6 min leitura
0

Política e denúncias de insalubridade em frigoríficos forçaram início do FDA

6 min leitura

Um jovem jornalista, Upton Sinclair, foi contratado por um jornal socialista para se infiltrar nas instalações de frigoríficos para fazer um “exposé”, uma denúncia sobre as condições de insalubridade em frigoríficos de Chicago. A intenção era muito mais política do que sanitária: o plano era propagar as agruras do capitalismo e das precárias condições da classe trabalhadora, contada em folhetins periódicos.

Contudo, a opinião pública ficou muito mais impactada em saber sobre a péssima qualidade do que estava comendo do que da insalubridade vivida pelos trabalhadores.  Por meses, o escritor disfarçou-se de operário, entrando nas fábricas sem ser notado e registrando as nojeiras que encontrava. O resultado foi uma ficção baseada em fatos reais sobre uma família de imigrantes lituanos e suas agruras na indústria, incluindo uma morte por intoxicação alimentar.

Cartoon divulgado nos jornais da  na época

As publicações do jornal foram consolidadas em um livro, The Jungle, de 1906.  Foi um best seller instantâneo, vendendo 25 mil exemplares em seis semanas, o que era bastante viral para a época. O fato tornou-se um escândalo internacional, repercutido por todos os jornais.

Mas o que contava o livro?

As condições de insalubridade reuniam várias situações críticas para a segurança dos alimentos:

Péssima higiene

Se os trabalhadores precisassem lavar as mãos antes de sair, eles deveriam usar os tanques de água da salmoura para os embutidos. Além disso, existiam ainda ratos e dejetos por todo o ambiente de produção, que geralmente não eram retirados para deixar a instalação minimamente limpa. O local era escuro, difícil de ver se estava limpo ou não.

“Armadilhas” para roedores eram pães com veneno, e muitos que morriam ficavam pelo chão mesmo ou acabavam voltando para a linha de produção depois que recuperavam a varredura.

A água dos telhados com condensado pingava sobre o produto, e milhares de ratos corriam sobre ela.

Frigorífico da época. Foto não tem cheiro, mas dá para imaginar.

Fraudes

Para tentar aumentar o volume de produção sem ter que gastar mais dinheiro com isso os trabalhadores eram orientados a dar uma “incrementada” em inúmeras receitas, principalmente as de carnes enlatadas.

Bórax e glicerina eram adicionados na comida para melhorar a aparência de uma linguiça importada da Europa que chegou branca e mofada. Os frigoríficos também usavam materiais para dar volume, como papel (já ouviram falar nesta lenda de carne com papelão no Brasil?). Qualquer coisa que caísse dentro das máquinas ficava por lá.

Sinclair até documentou uma formulação:

  • Pontas de carne defumada pequenas demais para serem cortadas com máquina
  • Tripa tratada com produtos químicos para não parecer branca e revelar sua origem
  • Restos de presunto e carne em lata recolhidos do chão;
  • Pelanca de bife;
  • Temperos o suficiente para ter gosto de alguma coisa

Reprocesso do tipo “nada se perde”

Perdas não eram permitidas dentro das fábricas, mesmo que o que se pretendesse jogar fora fosse carne estragada. Se alguma parte da produção caísse no chão, onde já estavam fezes de ratos e catarro de trabalhadores com tuberculose, ela seria colocada de volta no produto.

O presunto estragou? Sem problemas! Elzbieta, uma imigrante lituana, faz o seu trabalho diário: coloca o presunto vencido numa cortadeira, a duas mil rotações por minuto. Junta meia tonelada de presunto bom, e ninguém nem nota.

Carne humana na formulação

Acidentes de trabalho aconteciam a todo instante, algo comum nas linhas de produção do início do século 20. Porém, no caso destes frigoríficos, partes amputadas dos acidentados ficavam na comida. Alguém perdeu um dedo numa serra e ele caiu no cutter a duas mil rotações por minuto e “sumiu”.

Tragédias maiores foram descritas, como trabalhadores que às vezes caíam nos tonéis onde a gordura animal era derretida em banha, e seus corpos eram descobertos somente após cozimento prolongado. A banha era vendida para consumidor final ou para outros produtos e “vida que segue”.

Corrupção e histórico de problemas

E nesse cenário crítico, onde estavam os fiscais?  Não tinham nadinha de legislações de segurança de alimentos? Quem pensou que os EUA eram um país totalmente sem lei nesta época enganou-se.  Em 1862, Abraham Lincoln já tinha fundado o USDA, o Departamento de Agricultura. Havia uma atividade de fiscalização, embora não estruturada como é atualmente.

A partir da década de 1880, os relatórios do governo observaram os riscos à saúde provocados por alimentos contaminados.

Em 1890, foi publicado um regulamento, focado principalmente em produtos de exportação como bacon e porco salgado. Os produtores e embaladores dos EUA é que pressionaram o governo a implementar um programa de inspeção que lhes permitisse competir nos mercados estrangeiros (e foi um caso em que o poste fez xixi no cachorro). No ano seguinte, o escopo da regulamentação foi ampliado para carnes para exportação.

O primeiro escândalo generalizado relacionado a essas práticas inseguras ocorreu em 1898, quando a imprensa noticiou que a Armour & Company, um dos frigoríficos de Chicago, havia fornecido toneladas de carne enlatada ao exército dos EUA em Cuba durante a Guerra Hispano-Americana. A carne havia sido embalada com uma camada visível de ácido bórico, que supostamente preservaria a carne, mas era usado para mascarar o cheiro do produto em más condições. As tropas que comeram a carne adoeceram e ficaram sem condições para o combate. Alguns morreram.

Mas voltando aos fiscais, segundo o livro The Jungle, eles estavam lá, no escritório do chefe, recebendo uma propina para não atuarem em seus papéis. A situação de controle das grandes corporações foi relatada em livro da mesma época,  “The Greatest Trust in the World” (1905) sobre a centralização e mecanismo para escape da fiscalização, entre outros aspectos econômicos.

Reação do presidente da república

Dizem que o então presidente dos Estados Unidos, Theodore Roosevelt, engasgou-se com o café da manhã e se tornou vegetariano ao ler o livro de Sinclair. Ele mandou uma dupla de sua confiança para investigar de perto toda a história dos frigoríficos.  As fábricas ficaram sabendo e tiveram tempo para arrumar um pouco a casa, mas mesmo assim, não deu para esconder muita coisa.

Quando Roosevelt recebeu e leu o texto completo do relatório, ficou enojado. Era tudo verdade, ou até pior. Neill e Reynolds descobriram que a carne estava sendo “removida com pás de pisos de madeira imundos, empilhada em mesas raramente lavadas, empurrada de sala em sala em carrinhos de caixa podres, em todos os processos acumulava sujeira, lascas, sujeira do chão, e as expectorações de trabalhadores tuberculosos e outros doentes”. Eles também observaram trabalhadores urinando perto da carne e carne vencida sendo rotulada como nova. Só não confirmaram a parte de pessoas inteiras caindo no tanque de banha.

Atento observador da opinião pública, o presidente entendeu que  a questão da segurança de alimentos e higiene não poderia mais ser ignorada. Ele sabia que, quando os americanos soubessem da extensão total do problema, qualquer político que não apoiasse a reforma provavelmente perderia a reeleição. O assunto ganharia todos os jornais. Engenhosamente, em vez de peitar os líderes da indústria, Roosevelt decidiu aplicar pressão nos bastidores.

Com um forte senso de urgência, Roosevelt não perdeu tempo em conseguiu o apoio do congresso e em 30 de junho de 1906 – 4 meses e 4 dias após o lançamento do livro – entrava em vigor o Pure Food and Drug Act, que criou a FDA – Food and Drug Administration. Em março de 1907, também entrava em vigor o Federal Meat Inspection Act.

Essa lei inovadora autorizou os inspetores do USDA a impedir que qualquer carne contaminada ou rotulada incorretamente entrasse no comércio doméstico e estrangeiro. Isso não apenas beneficiou a indústria frigorífica e o público consumidor, mas ampliou muito a regulamentação do governo federal sobre a iniciativa privada.

Fiscais sanitários mostrando serviço para deixarem a população mais tranquila

Quanto a Sinclair, para ele seus planos foram frustrados. Em primeiro lugar, seu livro era para ser uma peça de propaganda socialista, pelos direitos dos trabalhadores. Os leitores, porém, não deram a mínima para o ser humano que caía no tacho, revoltando-se apenas com o fato de que havia ser humano no tacho virando presunto.

“Eu apontei para o coração do público e acidentalmente atingi o estômago”, lamentou o autor.

E você, sabia que o FDA tinha surgido por causa de um escândalo envolvendo frigoríficos em época de preocupação com sucessão eleitoral?

Referências

Pessoas em lata: upton sinclair, o homem que revelou 5 fatos sobre a indústria da carne dos EUA no século 20

Heroes of Food Safety: Upton Sinclair and the Meat Inspection Act of 1906

Gente em lata, o escândalo da carne em 1906

Imagem em destaque: Wikipedia

Fonte do cartoon: Hearts and Stomachs

Fotos: Newsela

6 min leituraUm jovem jornalista, Upton Sinclair, foi contratado por um jornal socialista para se infiltrar nas instalações de frigoríficos para fazer um “exposé”, uma denúncia sobre as condições de insalubridade em […]

4 min leitura
0

Intoxicação alimentar massiva a bordo mudou as regras da aviação

4 min leitura

Imagine uma aeronave lotada com 344 passageiros e cerca de 20 tripulantes na qual 197 pessoas começaram a ter simultaneamente náuseas, vômitos, diarreia e cólicas abdominais. Este episódio caótico a bordo foi o ponto de virada para mudar regras de segurança dos alimentos na aviação.

Era 3 de fevereiro de 1975. O Boeing 747 da Japan Air Lines estava indo de Anchorage, Alasca, para Copenhague, Dinamarca. O trecho todo seria Japão – Paris. Noventa minutos antes do pouso programado em Copenhague, os comissários de bordo serviram omeletes de presunto no café da manhã. Uma hora após os passageiros consumirem uma refeição contaminada com estafilococos, começou o horror.

Em terra, cento e quarenta e quatro pessoas precisaram de hospitalização, tornando-se o maior incidente de intoxicação alimentar a bordo de um avião comercial. Trinta estavam em estado crítico. Os outros 53 foram tratados em salas de emergência improvisadas.

Como nenhum dos médicos na Dinamarca falava japonês, e apenas alguns dos passageiros eram fluentes em dinamarquês ou inglês, funcionários que falavam japonês nos restaurantes de Copenhague foram convocados ao hospital para atuar como tradutores.

A causa-raiz do problema

A equipe de investigação foi liderada pelo oficial do Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos, Dr. Mickey S. Eisenberg, do Departamento de Saúde do Estado do Alasca.

Testes laboratoriais de amostras de fezes e vômitos de passageiros, bem como 33 amostras de sobras de omeletes de presunto, detectaram Staphylococcus aureus.  Concentrações elevadas de toxinas produzidas pelos estafilococos também foram detectadas no presunto, explicando o tempo de incubação extremamente curto.

As refeições foram preparadas na International Inflight Catering, uma subsidiária da Japan Airlines. Verificou-se que três cozinheiros haviam preparado as refeições, um dos quais tinha lesões infectadas no dedo indicador e médio da mão direita.  As lesões nos dedos do cozinheiro estavam infectadas com estafilococos. Na época não se contava com testes de DNA, mas o interessante foi que os testes revelaram tipos de fagos idênticos e resistências a antibióticos para todas as amostras, indicando que o cozinheiro era a fonte da contaminação.

O cozinheiro suspeito preparou refeições para três das quatro cozinhas. Ele havia enfaixado os ferimentos, mas não contou ao superior, por considerar um ato banal. Além disso, a administração não verificou se ele estava bem de saúde.

O cozinheiro suspeito preparou todas as 40 omeletes servidas na primeira classe, bem como 72 de 108 para uma das cozinhas do convés principal. Além disso, ele manuseou todas as 108 omeletes para outra cozinha.

De acordo com os microbiologistas, apenas 100 células de estafilococos são suficientes para causar intoxicação alimentar. A logística de alimentação a bordo forneceu condições ideais para que as bactérias crescessem e liberassem toxinas, que induzem fortes náuseas, vômitos, diarreia e cólicas abdominais. Por serem resistentes ao calor, as toxinas não eram destruídas quando as omeletes eram aquecidas.

Antes de serem servidas, as refeições foram armazenadas em temperatura ambiente na cozinha por 6 horas e depois refrigeradas (embora a insuficientes 10°C) por 14 horas e meia. Em seguida, eram armazenadas nos fornos das aeronaves, novamente sem refrigeração, por mais 8 horas. Se a comida tivesse sido mantida adequadamente refrigerada desde o momento em que foi preparada até estar pronta para ser servida, o surto não teria ocorrido.

Como os acidentes aéreos que costumam ter mais de uma causa-raiz, os investigadores da época concluíram o que hoje é senso comum: pessoas com lesões infectadas não devem manipular alimentos e que os alimentos devem ser armazenados em temperaturas baixas o suficiente para inibir o crescimento de bactérias.

Desdobramentos

O incidente teve uma vítima fatal: a do gerente de catering da Japan Air Lines, Kenji Kuwabara, de 52 anos, que cometeu suicídio ao saber que o incidente havia sido causado por um de seus cozinheiros.

Foi apenas por acaso que o piloto e o copiloto não haviam comido nenhuma das omeletes contaminadas, já que a companhia aérea não tinha regulamentos sobre as refeições da tripulação. Como os relógios biológicos dos pilotos estavam no horário do Alasca e não no horário europeu, eles optaram por um “jantar” de bifes em vez de omeletes de café da manhã. Se não tivessem feito isso, talvez não fossem capazes de pousar a aeronave com segurança.

Dali em diante os experts sugeriram que os membros da tripulação do cockpit comessem diferentes refeições preparadas por diferentes cozinheiros para evitar que surtos de intoxicação alimentar incapacitassem toda a tripulação, uma regra posteriormente implementada na aviação comercial.

Em 1977, a OMS publicou o Guide to Hygiene and Sanitation in Aviation e hoje há importantes diretrizes no World Food Safety Guidelines, da International Flight Association.

Mesmo assim, novas ocorrências aconteceram.

Em 1982, dez tripulantes  incluindo piloto e co-piloto da British Airways adoeceram a cerca de 35 minutos de Boston num voo de Lisboa. Descobriu-se que as refeições principais foram diferentes, mas tinha um prato em comum: a sobremesa, um pudim de tapioca. Três dias após o voo, ainda havia 6 passageiros com ocorrência.

Na Austrália, em 1980, o piloto de um avião bimotor sofreu uma intoxicação alimentar e desmaiou nos controles. Um passageiro reviveu o piloto inconsciente, que conseguiu pousar o avião com segurança.

Hoje em dia, empresas de catering que fornecem para as companhias de aviação são em sua maioria demandadas a ter uma certificação em segurança dos alimentos.

Há um filme satírico sobre intoxicação de piloto a bordo, Airplane! (1980), mas no fundo, para quem trabalha com segurança dos alimentos na aviação, isso não tem graça nenhuma.

Referências:

The New York Times

Wikipedia

Daily Mail

Fonte da imagem:  Stuff

4 min leituraImagine uma aeronave lotada com 344 passageiros e cerca de 20 tripulantes na qual 197 pessoas começaram a ter simultaneamente náuseas, vômitos, diarreia e cólicas abdominais. Este episódio caótico a […]

3 min leitura
0

Fagos como opção aos antibióticos frente à resistência microbiana

3 min leitura

A humanidade precisa urgentemente de opções para fazer frente à resistência microbiana aos antibióticos e uma saída pode ser a adoção de fagos.

Fagos ou bacteriófagos são vírus que de forma seletiva parasitam e destroem bactérias. A descoberta dos fagos antecede ao uso de antibióticos, porém pelo sucesso destes últimos, acabou ficando de lado em pesquisas e aplicações na medicina.

Existem algumas aplicações promissoras que vou apresentar aqui, mas antes vamos recordar a problemática que é a resistência microbiana aos antibióticos.

– Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), trata-se de uma das 10 principais ameaças à saúde global enfrentadas pela humanidade atualmente.

– Estimativas preveem 10 milhões de mortes anuais por resistência antimicrobiana até 2050. Em 2019, mais de 1,2 milhão de pessoas em todo o mundo morreram diretamente de resistência antimicrobiana (RAM) e outros 5 milhões morreram por causas correlacionadas.

– Mesmo quando as vidas não são perdidas, períodos mais longos de padecimento e desgaste do organismo, com possíveis sequelas, como amputação e falência de órgãos podem ser esperados. Tratamentos que seriam simples poderão ser bastante críticos.

– As causas definitivas do crescente aumento da resistência ainda são discutidas e pesquisadas, sendo que as referências apontam o uso terapêutico indiscriminado ou incorreto de antibióticos pela população, além das aplicações profiláticas e em prol da produtividade na produção de animais para consumo humano.  Contudo, depois da pandemia de Covid-19, quando o uso de antibióticos se intensificou, o problema parece ter se agravado. Infecções da corrente sanguínea devido à Escherichia coli e Salmonella spp. resistentes em 2021 aumentaram pelo menos 15% em comparação com as taxas em 2017.

A resistência antimicrobiana enfraquece a medicina moderna e coloca milhões de vidas em risco

Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da OMS

No Brasil, recentemente uma estudante de 18 anos faleceu por infecção de S. aureus de uma cepa resistente através de acne (leia aqui a notícia).

Fatos e dados importantes sobre fagos

  • Locais historicamente estratégicos de identificação e isolamento de cepas de utilidade são currais, fezes, esgoto.
  • Em um dos mecanismos de atuação, à medida que os fagos se instalam, os fagos filhos se desenvolvem, enfraquecem a parede celular da bactéria e ela explode, liberando 100 a 200 novos fagos.
  • Considerando as bibliotecas internacionais de fagos, 20 cepas são capazes de combater mais de 90% das espécies bacterianas, quando testadas.
  • Um painel de teste de resistência microbiana pode ser realizado em 8 horas, utilizando essas 20 cepas em uma única placa.
  • Os fagos são muito específicos em relação aos tipos de bactérias que infectam. Isso é bom e ruim: por um lado, pode ser muito difícil encontrar um fago específico que terá como alvo a bactéria de um paciente, mas essa especificidade também significa que não atacará a flora normal deste paciente.
  • Fagos podem ressensibilizar, ou seja, tornar bactérias resistentes a antibióticos novamente suscetíveis.
  • Na medicina, a terapia fágica é uma grande promessa para o tratamento de uma variedade de infecções. Os estudos estão priorizando infecções de difícil tratamento, como as que envolvem biofilmes em articulações protéticas e outros dispositivos implantados.
  • Aprovação de novos fagos no FDA é mais rápida e simples do que novas drogas (menos de 6 meses)
  • Por muito tempo, os bacteriófagos detêm um título indesejável na indústria de alimentos, especialmente em relação à contaminação de produtos fermentados.

Usos Potenciais de fagos para a segurança dos alimentos

Além das vias de contaminação por bactérias resistente em hospitais ou através de ferimentos/contágio onde há exposição de pele, a veiculação por alimentos é significativa.

Surtos de Salmonella, Campylobacter, Escherichia coli ou Listeria, como bem sabemos, acontecem.

Para prevenção do problema da contaminação na indústria, há a necessidade urgente de novas abordagens. Em 2006, o FDA aprovou o uso de fagos como “GRAS” – Geralmente Considerado Seguro. Têm sido usado cortes de carne vermelha e carne moída, contra E coli O157:H7.

Uma das vantagens dos fagos é que eles não afetam o sabor, a aparência ou o odor. Já existe comercialmente disponível um coquetel de fagos para Listeria, aprovado como aditivo para alimentos prontos para consumo. Existe um outro produto de fagos direcionado a espécies de Salmonella. Cada um desses produtos de fago é certificado como Kosher e Halal e não impactam a rotulagem de orgânicos.

Há ainda perspectivas para o uso de fagos para eliminação de biofilmes em superfícies de equipamentos e como alternativa para desinfetantes (leia aqui).

Sobre o tema da resistência antimicrobiana, uso de antibióticos na pecuária e avicultura, e segurança de alimentos não deixe de ler estes posts aqui do Food Safety Brazil:

Resistência antimicrobiana e segurança de alimentos
Resistência antimicrobiana ameaça a saúde pública mundial

Resistência Antimicrobiana (RAM): uma questão central em segurança de alimentos

Resistência microbiana a antibióticos de Salmonella isolada de frangos

Salmonella apresenta cada vez mais resistência a antibióticos

Se você busca dados sobre ocorrência de resistência microbiana, acesse o GLASS

Global Antimicrobial Resistance and Use Surveillance System

Aqui no blog tivemos um call para participação de brasileiros para elaboração de um documento-base para regulamentação harmonizada do uso de bacteriófagos na indústria de alimentos (confira aqui). Se você está por dentro do assunto, volte aqui para contar como estão os avanços no assunto.

Principal referência e fonte da imagem: Medscape em Can Phages Help Where Antibiotics Have Failed?

3 min leituraA humanidade precisa urgentemente de opções para fazer frente à resistência microbiana aos antibióticos e uma saída pode ser a adoção de fagos. Fagos ou bacteriófagos são vírus que de […]

3 min leitura
0

Resistência Antimicrobiana (RAM): uma questão central em segurança de alimentos

3 min leitura

O surgimento e a disseminação de patógenos bacterianos resistentes aos antibióticos representa uma grave ameaça ao bem-estar humano e animal em todo o mundo e pode trazer o ressurgimento de infecções mortais intratáveis (talvez “nova pandemia”?). Notavelmente, a OMS reconhece a resistência a antibióticos (RAM) como  um dos 10 principais desafios de saúde enfrentados pela humanidade no século XXI, que põe em risco a eficácia da prevenção e do tratamento de um número cada vez maior de infecções por vírus, bactérias, fungos e parasitas.

A RAM ocorre quando microrganismos (bactérias, fungos, vírus e parasitas) sofrem alterações quando expostos a antimicrobianos (antibióticos, antifúngicos, antivirais, antimaláricos ou anti-helmínticos, por exemplos). Os microrganismos resistentes à maioria dos antimicrobianos são conhecidos como ultrarresistentes. Como resultado, os medicamentos se tornam ineficazes e as infecções persistem no corpo, aumentando o risco de propagação para outras pessoas. Como a eficácia desses medicamentos diminui devido à resistência, infecções simples podem se tornar problemáticas novamente, remontando à era pré-antibióticos. 

Os antimicrobianos têm sido considerados ferramentas essenciais na luta contra doenças infecciosas. Eles foram introduzidos na alimentação animal desde a década de 1940. Os antibióticos são convencionalmente usados em animais de produção para tratar doenças clínicas (terapia), prevenir e controlar doenças comuns (profilaxia e metafilaxia) e aumentar o crescimento animal (promoção do crescimento). Pode haver um perigo, no entanto, na subdosagem. Não é difícil tornar os micróbios resistentes à penicilina em laboratório expondo-os a concentrações insuficientes para matá-los, e a mesma coisa ocasionalmente aconteceu no corpo humano. Então, existe o perigo de que o homem facilmente subdose a si mesmo e, ao expor seus micróbios a quantidades não letais da droga, torne-os resistentes.

A administração de antibióticos aos animais ou grupos de animais para tratar doenças ou infecções é chamada de antibioticoterapia. Os principais objetivos do emprego da antibioticoterapia em animais de produção são aliviar os sintomas e o sofrimento do(s) animal(is) afetado(s), limitar a transmissão da doença a animais saudáveis do rebanho e destruir o agente etiológico. Como a doença diminui o desempenho dos animais de fazenda e pode resultar em mortalidade, as aplicações terapêuticas também são componentes essenciais para aumentar a produção pecuária lucrativa, mas também a segurança dos animais e dos produtos consumíveis associados.

A promoção do crescimento refere-se à administração de antibióticos em concentrações subterapêuticas, geralmente em um aditivo para ração animal, durante um período de tempo para melhorar o desempenho fisiológico dos animais, principalmente para obter ganho de peso e eficiência alimentar. Embora o benefício líquido real do uso de antibióticos na alimentação de animais de fazenda seja difícil de medir, essa prática provavelmente é estimulada pelo ganho econômico e pela necessidade de lidar com as crescentes demandas dos consumidores por proteínas animais. 

Em comparação com outras aplicações de antibióticos, a promoção do crescimento é a mais controversa, por várias razões:

– É considerado principalmente como um método para aumentar o ganho econômico em ciclos de crescimento mais curtos;

– A expansão das operações de pecuária exige que grandes quantidades de antibióticos sejam usadas na promoção do crescimento;

– Os antibióticos usados para promoção do crescimento não são tão rigorosamente regulamentados como outras aplicações de antibióticos;

Pensa-se que aplicações subterapêuticas de antibióticos durante um período de tempo relativamente prolongado irão exercer uma pressão seletiva que permite a emergência e persistência de agentes patogênicos resistentes aos antibióticos que podem afetar animais e humanos.

A terapia com antibióticos e a prevenção de doenças são rigorosamente regulamentadas em muitos países e exigem receita de um veterinário. Além disso, os avanços na biossegurança e outras intervenções independentes de antibióticos (principalmente vacinas) reduziram efetivamente a dependência de antibióticos na terapia e prevenção de doenças nos países desenvolvidos. 

O tratamento de infecções causadas por patógenos resistentes a antimicrobianos é caro. Patógenos bacterianos transmitidos por alimentos, como Salmonella (é bem conhecido que resiste aos antibióticos, ocorre em alimentos contaminados como carne de aves e pode ser transmitida aos seres humanos) e Campylobacter, também podem evoluir para adquirir resistência a antibióticos e causar infecções difíceis de tratar. Por exemplo, estimou-se que a Salmonella não tifóide resistente a drogas gera US$ 365 milhões em custos médicos anualmente apenas nos EUA. A extrapolação desses números em escala global sugere a necessidade de intervenções mais mitigadoras para controlar o surgimento de RAM associada à pecuária e muito trabalho ainda é necessário.

Um esforço global coordenado é urgentemente necessário para combater a RAM além das fronteiras. Embora se preveja que as intervenções sejam favoráveis, também argumenta-se que a disseminação de patógenos resistentes aos antibióticos pode não ser afetada imediatamente. Isso ocorre porque os mecanismos e mutações que levam à RAM e têm pouco ou nenhum custo de condicionamento provavelmente persistirão na ausência de pressão antibiótica. 

A resistência aos antimicrobianos representa uma ameaça crescente à saúde pública mundial. Um aumento de bactérias transmitidas por alimentos resistentes aos antibióticos complicará o tratamento de infecções e doenças transmitidas por alimentos adquiridas pela exposição a animais de produção e ao ambiente da fazenda, um surgimento ou ressurgimento de novas cepas de bactérias resistentes a antibióticos será visto e a pressão seletiva de antibióticos em operações agrícolas pode enriquecer os pools de marcadores genéticos resistentes a antibióticos e aumentar a transmissão potencial desses marcadores fora da fazenda (via escoamento, esterco e descarte de resíduos agrícolas) e requer ação de todos os setores do governo e da sociedade, além das empresas na cadeia produtiva de alimentos.

Leia a matéria completa aqui

Imagem: https://www.paho.org/es/panaftosa/resistencia-antimicrobiana-produccion-animal 

3 min leituraO surgimento e a disseminação de patógenos bacterianos resistentes aos antibióticos representa uma grave ameaça ao bem-estar humano e animal em todo o mundo e pode trazer o ressurgimento de […]

4 min leitura
1

Perdas e desperdícios de alimentos são foco nas normas de food safety e quality envolvendo as emergências humanitárias

4 min leitura

Todos os beneficiários (incluindo os setores público e privado, sociedade civil, produtores individuais, atacadistas, feiras, sacolões, varejistas e consumidores) devem ter acesso aos alimentos seguros, nutritivos e com padrões de qualidade que atendam às suas expectativas, abordando riscos reais, potenciais e percebidos.

Mas acima de tudo, é preciso acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar (e de alimentos), a melhoria da nutrição e promover a agricultura sustentável que é um dos dezessete objetivos da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Há um total de 169 metas, integradas e indivisíveis, sendo a meta 12.3 relevante neste post:

“Até 2030, reduzir pela metade o desperdício de alimentos per capita mundial, nos níveis de varejo e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita”, ou seja, a perspectiva é de redução de perdas também nas fases de produção e processamento, integrantes das cadeias produtivas.

O foco não é apenas nas perdas e nos desperdício nas fases pós-colheita, assim deve-se incluir a mudança do comportamento do consumidor. Quanto mais alimento jogado fora, mais caro ele fica. Um terço dos alimentos produzidos no mundo é desperdiçado anualmente, ao custo de US$ 750 bilhões de acordo com a Agência para Agricultura e Alimentação das Nações Unidas (FAO). 

A Terra abrigará 8,6 bilhões de pessoas em 2030, 9,8 bilhões em 2050 e 11,2 bilhões em 2100, segundo estimativas do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais das Nações Unidas. Para suprir a crescente demanda, resultante do crescimento da população, o aumento do consumo nos países em desenvolvimento e as mudanças nos padrões de consumo, há a necessidade de maior produção gerando maior pressão sobre recursos naturais escassos, como solo, água, energia e nutrientes e deixando ainda mais nítido um problema social com elevado impacto ambiental: as perdas pós-colheita e o desperdício no final da cadeia de suprimentos.

A magnitude dos números do desperdício (mais de 30% da produção) indica a complexidade de um problema que começa quando o alimento é colhido no campo e depois processado, armazenado e transportado e pela escolha do consumidor final. As proporções das perdas em cada processo são:

– 10% dos alimentos desperdiçados são perdidos nos processos de produção e colheita;

– 50% dos alimentos desperdiçados são perdidos no transporte, manuseio e armazenamento;

– 30% dos alimentos desperdiçados são perdidos na distribuição;

– 10% dos alimentos desperdiçados são perdidos nos supermercados e na casa dos consumidores, tendo como principal fator a validade dos produtos.

Os motivos dos desperdícios vão desde o alto nível de exigência do consumidor até a crescente exigência do consumidor por qualidade. Por consequência também do varejo, tem levado também ao descarte de alimentos, ainda no campo, por não suprir os padrões estéticos exigidos por algumas redes supermercadistas. Por exemplo: o peso e o tamanho até o formato e a coloração ou considerados como “frutos feios”.

Desperdícios de alimentos prejudicam enormemente o meio ambiente, pois boa parte dos agrotóxicos, água, terras, fertilizantes, desmatamento, transporte, gastos de energia e petróleo para a produção de máquinas e combustíveis empregados em todos os processos da agropecuária são utilizados em vão. Isso faz com que seja necessário intensificar ainda mais a produção e, consequentemente, a pressão ao meio ambiente.

No caso de excedentes alimentares, a reutilização dos alimentos na cadeia alimentar humana e, caso os alimentos não estejam em condições para consumo humano, o desvio dos mesmos para a cadeia alimentar animal, poupando recursos que, de outra forma, seriam necessários para produzir ração. Só após, recomenda-se a transformação dos resíduos em energia renovável, mediante incineração ou compostagem e, somente em último caso, a destinação dos mesmos a aterros sanitários nos quais, no processo de degradação, haverá a geração de chorume e gases de efeito estufa.

Grande parte dos desperdícios de alimentos ocorre nos processos de transporte e distribuição, mas o consumidor pode contribuir para a redução, cuidando de não cair nas armadilhas das promoções que costumam ser irresistíveis, no entanto, são as grandes vilãs do consumo consciente. Elas nos estimulam a comprar um número alto de produtos, muitas vezes desnecessários e que acabam se estragando. Ou quem sabe desenvolvendo embalagens menores de acordo com a necessidade de consumo e reinventar a gastronomia do reaproveitamento no restaurante da sua empresa?

Devemos trabalhar além da distribuição de alimentos, as ações educativas permanentes realizando treinamentos, cursos, oficinas e palestras sobre diversos temas com destaque ao tema aproveitamento integral dos alimentos, como folhas, caules, sementes, cascas, raízes. Os objetivos dependem da gestão articulada entre os setores público e privado.

Uma boa dica é a empresa construir uma “Árvore de Perdas” pela Alta Direção tendo a oportunidade de desafiar a organização na busca de resultados surpreendentes por meio de investimentos em pesquisa, melhoria de processos e de infraestrutura, educação e conscientização do consumidor. Por exemplo: via homepage da empresa com dicas sobre como comprar, conservar e cozinhar os alimentos. Confesso que já comecei dando curso de boas práticas alimentares para merendeiras no qual lançamos mão de indicadores culinários (Fator de Correção, Fator de Cocção, Índice de absorção, Densidade) para otimizar os processos de pré-preparo e preparo, maximizando produtividade e minimizando perdas.

Para erradicar a fome faz-se necessário que todos os setores da sociedade participem e façam esforços para reduzir as perdas e desperdícios de alimentos. Então, mensurem quebras operacionais (vencimento, avarias, baixa qualidade dos silos, estradas mal conservadas), erros de inventários, erros administrativos, entre outros. Na distribuição e venda final inclua a questão de evitar descartes por vencimento ou manipulação incorreta, entrando aí varejistas e doação de alimentos não vendidos, mas consumíveis, para a população vulnerável, por exemplo, minimizando a responsabilidade sobre o doador, exceto em caso de negligência grave. Além de ação às instituições socio-assistenciais, como caridade, também para o uso como ração animal ou compostagem agrícola.

Hábitos mais sustentáveis para a sociedade e ajudar ao meio ambiente (o desperdício joga anualmente na atmosfera 3,3 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa, terceiro maior volume de emissões que provocam o aquecimento global) e os estabelecimentos do setor alimentício a sanar uma dor tão comum entre as mesmas e que pode angariar enormes prejuízos ao estabelecimento, que é o desperdício de alimentos, este o tema do momento nas normas de S.A.

Como estão se preparando para a cultura de consumo sustentável (aceitação e aquisição de alimentos in natura, que não tenham necessariamente o melhor aspecto (beleza, perfeição na forma, sem danos), mas que conservem suas propriedades nutricionais? Já construíram a sua “árvore de perdas” com os objetivos e as metas de reduções? Monte o seu “desperdiçômetro”!

Afinal, desperdiçar alimentos é um ato imoral, além de estúpido, insensato e caro. A coexistência da fome e dos desperdícios de alimentos é mesmo abominável.  E a nós, os consumidores, fica o convite às mudanças para hábitos alimentares conscientes.

4 min leituraTodos os beneficiários (incluindo os setores público e privado, sociedade civil, produtores individuais, atacadistas, feiras, sacolões, varejistas e consumidores) devem ter acesso aos alimentos seguros, nutritivos e com padrões de […]

5 min leitura
0

Homens lavam menos as mãos do que as mulheres?

5 min leitura

Um boletim informativo do Food Safety Information Council (link), entidade da Austrália dedicada à promoção de conhecimento em Segurança de Alimentos, foi lançado para o Dia Mundial da Segurança de Alimentos, contendo informações valiosas sobre hábitos higiênicos de homens e mulheres. Um exemplo: homens lavam menos as mãos do que as mulheres?

Para celebrar o Dia Mundial da Segurança dos Alimentos, o Food Safety Brazil trouxe uma tradução deste boletim. O conselho de informação de Food Safety da Austrália divulgou o material que achamos “a cara dos nossos leitores”! Venha com a gente celebrar a importância da segurança dos alimentos conferindo o nosso post!

Este relatório anual sobre o histórico de segurança de alimentos da Austrália saiu nas vésperas do 5º Dia Mundial da Segurança de Alimentos, celebrado em 7 de junho de 2023. O tema deste ano, ‘Normas alimentares salvam vidas’, chama a atenção para os padrões alimentares.

A Presidente do Conselho, Cathy Moir, afirmou que as normas alimentares ajudam a manter a comunidade australiana segura e garantem que a Austrália continue a ter a merecida reputação de um abastecimento alimentar seguro e de alta qualidade.

O papel do Conselho de Informação sobre Segurança de Alimentos é educar os consumidores para que possam ajudar a reduzir os cerca de 4,67 milhões de casos de intoxicação alimentar na Austrália todos os anos, que resultam em 47.900 hospitalizações, 38 mortes e um custo para a economia de 2,1 bilhões de dólares.

Todos os anos é realizada uma pesquisa junto aos consumidores australianos para verificar o comportamento deles. Segue abaixo o boletim de segurança de alimentos dos últimos 12 meses:

  • Aumento da aquisição de termômetros de carne: um em cada três entrevistados (29%) tem um termômetro de carne em casa, o que representa um aumento de 4% em 10 anos, desde que o conselho iniciou uma campanha de compra e utilização de termômetros de carne. 14% têm um termômetro de carne em casa e o utilizaram no último mês (eram 11% em 2012) e 23% têm um termômetro de carne em casa e o utilizaram no último ano (eram 20% em 2012). A utilização de um termômetro de carne é a única forma de garantir que os alimentos de maior risco, como aves, carne picada e salsichas, foram cozidos a 75°C no centro geométrico.
  • Consumo de carne crua e malpassada: nos últimos 6 meses, 28% dos entrevistados afirmaram ter comido carne crua (vaca, porco, cordeiro, canguru e miúdos) e 33% afirmaram ter comido carne malpassada. As pessoas mais jovens, com idades entre 18 e 34 anos, são mais susceptíveis de comer carne crua ou malpassada: quase metade (45%) comeu carne vermelha crua nos últimos 6 meses e metade (50%) comeu carne vermelha malpassada nos últimos 6 meses. A título de comparação, entre as pessoas com mais de 65 anos, 21% comeram carne vermelha malpassada nos últimos 6 meses. Comer carne crua ou malpassada constitui um risco de intoxicação alimentar e de infecção por parasitas, como a toxoplasmose. Cozinhar os bifes de carne vermelha a um mínimo de 65°C (malpassado) e deixá-los repousar durante 3 minutos reduz esse risco. As carnes vermelhas picadas são diferentes e devem ser cozidas a 75°C.
  • Redução da higiene das mãos: uma pesquisa nacional da Omnipoll para o Dia Mundial da Lavagem das Mãos, em Outubro de 2022, mostrou que 82% dos australianos dizem que lavam sempre as mãos depois de irem ao banheiro (contra 83% no ano anterior) e 53% admitem que lavam sempre as mãos antes de tocar nos alimentos (contra 58% no ano anterior). A lavagem das mãos é particularmente importante na prevenção da infecção por Norovírus, luta que só pode ser travada pela lavagem das mãos, uma vez que os desinfetantes para as mãos não são eficazes com o uso isolado.
  • Diferença de hábitos entre os sexos: a pesquisa sobre a lavagem das mãos revelou mais uma vez diferenças entre os sexos, uma vez que os homens lavam menos as mãos do que as mulheres depois de irem ao banheiro (80% dos homens contra 84% das mulheres) e antes de tocarem nos alimentos (52% dos homens contra 62% das mulheres). Os jovens lavam menos as mãos do que os grupos mais velhos depois de irem ao banheiro (74% com menos de 34 anos contra 86% com mais de 50 anos) e antes de tocarem nos alimentos (51% com menos de 34 anos contra 58% com mais de 50 anos). A falta de conhecimentos sobre a lavagem das mãos entre os jovens é também uma preocupação, uma vez que estes se tornam frequentemente manipuladores profissionais de alimentos.
  • Consumo de cogumelos selvagens: em 2022, o Centro de Informação sobre Venenos de NSW (que recebe chamadas de NSW, ACT e Tasmânia e chamadas de madrugada a nível nacional) recebeu 382 chamadas relativas a envenenamento por cogumelos. Destas, 159 foram de pessoas que ingeriram cogumelos silvestres intencionalmente, seja para procurar comida ou para fins recreativos.  Estas chamadas também incluíram 196 exposições a cogumelos em crianças (menores de 15 anos). Embora o número total de chamadas tenha diminuído em relação às 549 chamadas registadas em 2020, continua a ser um número elevado. O veneno contido em um cogumelo conhecido como “tampa da morte”, se ingerido, é suficiente para matar um adulto saudável e é difícil de distinguir de outros cogumelos comestíveis. É aconselhável limpar os cogumelos do jardim e dos locais onde as crianças possam brincar.
  • Por fim, o conselho de informação orienta que a população obtenha conselhos sobre segurança dos alimentos de fontes respeitáveis e não de influenciadores online que recentemente têm promovido atividades de risco, como comer fígado cru e mergulhar no lixo. Um mergulhador de lixo recolhe alimentos para os desfavorecidos e correm sérios riscos de doença. Ao invés de remexer nos caixotes do lixo, é mais seguro apoiar instituições de caridade de resgate de alimentos, como a Ozharvest, a Second Bite e a Foodbank.

A Presidente do Conselho, Cathy Moir, concluiu a apresentação do relatório deixando o contato para saber mais sobre segurança dos alimentos: “Quer você seja um cozinheiro doméstico ou queira criar uma negócio de alimentação ou seja um angariador de fundos voluntários ou queira saber mais sobre segurança dos alimentos, atualizamos recentemente o nosso site que está repleto de informações de fácil acesso. Você pode também participar no nosso trabalho e tornar-se membro. Saiba mais em www.foodsafety.asn.au. Contato para os meios de comunicação social: Assoc Professor Julian Cox, Director Científico do Conselho de Informação sobre Segurança de Alimentos, 0468 989 180 ou julian.cox@unsw.edu.au.”

Analisando o relatório da Austrália, o que você pensa sobre o comportamento dos brasileiros? Será que, também no Brasil, homens lavam menos as mãos do que as mulheres? Jovens lavam menos as mãos do que os idosos? Deixe nos comentários sua percepção, vamos adorar compartilhar opiniões!

Esta tradução é mais um trabalho colaborativo e totalmente voluntário realizado  por colegas e leitores aqui do blog, que unidos fazem o tema Segurança de Alimentos mais descomplicado. Você também pode participar do grupo de tradutores voluntários. Entre em contato com redação@foodsafetybrazil.org.

Luiza Dutra é engenheira química pós-graduada em Vigilância Sanitária, com experiência na área de qualidade de alimentos, produção, projetos, atendimento ao consumidor e treinamentos. Atualmente é consultora especialista em gestão, qualidade e segurança de alimentos. Por meio de serviços de consultoria e assessoria, capacita negócios de alimentação para oferecer alimentos seguros e manter a viabilidade econômica através de análises detalhadas da empresa e implementação das Boas Práticas de Fabricação. 

5 min leituraUm boletim informativo do Food Safety Information Council (link), entidade da Austrália dedicada à promoção de conhecimento em Segurança de Alimentos, foi lançado para o Dia Mundial da Segurança de […]

2 min leitura
0

Hoje é o Dia Mundial da Segurança de Alimentos!

2 min leitura

 A Segurança de Alimentos é celebrada em todo mundo nesta quarta-feira, dia 07/06.

Esta é uma iniciativa da ONU que começou em 2019, com a Resolução 73/250 , cujo objetivo é valorizar os profissionais e as práticas seguras na produção e distribuição de alimentos.

A OMS, em conjunto com a FAO, desenvolvem anualmente um Guia para o Dia Mundial de Segurança de Alimentos contendo algumas dicas e insights para as empresas adotarem nesta celebração. O Manual deste ano, disponibilizado para download (e que já valeu um post aqui), traz o tema: “Food Standards save lifes”, em português “As normas alimentares salvam vidas”.

Um trecho tirado do website da FAO traz um pouco da motivação desta celebração, e por consequência, deste tema:

“A Segurança de Alimentos salva vidas. Não é apenas um componente crucial para a segurança alimentar (food security), mas também desempenha um papel vital na redução de doenças transmitidas por alimentos. Todos os anos, 600 milhões de pessoas adoecem devido a cerca de 200 tipos diferentes de doenças transmitidas por alimentos. O fardo de tal doença recai mais pesadamente sobre os pobres e os jovens. Além disso, as doenças transmitidas por alimentos são responsáveis por 420.000 mortes evitáveis todos os anos.”

O Dia Mundial da Segurança de Alimentos é uma forma importante de conscientizar as pessoas quanto ao tema:

  • Demonstrando como prevenir doenças através da Segurança de Alimentos
  • Discutindo abordagens colaborativas para melhorar a Segurança de Alimentos em todos os setores
  • Promovendo soluções e formas de prover garantias cada vez maiores de Segurança de Alimentos na sua empresa

Sobre isso, o Manual ainda destaca:

“Não importa quem você é ou o que faz, você desempenha um papel importante em garantir que os alimentos sejam seguros para consumo. Se você trabalha em uma empresa de alimentos, definitivamente será responsável por garantir que os alimentos sejam seguros. Quer você defina os padrões de qualidade e segurança de alimentos na sua organização, implemente os padrões de qualidade e segurança exigidos pelas autoridades nacionais ou comunique mensagens de Segurança de Alimentos aos funcionários, a Segurança de Alimentos e a proteção do consumidor estão em suas mãos. A comunicação das empresas de alimentos é fundamental e tanto a equipe quanto os clientes se beneficiam ao saber e entender como os alimentos permanecem seguros, tanto na fase de produção quanto após a compra.”

O Food Safety Brazil parabeniza você que se dedica todos os dias para prover alimentos seguros!

Ahhh… vai celebrar o Dia Mundial da Segurança de Alimentos na sua empresa? Poste fotos nas redes sociais com a hashtag #worldfoodsafetyday.

2 min leitura A Segurança de Alimentos é celebrada em todo mundo nesta quarta-feira, dia 07/06. Esta é uma iniciativa da ONU que começou em 2019, com a Resolução 73/250 , cujo objetivo […]

4 min leitura
1

Ingeriu corpo estranho em alimentos? Medicina orienta a deixar “sair naturalmente” se tiver menos que 6 cm

4 min leitura

A não ocorrência de corpos estranhos é uma preocupação para a indústria de alimentos. A gestão destas ocorrências passou a ser priorizada depois da publicação de legislações específicas, como a RDC 623/2022, da Anvisa. Mas do ponto de vista médico, o que fazer em caso de ingestão de um corpo estranho?  Realizar um procedimento cirúrgico ou deixar “sair naturalmente”?

Esta pergunta parece desconexa com o mundo dos responsáveis pela qualidade e segurança dos alimentos nas empresas. Porém, em muitos estudos APPCC, dependendo da metodologia,  o critério de severidade do perigo pode estar relacionado ou não à necessidade de internação.

Assim, compartilho um trecho de uma publicação recente da revista Medscape:

Dois novos estudos sugerem que, mesmo quando uma pessoa engole algo potencialmente prejudicial como uma lâmina de barbear ou um ímã, a melhor conduta para um médico pode ser deixar a natureza seguir seu curso.

Alguns adultos que chegam ao pronto-socorro depois de engolir uma lâmina de barbear, uma bateria, um ímã ou vários objetos o fazem para “receber um benefício secundário”. Eles queriam receber atendimento médico, passar a noite no hospital ou outras atenções.

Alguns se tornam “passageiros frequentes” – retornando várias vezes ao mesmo hospital depois de engolir algo potencialmente prejudicial. Este grupo pode incluir presidiários e pessoas com problemas psiquiátricos.

Outros adultos engolem coisas por acidente, como aqueles com capacidade mental diminuída, pessoas intoxicadas e idosos com dentaduras que não percebem que há uma espinha de frango ou peixe em sua comida até que seja tarde demais.

Em ambos os casos, os médicos geralmente pedem um raio-X, descobrem com o que estão lidando e então decidem: inserimos um tubo na garganta do paciente com um dispositivo para recuperar os objetos ou mantemos lá e “deixamos a natureza seguir seu curso? Devemos internar a pessoa no hospital durante a noite ou mandá-la para casa com uma lista de sintomas que, se ocorrerem, ela deve voltar imediatamente ao hospital?

Dois novos estudos inclinam-se para uma gestão conservadora ou para deixar a natureza seguir seu curso, na maioria dos casos.

Comprimento do corpo estranho é a chave

Uma equipe de pesquisadores da Universidade do Sul da Califórnia descobriu que a remoção do corpo estranho não dependia de quão “alto risco” era o objeto – como uma bateria que poderia vazar ácido ou uma lâmina de barbear afiada.

Também não importava quantos objetos alguém engolia de uma só vez. Não houve cortes internos, obstruções intestinais ou fístulas quando revisaram os registros médicos de 302 casos. As fístulas são canais estreitos formados entre órgãos ou um órgão e a pele que podem causar vazamentos, infecções e outros problemas.

Apenas o comprimento do corpo estranho fez a diferença. Se um adulto engolisse um objeto com mais de 6 cm (cerca de 2,5 polegadas), era melhor removê-lo. Caso contrário, não importava na maioria dos casos se eles o retirassem ou esperassem que o corpo o removesse.

Eles estudaram pessoas que engoliram objetos estranhos de 2015 a 2021. A idade média foi de 29 anos, 83% eram homens e os pacientes foram internados no hospital cerca de três vezes cada.

Entre os 302 casos, 67% dos objetos engolidos eram cortantes ou pontiagudos, 38% eram opacos, 8% eram magnéticos e 5% eram corrosivos, como baterias. Quase 1 em cada 5 pacientes, 18%, engoliu vários objetos.

Em 40% dos casos, os médicos usaram a endoscopia para retirar os objetos. O restante teve conduta conservadora.

Doze dos pacientes foram operados. Em 10 casos, os objetos cortaram algo internamente e em dois casos, um objeto ficou preso. Os 12 pacientes de cirurgia tinham objetos mais longos, cerca de 4,5 polegadas, em comparação com pouco mais de 1 polegada em pessoas que não fizeram cirurgia.

Pacientes ambulatoriais

Em outro estudo, pesquisadores australianos relataram 157 casos de objetos engolidos envolvendo 62 pacientes.

No estudo retrospectivo – que analisa o comportamento passado – os pesquisadores examinaram os registros médicos nas 157 vezes em que as pessoas engoliram um objeto estranho. A idade média era de 30 anos, metade eram homens e cerca de dois terços eram prisioneiros. Mais de 4 em 5 tinham um histórico de saúde mental.

Pilhas foram engolidas em 23% dos casos, supostos balões contendo drogas em 17% e lâminas de barbear em 16%. Apenas uma pequena porcentagem, 4%, engoliu ímãs. Cerca de 40% dos casos eram objetos “miscelâneos”. Em um caso houve um paciente que precisou passar por uma cirurgia para remover cerca de 500 moedas engolidas.

Pouco mais da metade dos pacientes (55%) foram tratados de forma conservadora. Os casos de alto risco tinham a mesma probabilidade de serem tratados de forma conservadora ou com endoscopia. Semelhante ao estudo da USC, não foram relatadas perfurações ou obstruções intestinais.

A abordagem geral foi retirar objetos se eles causassem uma perfuração ou ficassem presos no esôfago. Caso contrário, as pessoas eram tratadas como pacientes ambulatoriais.

Um trabalho como este pode reacender a discussão sobre o critério legal no Brasil sobre a tolerância dimensional para contaminantes físicos em alimentos: 2,0 mm se rígidos ou com um comprimento acima de 7,0 mm se pontiagudos.

E acontece mesmo?

Só para ficar em relatos avulsos, já  publicamos aqui no Food Safety Brazil, um case de ingestão de metal que não causou dano ao consumidor, de 2012, com um vídeo de um rapaz comentando que ingeriu uma lâmina de barbear e os médicos orientaram a observar os sintomas e só retornar se notasse sangue nas fezes.

E também há uma notícia de mídia de uma criança de 5 anos que engoliu um parafuso e foi liberado a voltar para casa após fazer um raio x.

O que você achou do resultado destes estudos?

Principal referência: Swallowed Razors, Magnets, and More: New Advice for Doctors, Medscape.

Fonte da imagem: G1 Sorocaba e Jundiaí

Leia também:

https://foodsafetybrazil.org/mudancas-da-norma-fssc-22000-v-6-gestao-de-corpos-estranhos/

Qual limite devo adotar para matérias estranhas rígidas em alimentos?

 

4 min leituraA não ocorrência de corpos estranhos é uma preocupação para a indústria de alimentos. A gestão destas ocorrências passou a ser priorizada depois da publicação de legislações específicas, como a […]

2 min leitura
0

Reconhecimento profissional do GFSI para auditores em segurança dos alimentos

2 min leitura

A Iniciativa Global de Segurança de Alimentos (GFSI) lançou o primeiro piloto com Requisitos de Benchmarking para Órgãos de Reconhecimento Profissional (PRBs) de Auditores em Segurança dos Alimentos.

“O lançamento deste piloto marca um momento crucial na implementação dos novos Requisitos de Benchmarking do GFSI para órgãos de reconhecimento profissional. Estamos confiantes de que isso ajudará a reconhecer o papel vital dos auditores de segurança dos alimentos e a salvaguardar a aceitação contínua da profissão nos próximos anos.

Erica Sheward, Diretora do GFSI

Os requisitos de benchmarking serão testados por meio de um piloto com a Exemplar Global, que se inscreveu para se tornar um PRB reconhecido pela GFSI e os Proprietários de Programas de Certificação (CPOs) voluntários testarão o novo modelo, incluindo FSSC 22000, BRC Global e SQFI.

Um dos fatores que motivaram tal medida é que, embora os auditores sejam uma parte importantíssima para garantir alimentos seguros, a indústria vem enfrentando dificuldades de recrutamento, com mais auditores deixando a profissão do que novos recrutas entrando nela, fato que está pressionando a capacidade dos Organismos de Certificação de atender à crescente demanda por auditorias em segurança dos alimentos.

A situação piorou devido aos requisitos cada vez mais complexos e duplicados aplicados aos auditores, sejam os novos ou os que já atuam, que precisam capacitar-se e realizar testes em diferentes e distintos esquemas e padrões normativos, cada um com suas particularidades e critérios, porém, todos com o mesmo propósito: food safety.

Para ajudar a solucionar tal questão, a GFSI desenvolveu uma nova abordagem para a qualificação de auditores de segurança dos alimentos para Programas de Certificação reconhecidos pela GFSI que oferecem a criação de Organismos de Reconhecimento Profissional no setor responsáveis por validar competências comuns em um auditor.

“Ao mutualizar os esforços de qualificação para auditores em todo o setor, podemos tornar a auditoria de segurança de alimentos uma profissão acessível, alcançável e desejável para mais pessoas – ajudando a proteger o futuro profissional de um componente essencial do ecossistema de segurança alimentar.”

Erica Sheward, Diretora do GFSI

O objetivo ao final é que os Proprietários de Programas de Certificação e Organismos Certificadores possam contar com um registro único em um Órgãos de Reconhecimento Profissional reconhecido pela GFSI como prova da competência do auditor, eliminando assim a necessidade de verificações redundantes.

“O mundo depende de uma cadeia de abastecimento de alimentos segura e protegida e a GFSI estabeleceu um papel fundamental para isso. Os auditores dos programas de certificação reconhecidos pela GFSI estão na linha de frente na proteção da cadeia de suprimentos.”

Andrew Baines, presidente e CEO da Exemplar Global

Vamos aguardar ansiosos o desenrolar desta esplêndida iniciativa que poderá ajudar a auditores, certificadoras, proprietários de programas de certificação, e por fim, a todos os stakeholders da cadeia produtiva de alimentos, em especial, os consumidores que poderão contar com bons auditores na linha da frente para segurança de alimentos e bebidas.

2 min leituraA Iniciativa Global de Segurança de Alimentos (GFSI) lançou o primeiro piloto com Requisitos de Benchmarking para Órgãos de Reconhecimento Profissional (PRBs) de Auditores em Segurança dos Alimentos. “O lançamento […]

10 min leitura
0

Fraudes históricas no vinho

10 min leitura

A história do vinho confunde-se com a própria história da civilização humana, passando pelos egípcios, gregos, persas, fenícios, etruscos e romanos. As evidências mais antigas de sua produção, segundo o Journal of Archaeological Science, ocorreram na Idade do Cobre há 6100 anos, na região do Cáucaso, especificamente onde atualmente situa-se a Armênia.

O consumo de vinho está arraigado em nossas histórias. Noé, segundo os textos bíblicos, embriagou-se de vinho após o dilúvio, quem sabe para aliviar o estresse de sua aventura; o primeiro milagre de Jesus foi transformar água em vinho para alegrar uma festa de casamento, e segundo o texto, de ótima qualidade; e mais importante, foi a bebida servida na última ceia.

A bebida resulta da fermentação alcoólica total ou parcial do suco extraído de uvas, que são os frutos de uma planta da família das Vitaceae. Estes frutos podem ser tintos ou brancos em diversos degradês, sendo que para tornar o vinho tinto é preciso que as cascas das uvas tintas descansem no mosto, o que é chamado de maceração.

Há cerca de 60 espécies de videiras catalogadas no mundo, entre as quais está a Vittis vinífera L. que produz as uvas utilizadas para a produção dos vinhos classificados como finos, cujas variedades apropriadas são cerca de 5 mil. Entre elas estão os cultivares mais conhecidos, ao menos no Brasil: Cabernet Sauvignon, Merlot, Sauvignon Blanc, Chardonnay, Pinot Noir, Tannat, Malbec e Syrah.

O vinho tem um papel importante na gastronomia, acompanhando pratos, utilizado como uma forma de equilibrar sabores, e até mesmo, usado como ingrediente no preparo de carnes, risotos e molhos. Um vinho pode harmonizar organolepticamente com o prato, além disso, ao limpar as papilas gustativas, permite que a cada garfada se obtenha a melhor experiência gastronômica renovando o potencial gustativo na identificação dos sabores.

O vinho está entre os 100 produtos mais importados e exportados no mundo e movimenta bilhões de dólares anualmente. Segundo os dados da Organização Internacional da Vinha e do Vinho (OIV), com sede em Paris, são produzidos por ano cerca de 260 milhões de hl de vinho (1 hl = 100 litros) em todo o mundo.

E como é de se esperar num mercado tão relevante, sempre surgem os aproveitadores querendo lucrar indevidamente fraudando o produto, e infelizmente, comprar vinhos adulterados pode não ser tão incomum.

Falsificar vinhos é uma prática muito antiga. Na Roma antiga, Plínio, o Velho, reclamava que estava impossível distinguir o bom vinho romano das diversas adulterações que eram colocadas à disposição dos cidadãos romanos.

 In vino veritas, in aqua sanitas.”

O provável autor deste provérbio seria o filósofo Caio Plínio Cecílio Segundo, mais conhecido por “Plínio, o Velho” e traduzida significa: “No vinho está a verdade, na água está a saúde”.

Na Idade Média, as tabernas londrinas foram proibidas de estocar numa mesma adega os vinhos de origens diferentes, que eram vendidos em barricas, para evitar que um consumidor fosse enganado comprando “gato por lebre”. As penas para quem fosse pego vendendo um vinho fraudado eram severas e podiam variar desde a obrigação de beber todo o estoque até ser enforcado.

Vários tipos de falsificações são possíveis, passando pela simples troca de rótulos, rolhas e garrafas até elaborados esquemas de forjar garrafas de vinhos míticas para serem colocadas em leilões e vendidas por pequenas fortunas.

Outros tipos de adulteração podem incluir:

  1. Aromatizantes para conferir notas especiais, como madeira em vinhos que não envelheceram em barril de carvalho;
  2. Mosto de baixa qualidade com o acréscimo de água e açúcar até obter o brix necessário para alcançar o teor de álcool na fermentação
    1. O uso de açúcar, em casos restritos e em condições controladas, é aprovado pela legislação de alguns países e recebe o nome de chaptalização;
  3. Uso de alcalinizantes para reduzir acidez de vinho azedo;
  4. Combinação de vinho de boa qualidade para mascarar o de má qualidade, para que a bebida fique com sabor e aroma apreciáreis;
  5. Mistura de um vinho qualquer em parte de um lote de uma marca conhecida para aumentar garrafas da marca conhecida.

Ao longo do tempo foram criadas diversas legislações e mecanismos de controle como certificações de selos de origem objetivando manter a produção e comércio vinícola sob boa vigilância, mas nem assim foi possível eliminar totalmente os produtores ou comerciantes inescrupulosos.

Atualmente, a fraude mais comum é a falsificação, cujos principais alvos são os vinhos bem conhecidos e com maior valor agregado, ou seja, os mais caros que permitem mais ganhos aos fraudadores e são mais fáceis de colocar no mercado. Aproveitam-se daqueles que conhecem pouco as características sensoriais do produto, mas que querem ostentar a garrafa.

Um exemplo que vem ocorrendo aqui no Brasil é com o vinho D.V. Catena Tinto da Argentina, um dos vinhos que mais vem sendo falsificados e contrabandeados, estima-se por isso, que circule no comércio brasileiro um volume deste vinho maior do que aquilo que a vinícola Catena Zapata produz.

Entre os vinhos europeus mais falsificados, destacam-se: Domaine de la Romanée-Conti, Henri Jayer, Domaine Dujac, Château Cheval Blanc, Château Petrus, Château Lafite Rothschild, Château Latour, Château Mouton Rothschild, Château Lafleur, Château Le Pin, Château Latour à Pomerol, Château Rayas, Jaboulet La Chapelle Hermitage e Sassicaia.

Entre os vinhos americanos há registros de falsificações no Opus One e no Screaming Eagle, já entre os australianos há registros com o Penfolds Grange e Bin 707.

Além disso, o único tipo de açúcar presente no vinho deve ser o da própria uva, pois se houver, por exemplo, adição de açúcar de cana, deixa de ser vinho.

Sempre observe a quantidade de açúcar indicada no rótulo. Para os vinhos secos, até 4 gramas por litro; para os meio secos, até 18 gramas por litro; para meio doces, até 45 gramas por litro; e para doces, não menos que 45 gramas por litro. Se houver maior quantidade de açúcares do que isso e não for indicado no rótulo que o vinho é encorpado, significa que foi adicionado açúcar.

Se o ácido salicílico estiver presente nos ingredientes, o vinho foi produzido com violação da tecnologia de fabricação, pois é um ingrediente não aceito.

Exemplos históricos de fraudes com vinho

USO DE ANTICONGELANTE PARA CONFERIR CORPO E DOÇURA

Em 1985 ocorreu um caso emblemático, um escândalo devido ao uso de anticongelante na Áustria. Os produtores austríacos, em especial os de vinho a granel, estavam misturando dietilenoglicol ao vinho para fazê-lo mais doce e encorpado, como se fossem de colheita tardia, antes de serem enviados para a Alemanha para serem engarrafados, seja como vinho austríaco ou, ocasionalmente, misturado com vinho alemão.

A investigação chegou à conclusão de que, apesar da fraude, não haveria danos à saúde dos consumidores, devido às quantidades ínfimas utilizadas de dietilenoglicol, porém o escândalo representou o colapso da indústria vinícola austríaca, liquidando com sua reputação por muito tempo. Em consequência, as exportações caíram de 45 milhões para 4,4 milhões de litros por ano.

NÍVEIS LETAIS DE METANOL

Após o escândalo do anticongelante na Áustria, algo mais sério ocorreu em 1986, quando um enólogo italiano misturou álcool derivado de madeira que continha metanol ao vinho, objetivando fraudar aumentando o teor alcóolico de seu produto. O problema tornou-se grave porque o metanol é um álcool tóxico que além de cegueira pode levar à morte, e de fato, 23 pessoas morreram e mais de 90 foram hospitalizadas depois de serem envenenadas.

O vinho inicialmente afetado foi o Odore Barbera. Acreditava-se ser um único lote, mas o escândalo se espalhou e acharam metanol também no Fraris Dolcetto del Piemonte e diversos outros rótulos foram investigados.

SASSICAIA FAKE

Outro escândalo italiano chegou às manchetes em 2000, quando a polícia invadiu um armazém lotado com mais de 20 mil garrafas de “Sassicaia 1995”. As garrafas falsas do famoso vinho supertoscano estavam sendo vendidas na beira da estrada pelo líder da gangue.

Em 2020, a falsificação do Sassicaia voltou a ser notícia, quando os fraudadores engarrafaram e etiquetaram garrafas falsas para safras entre 2010 e 2015. Acredita-se que o vinho usado nos produtos falsificados seja originário da Sicília, as garrafas da Turquia e os rótulos, tampas e engradados falsos da Bulgária.

MISTURA DE UVAS NÃO DECLARADAS

Em 2008 a Itália foi atingida novamente por outro escândalo. Os produtores de Montalcino estavam adulterando deliberadamente seus vinhos feitos da uva Sangiovese com a uva Lancellota, que é de qualidade inferior e não é permitida na regulamentação do DOCG (Denominazione di Origine Controllata e Garantita) e é normalmente usada para fazer Lambrusco.

Enquanto isso era investigado, novas sondagens descobriram que uma das maiores propriedades da região estava também misturando Merlot com sua Sangiovese já por cerca de 25 anos.

O MAIOR FALSÁRIO DE VINHOS DO MUNDO (AO MENOS ATÉ AGORA)

Em 2013 Rudy Kurniawan, natural de Jacarta, Indonésia, que alegava ter, em 2007, a maior adega do mundo, foi condenado a 10 anos de prisão por vender vinhos falsificados. Em 2006, apenas em um leilão da Acker, Merrall & Condit, os seus vinhos acumularam um valor total de 24,7 milhões de dólares, mas estima-se que a cifra total comercializada por ele possa ter ido além dos 100 milhões de dólares.

Mas como a malandragem não dura para sempre, num dos leilões em que oferecia seus vinhos raros estava presente o grande produtor Laurent Ponsot, da Borgonha, que ao ver garrafas antigas de seu vinho anunciados em leilão, apressou-se ao local para avisar que no lote a ser vendido estavam vinhos de colheitas inexistentes, como o Ponsot Clos de la Roche de 1929, sendo que este só começou a ser produzido em 1934, e assim o falsário foi pego.

Descobriu-se na investigação que Kurniawan tinha uma oficina que possuía até brocas de dentistas para gravar em baixo relevo nas garrafas fabricadas imitando inscrições dos anos de 1780, cinzelando as letras com as iniciais, dando ares de autenticidade à garrafa de mentira.

VINHO VERDE COM UVAS DE OUTRAS PROCEDÊNCIAS

O Vinho Verde é produzido na Região Demarcada dos Vinhos Verdes, em Portugal, constitui uma DOC (Denominação de Origem Controlada) cuja demarcação remonta o ano de 1908, então, evidentemente, não pode ser produzido com uvas de outros terroirs.

Contudo, no final de 2019, jornalistas do Correio da Manhã de Portugal testemunharam a chegada de caminhões-tanque com uvas de origem desconhecida para a produção de vinho em adegas portuguesas de onde sai como vinho verde certificado, mostrando fraude de rastreabilidade na cadeia de custódia.

BORDOLÊS FAKE

Em 2023 a polícia francesa desmantelou um esquema de falsificação de vinho bordalês e fez mais de 20 prisões relacionadas a um golpe em grande escala envolvendo vinho de Bordeaux falsificado.

O vinho era vendido para supermercados na França e em outros países como sendo de châteaux de renome da região do Médoc, uma importante denominação de origem de vinhos da França – AOC (Appellation d’Origine Contrôlée), localizada na margem esquerda do estuário do Gironde, ao norte de Bordeaux. Porém, os vinhos na realidade eram de outras regiões francesas ou mesmo da Espanha, rotulados de forma fraudulenta.

Outros casos envolviam o uso de outras denominações de prestígio, incluindo Saint-Emilion e Pomerol.

AS FRAUDES NO BRASIL

No vinho nacional, as fraudes identificadas pela Polícia Federal são geralmente no sentido de burlar a alta carga de impostos e não adulterando o produto, há especialmente casos de descaminho, inclusive entre os Estados da Federação, ressaltando que por aqui os impostos podem representar mais da metade da garrafa, enquanto na Europa o vinho é classificado como alimento e a carga tributária é em média 15 – 20%, o que torna nosso País pouco competitivo, sendo este um obstáculo à cultura do vinho por ele se tornar um produto menos acessível e um incentivo aos contrabandistas.

Portanto, até o momento por aqui, a fraude do vinho nacional não é questão de food safety. Ao contrário, os enólogos e sommeliers  brasileiros têm feito um grande esforço para que o produto destaque-se tanto em qualidade percebida quanto intrínseca.

Um reflexo da evolução dos vinhos nacionais é o crescimento das IG (Indicações Geográficas), valorizando produtos tradicionais de determinados territórios e garantindo rastreabilidade.

No Brasil, existem duas modalidades de IG: a Indicação de Procedência (IP) e a Denominação de Origem (DO), sendo que a IP se aplica às regiões que se tornaram reconhecidas e o DO vinhos com qualidades ou características que se devem essencialmente ao meio geográfico, incluídos os fatores naturais e os humanos.

Mapa elaborado por Jorge Tonietto, Luciana Prado, Fábio Ribeiro (Embrapa Uva e Vinho); Ivanira Falcade (UCS); Dezembro 2022.

A produção de vinhos finos no Brasil, comparada à de outros países, é um bebezinho ainda. Por isso, ter ações de Food Fraud é essencial para que esta indústria cresça mantendo sua credibilidade.

Para evitar comprar vinho fraudado siga estas dicas:

  1. Em vinhos tradicionais, veja se a rolha bate com a marca do rótulo, porém, algumas rolhas não tem mesmo nenhuma identificação;
  2. Esteja atento a detalhes no rótulo, erros gramaticais ou fora dos padrões tradicionais em que são habitualmente comercializados;
  3. Observe impressão pobre em detalhes ou papel errado, assim como informações faltantes;
  4. Não se engane, se o preço está muito mais barato do que costuma ser, isso é um indício de que deve desconfiar;
  5. Compre de comerciantes que sejam capazes de demonstrar procedência/ rastreabilidade;
  6. Verifique no rótulo o teor de álcool da safra e outros dizeres de rotulagem e compare com a ficha técnica do fabricante.

Para finalizar o artigo, que fique claro que a fraude é a exceção e não a regra, que apesar de alguns poucos “malandros” querendo dinheiro fácil, o setor no geral é muito sério, fazendo desta bebida consumida há milênios, rótulos que são verdadeiras obras de arte, e são literalmente milhares de rótulos, cada um com uma combinação de uvas, terroirs e técnicas que os fazem únicos, portanto, escolha o que mais lhe agrada e desfrute com moderação.

Quer saber mais sobre fraudes em alimentos e bebidas? Leia também:

Mel: relato sobre fraudes no Brasil

O que o BoS 6.0 do FSSC 22000 fala sobre Food Fraud?

Como obter informações sobre fraudes em alimentos

Desenvolvimento da estratégia de mitigação de fraude, segundo o programa Food Fraud da U.S. Pharmacopeia

Doces ou travessuras: casos de fraudes em doces e guloseimas

10 min leituraA história do vinho confunde-se com a própria história da civilização humana, passando pelos egípcios, gregos, persas, fenícios, etruscos e romanos. As evidências mais antigas de sua produção, segundo o […]

Compartilhar
Pular para a barra de ferramentas