pontos.
  • Como parte final, temos as penalizações e sanções caso alguma cláusula não seja cumprida. Aqui podemos incluir penalizações diferentes dentro de uma escala de ocorrências, ou gravidade de problema. Assim, problemas reincidentes podem ter penalidades maiores. E essas penalidades podem ser desde advertências, valores de multa até interrupção do fornecimento do serviço.

Alguns pontos pensando em segurança de alimentos merecem destaque quando um contrato embasa a produção de um alimento. Como exemplos, temos food fraud, food defense, recall e recolhimento, que devem estar claros no contrato, inclusive os ensaios que precisarão ser realizados, com que frequência. Nos contratos também pode constar a necessidade de certificação, ou se o próprio contratante irá auditar o contratado ou qual o método que será utilizado para avaliação/homologação do contratado.

Quando pensamos em assegurar que algumas premissas sejam cumpridas, o contrato é uma transcrição formal dessas obrigações legais. O ideal é que ele tenha uma linguagem clara, objetiva, por isso a meu ver é interessante que os técnicos escrevam as questões mais técnicas para que saibam na prática o que se espera.

Nós que trabalhamos com segurança de alimentos estamos acostumados a seguir “regras” que são os requisitos legais que cabem para aquela atividade, mas nem sempre nos preocupamos em assegurar que as relações de serviço estejam escritas, com objetivos, o que se espera, como constatamos que o esperado está sendo cumprido e as penalidades caso algo saia fora do programado.

Você tem todos os contratos firmados? Estão dentro do prazo? Precisam de alguma revisão?

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Quorum sensing, a comunicação das bactérias

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A microbiologia é uma ferramenta indispensável para a indústria de alimentos. Esta ciência atualiza-se a cada dia e cabe aos setores das indústrias se qualificar constantemente. Pensando nisso, a Agron Food Academy lançou a II Semana Nacional da Microbiologia na Indústria (SEMICRO), um evento que traz na sua essência a prática da microbiologia dentro da indústria de alimentos, abordando temas práticos ministrados por profissionais reconhecidos e atuantes no setor. Esta semana ocorreu nos dias 21 a 23 de fevereiro de 2022, com apresentação de 9 palestras e 4 cursos.

A palestra que mais me chamou a atenção foi a ministrada pela Dra. Luciana Maria Ramires Esper, intitulada “Quorum sensing – Aplicação na microbiologia de alimentos”. Essa área de estudos teve início no final da década de 60, devido à observação de características peculiares da bactéria marinha Vibrio Fischeri. Cientistas observaram que a simbiose entre a bactéria V. fischeri e a lula Euprymna scolopes garantia uma bioluminescência ao organismo, sendo capaz de auxiliar na camuflagem ou na atração de presas e em troca, oferecer os nutrientes necessários para o crescimento bacteriano.

A. Vibrio fischeri bioluminescente sob um microscópio e B. Uma lula Euprymna scolopes

Mas foram nas bactérias que o termo ganhou corpo e consolidação. De maneira prática, Quorum Sensing pode ser entendido como Quorum significando número mínimo de participantes e Sensing significando sensor, ou seja, essa comunicação que as bactérias utilizam depende de uma quantidade de bactérias e de sinais que elas transmitem. Se há poucas bactérias, há poucos sinais e a comunicação não acontece. Se há muitas bactérias, há vários sinais e a comunicação acontece. Isso significa que a comunicação depende do acúmulo desses sinais.

A comunicação bacteriana depende de moléculas versáteis de sinalização química chamadas autoindutores, que regulam a expressão do gene bacteriano em um processo conhecido como quorum sensing. O Quorum sensing permite que as bactérias individuais dentro das colônias coordenem e realizem funções em toda a colônia, como esporulação, bioluminescência, virulência, conjugação, competência e formação de biofilme.

Se quiser se aprofundar mais neste assunto, há um Ted Talk super interessante aqui para assistir. Quem quiser, pode entrar na página da Agron Food Academy e se inscrever nas palestras clicando aqui.

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Validação de limpeza para residual de açúcares – Dicas úteis

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A comprovação da eficácia de procedimentos de limpeza COP e CIP é um processo indispensável sempre que há possibilidade de contaminação cruzada entre produtos na mesma linha. Muito já foi falado sobre a validação de limpeza quanto à remoção de substâncias alergênicas, as quais significam um perigo de grande severidade quando se trata de segurança de alimentos. Temos alguns posts sobre o tema em nosso blog, como aqui e aqui .

Apesar de menos lembrados como perigo, os açúcares adicionados (como sacarose e lactose) também podem ser contaminantes de alta severidade quando pensamos no sequenciamento de produtos contendo açúcar e produtos considerados “zero”, “sem adição de açúcar”, com “baixo teor de açúcares” ou mesmo “sem lactose”, uma vez que muitos destes alimentos são desenvolvidos para um grupo de consumidores cuja dieta possui restrição de determinado açúcar, como por exemplo consumidores diabéticos ou intolerantes à lactose. Este perigo, caso seja considerado contaminante para algum produto da linha, deve ser mapeado no estudo APPCC e deve ser controlado. Em relação ao nível aceitável destes contaminantes no produto final, tudo vai depender do tipo de alegação que leva o rótulo deste produto. Estes requisitos estão previstos pela Instrução Normativa-IN Nº 75, de 8 de outubro de 2020, que estabelece os requisitos técnicos para declaração da rotulagem nutricional nos alimentos embalados.

Além disso, a comprovação da remoção da sacarose pelos procedimentos de limpeza entre alimentos contendo açúcar e produtos “sem adição de açúcar” torna-se uma atividade essencial para o cumprimento da RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA – RDC Nº 429/2020, que dispõe sobre a rotulagem nutricional dos alimentos embalados , da INSTRUÇÃO NORMATIVA-IN Nº 75/2020, que estabelece os requisitos técnicos para declaração da rotulagem nutricional nos alimentos embalados  e da RESOLUÇÃO – RDC N° 136/2017, que estabelece os requisitos para declaração obrigatória da presença de lactose nos rótulos dos alimentos , comprovando assim a conformidade da rotulagem dos produtos fabricados com esta alegação.

Mas como realizar este estudo de validação? Eis algumas dicas:

  1. Selecione os métodos analíticos de acordo com o tipo de produto e capacidade analítica. Podem ser usados testes em laboratório interno ou externo. Algumas opções são o método de pesquisa de açúcares redutores por Reação de Benedict ou determinação de açúcares totais por volumetria.
  2. Determine a metodologia de coleta, podendo ser analisadas água de enxágue, superfícies ou uma combinação destas. Esta decisão irá depender do tipo de produto, desenho dos equipamentos e tipo de limpeza a ser executada. Adicionalmente, uma análise de residual de sacarose no produto “zero” produzido imediatamente após a limpeza seguida de produto contendo açúcar é altamente indicada.
  3. Faça controles positivos: comprove a eficácia dos métodos analíticos em amostras de produtos contendo sacarose ou mesmo em superfície “suja” após a produção destes alimentos.
  4. Descreva o procedimento de limpeza a ser testado e garanta sua padronização e reprodutibilidade.
  5. Elabore a “dinâmica do estudo”, descrevendo os momentos e pontos de coleta, os parâmetros a serem considerados, o plano amostral, os resultados pretendidos. A sugestão é que a atividade seja realizada no mínimo em triplicata.
  6. Planeje os testes de acordo com a programação da linha de produção, considerando sempre a sequência: produto com sacarose – limpeza – produto “zero”.
  7. Registre o estudo em um relatório que contenha a evidência documental do cumprimento de procedimentos e parâmetros, calibração de equipamentos de medição e análise, informações sobre os alimentos produzidos antes e após a limpeza, registro fotográfico dos testes, laudos analíticos e relatório dos resultados finais e conclusões.
  8. Qualquer resultado fora do pretendido deve ser investigado e revisões no procedimento de limpeza podem ser necessárias. Neste caso, deve haver uma nova rodada de testes em busca da validação.

Dicas dadas, agora é só avaliar se esta é uma necessidade interna de sua organização para colocá-las em prática!

Giulianna San Giacomo Simões é engenheira de alimentos, com pós-graduação em Gestão de Processos Industriais na Unicamp, consultora  em segurança de alimentos e auditora líder FSSC 22000. Ela foi vencedora do nosso último concurso cultural de posts.

Este post é uma celebração aos 10 anos de Food Safety Brazil!

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Auditoria interna não anunciada. Já pensou nisso?

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Com a chegada da versão 4.1 da FSSC 22000, a partir do início de 2019 tornou-se obrigatório que uma das auditorias de acompanhamento de cada ciclo de certificação seja uma auditoria não anunciada.

A empresa não deve ser informada com antecedência sobre a data desta auditoria não anunciada; o plano de auditoria não deve ser compartilhado até a reunião de abertura e, além disso, o auditor, ao chegar à unidade, tem uma hora para iniciar a auditoria pela área produtiva.

Isso foi criado para que empresas não se preparem somente para a data da auditoria e sim para que os procedimentos sejam seguidos no dia a dia.

E qual a importância da auditoria?

Muitas empresas não sabem ao certo a importância da auditoria. Ao contrário do que se imagina, elas não são inimigas ou vilões e não existem apenas para apontar defeitos. Aliás, o Food Safety Brazil já falou sobre isso – veja aqui.

As auditorias têm o objetivo de analisar todos os processos de uma empresa, a fim de obter evidências e avaliá-las para determinar se os critérios de auditorias são atendidos, detectar conformidades e pontos de melhorias. Com isso, é possível aprimorar os processos e reduzir falhas e, o mais importante: tornar o Sistema de Gestão de Segurança de Alimentos melhor a cada dia.

Devido a esse requisito das normas GFSI – não apenas FSSC, mas também BRCGS e IFS – muitas empresas estão implantando auditorias internas também não anunciadas.

A auditoria interna, além de ser um requisito obrigatório das normas de sistemas de gestão, é uma grande aliada. Como a própria empresa assume a execução das auditorias internas, pode parecer difícil fazer uma não anunciada – mas não é, desde que haja uma boa organização e comprometimento da equipe de auditores internos.

Assumindo este desafio – o de ter auditorias internas não anunciadas – os gestores passam a atuar de forma preventiva, preparam melhor as suas equipes e direcionam e priorizam esforços, de forma a garantir que não haverá pontos suscetíveis ou falhos em uma auditoria externa não anunciada. Desta forma, a cultura de segurança de alimentos vai sendo consolidada pouco a pouco na organização.

Além disso, também é uma forma de tornar os colaboradores mais seguros e confiantes, preparando-os também para as auditorias externas não anunciadas.

Pensando em tudo isso, que tal fazer sua próxima auditoria interna não anunciada?

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As diferenças entre um HACCP e um HARPC ou FSP

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Desde 2011, o governo dos Estados Unidos vem estabelecendo estratégias por meio da Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA, por sua sigla em inglês), a fim de ampliar o quadro de requisitos para a produção, distribuição e armazenamento de alimentos seguros. Foi um ano emblemático, pois naquela época o então presidente Barack Obama assinou a Modern Food Safety Law 111-353, que é considerada a mais importante reforma das leis de segurança de alimentos em mais de 70 anos. Em sequência, a construção de novas leis relacionadas à produção de alimentos teve um efeito cascata. Em 2015 foi lançada uma lei que revolucionou o mercado de alimentos em todo o mundo. Foi denominada Boas Práticas de Fabricação Atuais, Análise de Perigos e Controles Preventivos Baseados em Riscos para Alimentos para Consumo Humano (HARPC em inglês), ancorada no Código de Regulamentos Federais 21, parte 117.

Na Subparte C, estabelece que uma fábrica nacional ou estrangeira que exporte para os Estados Unidos registrada sob a seção 415 da Lei Federal de Alimentos, Medicamentos e Cosméticos, de acordo com os requisitos da seção 1, subparte H, deve estabelecer uma análise de perigos e controles preventivos baseados em risco ou Plano de Segurança Alimentar (FSP), desde que não esteja marcado por isenções conforme estabelecido na parte 117.5. Portanto, é importante esclarecer que a lei de controles preventivos não veio para substituir as leis estabelecidas de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (HACCP). Pelo contrário, são dois programas que podem trabalhar juntos dentro da mesma instalação. No entanto, é importante destacar suas diferenças nos critérios de aplicação.

A tabela a seguir mostra as diferenças entre HARPC ou FSP e HACCP.

Elemento-chave de comparação HACCP HARPC/FSP
A abordagem preventiva é baseada em um padrão, uma diretriz ou um conjunto de leis? Baseado em um guia recomendado pelo CODEX e NACMCF Com base na lei FSMA e principalmente na Norma Final para Controles Preventivos de Alimentos para Consumo Humano
Qual é o objetivo da abordagem preventiva? Prevenir, eliminar ou reduzir os perigos a um nível seguro (nessa prioridade) Controles preventivos que previnem ou minimizam significativamente riscos “conhecidos ou razoavelmente previsíveis”
Na Análise de Perigos, quais riscos de segurança são considerados usando a abordagem de precaução? Biológico, Químico, Físico Os perigos químicos devem incluir riscos radiológicos; considerar riscos motivados financeiramente.
Quem é o principal responsável pelo desenvolvimento e manutenção do plano preventivo? Principalmente um coordenador HACCP competente assistido por uma equipe multidisciplinar Indivíduo qualificado treinado em controles preventivos (PCQI), conforme descrito na Lei FSMA
Como são chamados os controles para perigos significativos? Pontos Críticos de Controle (PCC) para processos Pontos Críticos de Controle do Processo + controles em outros pontos que não são PCC
Com que frequência o estabelecimento revisa o plano preventivo? Pelo menos uma vez por ano, ou conforme necessário Pelo menos uma vez a cada 3 anos, ou conforme necessário
Qual é a abordagem documentada para fazer o plano preventivo? 12 passos do HACCP (inclui 7 princípios) 7 passos para desenvolver um plano HARPC
Como os limites críticos são interpretados? Limites críticos Parâmetros e valores mínimos/máximos (= limites críticos para controles de processo)
Para que controle é necessário o monitoramento? Obrigatório para PCC Obrigatório conforme aplicável para outros controles preventivos
Como as ações corretivas são interpretadas? Medidas corretivas Medidas corretivas ou correções, conforme o caso
A que se aplica a verificação? Para controles de processo Conforme apropriado para todos os controles preventivos. A verificação do fornecedor é necessária quando o fornecedor controla um perigo.
Como é interpretada a elaboração de Registros Críticos? Para controles de processo Conforme aplicável a todos os controles preventivos
É obrigatório no plano de Segurança dos Alimentos? Não é obrigatório no plano Necessário quando é identificado um perigo que requer um controle preventivo

Uma grande diferença que devemos destacar é que um Indivíduo Qualificado para Controles Preventivos (PCQI) tem responsabilidades legais na representação do HARPC, pois existem obrigações que não podem ser delegadas a outras pessoas que não possuem as responsabilidades legais.

O que é um Indivíduo Qualificado em Controles Preventivos?

Indivíduo qualificado que concluiu com sucesso o treinamento de desenvolvimento e aplicação de controles preventivos baseados em risco pelo menos equivalente ao recebido sob um currículo padronizado reconhecido pela FDA como adequado ou que seja qualificado por experiência de trabalho para desenvolver e implementar um sistema de segurança de alimentos.

Referências

  • Regulamento da FDA sobre as BPF atuais, Análise de Perigos e Controles Preventivos Baseados em Risco para Alimentos para Consumo Humano.
  • Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA). 21 CFR 117.3 Definições
  • Comitê Assessor Nacional sobre Critérios Microbiológicos para Alimentos. 1998. Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle. Diretrizes de Princípios e Aplicação. Journal of Food Protection 61(9):1246-1259

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Afinal, um perigo significativo pode ser controlado por programa de pré-requisito?

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Como evidenciar o controle de um perigo significativo para a segurança do alimento? Quando estamos à frente de um APPCC, o exercício que fazemos é avaliar se determinado perigo pode ser controlado por programas de pré-requisitos ou se um ponto crítico de controle se faz necessário.

Mas antes de entrar na discussão, comento que fui convidada a escrever um post em comemoração aos 10 anos do blog Food Safety Brazil. Como estes anos passaram rapidamente! Após alguns anos contribuindo como colunista, tem sido uma delícia receber todos os dias conteúdo relevante para a segurança de alimentos. Desta forma, não poderia dizer não para este pedido!

É um enorme prazer voltar a este canal. Para nosso bate papo de hoje, escolhi trazer reflexões sobre a proposta de nova árvore do Codex Alimentarius para identificação de Pontos Críticos de Controle.

Contextualizando, desde que a revisão do documento PRINCÍPIOS GERAIS DE HIGIENE DOS ALIMENTOS CXC 1-1969  foi publicada em 2020, sem uma sugestão ou modelo de árvore decisória para auxiliar as empresas na identificação de PCC, muitos colegas da área da qualidade e segurança de alimentos estavam se questionando se seria o fim deste tipo de direcionamento emitido pelo Codex Alimentarius ou ainda quando haveria consenso entre os membros participantes do grupo de trabalho para a publicação de uma nova e atualizada sugestão de ferramenta.

Nós vimos aqui neste post que uma nova proposta de árvore decisória foi aprovada na última reunião do grupo técnico e divulgada no relatório da 52ª seção do Codex Alimentarius.

É verdade que se trata de uma ferramenta de uso opcional e que ajustes ainda podem ocorrer antes de sua publicação oficial. No entanto, logo que divulgaram este conteúdo, já começou um questionamento sobre sua adequação ou ainda sobre seu entendimento, para que seja uma ferramenta útil e eficaz para as diferentes organizações. A grande dúvida foi concentrada na questão 1 traduzida livremente abaixo:

Q1: Pode um perigo significativo ser controlado a níveis aceitáveis nesta etapa por um programa de pré-requisito (ex.: BPH)?

Nota vinculada à Q1: Considere a significância do perigo (ou seja, a probabilidade de ocorrência na ausência de controle e a severidade do impacto do perigo) e se poderia ser suficientemente controlado por programas de pré-requisitos, como BPHs. BPHs podem ser de rotina ou BPHs que requerem maior atenção para controlar o perigo (por exemplo, monitoramento e registro).

Obs. da autora: BPH – Boas Práticas de Higiene

Mas afinal, pode um perigo significativo ser controlado por um Programa de Pré-requisito?

A resposta é: Sim! Mas atenção para a próxima pergunta deste post.

O que diz o documento do Codex sobre este tema:

Princípios gerais – página 4: (iv) Dependendo da natureza do alimento, do processo alimentar e do potencial de efeitos adversos à saúde, as BPH podem ser suficientes para controlar os perigos, incluindo, conforme o caso, alguns que requerem mais atenção do que outros, por terem maior impacto na segurança dos alimentos. Quando a aplicação de BPH por si só não é suficiente, uma combinação de BPH e medidas de controle adicionais deve ser aplicada nas CCPs.”

E isso não é uma novidade! Quem já está acostumado com os requisitos da ISO22000 ou ainda com a metodologia Avaliação de riscos e determinação de controles preventivos estabelecida pelo FSMA – FDA sabe que perigos significativos podem, sim, ser controlados de forma eficaz por Programa de Pré-requisitos. Vemos isso diariamente ao avaliarmos as eficácias de medidas de controle classificadas como PPRO e controles preventivos, respectivamente.

Mas será que pode ser qualquer programa de pré-requisito?

A resposta é:  Não!

É aqui que precisamos tomar cuidado e fazer algumas reflexões importantes.

A nota vinculada à Q1 da nova árvore decisória proposta pode levar ao entendimento de que um PPR de rotina, sem requerer atenção, incluindo uma medida de controle sem monitoramento e ou registro, pode ser suficiente para o controle de perigos significativos. No entanto, trago os seguintes trechos do próprio documento do Codex para contribuir com o nosso bate-papo:

Princípios gerais – página 4:

(v) As medidas de controle essenciais para alcançar um nível aceitável de segurança dos alimentos devem ser validadas cientificamente.

(vi) A aplicação de medidas de controle deve estar sujeita a monitoramento, ação corretiva, verificação e documentação, conforme apropriado à natureza do produto alimentício e ao porte do negócio de alimentos.”

Para esta análise, recomendo ainda a leitura do Anexo 1 – Comparação de medidas de controle com exemplos, onde o texto estabelece na coluna relativa a medidas de controle controladas por BPH:

“Às vezes, uma atividade de BPH pode ser direcionada para abordar um perigo específico e pode-se tratar de BPH que requer maior atenção (por exemplo, limpeza e higienização de superfícies de contato com alimentos para controle de doenças. Listeria monocytogenes em ambientes de fabricação de alimentos prontos para consumo).”

Em outro trecho do mesmo anexo lemos:

“Monitoramento: Quando relevante e necessário, para garantir que os procedimentos e práticas sejam aplicados corretamente. A frequência depende do impacto na segurança e inocuidade do produto.” “Verificação:  Quando pertinente e necessário, devidamente planejado (por exemplo, observação visual se o equipamento está limpo antes do uso).” “Manutenção de registros (por exemplo, registros de monitoramento): Quando relevante e necessário para permitir que a organização avalie se a BPH está funcionando conforme o esperado.” “Documentação (por exemplo, procedimentos documentados): Quando relevante e necessário, para garantir que as BPHs estejam sendo aplicadas corretamente.”

Desta forma, podemos concluir que é importante que medidas de controle gerenciadas por programa de pré-requisitos (chamadas de BPH no documento do Codex Alimentarius), quando responsáveis pelo controle de perigos significativos, sejam adequadamente gerenciadas, de forma que seja possível avaliar sua adequação e eficácia na eliminação ou redução de tais perigos aos níveis aceitáveis estabelecidos como seguros. Para isso, procedimentos de monitoramento, tomada de ação em caso de desvios, verificação e validação devem ser implementados nestas situações.

Como um programa de pré-requisitos de rotina ou simples contribui então com o controle de um perigo?

Vamos novamente analisar o que o documento do Codex nos diz na seção que traz requisitos a serem considerados para a avaliação da significância de um perigo:

“A probabilidade de ocorrência do perigo, considerando os programas de pré-requisitos, em ausência de controles adicionais.”

Uma adequada implementação de um programa de pré-requisitos de rotina contribui para a geração e ou manutenção de um ambiente adequado para a produção de alimentos seguros, podendo ocasionar a redução de probabilidade de ocorrência do perigo na unidade.  Como a significância de um perigo considera este fator, um perigo pode deixar de ser classificado como significativo por consequência direta desta implementação.

Desta forma, podemos concluir que todas as medidas têm sua importância e devem ser buscadas por uma organização. No entanto, possuem objetivos e efeitos distintos que somados buscam garantir a segurança dos alimentos envolvidos.

Conte para nós: a segurança de alimentos na sua empresa está sendo garantida por quais tipos de controles?

FICA A DICA:

O Programa de pré-requisitos que controla perigos significativos deve ser gerenciável e comprovadamente eficaz para o controle do perigo em questão, devendo existir monitoramento, tomada de ação em caso de desvios, verificação e validação.

Nota da autora: *textos destacados em azul e itálico ao longo do texto são uma tradução livre não oficial.

Ana Claudia Frota, engenheira de alimentos, gerente técnica de consultoria e especialista em sistemas de gestão da qualidade e segurança de alimentos.

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Concurso cultural prorrogado – Concorra a uma vaga e ajuda de custo no V Workshop Food Safety Brazil em Goiânia

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Que o nosso V Workshop Food Safety Brazil – na prática será em Goiânia você já está sabendo, ou se ainda não sabe, leia V Workshop Food Safety Brazil. A agenda desse ano está repleta de convidados que vão ampliar e transformar a sua visão sobre os mais diversos assuntos das atualizações regulatórias e normativas e o impacto na cadeia produtiva. Confira a programação completa clicando aqui.

E para ajudar os participantes a chegar a Goiânia, no auditório do Senai, para conversar, interagir e fazer networking, o FSB está lançando um concurso cultural para dar um apoio financeiro! Leia abaixo o que você precisa fazer.

  1. Escreva um texto a respeito da temática Segurança de Alimentos. O texto deve ser inédito, e o assunto deve ser relevante para os dias atuais. O texto deve ter entre 700 a 2000 palavras, escrito em Word e seguir a formatação:
  2. Fonte: Times New Roman
  3. Tamanho (corpo do texto): 12 normal
  4. Espaçamento entre linhas: 1,5
  5. Em caso de citações, utilizar padrão ABNT
  6. Fotos e imagens devem ser autorais ou ter autorização de seus autores para publicação. Também podem ser obtidas de bancos de imagens gratuitas – neste caso, deve ser enviado o link da imagem original. Serão aceitos textos sem imagens.
  7. Textos plagiados e com ataques a pessoas ou empresas serão desclassificados.
  8. Envie o seu texto para o e-mail vpresidente@foodsafetybrazil.org com o título no campo assunto CONCURSO CULTURAL 2022. Inclua as suas informações de contato (e-mail e telefone) e seu mini-currículo com até 300 caracteres.
  9. Os textos recebidos serão avaliados conforme os critérios de publicação do blog por um comitê de colunistas e profissionais do SENAI/GO (não podem participam candidatos ou pessoas com conflitos de interesse). Esta Comissão Avaliadora analisará os textos a partir dos seguintes critérios: a) Relevância do tema para a segurança de alimentos; b) Utilidade para o leitor; c) Clareza e coesão do texto.
  10.  Os autores cujos textos forem aprovados para publicação serão informados por e-mail.
  11. Ao submeter o texto, o candidato automaticamente concorda com os termos desta promoção e autoriza a publicação do conteúdo com os devidos créditos ao autor no Food Safety Brazil em data a ser definida por este, sendo ou não classificado como vencedor.
  12. Todos os textos que não forem desclassificados no item 2 serão publicados na página do nosso website.
  13. O prêmio consiste em isenção de pagamento para uma vaga no “V Workshop Food Safety Brazil – Atualizações regulatórias e normativas de segurança de alimentos e impacto na cadeia produtiva” em Goiânia/GO, e no reembolso* de despesas relacionadas à alimentação, hospedagem e transporte até o valor máximo de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais)*.
  14. O prêmio é pessoal e intransferível de forma que sua comercialização ou transferência para terceiros é expressamente proibida, não podendo ser convertido em dinheiro e nem trocado por qualquer outro produto. Em caso de o ganhador não poder usufruir do prêmio, o mesmo será repassado para o seguinte classificado da lista.
  15. Prazo para submissão: serão aceitos textos enviados até 13 de maio de 2022.
  16. Resultado: Será divulgado no blog e na página do blog no Facebook no 20 de maio de 2022.

Aguardamos seu post. Participe!

(*)Reembolso até o valor máximo de R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais) contemplado por este concurso cultural relacionado a transporte, hospedagem e alimentação mediante comprovação fiscal.

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Pasteurização x Esterilização de alimentos: quais as diferenças?

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O tratamento térmico é uma prática comum e importante na indústria de alimentos e bebidas. Ele é aplicado com o objetivo de oferecer um produto seguro ao consumidor. O emprego de calor aquece o alimento ou bebida e consequentemente reduz sua carga microbiológica. Os processos térmicos mais conhecidos e utilizados nestas indústrias são a pasteurização e a esterilização.

A diferença entre os dois processos térmicos está somente na temperatura?

Em linhas gerais, podemos dizer que tanto a pasteurização quanto a esterilização são técnicas de conservação de alimentos que se baseiam na eliminação de microrganismos e enzimas por meio do emprego de calor por um determinado tempo, o chamado binômio ‘’tempo’’ e ‘’temperatura’’.

Apesar de esta ser a diferença mais comum e conhecida por todos nós, a maior e mais importante diferença entre elas é o microrganismo que se pretende atingir.

Para iniciar o levantamento dos microrganismos-alvos, temos que primeiramente conhecer as características do alimento a ser processado. Alimentos com alta acidez ou baixa atividade de água já possuem uma resistência natural ao crescimento dos microrganismos. Por outro lado, alimentos que possuem baixa acidez e alta atividade de água possuem menor resistência ao desenvolvimento dos microrganismos.

Em seguida, temos que conhecer as características dos microrganismos. Eles podem ser vegetativos ou esporulados. Os vegetativos são menos resistentes ao calor enquanto os esporulados possuem maior resistência.

Como definir o tratamento térmico mais indicado para o alimento?

Depois que conhecermos as características do alimento e analisarmos os microrganismos que precisam ser destruídos, ficará fácil definir o melhor tratamento térmico. A pasteurização é utilizada para destruição de patogênicos vegetativos, com baixa resistência térmica. Geralmente é aplicada em produtos com pH abaixo de 4,6. É um tratamento que possui três modalidades: lenta, rápida e muito rápida e geralmente altera pouco as características sensoriais do produto e o valor nutritivo. Em geral, a pasteurização envolve aquecimento a temperaturas abaixo de 100°C, por um período curto de tempo.

A esterilização é o processo utilizado para destruição de microrganismos esporulados e com alta resistência térmica e consequentemente destrói também os de baixa resistência. Geralmente é aplicado em alimentos de baixa acidez (pH > 4,6) e alta atividade de água (Aw > 0,85). Por conta da particularidade do processo, o alimento pode sofrer alterações mais severas de sabor, cor e aroma.  O método envolve o aquecimento de alimentos a temperaturas elevadas, entre 115°C a 125°C, durante minutos ou segundos.

Tabela de comparação entre esterilização e pasteurização

Parâmetros de Comparação Esterilização Pasteurização
Definição É um método utilizado para eliminar todos os microrganismos e seus esporos. É um método usado para destruir formas vegetativas de bactérias
Tipos Pode ser física ou química. A esterilização física significa esterilização com calor ou mesmo esterilização a frio. A esterilização química significa esterilização a gás usando agentes químicos ou esterilização a frio. A pasteurização depende da temperatura e pode ser pasteurização em cuba, HHST, HTST.
Efeito Este método mata todos os microrganismos, incluindo formas vegetativas e de esporos. Este método elimina apenas as formas vegetativas de bactérias.
Uso A esterilização é usada em microbiologia, indústria alimentícia, indústria de embalagens etc. A pasteurização é utilizada em medicamentos, meios de cultura etc. É utilizada em métodos de conservação de alimentos na indústria alimentícia.
Período de validade O período de validade dos produtos esterilizados é maior do que os produtos de pasteurização. O prazo de validade dos produtos pasteurizados é menor que o dos produtos esterilizados.

Fonte: https://askanydifference.com/difference-between-sterilization-and-pasteurization/. Acesso: 21 de fevereiro de 2022.

Independentemente do método escolhido, é importante lembrar que a avaliação tem de ser baseada nas características do alimento (pH, Aw, etc), para garantir sua vida de prateleira e a segurança.

3 min leituraO tratamento térmico é uma prática comum e importante na indústria de alimentos e bebidas. Ele é aplicado com o objetivo de oferecer um produto seguro ao consumidor. O emprego […]

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V Workshop Food Safety Brazil

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O dia tão esperado chegou!

Estamos de volta retomando nossos eventos presenciais, e desta vez estaremos com um workshop no centro do Brasil. Goiás é um importante polo de agronegócios do país e será para a capital deste estado que levaremos conceitos e práticas que sempre fizeram parte da identidade do Food Safety Brazil.

No V Workshop Food Safety Brazil teremos a presença de autoridades e profissionais muito experientes para você voltar com muita informação para aplicar.

Você poderá participar de duas formas:

-Vendo, conversando, interagindo e sentindo o público e os palestrantes, lá no auditório do Senai de Goiânia; ou

– Vencendo fronteiras geográficas, do conforto de sua casa, sem custos de viagem! Acesso on-line e ao vivo a 70% das palestras.

As inscrições já estão disponíveis no link abaixo ou pelo QRCode do evento:

https://www.sympla.com.br/v-workshop-food-safety-brazil__1545813

Esperamos vocês por lá!

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Elaboração de vinhos: tradição x BPF

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Como consultora, minha trajetória em vinícolas chegou a 13 anos. Confesso que no começo tive muitas dúvidas, porque minha escola até o momento era de frigoríficos, moinhos, enfim, a área de vinhos era uma grande novidade. Fui procurar informações em normas, livros, dissertações, mas as dúvidas persistiam.

Confesso que o MAPA aqui no RS não fiscaliza com tanta intensidade a área de elaboração de bebidas, tornando mais difícil implantar as normas com os colaboradores. A célebre frase que escutei a vida toda: “o álcool mata tudo” tornava tudo mais difícil.

A instrução normativa do MAPA no 5, de 31 de março de 2000, é o “Regulamento Técnico para a fabricação de bebidas e vinagres, inclusive vinhos e derivados da uva e do vinho, dirigido aos estabelecimentos que especifica. “

Este regulamento estabelece os pontos principais a serem abordados de forma geral. Vamos falar dele junto com a experiência prática?

O regulamento fala de um modo geral da localização da vinícola, das circunvizinhanças, do controle de pragas, de como devem ser os prédios, controle da potabilidade de água, dos efluentes, vestiários e sanitários e vários outros assuntos referentes às Boas Práticas de fabricação.

Mas as dúvidas chegam…. devo usar touca descartável onde? Devo limpar de quanto em quanto tempo e com qual detergente? Quantas pias de lavagem de mãos devo usar? Qual controle microbiológico é necessário e com qual frequência? Precisa de caderno de campo?

Vamos à experiência prática

Seguindo ao pé da letra a norma que eu trazia na cabeça, meu primeiro erro foi solicitar que todas as pessoas, inclusive visitantes, colocassem touca. Erro lógico. Claro que não fazia sentido entrar em um local com garrafas fechadas, com área de engarrafamento isolada, com toucas descartáveis e gerando muito lixo numa vinícola que recebe muitos visitantes por dia. Então eu mudei a minha forma de pensar e comecei a achar soluções para minhas dúvidas.

ESTUDO DE RISCO DO USO DE TOUCAS POR SETOR

Setor de Vinificação: é o local de recebimento de uva e elaboração dos vinhos e espumantes. O risco é baixo de contaminação por cabelo porque o vinho irá passar por filtros neste processo e há um filtro antes do envase que é microbiológico.

Risco baixo, porém é necessário uso de toucas descartáveis porque os funcionários acessam tanques abertos, manipulam a uva e até por questões higiênicas.

Setor de Engarrafamento: local de envase do vinho ou espumante. O risco é alto, necessário porque os produtos estarão abertos até colocação da rolha e o vinho já passou por filtros. Inclusive é uma área obrigatória pelo MAPA de ser isolada (com vidros, sala separada, enfim como melhor se adaptar ao projeto da vinícola).

Rotulagem: colocação de rótulos nas garrafas. Todos os funcionários deverão usar touca porque está junto com o setor de engarrafamento. Aconteceram reclamações de clientes de adquirir vinhos de valor alto com cabelo grudado no rótulo e devolverem o produto.

-Caves e expedição: cave é onde os vinhos ou espumantes descansam. Como o produto já está embalado, então não há risco e não é necessário usar toucas.

HIGIENIZAÇÃO

Este assunto é muito importante para que tenhamos vinhos de qualidade porque as bactérias acéticas estão no ar, assim com as leveduras utilizadas na fermentação.

É proibido o uso de cloro nos tanques, piso, paredes. É proibido cloro em vinícola, por quê? Porque forma o mofo chamado Bouchonné (doença da rolha) que é infectado por um composto denominado tricloroanisol, conhecido como TCA. Ele causa um odor horrível ao fermentado. Para evitar o TCA não são usados produtos de higiene à base de cloro. Usam-se detergentes alcalinos sem cloro para limpar e para sanitizar, como ácido peracético (não precisa de enxágue) ou polibiguanida (que precisa enxaguar). Para o CIP do engarrafamento, utiliza-se ácido clorídrico, enxágue e soda cáustica, ou ainda existem empresas que utilizam o metabissulfito de sódio. A frequência de limpeza precisa ser definida por cada técnico, não tenho sugestão porque precisa ser avaliado cada processo. O CIP é realizado por quantidade de garrafas/hora.

PIAS DE LAVAGEM DE MÃOS

O MAPA explica que é necessário utilizar o número de pias conforme a necessidade do local, então eu sugiro que tenha uma pia próxima a cada posto de trabalho de manipulação, com detergente antisséptico sem odor, papel toalha e torneira com acionamento automático. Pias são mais cobradas na área de engarrafamento.

ANÁLISES MICROBIOLÓGICAS E FÍSICO-QUÍMICAS

Em vinícolas, análises de swab são realizadas após a higienização do tanque para controle de bactérias acéticas, durante a vinificação.

As análises físico-químicas são realizadas normalmente em laboratório interno da empresa ou laboratório externo. A análise sensorial é realizada pelo enólogo.

Momento da colheita: para ter uma noção da quantidade de açúcar em graus brix é utilizado um refratômetro que auxilia na decisão de colher ou não.

As análises realizadas para controle do mosto são: pH, acidez, Brix.

As análises detalhadas para determinar as características físico-químicas estão na Portaria 43 do MAPA que estabelece os parâmetros com valores máximos e mínimos para graduacão alcoólica, acidez volátil e total, e sulfatos totais, expressos em K2SO4.

As vinícolas, como autocontrole interno durante a preparação do mosto, realizam uma amostragem para análise de agrotóxicos para verificar se algum foi utilizado no período de carência. Caso seja detectado algum destes contaminantes, a vinícola realiza a rastreabilidade de todos os produtores que formaram o tanque.

CADERNO DE CAMPO

É necessário elaborar um caderno de campo que é entregue no dia de descarga da uva. O produtor vai anotar todo tratamento com agrotóxicos durante o período de preparação do parreiral. O caderno serve para não perder o controle. No dia da entrega da uva, ele entrega o caderno do campo preenchido para controle interno.

Artigos relacionados:

https://foodsafetybrazil.org/alergenicos-em-vinhos-preciso-rotular-os-coadjuvantes-de-tecnologia/

https://foodsafetybrazil.org/proteste-estuda-sulfitos-em-espumantes/

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Qual limite devo adotar para matérias estranhas rígidas em alimentos?

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Matérias estranhas rígidas podem ser introduzidas na cadeia produtiva de alimentos a qualquer momento, começando pela fonte primária no campo. Podem também ser inerentes ao produto, como os caroços na indústria de processamento de doces e geleias ou um osso ou dente de uma carcaça no segmento frigorífico. Existem ainda muitas outras fontes:

  1. Pedras e sujeira comumente encontradas em frutas, legumes e outros alimentos que são cultivados perto do solo;
  2. Metal comumente associado a atividades de manutenção ou processamento, como operações de corte, fatiamento, laminação, moagem, extrusão ou mistura, bem como materiais de embalagem ou recipientes, como fragmentos de metal, grampos e pregos;
  3. Partes de ferramentas inapropriadas como visto no artigo Perigos físicos e o uso de estiletes na indústria de embalagens e de alimento;
  4. Joias, adornos e itens pessoais resultantes de más práticas de manipulação;
  5. Plásticos rígidos ou outros contaminantes de materiais de embalagem, recipientes ou ambiente de processamento;
  6. Lascas de madeira de paletes ou material de embalagem;
  7. Descamação da tinta de estruturas ou equipamentos suspensos.

Veja um pouco mais sobre perigos físicos no artigo Perigos Físicos na mira da indústria de alimentos.

A RDC 14/2015, que trata de limites de tolerância para matérias estranhas em alimentos, acabou de ser revogada. Agora está valendo a RDC 623/2022 (se quiser saber o que mudou clique aqui).

Segundo esta Resolução, entre outros contaminantes, são consideradas matérias estranhas aquelas indicativas de riscos à saúde humana capazes de causar danos ao consumidor, abrangendo objetos rígidos.

Contudo, na atual resolução e na anterior que foi revogada, os limites dimensionais para objetos rígidos permanecem os mesmos, conforme apresentado na seguinte tabela:

DIMENSÃO TIPOS DE OBJETOS RÍGIDOS
Iguais ou maiores que 7 mm na maior dimensão. Objetos rígidos, pontiagudos e ou cortantes que podem causar lesões no consumidor, como fragmentos de osso ou de metal, lasca de madeira e plástico rígido.
Iguais ou maiores que 2 mm na maior dimensão. Objetos rígidos que podem causar lesões no consumidor, como pedra, metal, dentes, caroço inteiro ou fragmentado.

Quando leio e releio estes limites, confesso que eles não fazem muito sentido lógico no meu entendimento, mas posso estar errado e se um leitor ou alguém que participou da elaboração desta RDC souber me explicar num comentário, agradecerei.

Explicando meu ponto de vista

Objetos pontiagudos e/ ou cortantes, portanto perfurocortantes, são capazes de causar sérios danos, podendo perfurar e cortar a boca de um consumidor. Se forem engolidos, poderão causar danos ainda mais sérios como uma perfuração no esôfago, estômago, intestino ou reto, mas para este tipo de corpo rígido o limite na RDC é mais tolerante, sendo determinado um valor igual ou maior que 7 mm.

Neste caso dos perfurocortantes, podemos exemplificar com pedaços de fio partidos de sistemas de corte a fio, metal fresado de rolos moldadores ou de pás de mistura esbarrando em tanques ou reatores, pequenos parafusos, farpas de paletes, resíduos diversos de manutenção industrial etc.

Já para objetos rígidos não perfurocortantes, o limite é mais rígido, determinado como igual ou maior que 2 mm. Não que estes não sejam um problema, pois são, podendo, por exemplo, fazer um consumidor quebrar um dente ao morder um material duro ou levar a um engasgamento.

Aqui podemos exemplificar com carepas metálicas, pingos de solda, bilhas de rolamento, porcas, pedrinhas, o dente de uma cabeça de porco, caroços duros de frutas etc.

É preciso considerar que a maioria dos corpos estranhos que não sejam perfurocortantes, se engolidos podem ser expelidos sem tratamento, mas alguns, justamente pelo risco de causar danos como é o caso dos perfurocortantes, precisam ser removidos por endoscopia, por cirurgia ou manualmente.

Justamente esse é o ponto que não faz muito sentido no meu entendimento: o limite para corpos estranhos perfurocortantes que possuem um maior potencial de dano ao consumidor é mais tolerante do que para os corpos rígidos com menor potencial.

Matérias estranhas rígidas, além de um problema no que se refere à saúde dos consumidores podem também ser uma dor de cabeça para as organizações trazendo prejuízos econômicos, tema tratado no artigo Corpos estranhos em alimento geram dano moral mesmo sem ingestão.

Nesta perspectiva, os limites estabelecidos pela norma tornam-se ainda mais sem sentido. Imagine-se diante de uma reclamação de consumidor ou na frente de um juiz num eventual processo. Qual seria a real viabilidade de aceitarem a explicação de que um corpo estranho pontiagudo que perfurou a boca de um consumidor está dentro do limite legal aceitável por ter 5 ou 6 mm, uma vez que a RDC dá como limite 7 mm para perfurocortantes?

Há outras inconscistências. Veja que se uma empadinha contiver um caroço de azeitona perdido, isso seria um problema, pois tem mais do que 2 mm. Já  um pedaço de fio de aço de 6 mm parecendo uma agulha, caracterizando um perfurocortante, estaria dentro do limite permitido pelo regulamento.

Talvez esta nova RDC devesse ter tratado separadamente tipos de matérias estranhas rígidas, categorizando em metais (perfurocortantes ou não), caroços, madeira, plásticos rígidos, dentes e ossos, pedras etc. Em cada caso, deveriam ser definidos os limites dimensionais, considerando os potenciais impactos de cada um destes materiais na saúde dos consumidores, as particularidades dos processos onde tais riscos são gerados, e também a capacidade de ação preventiva das tecnologias existentes para um efetivo controle.

Na prática, tenho observado que muitos profissionais ignoram o limite de 7 mm usando como referência 2 mm. Afinal, quando se analisam perigos de corpos rígidos, é improvável que se possa predizer se serão perfurocortantes ou não, e claro, por um princípio de proteção ao consumidor, se opta pelo limite mais restritivo.

Então, na adoção de sistemáticas de controles, exemplificando com a utilização de uma peneira para conter perigos de objetos rígidos, opta-se por uma malha ou chapa perfurada de no máximo 2 mm. Analogamente, ao se colocar um detector de metais numa linha industrial, opta-se por um que seja capaz de detectar corpos de prova de materiais ferrosos, não ferrosos e inox de no máximo 2 mm.

Por isso, se há riscos de contaminação com corpos rígidos, independentemente da dimensão, é preciso tomar ações preventivas para que eles não cheguem até os alimentos (tema dos artigos Tudo o que você sempre quis saber sobre medidas de controles de perigos à segurança dos alimentos – Perigos físicos e TPM a serviço da segurança dos alimentos, que aborda o assunto objetivando evitar estes perigos durante atividades de manutenção).

Se concordou, discordou ou se tem uma explicação boa para estes limites da RDC, deixe aqui seu comentário!

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Juliane Dias sobre segurança de alimentos: “Paciência e resiliência para voltar a explicar o básico”

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Hoje o Food Safety Brazil completa 10 anos de existência. Para comemorar, conversamos com Juliane Dias, fundadora e por muitos anos responsável pela redação e gestão do blog, uma fonte de informações confiáveis sobre segurança de alimentos.

Atualmente Juliane está no papel de conselheira administrativa, já que uma nova diretoria assumiu as atividades desde outubro de 2021.

Nesta entrevista, Juliane nos fala do passado, presente e futuro da segurança de alimentos, sempre com um olhar atento para a veracidade das informações, as contradições e as novidades nesta área que desperta interesses e paixões nem sempre explícitos.

 FSB – Você já escreveu mais de 450 posts. De onde vem tanta inspiração?

Juliane – Olha, já sofri muita ansiedade por ter sempre um compromisso: “o que vamos escrever de interessante hoje?”. A inspiração vem do dia a dia, como dúvidas de clientes de consultorias, auditorias e treinamentos, das notícias de mídia. Em alguns momentos, dava um “estalo” ao ler trechos de livros antigos ou novos, e de sites especializados fora do Brasil. E desde que o WhatsApp começou a permitir grupos, é claro que nós, colunistas, nos “retroalimentamos”. Uma turma leve e divertidíssima, aliás, que está sempre pensando no assunto.  Sempre procurei atender o que eu mesma gostaria de ler, com qualidade, profundidade na medida certa e sem rebuscamentos desnecessários. Acho que o segredo é deixar ligado o botãozinho dentro de si dessa avidez por informação.

 FSB – Ao iniciar o blog, você imaginava que teria este alcance?

Juliane – Mais não do que sim, rs. Sou muito intuitiva… buscava, é claro, algo que “agitasse”, mas comecei sem métricas, metas, mais com paixão e transpiração mesmo. Depois as pessoas incríveis que foram se contagiando e adotando o projeto me forçaram a profissionalizar a estrutura.

São mais de 3 mil posts. Outro dia uma publicação no Instagram chegou a alcançar 12 mil usuários em um único dia. Já tivemos um post lido por mais de 750 mil pessoas. Outros foram o assunto do dia em páginas do segmento, inclusive de associações respeitadas, que replicavam o post na íntegra.

Não desmerecendo o trabalho árduo, acredito um pouco na sorte, no sentido de que houve um acerto, fazendo a coisa certa no momento certo, quando havia a necessidade e a receptividade, sem uma proposta equivalente. Na última década, assisti várias iniciativas começarem e morrerem na praia, mas o Food Safety Brazil seguiu perene e consistente.

 FSB – O que mudou em termos de segurança de alimentos no Brasil nestes 10 anos?

Juliane – Eu poderia aqui elucubrar sobre as transformações da indústria 4.0, big data, uso de tecnologias para a rastreabilidade e mais ferramentas para diagnóstico, identificação da causa e comunicação de surtos. Mas vou me ater a alguns movimentos anteriores à pandemia.

Tivemos uma legislação de rotulagem de alergênicos, fruto de um movimento da sociedade, algo sem precedentes. Também assistimos celebridades clamarem abaixo-assinados para o banimento de pesticidas em programas de culinária na TV, mostrando o potencial poder dos influenciadores na forma de regular as relações técnico-comerciais. Assistimos a várias ações policiais para interceptação de alimentos fraudados e posterior julgamento. Em nosso último grande escândalo de segurança dos alimentos, o da cervejaria, tivemos uma rápida e transparente investigação, apesar do não desfecho judicial. Nunca tivemos tantas legislações sanitárias publicadas. Ou seja, há interesse e seriedade em se tratar as questões de segurança dos alimentos.

Do ponto de vista da comunicação, há dez anos a notícia de uma atualização legal poderia ser publicada no blog um ou dois dias depois da publicação no Diário Oficial, o que provavelmente para muitos ainda seria uma novidade. Hoje, cada um de nós é um jornalista que pode dar “um furo de reportagem” instantaneamente nas redes sociais ou WhatsApp. Surgiram outras iniciativas como blogs, canais de YouTube, perfis no LinkedIn, todos falando sobre segurança dos alimentos. Essa “expansão do jornalismo” é fundamental, mas trouxe junto a saturação de informações e até a dúvida sobre a veracidade de algumas delas, dado que não estamos imunes às fake news sobre alimentos. Por isso, eu pelo menos estou sempre no modo “confie desconfiando” e procuro pesquisar o viés de uma notícia em mais de uma fonte. Quem está falando a verdade? Quais são os interesses e posicionamentos por trás de determinada publicação?  Temos um post sobre leite cru que rendeu muitos comentários, dado que muitos leitores consideram que a pasteurização é uma manipulação em favor das grandes corporações. A dúvida de quem está certo ou errado será um tipo de “trauma” que deve nos perseguir por um tempo.

FSB – Qual foi o impacto da pandemia na segurança dos alimentos?

Juliane – Vamos combinar: a régua baixou para todo mundo. As empresas mais sérias estão fazendo o melhor possível, mas todas estiveram ligadas no “modo sobrevivência”.  Certas questões realmente deixaram de ser prioridade enquanto se lutava para seguir produzindo. Alguns problemas com os quais vamos seguir convivendo por um tempo é o desabastecimento de matérias-primas e a maior probabilidade de fraudes ligadas a esta escassez/oscilação. O FDA anunciou que vai relaxar algumas exigências do FSMA.  Universidades e Institutos tiveram cortes críticos de verba para suas pesquisas.

Nos serviços de alimentação, o trabalho não será fácil, pois após um biênio de luta, quem sobreviveu, pouco ou nada pode investir em melhorias, capacitação e infraestrutura. Teremos que voltar a fazer muito do básico em termos de boas práticas, principalmente porque o turnover aconteceu.

Se você fizer uma busca no Google sobre ações da vigilância sanitária nos últimos dois anos, quase não irá encontrar casos de estabelecimentos lacrados por produtos vencidos ou falta de higiene, e sim multas por não uso de máscara ou funcionamento fora do horário. As reduzidas inspeções que aconteceram tiveram outro foco. E lute para encontrar estatísticas sobre surtos alimentares.

Outro ponto: sabemos que o mundo está mais polarizado politicamente, o que se agravou com as tensões pandêmicas. A política permeia tudo, até a segurança de alimentos, certo? Parece que a credibilidade da fundamentação técnico-científica se enfraqueceu, enquanto posicionamentos pessoais se acirram. Estejamos preparados: se a própria OMS e órgãos de saúde vêm sendo questionados, então como profissionais vamos ter que responder cada vez mais a perguntas do tipo “mas precisa mesmo fazer tudo isso?”. Teremos que ter paciência e resiliência para voltar a explicar o básico.

Por outro lado, o temor de adoecer, o custo para os cofres públicos e a necessidade de segurança emocional das pessoas devem manter a segurança de alimentos como um tema de preocupação.

FSB – Quais os maiores problemas de food safety no Brasil e no mundo?

Juliane – Quanto mais o tempo passa, mais me convenço que os problemas do Brasil no final das contas são os problemas de todo o mundo. Por mais que se trabalhe em prevenção, estamos sempre “correndo atrás do prejuízo”. Grandes mudanças na cadeia vêm após algum escândalo, modificando legislações, requisitos de certificação e práticas de mercado.

Os manipuladores de alimentos geralmente são os profissionais com menor escolaridade, passando por jornadas intensas, numa carreira de pouco reconhecimento social. Se fala muito na cultura de segurança dos alimentos como sendo uma “tarefa e problema deles”, quando na verdade a raiz do problema do engajamento vai mais profundamente nas relações humanas. Falando ainda de pessoas, ainda não sabemos como será o impacto de termos tido as crianças fora da escola por um ano (que lacunas os profissionais do futuro trarão?)

As dificuldades econômicas devem seguir motivando a fabricação caseira e o comércio informal de alimentos, muitas vezes preferidos pelo consumidor, sob a perspectiva de serem “artesanais” e “naturais”. Este movimento associado à desconfiança do que a indústria produz, pode nos levar ao perigoso caminho de termos poucos negócios devidamente profissionalizados.

O encontro do GFSI de 2022 colocou compromissos prioritários com a sustentabilidade, citando nominalmente a diminuição da pobreza, combate à fome, fornecimento de água potável. São questões extremamente essenciais à sobrevivência e me fazem pensar quantos anos nós regredimos com a pandemia! Dez anos? Quinze? Ou será que apenas nos despertamos para estas lacunas crônicas? Pessoalmente esperava foco nas catástrofes climáticas, tecnologias, responsabilidades na cadeia, mas eles ficaram como parte do caminho para chegar ao objetivo maior, pois a lição de casa de todo mundo é resgatar o fundamental ainda não atendido.

Além disso, precisamos urgentemente de harmonização e consenso para níveis aceitáveis de contaminantes em alimentos. Um pesticida banido na Europa e utilizado no Brasil pode causar o descarte de containers inteiros de alimentos aptos para consumo em outros países. Isso tem relação com o que já comentei, o antagonismo entre política x ciência.

FSB – Que mudanças o blog ajudou a promover?

Juliane – Olha, eu bem que tentei enumerar neste post aqui alguns marcos históricos. Mas nunca vamos saber de verdade, pois a gente “se serve” das informações da web e não volta para contar, né?  Claro que é legal que um post viralize, mas já ouvi colegas serem elogiados por um texto que nem teve tantas curtidas, mas “mudou a cabeça da alta direção” ou “me resolveu um problemão”. Isso não tem preço! Recentemente vimos o blog sendo referenciado num processo do Tribunal de Justiça de um estado. As publicações aqui pontuam como publicação técnica para a CAPES. E acho que demos uma mão reforçando a cultura de patrocínio da causa de segurança de alimentos num blog e temos empresas que são responsáveis por manter a estrutura.

FSB – Qual o futuro do blog?

Juliane – Food Safety Brazil é uma marca muito querida, “top-of-mind” com um grande potencial. Os gestores atuais, que assumiram com muito amor pela causa, receberam uma organização mais estruturada para dar continuidade. Mas claro, há muito a ser feito. Tem muito bastidor envolvido. A forma de comunicação tem sido cada vez mais dinâmica, e entendo que temos diferentes perfis de consumidores de informação sobre segurança dos alimentos: os que gostam de textos profundos, outros breves, vídeos, podcasts, memes, piadas… então para se manter sempre como a grande referência, é necessário adaptar-se aos novos tempos. Espero que os atuais e futuros gestores nunca se afastem das raízes, que é a pluralidade, a abertura, e principalmente as informações corretamente embasadas, “tecnicamente cirúrgicas”, com linguagem simples e acessível.

FSB – Qual a mensagem final para os leitores?

Juliane – Aqui sempre estivemos de portas abertas para pessoas que nunca tinham publicado um texto. Muitos colunistas chegaram com vontade, mas com muitos receios de “não serem bons o suficiente”. Começaram do zero e foram sendo desenvolvidos para aprender a escrever de acordo com a nossa linha editorial; hoje tem grande autonomia. Fizemos profissionais melhores dos dois lados:  os que desenvolveram o conteúdo, se tornaram referência, e os que consultaram e aplicaram este conteúdo. E, gente, quero lembrar que se você tem vontade de escrever para o Food Safety Brazil, não fique na vontade! Entre em contato pois terá o suporte para vencer essa barreira, seja para uma participação especial ou contínua.

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Avaliação de perigos químicos para a água no plano APPCC

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A água contaminada é um dos principais problemas vivenciados pelas indústrias brasileiras. Devido a isso, seu controle de qualidade é mandatório e essencial para a produção de alimentos seguros.

Na indústria de alimentos, a água pode ser utilizada em diferentes situações: na composição de matéria prima ou alimento, como agente de limpeza e no resfriamento ou aquecimento de equipamentos. Para ser considerada potável, ela precisa atender padrões e apresentar resultados de análises compatíveis com os parâmetros estabelecidos pela portaria GM/MS n° 888, de 04 de maio de 2021.

São aproximadamente 130 parâmetros, os quais estão divididos em tabelas de padrão de potabilidade, separados por substâncias orgânicas, inorgânicas, agrotóxicos e metabólitos, subprodutos de desinfecção, compostos organolépticos e microbiológicos.

Recentemente, a Repórter Brasil publicou dados preocupantes sobre o levantamento de 763 cidades no Brasil que tiveram a água contaminada. São diversas substâncias químicas e radioativas que foram encontradas acima do limite estabelecido pelo Ministério da Saúde.

 

 

Qual é o impacto disso para avaliação de perigos químicos no Plano APPCC?

Sabemos que os perigos químicos são de avaliação obrigatória para o plano APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle). Quando a água é tratada como insumo, ela deve atender todos os critérios de avaliação necessários para análise de perigos. Para realizar uma boa avaliação, você deve levar em consideração a origem e limites máximos preconizados pela legislação e requisitos internos.

Após a divulgação do mapa da água pela Repórter Brasil, é altamente recomendado para indústrias a reavaliação de seus planos conforme mapeamento de contaminação da região alocada, reavaliando a probabilidade dos perigos químicos para o insumo água.

Para conhecer a probabilidade e categorizá-la como baixa, média ou alta é preciso ter evidências que suportem tal afirmação. A ausência do histórico não é indicativa de que o perigo não existe ou que está sob controle. Uma sugestão para construir este histórico é aumentar a frequência de análises dos parâmetros que contempla a pesquisa por região.

Para atender a Portaria 888/2021 a água potável deve estar em conformidade com o padrão de substâncias químicas que representam risco à saúde e cianotoxinas, constantes nos Anexos 9 e 10.

“Art. 37 Os níveis de triagem usados na avaliação da potabilidade da água, do ponto de vista radiológico, são os valores de concentração de atividade que não excedam 0,5 Bq/L para atividade alfa total e 1,0 Bq/L para beta total.
§ 1º Caso os níveis de triagem de beta total sejam superados, deverá ser subtraída a contribuição do emissor beta K-40 (isótopo de Potássio com massa atômica 40 u).

  • 2º Caso as concentrações de atividades de alfa ou de beta total, após a subtração do K-40, permaneçam acima dos níveis de triagem citados neste artigo, outra amostra deverá ser coletada e analisada para alfa e beta total

I – os elementos ferro e manganês estejam complexados com produtos químicos comprovadamente de baixo risco à saúde, conforme preconizado no Inciso VIII do Art. 14 e nas normas da ABNT; e II – as concentrações de ferro e manganês não ultrapassem 2,4 e 0,4 mg/L.”

Após esta publicação, podemos ressaltar a importância de realizar a análise da Portaria 888/21 completa. Assim, iremos avaliar e construir o histórico necessário para uma boa análise de perigos.

Referências:

https://noticias.uol.com.br/reportagens-especiais/mapa-da-agua-agua-da-torneira-foi-contaminada-com-produtos-quimicos-e-radioativos-em-763-cidades/#end-card. Acesso em: 08 de março de 2022.

https://www.in.gov.br/web/dou/-/portaria-gm/ms-n-888-de-4-de-maio-de-2021-318461562. Acesso em: 08 de março de 2022.

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Entrevista com Johan Den Hartog – GMP+ International: Ontem, hoje e amanhã

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O GMP+ FSA completa 30 anos em 2022 (sobre a norma, leia este post), e o Blog Food Safety Brazil traz com exclusividade uma entrevista concedida por Johan Den Hartog, um dos idealizadores do GMP+ International, tendo atuado desde a criação do GMP Code em 1992 até hoje.

Johan trabalha no setor feed há mais de 40 anos, na Holanda, seu país natal, e em diversos países do mundo. No GMP+ International foi Managing Director entre 2010 (data da criação do GMP+ International) e 2021, quando se licenciou do cargo para assumir o posto de Business Development Director, atuando no desenvolvimento de novos mercados para a norma.

Nesta conversa, ele nos dá diversas informações e conta curiosidades sobre o início da norma, sobre o importante papel do Brasil no mercado feed e sobre o que esperar do GMP+ para os próximos anos.

Leonardo: A norma GMP+ começou em 1992 como um código de prática, sob o nome de GMP Code. Como foi o início das atividades?

Johan: A razão para início de tudo foram alguns incidentes relacionados à Segurança de Produtos para Alimentação Animal [Feed Safety] com ampla divulgação na mídia ocorridos na Holanda no final dos anos 1980. Houve o escândalo da Salmonela no setor avícola no Reino Unido em 1988, que resultou na exigência de exportadores holandeses de carne de aves para que houvesse um controle de Salmonela na alimentação animal [feed]. Em 1988/89, o nível de Aflatoxina B1 em ração à base de glúten de milho dos EUA foi altíssimo e resultou em um aumento do nível de Aflatoxina M1 no leite holandês, que também causou problemas para a exportação de produtos lácteos. Em 1989, tivemos um incidente na Holanda com inúmeros bovinos mortos devido a um lote de feed contaminado com alto nível de chumbo devido à mistura com minério no transporte marítimo. Isso resultou em atenção da mídia e pressão do Ministério da Agricultura holandês para tomar medidas.

Devido à redução dos níveis de detecção dos métodos de teste de laboratório, em ovos exportados para a Alemanha foram encontrados traços de anticoccidiostáticos. Foi resultado de contaminação na fábrica de ração.

Esses incidentes causaram problemas para a exportação de ovos, carnes e laticínios. Você precisa perceber que cerca de 60% dos produtos de origem animal holandeses são exportados, o que resultou em problemas de exportação e pressão de preços. Portanto, o Ministério da Agricultura holandês e a indústria de laticínios, carnes e ovos pressionaram fortemente a indústria de ração para tomar as medidas adequadas para evitar estes incidentes de feed safety. Além disso, a atenção negativa da mídia resultou em uma má imagem da indústria de rações. Tudo isso foi um forte gatilho para desenvolver e introduzir um código de Boas Práticas de Fabricação para a indústria de ração holandesa em 1992, o GMP Code. Ao mesmo tempo, estabelecemos um serviço privado de inspeção de ração para avaliação de conformidade. Tudo foi administrado por uma organização “semi-governamental” para a cadeia feed holandesa, chamada Product Board Animal Feed (PDV). Na época, eu era secretário geral do PDV, bastante envolvido em todas as questões.

 Leonardo: Em 1999, o GMP Code tornou-se GMP+. Como ocorreu essa migração do código de práticas para a certificação?

Johan: O GMP Code de 1992 estava focado apenas na produção de premixtures e compound feed. Ele era mais ou menos o que chamamos hoje de programa de pré-requisitos (PRPs). Em 1994 integramos os requisitos de gestão da qualidade baseados na ISO 9001. Em 1996, integramos um código para laboratórios. Mas não foi suficiente para facilitar às empresas o controle total dos riscos de feed safety de forma adequada. Tivemos sérios incidentes de feed safety com questões como BSE relacionadas à farinha de carne e ossos (1980), casos incidentais como cádmio em fosfatos minerais (1986), dioxina na polpa cítrica brasileira (1988) e dioxina em gordura reciclada da indústria alimentícia (1999). Todos esses incidentes e lições aprendidas foram a entrada para uma profunda melhoria do GMP Code e, portanto, mudamos o nome GMP para GMP+ em 1999. Integramos o seguinte ao esquema GMP+:

1.      Abordagem em cadeia: As emergências deixaram claro que a origem de muitos riscos de Feed Safety está na cadeia de abastecimento de produtos para alimentação animal (feed). Portanto, a extensão do esquema de certificação para toda a cadeia de abastecimento em 2000 teve como objetivo realizar o controle dos riscos o mais rapidamenteo possível na cadeia de abastecimento de alimentos onde ocorrem perigos/riscos. Também introduzimos o slogan ‘Feed for Food’ para conscientizar que os subprodutos da indústria de alimentos [food] não são resíduos, mas usados como ração para animais produtores de alimentos.

2.      APPCC: O código GMP era reativo. Para nos tornarmos mais pró-ativos, também integramos o APPCC ao esquema. Isso foi apenas alguns anos antes de ser introduzido na indústria de alimentos [food].

3.      Rastreabilidade, comunicação de crise e EWS: Todas as ferramentas anteriores são úteis para evitar a contaminação, mas também aprendemos que a cadeia de suprimentos é complicada e nem todos os perigos / riscos podem ser identificados com antecedência. Por isso, introduzimos algumas ferramentas para permitir que as empresas atuem de forma correta e rápida em caso de uma contaminação inesperada. Introduzimos requisitos para gerenciamento e comunicação de crises às empresas e rastreabilidade. Para fortalecer o controle de danos ao nível do setor, também introduzimos o Early Warning System [Sistema de Alerta Prévio].

Veja a figura abaixo. Estes são os principais blocos de construção do sistema GMP+ desde 2000. Demorou cerca de 5 anos (2000 – 2005) para implementá-lo em toda a cadeia de abastecimento. Foi eficaz para evitar emergências de Feed Safety e, caso ocorra, ter ferramentas adequadas de controle de danos. Além disso, introduzimos a certificação completa de terceiros em 2003.

Leonardo: O GMP+ deixou de ser administrado pelo PDV em 2010, com a fundação do GMP+ Internacional. Como foi essa transição? Como isso influenciou em relação ao esquema GMP+ que conhecemos hoje?

Johan: O PDV era uma típica organização semi-governamental holandesa. Devido à extensão a toda a cadeia de abastecimento, conseguimos a participação de empresas certificadas em todo o mundo, mais fora da Holanda do que dentro. Em 2008 já mais de 10.000 em todo o mundo. Por isso, decidimos criar uma organização independente, GMP+ International, apta para operação internacional e envolvimento de stakeholders de todo o mundo. Essa mudança da organização gestora não impactou o esquema de certificação GMP+. Atualizamos apenas o logotipo GMP+ FSA que é usado até hoje.

Leonardo: O GMP+ FSA é um esquema de certificação que inclui vários documentos (além dos documentos principais, especificações técnicas). O que o motivou a adotar esse modelo?

Johan: O esquema abrange todas as etapas da cadeia de fornecimento de ração, portanto, vários e diferentes processos e tipos de empresa. Por um lado, temos documentos com requisitos que as empresas devem cumprir para se tornarem certificadas. Por outro lado, temos documentos com requisitos que os organismos de certificação têm de cumprir. Tentamos torná-lo o mais claro e acessível possível.

Leonardo: Qual foi o maior desafio que você enfrentou como uma das lideranças desta iniciativa desde 1992?

Johan: O maior desafio no início foi convencer as pessoas da indústria a estabelecer os requisitos por conta própria. Uma mudança fundamental do mindset era necessária. O autocontrole via certificação privada foi considerado como aumento de custo sem valor agregado e limitação de graus de liberdade. Em segundo lugar, um desafio foi estender o escopo da certificação a toda a cadeia de suprimentos antes de 1999. Para ser honesto, os escândalos com grande atenção da mídia ajudaram a mudar, porque pressionaram a imagem da indústria e tiveram enormes consequências financeiras (prejuízos, problemas de exportação, pressão de preços e aumento dramático do prêmio do seguro de responsabilidade do produto). A experiência de que os instrumentos GMP+ (desde 2000) foram eficazes e agregaram valor, que as empresas apreciaram, foi a melhor recompensa pela luta que tivemos durante os primeiros dez anos. Hoje em dia, a parte desafiadora é como garantir que esse sistema esteja vivo por muitos anos. Por isso, temos a atenção para fomentar a Cultura de Feed Safety em todo o mundo.

 Leonardo: Qual você acredita ser a maior diferença entre o esquema GMP+ e outras normas Feed?

Johan: A grande diferença do GMP+ em comparação a outros padrões voltados ao segmento feed é que ele cobre toda a cadeia de fornecimento e é aplicada em todo o mundo. Isso significa que é aplicável em todas as diferentes regiões e situações. O esquema é focado no mercado, estabelecemos os padrões de acordo com o que é necessário e aplicável à indústria e continuamos a ouvir. Além disso, oferecemos às empresas serviços adicionais como nossos Feed Support Products, Transport Database [IDTF] e GMP+ Academy.

 Leonardo: Como você vê os paralelos entre padrões food (como FSSC 22000) e feed (como o GMP+ FSA)?

Johan: Assim como o GMP+ FSA, o FSSC 22000 também é baseado no ISO 22000. Seu núcleo é o setor de alimentos [food], mas também possui uma norma feed para indústrias produtoras de alimentos e geram coprodutos utilizados na alimentação animal. A GMP+ International possui um protocolo de auditoria combinado para empresas de processamento de alimentos que desejam um certificado FSSC22000 para o mercado food e um certificado GMP+ FSA para o mercado feed. O valor agregado do GMP+ FSA é que é mais feito sob medida para o setor feed por meio de suas especificações técnicas e nossos suportes (Feed Support Product, GMP+ Academy, etc.).

 Leonardo: Como você vê o Brasil dentro do esquema GMP+? Como você vê o potencial para o futuro da norma no país?

Johan: A partir de 2000, quando introduzimos a abordagem em cadeia, as unidades brasileiras de esmagamento de oleaginosas, processadores de frutas cítricas, empresas de trade e terminais de armazenamento são certificados GMP+ FSA. O principal motivo é a exportação de farelo de oleaginosas e polpa cítrica para a Europa. Na última década, observamos um crescimento constante do número de produtores certificados de matérias-primas para alimentação animal [feed materials], bem como comerciantes de feed materials processados, soja e milho, devido à crescente exportação. Uma oportunidade adicional para as empresas brasileiras é que a demanda pela certificação GMP+ FSA está crescendo tanto na Europa quanto na Ásia e no Oriente Médio. O GMP+ é o certificado internacional de garantia de Feed Safety mais conhecido no mundo, com mais de 19.000 empresas certificadas em 88 países em todo o mundo. Espero também mais oportunidades para outras categorias de feeds, como farinha de carne e osso da indústria brasileira exportada para o mercado asiático. Um certificado GMP+ FSA dará preferência no mercado. Um certificado GMP+ FSA é um passaporte para o mercado internacional.

Para o mercado doméstico, um certificado GMP+ FSA agregará valor às empresas brasileiras devido às novas regulamentações do governo brasileiro para garantia de Feed Safety. Esquemas de certificação privada como GMP + FSA são aceitos e fornecem conformidade com os regulamentos feed nacionais.

Além das oportunidades de vendas, um certificado GMP+ FSA oferece mais benefícios: (i) processo de produção mais suave e eficiente, (ii) menor custo de falhas e riscos de mercado, (iii) funcionários mais motivados e envolvidos.

 Leonardo: O cenário Covid-19 deixará marcas nos padrões GMP+?

Johan: A Covid-19 não é um tópico de Feed Safety, embora tenha impacto na indústria feed por outros motivos. A única marca é uma implementação acelerada de auditoria remota. Já estávamos buscando possibilidades antes da pandemia, mas as restrições devido à pandemia para viagens estimularam a implementação da auditoria remota e a obtenção de experiências com ela.

 Leonardo: O que podemos esperar sobre o futuro do esquema GMP+?

Johan: As lições que aprendemos nos últimos 30 anos permitirão que o GMP+ International continue de forma sustentável, com forte comprometimento de muitas empresas e grupos de partes interessadas. Em agosto de 2021, recuei como diretor administrativo; e estou feliz por poder continuar apoiando a organização até minha aposentadoria completa no próximo ano. Tenho toda a confiança de que a nova gestão GMP+ e a equipe continuarão buscando valor agregado do esquema de certificação GMP+ e serviços (como FSP e GMP+ Academy) para feed. A unidade é e será: Feed Safety Worldwide. O comércio e a indústria brasileira de feed poderão continuar a colher os benefícios disso. A melhor garantia é a continuidade do envolvimento das partes interessadas brasileiras por meio da GMP+ Task Force Brasil. Este envolvimento será reforçado se os grupos de partes interessadas se tornarem parceiros da GMP+ International: ANEC já é um parceiro GMP+ feed, Sindirações um GMP+ Registered Training Institute e temos um GMP+ Registered Consultant / GMP+ Registered Trainer ativo, a Markovic Food Management. Torcemos para que novas parcerias surjam em um futuro breve.

Se quiser ler a entrevista em inglês, clique aqui.

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Nova Resolução de recall RDC 655/2022 da ANVISA – mudanças e peticionamento

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O objetivo da nova resolução RDC 655/2022 é:

Estabelecer os critérios e procedimentos para o recolhimento de alimentos, inclusive in natura, bebidas e águas envasadas, ingredientes alimentares, matérias-primas alimentares, aditivos alimentares, coadjuvantes de tecnologia de fabricação, embalagens e outros materiais em contato com alimentos e para a comunicação à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e aos consumidores.

 As mudanças em relação à RDC n° 24/2015 já são conhecidas, mas não custa relembrá-las:

1) O capítulo III transformou-se em um único parágrafo, o artigo 21. Este capítulo diz que a empresa deve estar cadastrada junto à ANVISA, assim ela pode comunicar caso necessite realizar o recolhimento. Neste mesmo capítulo, consta que os relatórios de comunicação de recolhimento deverão ser protocolados junto à ANVISA pelo SISTEMA DE PETICIONAMENTO ELETRÔNICO pelo site https://www.gov.br/anvisa/pt-br. O passo a passo para peticionar está no link: https://www.gov.br/anvisa/pt-br/sistemas/peticionamento/arquivos/passo-a-passo-peticionamento. Já para o peticionamento, é preciso acessar o link: http://antigo.anvisa.gov.br/en_US/peticionamento.

2) O capítulo IV no artigo 32 da antiga RDC 24 de 2015 passa a ser o artigo 30 da RDC 655/2022. O mais importante é facilitar muito a decisão das empresas no momento de recall a necessidade de comunicar aos consumidores ou não. Como isto é realizado? Pelo peticionamento eletrônico será decidido pela anuência prévia do conteúdo informativo da mensagem de alerta ao consumidor.

Comentando o artigo 1 do texto: o sistema de peticionamento não é tão fácil de realizar. É necessário instalar o programa internet explorer versão 6.0 ou superior como as versões 9,10 e 11. Como fazer esta instalação?  Acessar o botão modo exibição de compatibilidade exibido na barra de endereços e ele deverá ser ativado. Clicar no botão modo de exibição de compatibilidade, a fim de que o ícone mude de um contorno para uma cor sólida. Se houver dúvidas quanto ao procedimento, o site da Microsoft disponibiliza um vídeo explicativo a respeito (nota explicativa da Anvisa- BI chamado da ANVISA).

A dificuldade de conseguir acessar este sistema é que nem todos os modelos de computadores conseguem acessar o programa. Na maioria das vezes é necessário utilizar um modelo mais antigo.

As novidades estão aí e você deve lembrar de atualizar sua documentação da garantia de qualidade e utilizar as novas ferramentas disponibilizadas com as novidades e dificuldades comentadas neste texto. Experimente realizar o sistema de peticionamento, assim é possível evitar surpresas em momentos de crises.

Links relacionados:

https://foodsafetybrazil.org/rdc-2415-quem-deve-iniciar-o-recolhimento/

https://foodsafetybrazil.org/recolhimento-de-alimentos-principais-requisitos-da-resolucao-rdc-2415/

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Sinergia entre Segurança de alimentos e Segurança do trabalho na panificação

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Na indústria de panificação, devido às características das atividades envolvidas, muitos fatores podem afetar de forma negativa o cenário de produção. Neste contexto é possível associar os aspectos relacionados à Qualidade e Segurança dos Alimentos e de forma intrínseca ou não, a segurança do trabalho e a integridade do trabalhador.

A limpeza dos equipamentos e das instalações físicas é um desses fatores que gera discussões polêmicas no segmento da panificação. Em algumas etapas do processo produtivo é necessário realizar uma limpeza a seco, na qual o aspirador de pó é um dos equipamentos que contribuem para a remoção de todo o resíduo. O uso de água nesta circunstância eleva a umidade do ambiente,  favorecendo a contaminação microbiológica, especialmente por microrganismos da classe deterioradora.

No aspecto da Segurança do Trabalho, as panificadoras estão no grupo das indústrias que apresentam os seis principais tipos de acidentes de trabalho, que são: queda de altura, cortes, choques elétricos, contusões, fraturas e amputação. As masseiras, os fornos, as fatiadoras e os resfriadores são equipamentos que fazem parte de uma linha de produção de pães de forma, por exemplo, e podem oferecer esses riscos quando operados de maneira inadequada e irresponsável. É extremamente necessária a elaboração de Procedimentos Operacionais Padrão (POP) e uma política sólida de treinamentos dos funcionários na função com intuito de educá-los e mitigar os acidentes.

Esta abordagem evidencia a Qualidade e a Segurança do Trabalho como pilares robustos que sustentam a missão, visão e os valores de qualquer companhia, garantindo assim notoriedade e destaque no mercado de trabalho mediante seus resultados.

Você já se questionou o quanto essas áreas são extremamente consonantes e atuam em sinergia para o sucesso do negócio? Pois é, observei isso perfeitamente durante as minhas atividades quando Analista da Qualidade e representante dos trabalhadores na Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA).

Ao longo do mapeamento dos riscos ambientais, a qualidade pode ser prejudicada em casos de falhas na construção dos mapas de risco. Na indústria de panificação, o calor peculiar demonstra ser um dos principais riscos. A falha durante o mapeamento traz consequências negativas, pois o cenário de sudorese excessiva, frente à temperatura elevada no ambiente e ao uso de EPI inadequado dos funcionários, impactam as regras de BPF, permitindo o surgimento de possíveis Doenças Transmitidas por Alimentos (DTA). 

O mesmo acontece com a adequação dos maquinários mediante o cumprimento da NR-12 (Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos), a norma que visa à proteção das máquinas e equipamentos com o objetivo de mitigar os acidentes de trabalho. No dia a dia da indústria é importante a participação da Qualidade devido aos resíduos gerados (massa e farelo de pão) ao longo da produção. Nesta ocasião, na confecção das proteções dos equipamentos, os materiais utilizados devem seguir os requisitos sanitários. Na Segurança de Alimentos, o impacto é com relação ao programa de limpeza e higienização, uma vez que são formados locais de difícil acesso, com surgimento de novas fontes de contaminação, principalmente de origem biológica.

Outra frente de atuação conjunta da Segurança do Trabalho e Qualidade é o combate à utilização indevida de ar comprimido. No que tange à limpeza dos equipamentos, o uso de jatos de ar para remoção do farelo no setor de embalagens contribui para o processo de contaminação dos pães por bolores devido ao aumento da carga microbiana do ar ambiente. No aspecto da segurança, o risco é de acidente grave em caso de manipulação inadequada, pois o direcionamento do ar contra a pele pode provocar uma embolia por ar nos vasos sanguíneos e, se for direcionado aos olhos, pode ocorrer um deslocamento da órbita ocular.

O fato é que, diante de toda esta abordagem, não restam dúvidas de que a Qualidade e a Segurança do Trabalho são setores que por si só carregam a responsabilidade de cuidar e preservar os dois grandes ativos de toda e qualquer organização, as pessoas e a marca. Neste contexto, os fatores extrínsecos, que são as características do ambiente em que o alimento se encontra, e as medidas de Segurança e Saúde Ocupacional devem ser percebidas como um agente colaborativo. Todavia é preciso entender que produzir com qualidade e praticar a segurança são responsabilidade de todos, independentemente da hierarquia. Caso contrário, a trajetória da empresa poderá ser estigmatizada por sucessivos erros e extremo fracasso.

Autores: Carlos Renato Cortes Aquino, Elaine Pinto, Gisela da Silva Costa, Larissa Dias Campos, Yoly Gerpe Rodrigues e Sérgio Thode Filho, todos do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Mestrado em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PCTA/IFRJ).

Imagem: foto de Anamul Rezwan no Pexels

Referências:

Guia trabalhista. Norma regulamentadora n.º 01 – disposições gerais e gerenciamento de riscos ocupacionais. 09 mar. 2020. Disponível em http://www.guiatrabalhista.com.br/legislacao/nr/nr1.htm Acesso em 12 fev. 2022.

Guia trabalhista. Norma regulamentadora nº 5 comissão  interna  de  prevenção de acidentes. 07 out. 2021. Disponível em: http://www.guiatrabalhista.com.br/legislacao/nr/nr5.htm.  Acesso em 12 fev. 2022.

Guia trabalhista. Norma regulamentadora nº 12 – Segurança no trabalho em máquinas e equipamentos. 30 jul. 2019. Disponível em: http://www.guiatrabalhista.com.br/legislacao/nr/nr12.htm. Acesso em 16 fev. 2022.

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Assuntos regulatórios nas indústrias de alimentos: entrevista com a colunista Talita Andrade

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O time de colunistas do Food Safety Brazil é formado por profissionais voluntários e de referência na área de segurança de alimentos. Para que os leitores conheçam um pouco da  história de cada um deles, fizemos uma série de posts dedicados a entrevistá-los. Hoje vamos conhecer Talita Andrade, engenheira de alimentos e MBA em Marketing pela UNICAMP. Atualmente é aluna de mestrado do Departamento de Ciência de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos da UNICAMP. Desde 2005 atua na indústria de alimentos, tendo trabalhado em grandes empresas nacionais e multinacionais. Atua há quase 15 anos na área de Assuntos Regulatórios, e desde 2019 está na FrieslandCampina Ingredients como responsável pela área de Regulatórios na América Latina.

  • Talita, qual é o maior desafio para quem atua em Assuntos Regulatórios?

Resposta: Um dos maiores desafios é se manter atualizado, não somente em relação a novas legislações publicadas, mas principalmente em relação ao que está em discussão nas agendas dos órgãos e na pauta das associações de indústria. A área de Regulatórios deve ser os olhos e os ouvidos da empresa, com foco em mitigar riscos, trazer oportunidades de inovação e melhoria contínua, além de manter a empresa em conformidade com a legislação sanitária vigente.

Outro grande desafio é consolidar o papel de Regulatórios na companhia e construir uma relação permanente com todas as áreas da empresa, especialmente com os times de Marketing, Inovação, Jurídico, Comunicação, Qualidade e P&D, de modo que todos os fóruns e projetos tenham um representante de Regulatórios. É fundamental que todo projeto tenha um parecer sob a ótica das normas sanitárias e com a antecedência necessária para realização de ajustes quando couber.

  • Você está há quase 15 anos atuando em Assuntos Regulatórios. Que discussões são coisa do passado e quais ainda estão presentes?

Resposta: No passado, havia discussões com foco essencialmente técnico. Com o passar do tempo, a ótica do consumidor ganhou força, e hoje a presença dos órgãos de defesa do consumidor e ONGs nas discussões regulatórias é muito grande. Alguns bons exemplos são a publicação da norma de rotulagem de alergênicos em 2015 e da norma de declaração da presença de lactose em 2017, a publicação da nova legislação de rotulagem nutricional em 2020 e a publicação da norma de cereais integrais em 2021. Isso é algo que veio para ficar e influencia bastante a agenda dos órgãos.

A ótica da saúde também sempre foi considerada nas discussões, mas isso tem se intensificado nos últimos anos. Temos vivido recentemente relevantes movimentos regulatórios gerados por novos conhecimentos científicos, tais como restrições do uso de bisfenol nas embalagens plásticas, proibição do emprego de gorduras trans na produção de alimentos e o mais recente banimento do corante dióxido de titânio. Com a tendência crescente da busca por alimentação saudável, é fato que novas discussões regulatórias como estas surgirão.

Além disso, no passado havia menor divulgação das pautas em discussão pelas autoridades sanitárias no Brasil. No entanto, nos últimos anos, algumas ações de âmbito federal visando dar maior transparência às ações das autoridades reguladoras tem proporcionado ao setor regulado maior visibilidade das Agendas Regulatórias, o que é excelente. Também é algo que veio para ficar. E ainda, nota-se que, apesar de não termos no Brasil processos de regulamentação rápidos, esse mecanismo de publicização e organização das agendas já tem dado maior celeridade ao rito de publicações de novas normas alimentares.

  • E você considera que essa divulgação das agendas do processo regulatório, além de evitar que as empresas sejam “pegas de surpresa”, também diminuirá os impactos para o setor produtivo?

Resposta: Algo que também é relativamente novo e deve se perpetuar é a organização do processo regulatório no Brasil, com destaque para a obrigatoriedade da realização da Análise de Impacto Regulatório (AIR). Essa inovação é sem dúvida uma ferramenta crucial para a construção de novas legislações, de modo a avaliar e ponderar os impactos do futuro regulamento para todos os stakeholders envolvidos, ou seja, órgão regulador, setor produtivo e consumidor. Tal organização regulatória garante ainda a realização de etapas de participação social, como Consulta Pública e Audiência Pública, algo muito importante no processo regulatório, para contemplar o ponto de vista de todos os atores impactados pela norma. Outro destaque nessa organização regulatória é a previsão de realização da Análise do Resultado Regulatório (ARR), que visa avaliar os resultados obtidos após a publicação da norma e verificar se a mesma resolveu o problema regulatório e atendeu a necessidade pela qual foi criada, de modo a dar visibilidade ao órgão da necessidade de revisão e até mesmo de revogação. Sem dúvida, a AIR e a ARR geram um sistema regulatório mais equilibrado, construído com base em evidências científicas e em fatos reais do cotidiano da indústria. Isso não só resulta num impacto adequado das regulamentações, como também colabora para a solução do problema regulatório.

  • E o que parece ser o futuro das discussões regulatórias?

Resposta: Em relação ao futuro, não muito distante, está na pauta das autoridades sanitárias no Brasil a questão das novas tecnologias e inovação, por exemplo, carne de laboratório, produtos plant based, novos alimentos e novos ingredientes etc. Em outubro do ano passado, a ANVISA realizou oficinas técnicas sobre plant based para obter elementos para a identificação e a análise do problema regulatório, suas causas e consequências, e mapeamento dos agentes por ele afetados. O MAPA também está trabalhando neste tema, e em 2021 realizou a Tomada Pública de Subsídios sobre a regulação dos produtos plant based. A discussão de novos alimentos também está sendo trabalhada pela Agência na revisão das Resoluções 16, 17, 18 e 19/1999, prevista na Agenda Regulatória 2021-2023. Um dos tópicos em debate é o conceito de novo alimento e a definição de histórico de consumo, além dos requisitos para avaliação de segurança e comprovação da eficácia de claims. É inevitável pensar que as discussões do futuro estarão focadas no avanço tecnológico e inovação.

Algo bastante recente e que provavelmente vai se tornar pilar constante do processo regulatório no Brasil é o aproveitamento de análise realizada por Autoridade Reguladora Estrangeira Equivalente para regularização de produtos sujeitos à ANVISA. O tema foi tratado na Consulta Pública 1039/21 e tem forte relação com as discussões regulatórias das aprovações das vacinas no cenário da pandemia do novo coronavírus. Tendo em vista esse racional da CP, em novembro de 2021, a Gerência Geral de Alimentos da ANVISA disponibilizou quatro novos processos de avaliação de segurança e eficácia de novos ingredientes de alimentos, que permitem uma análise simplificada para alguns casos específicos, entre eles a avaliação de novos alimentos a partir do aproveitamento de análise realizada por autoridades regulatórias estrangeiras. Esse é um grande avanço que proporciona celeridade às inovações da indústria de alimentos. Vivemos recentemente essa experiência na empresa, e conseguimos aprovação da ANVISA em tempo recorde!

  • Está ficando mais simples ou mais complexo atuar em Assuntos Regulatórios?

Resposta: Na minha opinião, se por um lado o processo regulatório no Brasil está cada vez mais organizado com os órgãos provendo ao setor regulado ferramentas que facilitam o acesso aos regulamentos, o entendimento das normas, o acompanhamento e a participações nas agendas, por outro lado é crescente nas empresas a demanda para a área de Regulatórios frente ao avanço da tecnologia e da inovação, o que torna mais complexo atuar na área.

A modernização da indústria de alimentos em termos de matérias-primas, novos ingredientes e processos, somada às tendências de consumo que requerem saudabilidade, praticidade e conveniência, exigem do profissional da área maior domínio das normas, atualização diária, relacionamento contínuo com órgãos e associações e forte atuação na Agenda Regulatória. Tudo isso visando manter a operação da empresa em conformidade com a legislação vigente e garantir a continuidade do negócio, bem como viabilizar as oportunidades em lançamentos disruptivos e novos.

  • Talita, pensando no seu tempo, há uma programação prévia para atualizações (por exemplo uma hora por dia, 1x na semana)? Considerando que temos várias novas publicações, normas revogadas, qual a sua ferramenta preferida para se atualizar?

Resposta: Em relação à legislação nacional, diariamente leio os informativos do Diário Oficial da União (DOU) compilados pelas associações das quais a empresa é membro e pela consultoria que nos dá suporte. Essa é minha ferramenta favorita, porque é prática e rápida, além da publicação já vir acompanhada de análises e comentários.

Além disso, uma vez ao mês reviso as publicações por meio de um compilado mensal com todas as novas normas alimentares no Brasil. Em relação ao cenário internacional, recebo mensalmente um compilado de um banco de legislação contratado pelo global na Holanda. A movimentação no MERCOSUL e no Codex Alimentarius eu acompanho via associação com a frequência de acordo com a agenda dessas discussões. Além disso, visito constantemente os sites do MAPA e da ANVISA, e também acompanho estes órgãos e stakeholders pelo Linkedin. Por último, também fico atenta aos eventos e feiras que geralmente incluem workshops e palestras sobre temas regulatórios, além de webinars, que aumentaram grandemente durante a pandemia.

  • Talita, o que você sugere para pequenas empresas se manterem atualizadas e cumpridoras dos seus deveres, já que por tudo que citou há uma complexidade para gerenciar?

Resposta: Geralmente as pequenas empresas não têm um departamento de Assuntos Regulatórios, mas algumas áreas como Pesquisa e Desenvolvimento, Qualidade e Jurídico, são responsáveis por atividades como a avaliação de fórmulas, análise de viabilidade de projetos, registro de produtos, elaboração de rotulagem, análise da comunicação de produtos, defesa de notificações etc. Ou seja, a área funciona de forma desmembrada. Esse não é o modelo ideal. Nestes casos, para um adequado gerenciamento, é muito relevante investir em treinamentos para ter ao menos um profissional especialista em legislação com domínio do tema e visão do todo. Há também a possibilidade de contratação de consultoria, que pode ser responsável por todas as atividades ou para dar suporte pontualmente em casos mais complexos.

Também, por não ter uma área dedicada somente a Assuntos Regulatórios, é mais desafiador organizar um sistema de acompanhamento das novas publicações. Existe a opção, por exemplo, da aquisição de acesso a bancos de legislação que são providos de ferramentas de busca por categorias de produtos e temas, além de alertas de monitoramento do Diário Oficial personalizados. Outra opção novamente são as consultorias, que oferecem serviços como envio de e-mail mensalmente com o compilado das legislações publicadas e acompanhadas da análise dos impactos.

Para a saúde da empresa é muito importante ter um processo de follow-up das publicações. Em caso de não ter essa possibilidade de investir em ferramentas ou consultoria, como já citei, a empresa precisa de um especialista. Ao longo dos últimos anos, os sites dos órgãos como MAPA, ANVISA e INMETRO receberam grandes melhorias, como organização das bibliotecas de normas por categorias de produtos, publicação de documentos de “Perguntas e Respostas” e ferramentas de busca. Um profissional treinado pode conseguir um bom resultado usando esses recursos gratuitos. No site da ANVISA, por exemplo, todos os documentos de Perguntas e Respostas estão reunidos em uma única ferramenta, e todas as normas da Agência estão reunidas na Biblioteca de Alimentos. Já na Biblioteca do MAPA, as normas estão organizadas por categorias e temas.

  • E como uma empresa pequena pode participar das Agendas Regulatórias que você comentou?

Resposta: Sem uma área de Assuntos Regulatórios estruturada, também é mais difícil desenvolver estrategicamente as relações externas, tal como a filiação em associações de classe, que além de canal para atualização sobre novos regulamentos, é a principal porta para atuação nas discussões das Agendas Regulatórias e para maior proximidade com os órgãos. Tal acompanhamento e participação nos movimentos e fóruns regulatórios é de extrema relevância para mitigar riscos, reduzir impactos e aproveitar oportunidades de inovação ou até mesmo de redução de custos. As associações de maior porte podem ter um custo maior de anuidade, no entanto existem associações específicas que representam as pequenas indústrias e até mesmo os produtores artesanais. Eu recomendo fortemente que as empresas avaliem essa estratégia e dentro do possível ingressem nas associações de suas respectivas categorias.

Caso seja inviável investir na filiação em associações, como mencionei, os sites dos órgãos hoje em dia estão bastante organizados, e um profissional treinado consegue navegar e obter informações sobre status de cada tema das Agendas Regulatórias e também consegue enviar posicionamento da empresa nas Consultas Públicas. Por exemplo: as Consultas Públicas do MAPA estão organizadas no SISMAN – Sistema de Monitoramento de Atos Normativos. Já as Consultas Públicas da ANVISA estão disponíveis na página da Agência.

De novo, esse não é o modelo completo e ideal, mas já é uma forma mínima para estar ciente das discussões em andamento.

  • Para encerrar, quais os posts que você mais gostou de escrever e quais tiveram maior repercussão?

Resposta: Meus temas favoritos são rotulagem e aditivos alimentares. Então tenho um “carinho especial” pelos seguintes textos: “Rotulagem de alimentos para fins industriais: como elaborar?”, “Adoçantes são seguros? Uma abordagem sob a ótica de Food Safety e Regulatory Affairs”, “Alegações na rotulagem de alimentos: o que pode e o que não pode?” e “Dúvida de leitor: quais as normas do INMETRO para rótulos de alimentos?”.

Entre os de maior repercussão, escrevi o texto “Produção e Comercialização de alimentos artesanais – saiba por onde começar para regularizar seu negócio”, que foi o quinto post mais lido em 2021 no Food Safety Brazil.

Se você deseja conhecer outros textos da Talita Andrade sobre legislação de alimentos, clique aqui.

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A nova árvore decisória do Codex Alimentarius

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O relatório da 52ª seção do Codex Alimentarius trouxe uma novidade que está causando um frenesi nos amantes do HACCP, um modelo de árvore decisória!

Árvores decisórias são ferramentas de análise lógica na forma de representações gráficas que ajudam na tomada de decisão sobre considerar uma etapa de processo um PCC (Ponto Crítico de Controle) ou não.

Assim, árvores decisórias ajudam especialmente no Princípio 2 do HACCP, que trata da identificação de PCCs.

Segue uma tradução livre desta árvore decisória:

Figura 1: Tradução livre da árvore decisória do Codex Alimentaius. Como as saídas dos passos 2 e 3 são muito similares levando à mesma lógica na árvore original, nesta tradução foi considerada como sendo a mesma saída. 

Importante informar que esta árvore decisória é um EXEMPLO, portanto uma sugestão que você pode usar ou não. Outros modelos de árvores ou ferramentas lógicas continuam sendo utilizadas.

Note que esta árvore decisória, justamente por seguir o HACCP clássico do Codex Alimentarius, não apresenta em sua linha de raciocínio um caminho que diferencie conceitualmente PCCs e PPROs (Programa de Pré-Requisitos Operacionais), o que a torna menos útil para quem tem, por exemplo, um SGSA com base na FSSC 22000.

Neste caso, sugiro que deem uma olhada no artigo HACCP na produção de alimentos: minha árvore decisória favorita que apresenta um modelo que contempla caminhos lógicos distintos para identificação de PCCs ou PPROs.

Acesse o Codex Alimentarius pelo link https://www.fao.org/fao-who-codexalimentarius/en/.

Você gostou deste modelo de árvore decisória? Não gostou? Deixe sua opinião nos comentários!

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Food Safety Brazil comemora 10 anos de existência!

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O tempo voa! Este ano o Food Safety Brazil completa 10 anos de existência!Esta é uma história que tem muito a comemorar. Por aqui tivemos a honra de conviver com profissionais das diversas áreas da cadeia produtiva de alimentos: engenheiros, veterinários, biólogos, químicos, e muitas outras profissões que contribuíram para fazer com que o Food Safety Brazil fosse uma referência em conteúdo de segurança de alimentos. Somos muito gratos a todos que fizeram e fazem parte da nossa história

 

Parece que foi ontem mesmo que preparamos o vídeo comemorativo de 5 anos. E foi emocionante…. Quer conhecer a primeira metade da nossa história?  Clique aqui para relembrar este momento.

 

Nestes 10 anos podemos dizer que fomos maleáveis a todas essas mudanças pelas quais passamos, sejam elas no âmbito regulatório, no cenário global, e no direcionamento da nossa organização. E também fomos receptivos aos talentos que vieram fazer parte da nossa equipe.

Para comemorar os 10 anos do Food Safety Brazil, estamos preparando pílulas de alegria, conhecimento e reconhecimento. Teremos depoimentos, entrevistas e muito conteúdo rico para renovar os nossos votos com vocês, leitores. 

Vamos fortalecer nosso compromisso de compartilhar conhecimento e experiências em segurança de alimentos.

 

Venha com a gente!

 

Fernanda Spinassi, Presidente da Associação Food Safety Brazil

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