No dia 24/06/2020, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 14.016, que dispõe sobre o combate ao desperdício e a doação de excedentes de alimentos para o consumo humano. Esta lei permite que estabelecimentos relacionados à fabricação de produtos alimentícios, desde produtos industrializados até refeições prontas para o consumo e alimentos in natura, possam doar seus excedentes, desde que atendam alguns critérios específicos. E é exatamente destes pontos que queremos tratar, ou seja, da relação direta dessa nova lei com a qualidade e segurança dos alimentos. Falaremos também dos aspectos relevantes para que essa lei cumpra exatamente seu papel de assistência à população mais vulnerável, que necessita da doação de alimentos para compor sua alimentação e nutrição.
Antes de tratarmos especificamente desses requisitos de segurança dos alimentos relacionados a esta lei, destacamos os principais pontos mencionados na norma, incluindo quais estabelecimentos e locais estão aptos a realizar esse tipo de ação, a forma de doação e como esses produtos devem chegar até os beneficiários, passando por quem são os grupos que devem receber os alimentos, entre outros aspectos:
- O alimento deve estar dentro da validade e das condições adequadas de conservação, o que impossibilita assim a doação de produtos vencidos ou até mesmo que tenham sua qualidade e segurança comprometida por falta de correta armazenagem;
- Os produtos e refeições a serem doados devem ter sua qualidade e segurança sanitária garantidas. Ainda que a embalagem esteja danificada, devem ser observados o estado e a possibilidade de consumo daquele alimento;
- Os alimentos devem ter suas características nutricionais e sanitárias mantidas, ainda que seus aspectos comerciais estejam comprometidos, para que sejam assim doados e não comprometam a saúde dos indivíduos e proporcionem nutrientes essenciais à alimentação das pessoas que os recebam.
- Estão aptos a doarem excedentes de alimentos: as empresas, hospitais, supermercados, cooperativas, restaurantes, lanchonetes e demais estabelecimentos que preparem e forneçam alimentos prontos para o consumo de indivíduos como empregados, pacientes, entre outros;
- Os alimentos prontos para o consumo ou produtos alimentícios podem ser doados diretamente às pessoas a quem se destinam, ou por intermédio do poder público, mediante bancos de alimentos e entidades beneficentes de assistência social;
- Os alimentos aptos à doações se destinam a pessoas, famílias e grupos em situações de vulnerabilidade e de risco nutricional e alimentar, combatendo assim o desperdício de alimentos e destinando a grupos que possuem necessidades alimentares;
- Os produtos doados não configuram relação de consumo entre o doador e o beneficiário, o que ainda segundo a lei, exime o doador de quaisquer responsabilidades por danos causados pelos alimentos doados aos indivíduos que receberam tal doação;
- Ao realizar a primeira doação, seja ao beneficiário direto ou ao intermediário, a responsabilidade do alimento passa a ser de quem recebeu e não mais da empresa que doou tal produto, a menos que seja provado na esfera judicial que a doação teve a intenção de causar danos à saúde das pessoas.
Podemos interpretar essa nova lei como uma possibilidade de melhoria geral na promoção de saúde dos indivíduos por meio da doação de alimentos próprios para o consumo. Com isso, aumenta o acesso à alimentação de qualidade para pessoas com menor poder aquisitivo.
Avaliando pelo olhar da segurança dos alimentos devemos detalhar alguns aspectos relevantes já apontados dentro do contexto da lei, mas que requerem maiores cuidados dos profissionais da área do food safety e principalmente de quem pretende doar seus excedentes alimentícios:
- Validade: A lei descreve que apenas podem ser doados alimentos dentro do prazo de validade. Pensando em alimentos embalados, é muito fácil identificar a data de validade do produto, mas e para alimentos preparados prontos para o consumo? Qual a validade dessas refeições? Nesse caso é extremamente importante as empresas validarem todos os seus produtos prontos para consumo e considerar que a doação deve ser realizada antes do vencimento. Além disso, vale destacar ao beneficiário que o produto deve ser consumido até a data do vencimento e deixar clara essa informação.
- Conservação: Um dos principais problemas de “quebra” dos produtos alimentícios em redes varejistas é a conservação dos produtos, principalmente daqueles que requerem controle de temperatura. Esses alimentos muitas vezes ficam fora do padrão para comercialização e assim podem entrar para a doação, certo? Depende. Caso a temperatura não tenha afetado a sanidade do alimento ele pode ser doado, em caso contrário ele deve ser descartado.
- Controle de qualidade: É muito importante que as empresas realizem uma análise completa dos produtos que serão doados, envolvendo: checagem da validade; integridade da embalagem; características sensoriais preservadas como odor que deve estar característico, textura adequada, cor e sabor dentro do padrão; registro de todos os produtos que foram doados e seus respectivos beneficiários, entre outros.
- Transporte: Esse ponto é o mais crítico para quem recebe essas doações, pois como a pessoa que recebeu os alimentos deve transportá-los até chegar ao seu destino de consumo? Nesse caso o ideal seria realizar a doação a uma instituição que tenha seriedade em seu trabalho e que colete esses alimentos na empresa doadora e os transporte com qualidade e segurança até os beneficiários.
Em minha visão, essa Lei 14.016 possui seus prós e contras e ainda vai causar muitas discussões entre os especialistas em segurança dos alimentos, que analisam essa publicação com olhar mais refinado e identificam diversas vertentes no processo de doação de alimentos. E você, o que achou da Lei 14.016 que permite a doação de excedentes de alimentos?
3 min leituraNo dia 24/06/2020, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei 14.016, que dispõe sobre o combate ao desperdício e a doação de excedentes de alimentos para o consumo […]