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Presunto cozido fatiado refrigerado é susceptível à contaminação por Listeria monocytogenes ?

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A carne suína apresenta grande importância econômica e alimentar, uma vez que é um dos produtos mais populares e consumidos em todo o mundo. Para o Brasil, sua importância é ainda maior, uma vez que somos um dos maiores produtores mundiais de carne suína, ocupando a quarta posição no ranking mundial de produção e exportação. Considerando todos os produtos suínos, in natura e processados, as exportações brasileiras da carne suína em 2018 totalizaram 646 mil toneladas.

O presunto cozido é obtido exclusivamente a partir de pernil de suínos desossados, sendo um produto industrializado acrescido de ingredientes, curado em salmoura, submetido a processo de cozimento adequado e refrigerado após a cocção. Assim como qualquer outro alimento, a complexa estrutura química interfere, de distintas formas, na diversidade microbiana associada a ele.

A etapa de cozimento no processo produtivo do presunto elimina uma ampla variedade de microrganismos patogênicos, entre eles Listeria monocytogenes. Mas isso não significa segurança total, uma vez que falhas no processo produtivo (manuseio inadequado, estocagem ineficiente e equipamentos não higienizados corretamente) podem comprometer a segurança do produto final entregue ao consumidor, e este pode se tornar veículo para Listeria monoctytogenes.

Nesse contexto,  sugere-se  que a contaminação observada em estudos aconteça durante o pós-processamento das peças, o que pode indicar a uma contaminação cruzada no manuseio dessas peças. O processo de fatiamento, por exemplo, aumenta o risco de contaminação devido às condições de higiene do manipulador e do ambiente, a partir do contato com superfícies mal sanitizadas em mercados, padarias e delicatessens.

 Nos EUA, um surto de Listeria monocytogenes tendo como veículo o presunto foi reportado pelo CDC (Centro de Controle e Prevenção de Doenças). Quatro indivíduos foram hospitalizados e desses, um foi a óbito. O surto foi associado ao consumo de presunto cozido de uma marca específica, a qual sofreu processo de recall. O segundo caso, extremamente preocupante, foi o do serviço de alimentação do hospital Queensland Children’s na Austrália. Sanduíches de presunto servidos aos pacientes estavam contaminados e a identificação foi feita pelo próprio setor de qualidade e segurança alimentar do hospital. Nesse caso nenhum paciente ou acompanhante desenvolveu ou reportou a doença. Na última década, diversos estudos vêm demonstrando não apenas a presença de L. monocytogenes em presunto cozido, um alimento amplamente e diariamente consumido em nosso país, como também a disseminação de cepas resistentes, e até mesmo multirresistentes a antibióticos. Geralmente a espécie é sensível a uma vasta gama de antibióticos contra Gram positivos como tetraciclinas, eritromicina, ampicilina e gentamicina.

Desse modo. é essencial que sejam ofertados treinamentos adequados para manipuladores, incluindo como se aplicar as boas práticas de fabricação em ambientes de processamento, e controle/monitoramento/inspeções constantes desses ambientes pela própria empresa, mas também por agências de controle sanitário para evitar a contaminação do presunto cozido refrigerado por Listeria monocytogenes.

Autores: Vanessa Tavares de Souzaa, Aline dos Santos Garcia-Gomesa,b

a Laboratório de Microbiologia, Departamento de Alimentos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Brasil

b Laboratório de Estudos Integrados em Protozoologia, Instituto Oswaldo Cruz (IOC), Fiocruz. Rio de Janeiro, Brasil 

Referências

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Os coronavírus e as origens ambiental e alimentar em perspectiva

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As previsões de novas pandemias se repetem ao longo das décadas e com preocupação justificada.  Surtos de gripe A que seriam capazes de provocar pandemias como a influenza aviária e suína e dizimar grande número de pessoas não se confirmaram. Historicamente, a gripe causada pelo vírus russo H2N2 (1889-1890) levou 1,2 milhões de pessoas a óbito. Quase três décadas depois, o vírus H1N1 da gripe espanhola (1918-1919) fez sucumbir entre 50 e 100 milhões de pessoas.  Em sequência, a pandemia do vírus da gripe asiática H2N2 (1957-1958) acometeu dois milhões de pessoas e a gripe de Hong Kong – vírus H3N2 (1968-1969) – eliminou três milhões. Mais recentes e menos letais, a pandemia da “gripe aviária” H5N1 (1997-2004) causou cerca de 400 óbitos e a pandemia da “gripe suína” H1N1 (2009-2010) levou a morte 17 mil pessoas.

Muitas das doenças infecciosas mais perigosas que afetaram as populações humanas como peste, varíola, raiva, ebola, tifo, febre amarela e AIDS, tiveram origem em animais silvestres. Em algumas situações, o vírus permanece praticamente o mesmo que nas espécies hospedeiras evolutivas e com múltiplas oportunidades para se espalhar de animais para seres humanos.

Ali Ekici e colaboradores não sabiam que ao prenunciar uma pandemia inevitável e iminente de influenza surgiria uma ameaça tão mórbida  como a Covid-19 causada pelo coronavírus humano SARS-Cov-2.

Os coronavírus são nossos conhecidos há várias décadas já que vários genomas (229E, HKU1, NL63, OC43) causam resfriado comum no homem. Entre os coronavírus causadores das Síndromes Respiratórias Agudas Graves-SRAG, o SARS-CoV-1 matou quase 800 pessoas entre 2002 e 2003 e o MERS-CoV entre 2012 e 2018 levou a óbito 791 pessoas.  Enquanto isso, até o momento, o SARS-CoV-2 causou a morte de mais de 310 mil pessoas em todo o mundo.

Essas doenças geralmente têm vários reservatórios de animais e hospedeiros intermediários, bem como vias de transmissão complexas que incluem o contato direto ou indireto entre humanos e animais.

As doenças causadas pelos beta-coronavírus emergentes causadores da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS-CoV-1) e Coronavírus da Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV) foram originárias de morcegos.

Os beta-coronavírus são circulantes em morcegos frugívoros, o que demonstrou as necessidades de avaliar o risco de passagem para populações humanas, especialmente para indivíduos que caçam e consomem morcegos infectados.

A origem de hospedeiros animais em relação ao SARS-CoV-1 foi caracterizada nos mercados, restaurantes e fazendas  de vários países orientais  onde três pequenos carnívoros (guaxinins, civetas e ferrets) superexplorados pelo comércio internacional tiveram destaque. Uma das principais lições deixada pela  SARS-CoV-1 é que as raízes subjacentes das doenças zoonóticas emergentes podem estar na crise paralela da perda em massa da biodiversidade como resultado da exploração excessiva de populações de animais selvagens e da destruição de seus habitats naturais pelo aumento da população humana.

No caso do MERS-CoV, causador da Síndrome Respiratória do Oriente Médio, que está relacionado aos dromedários e camelos, especula-se  uma fonte de infecção  através da carne e, principalmente, do leite dessas espécies, sendo recomendado não ingerir esses alimentos.

O SARS-CoV-2 é o vírus mais recente dentre todos aqueles que surgiram da vida selvagem (morcegos), que romperam a barreira das espécies animais, sofreram mutações e depois se espalharam entre os seres humanos.

Na China, a maioria dos casos iniciais da Covid-19 estava relacionada a pessoas  que tinham visitado o mercado de frutos do mar –  Huanan South Seafood Market – em Wuhan, que também vende  carne e animais vivos exóticos.

Também há a questão do possível acesso de morcegos aos armazéns já que um dos principais riscos em grandes instalações de processamento de alimentos são estruturas superiores com construções não higiênicas. Surgiu a hipótese de que os frutos do mar ou a água do recipiente estivessem contaminadas (p. ex., excrementos de morcegos). A rastreabilidade e origem do pescado ou animais  deveriam ser investigadas para revelar se esses artigos do mercado de Huanan foram comercializados para outros mercados onde houve outros casos.

As carnes e os frutos do mar são ricos em glicosaminoglicanos, assim como a mucina do trato respiratória e que, portanto, podem servir como receptores altamente carregados para o SARS-CoV-2 para aderir e interagir com o tecido epitelial do hospedeiro.

No caso específico da SRAG causada pelo SARS-CoV-1, os colaboradores que abatiam ou manipulavam animais silvestres para alimentação foram os mais representados entre os casos iniciais da doença.

As evidências clínicas da Covid-19 sugerem que o sistema digestivo pode servir como uma rota alternativa de infecção quando as pessoas estão em contato com animais selvagens ou doentes infectados e portadores assintomáticos ou indivíduos com sintomas entéricos leves desde o início.

Mesmo assim, a demanda por alimentos “de luxo” exóticos em cadeias comerciais  como carnes de civeta, pangolim, porcos-espinhos, ratos de bambu, sopas de barbatana de tubarão e  de morcegos não param de crescer em restaurantes, em mercados ilegais e através de plataformas on-line, onde os consumidores também podem encontrar receitas e conselhos sobre culinária.

Semelhante a epidemia da SARS causada  pela SARS-Cov-1, a Covid-19 teve propagação zoonótica e de pessoa para pessoa, e constituiu uma ameaça significativa à saúde global e ao desenvolvimento socioeconômico.  Deve haver medidas para regulamentar a conservação da vida selvagem e a segurança alimentar para impedir a exposição humana a um novo vírus, incluindo o aumento da conscientização social sobre os perigos de consumo de carne de animais silvestres, fortalecendo a legislação sobre consumo e comércio de animais silvestres, melhorando os padrões de segurança alimentar e estabelecendo mecanismos de vigilância.

Foram expressas preocupações sobre o potencial desses vírus persistirem em alimentos crus de origem animal e existem pesquisas em andamento para avaliar a viabilidade e o tempo de sobrevivência da SARS-CoV-2 nos alimentos.

Órgãos como a Organização Mundial de Saúde -OMS e o Centro de Controle de Doenças americano – Center of Diseases Control –  têm  recomendado evitar viagens para áreas de alto risco, contato com indivíduos sintomáticos e consumo de carne de regiões com surtos de Covid-19.

Conclusões

Apesar da pandemia, parece que os governantes ainda não entenderam os aspectos ambientais dessas doenças já que nesse momento, vários mercados de animais vivos reabriram na China e em outros países asiáticos.

No Brasil, o aumento das práticas de desmatamento para atividades diversas expõe a população ao surgimento de um novo agente com potencial pandêmico. Quando ocorre essa prática, é comum por falta de desenvolvimento comercial nas imediações, haver o consumo de carne de animais de caça. Soma-se a isso o contrabando de animais vivos em virtude da queda acentuada das atividades de turismo. As autoridades brasileiras dos diferentes órgãos (saúde, ambiental, agricultura) devem se posicionar quanto a essas possibilidades evitando o surgimento de novas doenças.

Autores: Alfredo Tavares Fernandez –  Professor doutor das disciplinas de tecnologia de carnes e derivados, Inspeção de POA II e epidemiologia das Doenças de Origem Alimentar da Faculdade de Veterinária da Universidade Federal Fluminense- UFF

Elaine de Castro Antunes Marques Fernandez – MBA em Segurança de Alimentos e Gestão de Qualidade e Segurança de Alimentos – Universidade Veiga de Almeida

Referências

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Verificação da qualidade nos procedimentos de higiene de indústria de cárneos

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Um dos fatores que contribuem para o aumento dos surtos de doenças veiculadas por alimentos (DVA) é a quantidade de refeições feitas fora de casa. As DVA representam um importante problema de saúde pública. Os dados de DVA nos Estados Unidos, segundo a Centers for Disease Control and Prevention, compreenderam 24.029 casos, com 5.512 hospitalizações e 96 mortes (em 2016). Já no Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, nos anos de 2010 a 2017, foram 5.252 casos. As falhas no processo de higienização estão diretamente ligadas às DVA assim como as falhas no processo de produção de alimentos, de maneira geral.

Percebe-se então a importância do controle nos procedimentos de higiene dos equipamentos e utensílios nos serviços de alimentação. Estudos conduzidos por diversos autores mostram presença de microrganismos patogênicos em superfícies de bancadas, equipamentos, utensílios, mesas de refeições e dos pratos, cortadores e placas de cortes em serviços de alimentação e restaurantes comercias. Ressalta-se ainda que a presença destes microrganismos deteriorantes e patogênicos pode acarretar perda de qualidade das refeições, além do aumento do risco de surtos alimentares, pois eles aderem às superfícies e permanecem viáveis até mesmo após o processo de higienização local.

A higienização é um ponto crucial na indústria de alimentos, pois sua falta pode ocasionar problemas indesejáveis, como deterioração dos equipamentos e, consequentemente, aumento do valor investido em estrutura e manutenção; contaminação dos produtos produzidos, levando ao desconforto e à insatisfação dos consumidores, que podem sofrer danos à saúde.

Para a verificação da qualidade no procedimento de higiene pré e operacional na indústria de processamento de cárneos, procedeu-se a um levantamento de dados do controle da higienização através das coletas de superfície que foram analisadas para contagem total de mesófilos e detecção de Salmonella spp. Além disso, foi feito o acompanhamento de atividades técnicas e brainstorming para elaboração do Diagrama de Ishikawa, para estudar as causas que podem interferir na eficiência da higienização industrial.

Para ter acesso ao trabalho completo (15 páginas), clique aqui.

Déborah de Souza Oliveira é engenheira de alimentos com mestrado em Tecnologia de Alimentos. 

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A importância das embalagens bioativas e da própolis para conservação de alimentos

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As embalagens utilizadas para os alimentos vêm apresentando transformações positivas no decorrer do tempo, bem como as matérias primas utilizadas, os meios de produção em grande escala e os métodos para conservação das características principais de cada alimento produzido. Tudo isso em decorrência do aumento das informações e estudos relacionados aos temas relevantes para cada área da indústria de alimentos.

Uma embalagem considerada como ativa é aquela que exerce algum papel extra na preservação de alimentos, não se limitando ao de promover uma barreira inerte a influências externas. Isso acontece porque os constituintes do material, o produto e o ambiente interagem para prolongar a vida útil dos alimentos.

Alguns componentes ativos utilizados em embalagens como sachês e filmes plásticos absorvedores de etileno, sachês absorvedores de umidade, filmes que eliminam o excesso de umidade e controlam os níveis de oxigênio (O2), dióxido de carbono (CO2) e etileno, filmes com permeabilidade sensível à temperatura e embalagens antimicrobianas com emissores de dióxido de cloro, dióxido de enxofre, antioxidantes (impedem ou retardam as reações de oxidação) são exemplos de componentes de embalagens ativas, ao passo que os indicadores de tempo-temperatura, bem como os de amadurecimento e frescor são ótimos exemplos de componentes inteligentes.

Já as embalagens inteligentes funcionam como um indicador interno ou externo da qualidade do produto embalado, como de tempo e temperatura, para fornecer informações para o consumidor. Quando um alimento está se deteriorando, reações bioquímicas estão ocorrendo nele e muitas vezes são imperceptíveis, pois sua aparência se mantém como a de um produto fresco.

Além de apresentar diversas dessas características citadas anteriormente, as embalagens bioativas ou biofilmes também são ambientalmente corretas, pois são feitas do reaproveitamento de resíduos que seriam descartados na natureza e que se degradam facilmente no meio ambiente. Isso permite dizer que a embalagem bioativa é desenvolvida pensando também no futuro da sociedade, que consome cada vez mais alimentos processados e gera consequentemente uma maior quantidade de resíduos, o que causa prejuízos a médio e longo prazo para o planeta.

Os produtos e matérias primas utilizados para a produção de embalagens bioativas podem ser obtidos de diferentes polissacarídeos e fontes renováveis como fécula de mandioca, amido, gelatina, nanopartículas, quitosana e as pectinas, matriz polimérica base para o desenvolvimento dos biofilmes e que podem ser extraídas de frutas cítricas, algumas frutas do cerrado como o pequi. Existem também a pectina elaborada industrialmente, conhecida como comercial e outras fontes.

Há estudos em desenvolvimento para a produção de embalagem bioativa produzida com a pectina extraída do mesocarpo do pequi acrescida de extrato etanólico de própolis. Esse ingrediente confere o incremento de compostos bioativos, flavonoides, terpenos, álcoois e possui atividade antimicrobiana, com a função inicial de embalar alimentos, garantindo proteção contra microrganismos e mantendo por mais tempo suas características sensoriais originais e intactas do alimento a ser embalado.

Nesse contexto, entram as embalagens inteligentes, ativas e os biofilmes, adicionados ou não de componentes bioativos, para ajudar na identificação do ponto correto do produto, além de garantir maior vida de prateleira e evitar danos ao meio ambiente no momento do descarte das embalagens.

Em 2015, Luis Villaroya comprovou que devido às inúmeras propriedades encontradas na própolis, como antibacteriana, antiviral, antifúngica, antioxidante, anti-inflamatória, imunoestimulantes, propriedades anticancerígenas e pelo fato de os principais componentes serem geralmente reconhecidos como seguros para o consumo humano, além dos consumidores estarem em busca de produtos ecológicos, é que a própolis está ganhando popularidade como conservante natural para novas aplicações na indústria de alimentos e está sendo adicionada aos alimentos e bebidas como fonte de compostos bioativos para melhorar a saúde e consequentemente sua aplicação na produção das embalagens que  entrarão em contato direto com os alimentos produzidos.

A fim de implementar novos estudos e complementar informações científicas, desde 2000 Sforcin e colaboradores detectaram que para comprovar a eficácia da própolis como protetora dos alimentos embalados, a sua atividade antibacteriana é bem documentada contra diferentes bactérias como: Staphylococcus aureus, Pseudomonas aeruginosa, Escherichia coli e Salmonella typhimurium. Embora os levantamentos apontem que a própolis seja principalmente ativa contra as bactérias Gram-positivas, que são inibidas com uma concentração menor de própolis do que as bactérias Gram-negativas, ela mantém sua característica antimicrobiana em todas as espécies.

Com todas as informações já publicadas e testadas e com as inúmeras novidades que irão surgir com os testes e estudos realizados pelo mundo, se tornará cada vez mais comum a utilização de embalagens completas, eficientes, inteligentes e ativas tanto na indústria de alimentos quanto em outros segmentos industriais.

Além do mais, as novas embalagens que se mostram cada vez mais importantes no mercado visam alcançar alguns objetivos principais como o de estender o prazo de validade dos alimentos, com qualidade e segurança, reduzir o desperdício de alimentos e reduzir a adição de conservantes artificiais ou substitui-los por substâncias naturais com função antimicrobiana.

Autoras: Lilianne Baldoino Monteiro1, Geovana Rocha Plácido2, Tainara Leal de Sousa3

1 Mestranda em Ciência e Tecnologia de Alimentos no Instituto Federal Goiano, Campus Rio Verde – Goiás.

2 Professora Doutora no Instituto Federal Goiano, Campus Rio Verde – Goiás.

3 Doutoranda em Biotecnologia e Biodiversidade, Universidade Federal de Goiás

Referências

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SFORCIN, JM, FERNANDES JR., A., LOPES, CAM, BANKOVA, V. E FUNARI, SRC. Efeito sazonal na atividade antibacteriana da própolis brasileira. Jornal de Etnofarmacologia, 73 (1-2), 2000.

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Embalagens, segurança dos alimentos e sustentabilidade

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As características dos materiais alimentícios determinam a sua forma de contenção, conservação, armazenamento, distribuição e consumo. Um determinado alimento demanda um ou mais tipos de embalagens desde a sua produção até o momento do seu consumo. Quando tratamos da indústria de processamento, as embalagens podem exercer funções primárias – de contato direto com o alimento; secundárias – responsáveis por agrupamento e/ou conveniência; e terciárias – associadas ao manuseio e/ou transporte.

A função primária de contenção está associada à conservação dos alimentos, pois os protege do contato direto com agentes físicos, químicos e biológicos que os levariam à deterioração precoce. Por outro lado, nas embalagens primárias existe uma grande preocupação com a segurança dos alimentos, pois os materiais adotados podem ser um risco à saúde humana ou causar modificações indesejáveis na composição ou nas características sensoriais dos alimentos, através da migração para os alimentos de componentes tóxicos ou contaminantes. Por isso, devem ser adotados materiais que impeçam a migração de tais componentes ou que atendam aos limites máximos estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Dessa forma, poderíamos dizer que materiais inertes seriam os mais adequados para aplicação primária nas embalagens de alimentos.

Entretanto, estudos demonstram que algumas substâncias podem interagir com os alimentos de uma forma positiva, contribuindo com a preservação das suas características de interesse. Embalagens associadas a esses tipos de substâncias são chamadas de embalagens ativas. São exemplos desta categoria as embalagens de batatas fritas nas quais ocorre a substituição do gás oxigênio (catalisador de reação oxidativa) no seu interior pelo nitrogênio que é um gás inerte e previne a oxidação dos ácidos graxos resultantes do processo de fritura.

Ainda destacando tecnologias de embalagens que têm contato direto com os materiais alimentícios, as embalagens inteligentes se propõem a monitorar dados através de sensores, como parâmetros de qualidade (temperatura e grau de amadurecimento) e apresentá-los aos consumidores em tempo real. Além do fornecimento de informações mais confiáveis, outro grande benefício desta tecnologia seria a prevenção do manuseio inadequado e consequente prevenção de perdas e desperdícios. Exemplificando: na seleção de frutas, muitos consumidores costumam pressioná-las para identificação de seu grau de amadurecimento, comprometendo a qualidade de um ou mais itens nesse processo, o que representa uma parcela importante das perdas nas redes varejistas.

Além disso, embalagens inteligentes também apresentam vantagens do ponto de vista da rastreabilidade, o que faz delas uma solução com potencial de uso no que chamamos Indústria 4.0. Nessa indústria os dispositivos inteligentes, capazes de armazenar, monitorar e compartilhar informações de processos e produtos com segurança e rapidez são elementos fundamentais. Assim, os dispositivos associados às embalagens podem garantir informações de interesse para produtores e consumidores.

Muitos estudos motivam a ampliação do uso dessas tecnologias em virtude das vantagens já mencionadas. Entretanto, também chamam a atenção para barreiras como custo, maquinabilidade e aspectos regulatórios, por exemplo. No que tange às questões de custo e maquinabilidade, com o amadurecimento de pesquisas, é possível que possamos superá-las, num futuro próximo.  No aspecto regulatório, voltamos à questão supracitada da segurança dos alimentos, relacionada aos materiais aplicados nas embalagens, e por isso essas novas tecnologias precisam estar regulamentadas pela ANVISA.

Até então, somente a União Europeia regulamenta esses tipos de embalagens, especificamente pela (EC) 450/2009. O Brasil e muitos outros países ainda não dispõem de regulamento específico, alguns apenas baseiam-se nos padrões europeus ou no conceito Generally Recognized as Safe (GRAS) adotado pela Food and Drug Administration (FDA) para aprovar materiais em contato com os alimentos. Espera-se que os órgãos regulamentadores dos diferentes países atualizem suas normas à medida que a demanda por essas tecnologias aumente em seus mercados.

Além disso, o fator sustentabilidade também é parte do desafio. De acordo com a Aliança de Embalagens Sustentáveis da Austrália, podemos definir uma embalagem como sustentável com base em 4 critérios: i) efetividade – referente ao custo-benefício para todos na cadeia de produção; ii) eficiência – referente à utilização de recursos (materiais, energia, etc.) da forma mais eficiente possível; iii) sistema cíclico – referente à capacidade das embalagens serem “recuperadas” pela indústria ou pelo ambiente; e iv) segurança – referente ao uso de materiais não poluentes ou tóxicos, que não provoquem danos aos humanos e ao ambiente.

Atualmente, os principais materiais utilizados (vidro, plástico, metal, cartonados), quando descartados, representam um grande problema do ponto de vista ambiental, pois não conseguem ser reabsorvidos pelo ambiente num prazo razoável, ou recuperados pela indústria em sua totalidade. Isso tem feito com que grandes empresas e universidades desenvolvam pesquisas para identificação de materiais sustentáveis. Entre as soluções mais exploradas estão os biopolímeros, que podem substituir polímeros derivados do petróleo, e quando associados a sistemas de compostagem apresentam baixo impacto ambiental.

Ainda poderíamos tratar das múltiplas funcionalidades das embalagens nas etapas de logística e venda, por exemplo, mas isso seria material para um outro texto. O intuito aqui é destacar a importância das embalagens no mundo alimentício e, principalmente, chamar atenção para os desafios de segurança dos alimentos e sustentabilidade. As soluções que têm sido propostas estão em constante discussão e aprimoramento, elas precisam atender aos diferentes requisitos apresentados. Precisamos de materiais seguros para embalagens ativas, inteligentes e sustentáveis que favoreçam um padrão de qualidade diferenciado, minimizando perdas e desperdícios, talvez até eliminando a necessidade de outros conservantes, e reduzindo o impacto ambiental como um todo.

Mariana Costa é engenheira de alimentos, especialista em Gestão de Projetos.

Referências:

http://www.sustainablepack.org/

http://portal.anvisa.gov.br/registros-e-autorizacoes/alimentos/produtos/embalagem

Packaging Technology and Science (2012) – Framework for Sustainable Food Packaging Design

Atas de Saúde Ambiental (2016) – A Importância das Embalagens para Alimentos – Aspectos Socioeconômicos e Ambientais 

4 min leituraAs características dos materiais alimentícios determinam a sua forma de contenção, conservação, armazenamento, distribuição e consumo. Um determinado alimento demanda um ou mais tipos de embalagens desde a sua produção […]

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Vegetais minimamente processados: importância da sanitização para conter a disseminação de microrganismos resistentes

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A população mundial está mudando seus hábitos alimentares. O aumento da aquisição de alimentos prontos para o consumo é uma realidade cada vez mais presente. Isto se dá em função da busca por uma maior praticidade, diante de um ritmo de vida cada vez mais acelerado, que resulta na redução do tempo destinado ao preparo de alimentos.

Outra realidade também é a busca por uma alimentação saudável, cujo conceito consagrado pelas diretrizes alimentares da grande maioria de países no mundo é ser composta por uma combinação equilibrada de carboidratos, proteínas, gorduras, vitaminas e minerais, tendo como base o consumo de alimentos frescos, incluindo cereais, frutas e vegetais e alimentos de origem animal.

No Brasil, o mais recente Guia Alimentar para a População Brasileira propõe que a base da alimentação seja constituída de alimentos in natura e ou minimamente processados, em grande variedade e de origem predominantemente vegetal.

Uma alternativa simples e rápida para a inserção de alimentos saudáveis na rotina diária são os vegetais e frutas minimamente processados. Estes conseguem unir os parâmetros de saudabilidade e conveniência requeridos pela sociedade moderna, tendo ainda como vantagem a redução da produção de lixo doméstico, tendo em vista que são comercializados previamente lavados, cortados e limpos.

Alguns pontos negativos desses alimentos precisam ser evidenciados: maior custo e perecibilidade quando comparados aos produtos in natura, bem como a baixa credibilidade, por alguns consumidores, em relação à qualidade, origem e veracidade das informações contidas na embalagem. Um quesito relevante, quando se fala de alimentos desse tipo, é a sua qualidade microbiológica. Como são produtos que se apresentam prontos para o consumo, quão eficiente foi o processo de sanitização empregado?

Diversos fatores, da fazenda até a mesa, podem interferir na segurança microbiológica desses produtos. Os riscos durante a pré-colheita são reconhecidos como os mais relevantes, pois a contaminação estabelecida no campo torna-se um desafio à descontaminação. Essa contaminação é favorecida pela proximidade com o solo, uso de água de irrigação contaminada, manuseio pelos trabalhadores agrícolas, sendo o risco aumentado quando são realizadas operações manuais de corte, lavagem e embalagem.

Doenças transmitidas por alimentos são uma causa significativa de morbidade e mortalidade, podendo atingir qualquer indivíduo, seja ele de algum grupo de risco ou não. Muitos surtos de origem alimentar têm sido associados a vegetais e o grupo microbiano mais comumente envolvido em doenças transmitidas por alimentos frescos são as bactérias, com destaque para a família Enterobacteriaceae, cujos principais agentes etiológicos são Salmonella spp. e Escherichia coli. Não podemos esquecer que além de bactérias, outros grupos microbianos como protozoários e helmintos estão intimamente associados às contaminações de origem alimentar em vegetais.

Estudos correlacionam produtos minimamente processados como importantes veículos de transmissão de patógenos, sobretudo pelo fato de já se apresentarem prontos para o consumo, não “necessitando” de higienização prévia antes do consumo, o que se torna um desafio para a segurança de alimentos.

Um outro ponto de extrema relevância associado a esse tipo de produto é a presença/manutenção de cepas bacterianas resistentes. Os vegetais frescos podem atuar como reservatórios e transportadores de bactérias resistentes a antimicrobianos, disseminando esta resistência pela cadeia alimentar. Estas bactérias, quando presentes em fontes não clínicas, como esgoto, água, alimentos e solo demonstram a condição do ambiente, revelando que a disseminação da resistência não é causada, ou está restrita, somente aos hospitais ou ao uso excessivo de antibióticos. Estudos relacionados à resistência bacteriana vêm sendo conduzidos na atualidade fora dos hospitais, buscando entender a disseminação dessas bactérias na comunidade, associando esses dados à presença de antibióticos no meio ambiente, seu uso na terapia veterinária e na agricultura.

É importante monitorar não só a diversidade microbiana, mas também o perfil de resistência a antimicrobianos em produtos frescos. Avaliações de risco e intervenções adequadas podem ser pensadas, uma vez que a presença de microrganismos resistentes constitui uma ameaça severa ao consumidor. Isto porque, em um surto de origem alimentar associado a microrganismos resistentes, a escolha do antibiótico se torna limitada, há a possibilidade de falha no tratamento e ainda a possibilidade de os microrganismos adquirirem vantagem em uma futura antibioticoterapia.

O hipoclorito de sódio é amplamente utilizado na etapa de sanitização para reduzir a contaminação bacteriana em vegetais. Entretanto, estudos têm relatado inúmeros isolados bacterianos com resistência ao cloro. Isto pode contribuir para a redução da vida útil destes produtos, bem como o envolvimento deles em surtos de origem alimentar.

A RDC Nº 14, de 28 de fevereiro de 2007, que aprova o Regulamento Técnico para Produtos Saneantes com Ação Antimicrobiana harmonizado no âmbito do Mercosul, define sanitizante como “um agente/produto que reduz o número de bactérias a níveis seguros de acordo com as normas de saúde”. A Portaria da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde SVS – MS nº 152, de 26/02/1999, que aprova o Regulamento Técnico para produtos destinados à desinfecção de água para o consumo, e de produtos algicidas e fungicidas para piscinas, autoriza o uso de hipoclorito de sódio para desinfecção de água para o consumo humano. A Resolução RDC nº 77 de 2001 estende este regulamento a produtos para desinfecção de hortifrutícolas.

A eficácia desse sanitizante está diretamente relacionada não apenas à concentração de cloro ativo utilizado, mas também ao tempo de exposição do alimento ao sanitizante. Assim, a utilização do binômio concentração de cloro ativo/tempo de contato correto é fundamental para a exclusão dos riscos expostos previamente, garantindo a entrega ao consumidor de um alimento seguro.

Autoras: Juliana Souza Alvesa, Barbara Cristina Euzebio Pereira Dias de Oliveiraa*, Aline dos Santos Garcia-Gomesa,b

a Laboratório de Microbiologia, Departamento de Alimentos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Brasil

b Laboratório de Estudos Integrados em Protozoologia, Instituto Oswaldo Cruz (IOC), Fiocruz. Rio de Janeiro, Brasil 

Referências:

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Brasil. Ministério da Saúde. Guia alimentar para a população brasileira / ministério da saúde, secretaria de atenção à saúde, departamento de atenção básica. – 2. ed. – Brasília: Ministério da Saúde, 2014. 156 pp.

Carvalheira A., Silva J., Teixeira P. Lettuce and fruits as a source of multidrug resistant Acinetobacter spp. Food Microbiology. 64: 119-125 (2017).

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Karumathil, D. et al. Prevalence of multidrug-resistant bacteria on fresh vegetables collected from farmers’ markets in Connecticut. Journal of Food Protection. vol. 79. 2016.

Meireles, A. et al. Antimicrobial susceptibility and sessile behaviour of bacteria isolated from a minimally processed vegetables plant. Biofouling, 34: 1150-1160 (2018).

Nascimento, K. et al. Alimentos minimamente processados: uma tendência de mercado. Acta Tecnológica. 9(1) 48- 6. (2014).

Newell, D. et al. Food-borne diseases – the challenges of 20 years ago still persist while new ones continue to emerge. International Journal of Food Microbiology. 2010

Osaili, T. et al. Decontamination and survival of enterobacteriaceae on shredded iceberg lettuce during storage. Food Microbiology 73, pp 129-136 (2018).

Verraes, C. et al. Antimicrobial resistance in the food chain: a review. Int. J. Environ. res. public health. 10:2643-2669 (2013).

Vital, P. et al. Microbiological assessment of fresh, minimally processed vegetables from open air markets and supermarkets in luzon, philippines, for food safety. Environ Dev Sustain 21, 51–60 (2019).

WHO, Word Health Organization. Population nutrient intake goals for preventing diet-related chronic diseases. disponível em http://www.who.int/nutrition/topics/5_population_nutrient/en/. Acessado em 10 mar 2020.

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Manutenção e segurança dos alimentos: o grande desafio

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Em muitas fábricas em que andei atuando, pude observar que manutenção e segurança de alimentos sempre possuem alguns entraves que deixam qualquer time de qualidade assustado.

Levando em conta esses pontos críticos, listei alguns itens que podem ser importantes para uma gestão adequada quando tratamos de manutenção e segurança de alimentos.

O básico nós temos intensificado principalmente nestas épocas de crise, que são a correta lavagem das mãos e uso de máscaras e protetores de forma adequada, mas além destas recomendações, coloco aqui alguns dos principais itens que o time de manutenção deve seguir para contribuir com a Segurança dos Alimentos:

  • Comunicação entre as áreas

Comunicação é primordial! No momento de uma manutenção, uma pessoa do time de qualidade (analista de linha) deve ser comunicada para apoiar o time de manutenção em relação aos riscos que a atividade pode gerar para os alimentos da linha. Essa primeira análise de riscos deve indicar quais locais devem ser protegidos a fim de evitar uma contaminação.

  • Limpeza após manutenção

Após a manutenção é dever do time realizar uma breve limpeza do local. Retirar possíveis contaminantes (materiais de manutenção, ferramentas, pedaços de materiais utilizados no reparo, parafusos, porcas e outros materiais que não pertençam à linha), limpar as áreas de contato com os alimentos com produtos adequados e comunicar o departamento da qualidade é o básico que deve ser feito. Nesta comunicação, o parecer final da qualidade deve dizer se será necessário um processo de sanitização após o reparo.

  • Reparos temporários

Algumas vezes não é possível realizar o reparo de forma adequada, mas o reparo temporário – ou como é mais conhecido, a “gambiarra” – deve ser feito(a) de forma consciente. Todo o local que possui contato com alimentos deve ter o uso de materiais de grau alimentício e deve ser identificado, seja nele mesmo ou em registro de manutenção. Essa identificação deve garantir que o reparo seja temporário e que logo seja substituído por um reparo definitivo e mais adequado.

  • Reconciliação de partes

Toda manutenção corretiva pode gerar uma substituição de uma peça quebrada e para que as peças danificadas não se tornem um risco para os alimentos, deve ser feita sempre a reconciliação de partes que é onde todos os elementos que compõem a peça devem ser juntados e remontados para garantir que nenhuma parte contaminou os produtos que estão passando na linha. Quando isto não é possível, a Qualidade (que deve estar junto) realiza uma retenção dos produtos que passaram na linha e os reprova para assegurar que a parte não encontrada não seguirá até o consumidor.

O resultado de uma ação mal sucedida deste tipo pode resultar em problemas como o apontado neste post. 

  • Lubrificação

A manutenção deve utilizar dentro das linhas produtivas somente os produtos adequados de grau alimentício. Estes produtos são avaliados por órgãos competentes que asseguram que os produtos podem ter contato acidental com alimentos sem causar danos ao consumidor. Lembro que apenas o fato de terem o grau alimentício não significa que podem entrar em contato a todo momento com o alimento. Um alimento que tiver contato com esse tipo de lubrificante é considerado adulterado.

Hoje a tecnologia em lubrificantes tem se mostrado responsável e com nível elevado frente à segurança de alimentos, como nos conta Cíntia Malagutti em https://foodsafetybrazil.org/futuro-industria-de-alimentos-e-os-lubrificantes/. 

  • Vazamentos

Os vazamentos devem ser sempre contidos para que não contaminem o produto, para isto todos os locais de possível contato com alimentos em diferentes níveis devem possuir cubas de contenção ou chapas defletoras.

  • Estoques de peças

As peças para equipamentos que processam alimentos devem ser limpas e higienizadas antes de serem guardadas no estoque. Também devem ficar bem embaladas e longe do piso.

  • Lesões e feridas

Muito comum com o time de manutenção é ocorrerem pequenas lesões e feridas durante as atividades. No momento em que ocorrer um incidente deste tipo, deve-se imediatamente procurar o departamento médico da empresa para que cuidar deste ferimento e também fazer as proteções adequadas para evitar contaminações do funcionário com o alimento e vice-versa.

  • Terceiros na fábrica

A manutenção tem por hábito receber muitos terceiros para avaliar peças, equipamentos ou problemas nas linhas. Eles também devem seguir todas as recomendações que são cobradas do time de manutenção, portanto é de responsabilidade do time visitado, orientar, oferecer as proteções adequadas e direcionar os trabalhos em função de evitar o risco com a segurança dos alimentos.

  • Boas Práticas de Manutenção

Por fim, estas são algumas boas práticas a serem realizadas pelo time de manutenção: a utilização de ferramentas limpas e organizadas, assim como os panos e outros itens para limpeza devem estar livres de resíduos indesejados, manter a limpeza de painéis e caixas não seladas nas áreas produtivas, observar a correta montagem de proteções e fazer inspeções regulares em locais onde as proteções dificultam o acesso, observar indícios de vazamentos e acúmulo de lubrificantes, retirar dos ambientes com alimentos os resíduos de manutenção e assegurar as devidas proteções das áreas de contato com os alimentos durante a execução dos trabalhos.

Renato Matsuoka é engenheiro eletricista pela FEI e possui MBA em Supply Chain e Logística pela FGV. 

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Food Defense: conceitos e aplicação na garantia de qualidade de leite e derivados

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Alimento seguro é aquele que não causa dano à saúde quando consumido de acordo com o uso intencional. Isso é garantido pelas práticas que permitem o controle de qualquer agente biológico, físico e químico, que em contato com o alimento, promova risco de contaminação. Nesse contexto, as normas relacionadas aos sistemas de gestão de qualidade e segurança de alimentos adquirem relevância, como sistemática de padronização em todos os elos da cadeia de produção e distribuição de alimentos.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, o bioterrorismo é a contaminação deliberada ou proposital de alimentos para consumo humano ou animal através de agentes químicos, biológicos ou radionucleares, com o objetivo de causar dano ou morte em populações civis, ou alterar a ordem social, econômica ou política estabelecida. Por sua vez, agroterrorismo é a tentativa maliciosa de uma pessoa ou grupo de destruir a indústria agrícola e/ou interromper o fornecimento de alimentos de uma nação em termos de pré-colheita ou colheita, com o objetivo final de criar instabilidade, a partir da introdução deliberada de doenças animais ou vegetais. O início dos anos 2000 entrou para a história após o atentado de 11 de setembro nos Estados Unidos, fazendo com que todo o sistema de ações antiterroristas fosse revisado.

Neste cenário, surge o conceito de Food Defense que, em português, pode ser denominado “defesa dos alimentos”, com o objetivo de prevenir ataques maliciosos à população por meio de alimentos, bioterrorismo e priorizar ações em caso de incidentes.

Em um contexto mais amplo, o termo Food Defense inclui ações deliberadas de fraude alimentar, ataques cibernéticos e sabotagem, responsabilizando as pessoas pelos incidentes decorrentes. Dessa forma, dois fatores importantes devem ser considerados: a motivação para a agressão e o perfil dos agressores.  De fato, o plano de defesa dos alimentos deverá ser desenvolvido com base no potencial alvo, no perfil e na motivação dos potenciais agressores. As motivações mais frequentes são: ações terroristas, causar prejuízo financeiro a uma empresa sem afetar as pessoas e extorsão para obter ganho financeiro. Há também registros de ameaças relacionadas a crimes cibernéticos, espionagem industrial, sabotagem.

A produção de leite no Brasil alcança patamares da ordem de 50 bilhões de litros por ano, tornando-o um produto com potencial para adulteração economicamente motivada e ataques maliciosos.  Um histórico recente mostra que o leite tem sido alvo de fraudes. Inicialmente as adulterações tinham o objetivo de ganho de volume através da adição de água e de desnate para a produção de creme de leite. Em seguida, novas práticas foram adotadas, como adição de soro de queijo, peróxido de sódio, hidróxido de cálcio, sal, açúcar e amido. Essas ações intencionais, motivadas por ganho econômico, podem agregar contaminação ao produto, revelando a fragilidade desta cadeia produtiva para ataques maliciosos.

Em virtude do volume de produção, relevância na alimentação e na economia, uma contaminação proposital em leite e seus derivados pode provocar um incidente com impacto severo de cunho social e político.  Por esse motivo, as unidades produtoras de leite e derivados devem ser capazes de se comunicar de forma efetiva com o ambiente externo no início, durante e após um evento, de forma a proteger clientes, dar ciência e apresentar tratativas a entidades governamentais e, até mesmo, controlar situações de pânico da população.

De fato, a implementação de um ambiente organizacional no laticínio deve ser estabelecida de forma preventiva para evitar ações maliciosas, e pode ter como base um programa de cultura de segurança de alimentos, com o objetivo de estabelecer um comportamento natural de proteção do produto sendo por isso necessário nomear uma equipe multidisciplinar. Embora seja muito comum que os projetos de Food Defense sejam liderados pela área de qualidade, o sucesso da implementação depende da multidisciplinaridade para lidar com o assunto.

Uma boa prática observada no mercado é que o plano para prevenção de ações maliciosas seja construído com a participação da equipe APPCC, de forma a apresentar dados técnicos sobre os potenciais danos, disponibilidade, doses letais e danos provocados pelos contaminantes. Vale também destacar a capacitação em food defense dos profissionais da área de segurança patrimonial, uma vez que estes são responsáveis por controlar a entrada e o trânsito de pessoas nas empresas. Os profissionais de RH também têm papel fundamental, afinal, perfis psicológicos suspeitos devem ser identificados antes mesmo da contratação.

Dentro de um laticínio, a análise para abordar os riscos em Food Defense pode ser feita considerando-se três tópicos: produto, as instalações da empresa e os aspectos organizacionais. Em relação ao produto, pode-se avaliar se há significado religioso, se é utilizado como matéria prima em uma ampla gama de alimentos ou se possui ingredientes de países em situação de guerra, conflitos religiosos, políticos e de terrorismo. A posição do alimento na cadeia de abastecimento e os impactos em caso de interrompimento também devem ser avaliados.  Estudos avaliando a percepção do sistema  de Food Defense em laticínios no Brasil (sem implementação formal do sistema) são escassos:  recentemente, pesquisa envolvendo a percepção de unidades produtoras de leite no Brasil tem como primórdios o controle da segurança externa da unidade produtora, controle de acesso do pessoal, com taxas de 84% e 82% de respostas positivas para esses itens.

Pelo exposto, demonstra-se a relevância em implementar os requisitos de Food Defense para produtores de leite e derivados de forma a ganhar visibilidade perante seus concorrentes, agregando valor ao produto lácteo e simultaneamente resguardando a saúde do consumidor.

Autores:  Leo O. Lopes1, Ramon Silva1,2, Jonas T. Guimarães1, Nathalia M. Coutinho1, Tatiana C. Pimentel2,  Erick A. Esmerino1, Maria Carmela K.H. Duarte1, Denise R.P. Azeredo4, Adriano G. Cruz4*

 1Universidade Federal Fluminense (UFF), Faculdade de Medicina Veterinária

2Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Departamento de Alimentos, Rio de Janeiro, Brasil.

3Instituto Federal do Paraná (IFPR), Paranavaí, Paraná, Brasil.

Referências

Abrantes, M.R; Campêlo, C.S., Silva, J.B.A. Fraude em leite: Métodos de detecção e implicações para o consumidor. Rev Inst Adolfo Lutz. São Paulo,73, 244-251, 2014.

Betancourt, Sarah Romeiro. Defesa Alimentar (Food Defense): Aplicação da ferramenta Carver + Shock na indústria do leite no Brasil. Mestrado em Gestão e Inovação na Indústria Animal – Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos, Universidade de São Paulo. 2017.

Huff, A. G. Food Defense, Michigan State University, East Lansing, MI, United States. 2018. 6 pp.

Norma ISO 22000:2018 – Sistemas de gestão da segurança de alimentos – Requisitos para qualquer organização na cadeia de alimentos

Yiannas, Frank. Cultura de Segurança de Alimentos: Criando um Sistema de Gestão de Segurança de Alimentos Baseado em Comportamento. São Paulo, SP: Food Design, 2014.

Lopes, L.O. et al.  Food defense: perceptions and attitudes of Brazilian dairy companies. Journal of Dairy Science, in press, 2020.

Moraes, Bruna Márcia Machado  e  Bender Filho, Reisoli. Mercado Brasileiro de Lácteos: análise do impacto de políticas de estímulo à produção. Revista de  Economia e  Sociologia Rural, 55, 783-800, 2017

Manning, L.; Baines, R.N. &  Chadd, S.A. Deliberate contaminatiom of the food suply chain, British Food Journal, 107, .225-245, 2005.

Manning, L. & Soon, J. Food Safety, Food Fraud, and Food Defense: A Fast Evolving Literature Journal of Food Science, 81, R823-34, 2016?

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Agricultura familiar na merenda escolar: importância de uma boa higienização para garantir a segurança dos alimentos

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A alimentação escolar é um direito garantido pela legislação brasileira aos estudantes da educação básica pública. Para a garantia desse direito, foi criado pelo governo federal o Programa Nacional da Alimentação Escolar (PNAE), regulamentado pela Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009, e gerido pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Para o êxito do programa, a atuação do profissional nutricionista é uma importante ferramenta na prevenção e promoção da saúde dos estudantes de todo o país. O cardápio escolar é um instrumento que assegura a oferta de uma alimentação saudável e adequada aos alunos durante o período letivo, a partir de alimentos variados, nutritivos e que atendam a cultura alimentar local.

O Guia Alimentar para a População Brasileira preconiza o consumo preferencialmente de alimentos in natura e minimamente processados, propondo como base uma alimentação balanceada, saudável, saborosa, culturalmente apropriada e promotora da soberania alimentar. Estabelece que a compra e inserção de alimentos in natura nos cardápios das escolas favoreçam as recomendações brasileiras para a alimentação saudável.

As refeições devem ser preparadas com condições higiênico-sanitárias adequadas, atendendo à legislação vigente, assegurando a qualidade e a inocuidade dos produtos manipulados. Dessa forma, os serviços de alimentação escolar devem cumprir os procedimentos de Boas Práticas de Manipulação (BPM) e proporcionar o treinamento necessário aos manipuladores de alimentos, de acordo com as diretrizes da RDC 216/2004, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). A realização desses procedimentos, de acordo com a legislação estabelecida, é necessária para evitar casos de infecção ou intoxicação alimentar, bem como para manutenção da qualidade dos serviços de alimentação.

Um marco do PNAE é a obrigatoriedade de que, no mínimo 30% do valor repassado a estados e municípios seja utilizado na compra de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar.  Essa obrigatoriedade é de fundamental importância para os pequenos agricultores, pois estimula a economia local, a permanência das famílias no campo e ainda fomenta a soberania alimentar.

A aquisição dos alimentos provenientes da agricultura familiar pelos gestores e nutricionistas proporciona aos alunos a oferta de um alimento de melhor qualidade nutricional e que respeita o hábito alimentar regional. Além disso, a agricultura familiar, por meio dos serviços públicos de extensão rural, vem sendo estimulada a produzir com base agroecológica, preservando a diversidade biológica dos ecossistemas, o uso saudável do solo, da água e do ar e a reciclagem de resíduos de origem orgânica, reduzindo ao mínimo o emprego de recursos não renováveis. Com isso, é possível promover a diversificação de cultivos e o menor uso de produtos químicos.

Os gêneros alimentícios provenientes da agricultura familiar são, de forma geral, de produção rural cuja gestão e mão de obra são provenientes do núcleo familiar. Esse tipo de cultivo, muitas vezes, pode favorecer a presença de parasitas nesses gêneros alimentícios, em especial nas hortaliças como a alface, quando irrigadas com água contaminada. Outras formas de manejos inadequados que podem levar à contaminação são: o emprego de adubo orgânico com dejetos de material fecal; presença de animais na área de cultivo e a forma inadequada de armazenamento e transporte dessas hortaliças no escoamento da produção. A alface, por ser normalmente consumida crua, quando não higienizada adequadamente, pode conter ovos e larvas de helmintos e cistos de protozoários, sendo uma importante via de transmissão de parasitas intestinais.

Diversos trabalhos têm avaliado a qualidade nutricional, microbiológica e parasitológica dos produtos oriundos da agricultura familiar no Brasil. Inúmeras podem ser as fontes de contaminação de parasitas, sendo a água contaminada um dos principais veículos de transmissão. O uso das fezes de animais como adubo, sem o devido manejo, também pode se converter em fonte de contaminação para hortaliças, legumes e frutas. A transmissão de enteroparasitos ocorre na maior parte dos casos por ingestão, principalmente de água e/ou comida contaminadas com formas infectantes, em razão de condições higiênico-sanitárias insuficientes associadas à falta de saneamento básico e à manipulação inadequada dos alimentos.

De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO)  e a Organização Mundial da Saúde (OMS), certas medidas devem ser adotadas para reduzir o risco de infecção por parasitas. Para os produtores, é importante o manejo correto dos fertilizantes orgânicos, através da técnica de compostagem adequada. A qualidade da água utilizada para irrigação dos alimentos também precisa ser monitorada. Boas práticas de produção devem ser adotadas, a fim de garantir a segurança do alimento.

Para minimizar os riscos decorrentes das doenças causadas por alimentos contaminados, deve-se preconizar que as mãos sejam lavadas regularmente, antes, durante e depois do preparo dos alimentos, durante o manuseio de objetos, depois de tocar em animais, depois de ir ao banheiro, e em outras situações. É importante também assegurar que o alimento servido esteja bem cozido e quente; selecionar alimentos frescos com boa aparência, os quais antes do preparo devem ser bem lavados e desinfetados; não consumir alimentos crus, com exceção das frutas e verduras que podem ser previamente higienizadas, seguindo os procedimentos de higienização recomendado pelo Centro de Vigilância Sanitária da Secretaria de Estado da Saúde (Portaria CVS no 5/2013). Para o processo de higienização devem ser retiradas as folhas deterioradas  e deve ser feita a lavagem em água corrente dos vegetais folhosos (folha a folha). Depois, fazer a imersão em solução clorada à base de hipoclorito de sódio, com 2% de cloro ativo estabilizado (imergi-las em solução contendo 1 colher de sopa de água sanitária comercial para cada litro de água). Aguardar 10 minutos, para o processo de sanitização, seguido de enxágue em água corrente. O processo de sanitização é primordial para a garantia de um alimento seguro.

Os manipuladores de alimentos também podem ser fonte de contaminação e disseminação, na condição de portadores assintomáticos de enteroparasitos, associada aos maus hábitos higiênicos, como a não higienização adequada das mãos, contribuindo para a prevalência das parasitoses.

É necessário fortalecer o sistema de Vigilância Sanitária e a orientação dos agricultores familiares, bem como dos manipuladores de alimentos e da população em geral sobre a importância de uma boa higienização dos vegetais antes do consumo, garantindo assim a qualidade dos alimentos do campo até a mesa.

Autores: Taisa C Machadoa,b, Cleide Cristina A. Borgesb, Flávia C.R.  Mendonçab, Barbara Cristina E.  P. D.  Oliveiraa

 a Laboratório de Microbiologia, Departamento de Alimentos, Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Brasil

b Laboratório de Educação Profissional em Técnicas Laboratoriais em Saúde (LATEC) da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio- FIOCRUZ, Rio de Janeiro,

Referências

ALVES, Ailla S.; CUNHA NETO, Adelino; ROSSIGNOLI, Paulo A. Parasitos em alface-crespa (Lactuca sativa L.) de plantio convencional, comercializada em supermercados de Cuiabá, Mato Grosso, Brasil. Revista de Patologia Tropical, Goiás, v. 42, n. 2, p. 217-229, abr./jun. 2013.

BARROS, Dayane M. et al. A atuação e importância do nutricionista no âmbito da saúde pública/Nutritionist’s role and importance in public health. Brazilian Journal of Development, Curitiba, v. 5, n. 10, p. 17.715-17.728, 2019.

BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC nº. 216 de 15 de setembro de 2004. Dispõe sobre regulamento técnico de boas práticas para serviços de alimentação. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 16 set. 2004.

BRASIL. Ministéri da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia alimentar para a população brasileira. 2. ed. Brasília, 2014.

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 11.947 de 16 de junho de 2009. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2009/Lei/L11947.htm>. Acesso em: 1 set. 2019.

FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS/WORLD HEALTH ORGANIZATION (FAO/WHO). Multicriteria-based ranking for risk management of food-borne parasites. Microbiological Risk Assessment Series, Rome, n. 23, 302p, 2014.

MELÃO, Ivo B. Produtos sustentáveis na alimentação escolar: o PNAE no Paraná. Caderno IPARDES-Estudos e Pesquisas, Curitiba, v. 2, n. 2, p. 87-105, 2012.

NERES, Alessandro C. et al. Enteroparasitos em amostras de alface (Lactuva sativa var. crispa), no município de Anápolis, Goiás, Brasil. Bioscience Journal, Uberlândia, MG, v. 27, n. 2, 2011.

PINTO, Lidia C. et al.  Estruturas parasitárias em alface (lactuca sativa l.), comercializadas na feira livre do município de jardim, Ceará. Caderno de Cultura e Ciência, Crato CE, v. 17, p. 1-14, 2018

São Paulo (Estado). Secretaria de Saúde. Coordenação dos Institutos de Pesquisa. Centro de Vigilância Sanitária. Portaria CVS no 5, de 9 de abril de 2013. Aprova o regulamento técnico sobre boas práticas para estabelecimentos comerciais de alimentos e para serviços de alimentação, e o roteiro de inspeção, anexo. Diário Oficial do Estado de São Paulo. 19 abr 2013.

5 min leituraA alimentação escolar é um direito garantido pela legislação brasileira aos estudantes da educação básica pública. Para a garantia desse direito, foi criado pelo governo federal o Programa Nacional da […]

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Guia para a indústria de alimentos: Melhores práticas e planejamento para situação imediata

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O surto de coronavírus já afetou grande parte dos países no mundo, e muitos deles encontram-se em quarentena tentando de alguma forma diminuir a propagação do vírus.

O objetivo desta tradução é auxiliar nas melhores práticas e orientação operacional para a indústria de alimentos nos problemas que estão ocorrendo hoje.

As orientações são para toda a cadeia de fornecimento, clientes, associados e fornecedores.

Clique AQUI e baixe o conteúdo.

Marcelo Avolio, engenheiro químico, gestor da Qualidade.

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Preparação para enfrentar Pandemia de Coronavírus na Indústria de Alimentos (tradução)

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