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Staphylococcus aureus e intoxicação alimentar: uma rápida visão geral

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O aumento de refeições realizadas fora de casa tem contribuído para a ocorrência dos surtos de doenças transmitidas por alimentos (DTA), que são um importante problema de Saúde Pública em todo o mundo [14].

Nos EUA, somente no ano de 2016, foram relatados 24.029 casos de DTA, com 5.512 hospitalizações e 96 mortes [4]. Já no Brasil, onde a notificação dos surtos não ocorre de forma efetiva em todos os estados, foram reportados 5.252 casos de surtos DTA entre os anos de 2010 e 2017, sendo que Staphylococcus aureus, Salmonella spp. e Escherichia coli foram os principais agentes envolvidos [3].

Os estafilococos são bactérias Gram positivas, aeróbicas facultativas, e se caracterizam em grupos que assemelham a cachos de uva. Este grupo é representado por bactérias imóveis, não esporuladas e geralmente não capsuladas, apresentando positividade para o teste de catalase na maioria das vezes. São bactérias que crescem em meios de cultura comuns, como caldo ou ágar simples, com pH próximo ao neutro e em temperatura ótima de 37° C. As colônias formadas em placa, após 18-24 horas de incubação, apresentam-se arredondadas, lisas e brilhantes [6] [11].

Essas bactérias podem ser encontradas no ar, no esgoto, na água, no leite e em alimentos ou equipamentos utilizados para processar alimentos, nas superfícies expostas aos ambientes, nos seres humanos e nos animais, sendo esses dois últimos os principais reservatórios. Os estafilococos podem estar presentes nas vias nasais, na garganta e também no cabelo e na pele de 50% ou mais dos indivíduos saudáveis [8].

Os estafilococos são divididos em dois grandes grupos: coagulase-positiva (SCP) e coagulase-negativa (SCN). As espécies de SCP são S. aureus subsp. aureus, S. aureus subsp. anaerobius, S. hyicus, S. lutrae, S. intermedius, S. pseudintermedius, S. schleiferi subsp. coagulans e S. delphini. Todas as demais espécies são coagulase negativas [2].

Entre as espécies de Staphylococcus, S. aureus é a mais importante em função de sua capacidade de adquirir resistência a antimicrobianos (como por exemplo, os S. aureus resistentes à meticilina, conhecidos como MRSA) e de sua patogenicidade, sendo a espécie mais relacionada a surtos de intoxicação alimentar. Staphylococcus aureus é um patógeno oportunista e versátil, que pode sobreviver em diversos ambientes e crescer em muitos tipos de alimentos. Ele pode causar desde infecções superficiais na pele até doenças invasivas graves e potencialmente fatais [1] [12]. Esse micro-organismo produz uma grande variedade de fatores de patogenicidade e virulência, tais como: estafiloquinases, hialuronidases, fosfatases, coagulases, hemolisinas e enterotoxinas.

A intoxicação alimentar por estafilococos resulta da ingestão de enterotoxinas estafilocócicas (EE) pré-formadas em alimentos e a maioria dos surtos se deve à manipulação inadequada destes, por falta de higiene pessoal ou pela higienização deficiente de utensílios e de equipamentos [12]. As EE são proteínas de baixo peso molecular, as quais podem ser diferenciadas por meio de sorologia em vários tipos antigênicos [8] e a sua alta estabilidade e resistência à maioria das enzimas proteolíticas como pepsina e tripsina garantem que essas toxinas permaneçam ativas no trato gastrintestinal [7].

As intoxicações alimentares ocorrem principalmente quando o alimento não foi mantido quente (60º C ou mais) ou refrigerado (7,2º C ou menos) o suficiente para impedir o crescimento microbiano e, consequentemente, a produção de enterotoxinas [8]. O diagnóstico de intoxicação alimentar por estafilococos, de uma forma geral, é confirmado pela identificação de contagens superiores a 105 UFC g-1 de S. aureus a partir dos restos de alimentos ou pela detecção de EE remanescentes nos alimentos [6].

Os alimentos que costumam estar relacionados às intoxicações causadas por S. aureus incluem carnes e produtos de carne; frangos e produtos de ovos; saladas com ovos; atum, galinha, batata e macarrão; produtos de panificação, como os recheados com creme; tortas de creme e bombas de chocolate; sanduíches e leite ou produtos lácteos. Geralmente são produtos que necessitam de bastante manipulação para serem preparados.

Os sintomas de intoxicações estafilocócicas incluem náuseas, vômitos e cólicas abdominais. O início dos sintomas das enfermidades costuma ser rápido, ocorrendo no período de poucas horas após a ingestão do alimento. Os sintomas podem ser bastante agudos, dependendo da suscetibilidade individual à toxina, da quantidade de alimento contaminado ingerido, da quantidade de toxina no alimento ingerido e da saúde geral do indivíduo [8].

S. aureus também possui a capacidade de formar biofilmes, compostos por multicamadas de células e resistir à dessecação, ao calor e são mais tolerantes aos desinfetantes comuns do que a maioria das bactérias podendo permanecer em superfícies, utensílios e equipamentos utilizados no preparo de alimentos, o que constitui outra importante fonte de contaminação [2].

A contagem de S. aureus em alimentos normalmente é realizada usando técnicas microbiológicas com meios seletivos como Baird-Parker (BP), acrescido de telurito de potássio, que pode ser complementado com fibrinogênio plasmático de coelho [9] [10].  Além dos métodos normalizados, foram desenvolvidos métodos alternativos, também comercialmente disponíveis, baseados em meios seletivos que permitem a identificação presuntiva de S. aureus no prazo de 24 horas em vez das 48 horas dos métodos normalizados atuais [5].

Para a avaliação do risco de intoxicação alimentar estafilocóccica, entretanto, tem sido dada menor importância à contagem de unidades formadoras de colônias de S. aureus presentes nos alimentos e maior atenção à produção de enterotoxinas [13]. Atualmente, há diversas pesquisas em desenvolvimento, visando melhorar a caracterização e a detecção das EE, por métodos imunológicos e moleculares [6].

Em resumo, as bactérias do gênero estafilococos possuem grande relevância em relação às DTA, que têm sido frequentemente associadas à má higiene dos alimentos, limpeza inadequada de equipamentos, contaminação cruzada por ingredientes após um processo de aquecimento e abuso de tempo/temperatura durante o processamento dos alimentos. De acordo com FETSCH & JOHLER (2018), estratégias que visem mitigar ou que ajudem a controlar os riscos são essenciais e devem levar em conta fatores como o tipo de processamento dos alimentos, a observação das boas práticas e a variabilidade da produção de EE nos diversos alimentos.

Autoras: Mariana Ambrósio Andrade Machado, Hilana Ceotto Vigoder e Janaína dos Santos Nascimento

Referências:

[1] BENKERROUM, N. Staphylococcal enterotoxins and enterotoxin-like toxins with special reference to dairy products: An overview. Critical reviews in Food science and nutrition, v. 58, n. 12, p. 1943-1970, 2018.

[2] BOTELHO, C. V. Staphylococcus coagulase positiva e Staphylococcus aureus resistentes a antibióticos em cadeia produtiva de carne suína. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, 2017.

[3] BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde – SVS. (2017). Surtos de doenças transmitidas por alimentos no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde. Recuperado em 9 de janeiro de 2018, de <http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/maio/29/Apresentacao-Surtos-DTA-2017> Acesso em 20 de junho de 2019.

[4] CENTERS FOR DISEASE CONTROL AND PREVENTION – CDC. (2013). Commercial dishwashing specification: guideline for mechanical ware washing in foodservice establishments. Atlanta: US Department of Health and Human Services.http://www.bccdc.ca/NR/rdonlyres/558797A0-F492-43D7-ACE3-260D5E726380/0/GuidelinesMechanicalWarewashinginFoodServiceEstablishmentswebformatJan2013.pdf Acesso em 21 de junho de 2019.

[5] CRETENET, M.; EVEN, S. & LE LOIR, Y. Unveiling Staphylococcus aureus enterotoxin production in dairy products: a review of recent advances to face new challenges. Dairy Science & Technology, v.91, p.127-150, 2011.

[6] FEITOSA, A. C., RODRIGUES, R. M., TORRES, E.A.T., SILVA, J. F. M. Staphylococcus aureus em alimentos. Revista Desafios, v. 4, n. 4, 2017. Disponível em: http://dx.doi.org/10.20873/uft.2359-3652.2017v4n4p15. Acesso em: 21 jun. 2019.

[7] FETSCH, A., & JOHLER, S. Staphylococcus aureus as a foodborne pathogen. Current Clinical Microbiology Reports, v. 5, p. 88-96, 2018.

[8] FORSYTHE, S. J. Microbiologia da segurança dos alimentos. 2 ed. Porto Alegre: Artmed, 2013. p. 243-246.

[9] INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATIONISO 6888-2. Microbiology of Food and Animal Feeding Stuffs – Horizontal Method for the Enumeration of Coagulase-Positive Staphylococci (Staphylococcus aureus and Other Species) – Part 2: Technique Using Rabbit Plasma Fibrinogen Agar Medium. International Organization for Standardization, Geneva, 2003.

[10] INTERNATIONAL ORGANIZATION FOR STANDARDIZATION ISO 6888-3. Microbiology of Food and Animal Feeding Stuffs – Horizontal Method for the Enumeration of Coagulase-Positive Staphylococci (Staphylococcus aureus and Other Species) – Part 1: Technique Using Baird-Parker Agar Medium.  International Organization for Standardization, Geneva , 2003.

[11] LEE, A. S., LENCASTRE, H., GARAY, J., KLUYTMANS, J., MALHOTRA-KUMAR, S., PESCHEL, A., HARBARTH, S. Methicillin-resistant Staphylococcus aureus. Nature Review: Disease Primers, v. 4, n. 18033, 2018.

[12] Oliveira, A. G. M., Melo, L., Gomes, D. B. C., Peixoto, R. S., Leite, D. C. A., Leite, S. G. F., Colares, L. G. T., Miguel, M. A. L. Condições higiênico-sanitárias e perfil da comunidade microbiana de utensílios e mesas higienizadas de um serviço de alimentação localizado no Rio de Janeiro. Brazilian Journal of Food Technology, Campinas, v. 22, Mai./2019. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1981 67232019000100600&lang=pt#B047. Acesso em: 20 jun. 2019.

[13] SCHELIN, J., SUSILO, Y., & JOHLER, S. Expression of staphylococcal enterotoxins under stress encountered during food production and preservation. Toxins, v. 9, n. 12, 401, 2017.

[14] WORLD HEALTH ORGANIZATION – WHO. (2018). Foodborne outbreaks: guidelines for investigation and control. http://www.who.int/foodsafety/publications/foodborne_disease/outbreak_guidelines.pdf Acesso em 20 de junho de 2019.

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Gerenciando utilidades sanitárias – Ar Comprimido

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Já pensou se sua “não conformidade” não estiver ligada somente aos seus processos diretos na produção de alimentos? Sabia que além da qualidade da matéria-prima, dos equipamentos e mão-de-obra qualificada, também as utilidades conceitualmente sanitárias podem elevar ainda mais a qualidade do seu produto final?

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 1: Utilidades mais utilizadas na indústria em geral, porém quando em indústrias de produtos com risco humano, podemos considerá-las como “sanitárias”.

Como detectar se estas utilidades manterão o bom desempenho dos equipamentos?  Considera-se que todas as utilidades dentro de uma cadeia produtiva da indústria de alimentos devem ser dimensionadas, instaladas e operadas de forma sanitária. Portanto, da mesma forma que a “Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle” é aplicada para os processos produtivos, a mesma deve ser aplicada para as utilidades.

Dentro deste contexto, uma das utilidades pouco notadas na indústria é o ar comprimido. Mas sabiam que na maioria das etapas finais produtivas, o ar comprimido tem contato direto com o produto e/ou embalagem primária? E o uso efetivo para limpeza de superfícies e utensílios que mantêm contato direto com matérias-primas e produto final é ponto relevante de processos de sanitização, sejam eles “CIP” (Clean in place) ou “COP” (Clean out place).

O que devemos avaliar para identificar o perfil de qualidade do ar comprimido? Quais os efetivos contaminantes que podem provocar uma “não conformidade” de produto e/ou processo?

Para responder, podemos ter como base a norma ABNT ISO 8573-1 / 2013 – “Contaminantes e classes de purezas” aplicadas para qualquer segmento industrial, que determina não somente os contaminantes mais prováveis, mas os limites em cada classificação, tendo também direcionamento dos métodos analíticos de detecção, adequando os disponíveis no mercado de serviços.

A ISO 8573-1 indica a determinação dos seguintes contaminantes: óleo (mg/m³), particulados (mg/m³) e/ou partículas não viáveis (unid/m³), temperatura do ponto de orvalho (ºC) e/ou teor de umidade (g/m³), partículas viáveis (UFC/m³) que podem ser determinados pela contagem de bactérias, fungos e bolores,  e demais contaminantes gasosos, como: oxigênio, monóxido de carbono, dióxido de carbono, óxido e dióxido de nitrogênio e dióxido de enxofre. Porém, quando falamos em “Segurança de Alimentos”, devemos nos concentrar nas normas regulamentadores e/ou nos  guias e normas recomendados da área, que efetivam o sistema da qualidade de uma indústria de alimentos.  Vejamos então o que estas normas dizem:

  • ISO 22000

Figura 2 – Parágrafo da ISO 22000 para o ar comprimido

  • BRC – Global Standard for Food Safety

Figura 3 – Parágrafo da BRC para o ar comprimido

  • IFS – PAC Secure

 

 

 

 

Figura 4 – Parágrafo da IFS – PAC Secure para o ar comprimido

Observem então, que nenhuma delas têm limite de aceitação, apenas indicam alguns parâmetros de controle e/ou como realizar este controle, com a utilização de compressores, secadores e/ou filtros adequados, deixando uma lacuna, a de como iniciar este monitoramento, até mesmo para adequar os “POPs” de manutenção preditiva e corretiva.

COMO AVALIAR SE SEU SISTEMA É ADEQUADO?

Em todos os parques industriais, o ar comprimido é gerado e tratado dentro das unidades fabris, portanto qualquer “não conformidade” nada mais é que um custo energético, visto que para se ter produzido tal produto, os compressores e secadores consumiram energia elétrica.

  • Como avaliar se a contaminação do seu produto não pode ser causada pela má qualidade do ar comprimido?
  • Como avaliar se sua parada produtiva não foi ocasionada por uma má qualidade do ar comprimido que danificou seu sistema pneumático?

Para isso, inicialmente, a geração, secagem e filtragem do ar comprimido poderão garantir que o grau de contaminação, seja ela física e/ou microbiológica seja diminuída já na área de utilidades. Junte-se a isso, uma instalação de material adequado e tratamentos nos pontos de uso para assegurar um menor número de manutenções corretivas. Observe na figura abaixo, como os contaminantes do ar comprimido poderão chegar até o seu ponto de uso:

Figura 5 – Formação de contaminantes do ar comprimido

O que se deve avaliar no sistema de ar comprimido para identificar os riscos e os pontos críticos do seu processo, sem levar em consideração se deverá seguir alguma obrigatoriedade normativa, tendo assim somente a questão do risco de contaminação que poderá lhe causar maiores não conformidades no seu produto final:

  1. O ar comprimido tem contato direto com produto, embalagens primárias, superfícies de contato e/ou utensílios;
  2. O processo produtivo poderá ter paradas repentinas por contaminação e/ou danos no componente pneumático e consequentemente degradar matéria-prima e/ou qualquer outro insumo neste tempo;
  3. Presença de tratamento pontual (filtros para retenção de óleo, partículas, odor e/ou microrganismos);
  4. O material da sua instalação é adequado para uma planta sanitária;
  5. O secador de ar comprido foi bem dimensionado tanto em capacidade do compressor como para as condições climáticas da fábrica;
  6. O compressor possui lubrificação direta ou indireta;
  7. A localização da central de compressores evita que o ar ambiente admitido transfira determinados contaminantes para o ar comprimido.

Atualmente, algumas normas ligadas à segurança de alimentos pedem apenas requisitos qualitativos, os quais requerem apenas que o ar comprimido seja incolor, inodoro e livre de contaminantes, e que nos pontos de uso a presença de filtros deve ser aplicada. Porém, uma norma recomendada para qualidade do ar comprimido já é aplicada em todos os segmentos industriais,  a qual indica analitos a serem controlados bem como os critérios de aceitação quantitativos para o controle efetivo da qualidade do ar comprimido.

Seguem alguns passos iniciais para um estudo para determinação:

  1. Análise de risco definindo os pontos críticos;
  2. Determinar requisitos de instalação e operação dos equipamentos pertinentes ao sistema de geração, tratamento e distribuição do ar comprimido;
  3. Dentro da operação dos mesmos, definir os POPs de manutenção preditiva, preventiva e corretivas;
  4. Determinar o critério de desempenho da qualidade do ar comprimido, avaliado dentro da análise de risco citadao no item 1, acima;
  5. Plano de indicadores e monitoramento do sistema.

Observem que o planejamento acima poderá garantir o controle total do sistema, além de evitar “não conformidades” e economia, sendo ela de energia e custos efetivos.

Nos próximos posts, iremos abordar como iniciar cada item acima. Siga-nos!

 

Margarete Nagata

Engenheira de alimentos, consultora em gases industriais

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Importância da implantação do sistema de rastreabilidade na indústria de alimentos

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A segurança dos alimentos é um tema que tem chamado à atenção dos consumidores, e com isso, os produtores, agricultores e fabricantes estão atentos a essa demanda, melhorando a informação e a rastreabilidade referente à origem e ao processo que os produtos seguem, aumentando desse modo à confiança do consumidor final pelos produtos que ele está consumindo [1].

Pelo Código de Defesa do consumidor, é direito deste a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que eles possam apresentar.

A rastreabilidade é a capacidade de seguir as coordenadas de qualquer alimento por todas as etapas em que ele passou, como produção, processo e distribuição até chegar ao cliente final. Ela atua como uma ferramenta de comunicação para garantir a conexão de toda a informação sobre o produto ao longo da cadeia de suprimentos [2][3].

De acordo com os autores Olsen e Borit, a rastreabilidade é “A capacidade de acessar qualquer ou todas as informações relacionadas àquilo que está sendo considerado, durante todo o seu ciclo de vida, usando identificações registradas”. Os objetivos da rastreabilidade são segurança do consumidor, confiança do mesmo com a marca e a qualidade do produto [1][4].

Para que seja possível a rastreabilidade dos produtos, é necessário obter a documentação de todo o percurso por meio de formulários e registros, pois através deles é possível identificar todo o insumo que foi utilizado e acompanhar o processo pelo qual o produto passou. Através desses documentos, a empresa pode responder rapidamente ao cliente referente a uma reclamação e esses detalhes ajudam o consumidor a obter confiabilidade no produto e na marca. Toda empresa precisa ter foco no cliente, pois ele é a pessoa mais importante para qualquer empresa [5][6].

Nos dias atuais, a grande preocupação de empresas que buscam a liderança competitiva e expansão dos negócios, reporta-se a qualidade dos produtos. Basta um insumo fora do padrão da empresa que o produto acabado pode estar comprometido, podendo alcançar vários consumidores e com isso diminuindo a credibilidade dos clientes em relação à marca. No entanto, com a rastreabilidade é viável minimizar as perdas e reduzir o problema, pois todas as informações necessárias para controlar a cadeia produtiva estarão registradas [3].

Uma das vantagens da rastreabilidade para o consumidor é a transparência informativa que essa ferramenta proporciona, por exemplo, é importante em processos diferenciados como o de produtos orgânicos que os clientes tenham certeza que o produto que eles desejam consumir condiz com o que eles estão comprando. Como também, a rastreabilidade pode ser usada

 

por empresas que possuem projetos socioambientais e queiram informar os consumidores sobre essa iniciativa [5].

A rastreabilidade pode ajudar na interação do produto com o consumidor fazendo com que este possua confiança com a empresa que ele está comprando, pois ele vai ter acesso à procedência da matéria-prima, do processo e do produto acabado [6]. Esse rastreio permite à empresa acompanhar a trajetória e a localização de seus produtos, a qualquer momento, independentemente de quantos fornecedores, empresas e distribuidoras estiverem envolvidas até chegar o cliente final.

O padrão Global de Rastreabilidade (Global Traceability Standard – GTS) é elaborado por métodos que registram cada etapa da cadeia produtiva que o produto passou, permitindo que seja possível ter acesso a informação tanto para onde o produto deve seguir como também a trajetória de onde ele veio, até chegar ao problema identificado. Esse padrão possibilita fazer as assistências de acompanhar o processo inteiramente e certificar que os clientes irão consumir seus produtos como desejam.

Com isso, um recall pode ser efetuado de forma rápida e eficiente, uma vez que é de suma importância ter competência para recolher os lotes não conformes de algum produto em curto prazo, para que o problema não tenha danos maiores, e com agilidade, antes que o consumidor seja afetado.

Os códigos de barra e as etiquetas inteligentes são exemplos de possibilidades para registrar e armazenar informações relevantes do produto como data de produção, validade, número do lote, onde foi fabricado, entre outras informações [1].

A tecnologia de identificação por radiofrequência (RFID) é considerada uma das principais tecnologias que contribuem para a rastreabilidade, ela é uma tecnologia de identificação automática que realiza a captura de dados. Com a RFID, o sistema de rastreabilidade podem se tornar mais transparente, exato e eficaz, pois essa inovação possui uma taxa de leitura mais exata comparada aos códigos de barras geralmente utilizados nos produtos. A RFID tem sido adotada nos processos de supply chain e na logística agroalimentar [7].

Em resumo, esse sistema de rastreamento é uma metodologia para encontrar e centralizar todos os dados como origem, processo, manuseio, atividades associadas que façam referência ao produto durante toda a cadeia de suprimentos (supply chain) [3].

Autora do post: Mariana Ambrósio Andrade Machado

Técnica em alimentos

Engenheira de Alimentos

Graduanda em Administração

 

Referência Bibliográfica:

[1] GS1 BRASIL. Clash 2017 destaca importância da rastreabilidade de alimentos

Disponivel             em:          <https://www.gs1br.org/noticias/clash-2017-destaca-

import%c3%a2ncia-da-rastreabilidade-de-alimentos>. Acesso em: 09 fev. 2019.

 

[2] IFOPE. Entenda   os    sistemas    de    rastreabilidade    de    alimentos. IFOPE educacional, abr.                            2018. Disponível                                         em:

<https://blog.ifope.com.br/2018/04/24/entenda-os-sistemas-de-rastreabilidade-de-alimentos/>.  Acesso em: 09 fev. 2019.

 

[3] HALEEM, A., KHAN, S. & KHAN, M. I. Traceability implementation in food supply chain:  a grey-dematel approach. Information  Processing in Agriculture, India, jan. 2019. Disponível em: < https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/s2214317318303433>

[4] OLSEN, P. & M. BORIT, M. Como definir a rastreabilidade. Tendências Food Sci Technol , v. 29, n.  2 , pp. 142 – 150, 2013. doi 10.1016 / j.tifs.2012.10.003

[5] CONCHON, L. F.; LOPES, M. A. Rastreabilidade e segurança alimentar. Boletim Técnico Universidade Federal de Lavras Departamento de Medicina Veterinária, 2012.

 

[6] FISPAL TECNOLOGIA. Vantagens da rastreabilidade para a indústria de alimentos e bebidas. https://digital.fispaltecnologia.com.br/vantagens-da- rastreabilidade-para-industria-de-alimentos-e-bebidas/. Acesso em: 09 fev. 2019.

[7] LIANG, W., CAO, J., FAN, Y., ZHU, K., & DAI, Q. Modeling and implementation of cattle/beef supply chain traceability using a distributed RFID-based framework in China. PloS one,  v. 10, n. 10, e0139558, 2015. Disponível em: <https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0139558>.

 

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Dados e principais causas de recolhimento de alimentos no Brasil

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Quem trabalha na indústria de alimentos sabe que basicamente “mata-se um leão” por dia. A rotina de qualquer profissional da área de alimentos gira em torno de gerenciar o processo e os colaboradores, a fim de que produtos de alta qualidade e seguros cheguem à nossa mesa. Para que tudo isso flua se faz necessária uma equipe muito alinhada e planejamento. Quando me refiro a planejamento, significa prever tudo que pode ocorrer, que possa levar o consumidor a algum tipo de risco. Este seria o cenário perfeito, não é mesmo? Entretanto, às vezes, mesmo com tantos cuidados, o cliente detecta algum problema no produto e a empresa precisa realizar um recolhimento do lote.

Todas as fases que envolvem o recolhimento de algum produto são bastante desgastantes. Mesmo se a empresa dispuser de um plano de recolhimento que determine como proceder em caso de incidentes, essa não é uma tarefa que faça parte dos planos das empresas. Caso sua empresa não possua esses procedimentos implantados e validados, sugiro fazer a leitura de dois posts que já foram publicados  aqui no blog que descrevem as diretrizes para o recolhimento de produtos: Recolhimento de Alimentos: principais requisitos da Resolução RDC 24/15 e Recolhimento de Alimentos: como fazer e atender a Resolução RDC 24/15. Vale lembrar que é comum nesse contexto surgir o termo “recall”, porém a RDC 24/2015 não usa esse termo.

Costumo dizer para as pessoas que trabalham comigo, meus alunos, que existem todos os tipos de profissionais. Como queremos ser lembrados? Atuar na indústria de alimentos requer muita ética e clareza de qual é propósito da minha empresa. Por que estou dizendo isso? Nosso sistema de fiscalização não tem “pernas” para atuar como gostaríamos, por isso muitas empresas aproveitam-se dessa lacuna, prejudicando a imagem das que trabalham respeitando o seu cliente.

Ao analisarmos os dados dos processos notificados pela ANVISA, observa-se que o movimento de avaliação/ fiscalização está sendo realizado. A partir de 2016, temos histórico registrado desse trabalho, como se pode observar nas figuras 1 e 2.

Figura 1. Número de Processos de Recolhimento de Alimentos

 

 

 

 

 

 

 

 

*até Maio de 2019.

Fonte: http://portal.anvisa.gov.br/produtos-irregulares#/

Figura 2. Motivos de Recolhimento de Produtos.

 

Analisando esses dados, devemos nos perguntar: estamos agindo de forma preventiva? Todos os riscos/perigos estão sendo identificados? Estamos atendendo a todos os aspectos da legislação vigente? Ressalto aqui a questão de rotulagem e registro, que sugiro revisar, pois foram as maiores causas de processos. Será que todos os ingredientes estão contemplados na lista de ingredientes? Existe alguma declaração que possa levar o consumidor ao erro? Olhe para o seu processo, faça esses questionamentos, com certeza você irá garantir que sua empresa não faça parte dessas estatísticas.

Reconhecer o erro e informar ao consumidor são méritos de pouquíssimas empresas. Um processo de recolhimento, além de muito oneroso por necessitar de robustez, também gera um desgaste para a marca. O fator negativo da maioria dos recolhimentos registrados no Brasil é que eles partem de reclamação do consumidor ou dos órgãos de fiscalização e não porque a identificação da falha foi feita pela empresa. No período avaliado, apenas 13% dos processos foram de recolhimento voluntário.

Assim, lembre-se dessa dica: aprenda com o erro dos outros! Atualmente, devemos ser o mais transparente possível dentro da cadeia de alimentos, isso vai gerar empatia por parte do consumidor.

Josiane Kilian possui graduação em engenharia de alimentos pela Universidade Comunitária Regional de Chapecó – UNOCHAPECO (2007) e pós-graduação em tecnologia de alimentos, com área de concentração em tecnologia e processamento de carnes UNC (2011). É mestre (2014) e doutora (2018) em engenharia de alimentos pela URI-Erechim-RS. Tem experiência na área de ciência e tecnologia de alimentos, com ênfase em industrialização de carnes, leites e análise sensorial de alimentos e bebidas. Atualmente é professora do curso de Engenharia de Alimentos na Universidade do Oeste de Santa Catarina.

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Manutenção em linhas de produção de alimentos e seus riscos

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Sabemos que atualmente a disponibilidade de linha, também conhecida como “asset intensity”, é um importante indicador para as indústrias, pois mede o quanto o negócio está sendo bem gerido, o quanto a manutenção e os cuidados com as máquinas estão sendo efetivos.

Considerando um cenário de manufatura enxuta com produção sob encomenda, com prazos para entrega do produto no cliente, bastante comum nas indústrias de alimentos atualmente, por mais que tenhamos áreas especializadas na gestão preventiva de máquinas, sempre teremos ocorrências de manutenções corretivas, seja por uma peça mal instalada, uma lubrificação mal realizada ou um dimensionamento de frequência mal realizado.

A máquina quebrou no meio de uma produção, até mesmo porque é nesse momento que ela está em uso, certo?

E agora? Bem, o primeiro e principal objetivo é solucionar a quebra e disponibilizar a máquina para operar novamente, lógico, é a produção quem movimenta todo negócio. Contudo, é nesse momento que temos um grande risco para a segurança do produto. É fundamental que a produção retorne o quanto antes, mas temos que nos prevenir quanto à contaminação cruzada em função de uma manutenção mal executada, disposição inadequada de ferramentas e/ou partes do equipamento diretamente no chão ou principalmente por uso inadequado de ferramentas, que estavam acessíveis imediatamente no momento da necessidade.

Quando pensamos em manutenção e os controles necessários para prevenir a contaminação do produto, é fundamental que seja garantido e implementado procedimento sólido, capacitando principalmente o time de manutenção para execução de atuações corretivas em máquinas de alto risco previamente já mapeadas.

Algumas ações que nos ajudam a mitigar esses riscos:

  • Mapear máquinas com potencial risco iminente de contaminação do produto durante manutenções;
  • Definir junto à manutenção as ferramentas dedicadas às manutenções dessas máquinas;
  • Capacitar os manutentores quanto às boas práticas de manutenção durante as intervenções;
  • Estabelecer procedimentos contínuos de limpeza e higienização dessas ferramentas;
  • Realizar inspeções intermitentes das condições das ferramentas, bem como da eficiência das limpezas por meio de swabs para análise de microbiologia, por exemplo;
  • Estabelecer registros e controles das intervenções nessas máquinas para rastreabilidade em eventuais contaminações dos produtos;
  • E lógico: sempre ficar de olho no processo como um todo para garantir a melhoria do processo.

Então, reveja seu processo, avalie os riscos e fique de olho nas manutenções, elas geram mais riscos do que pensamos.

 

Autoria: Wallace Lisboa de Siqueira

Bacharel em Sistemas de Informação, Universidade Estadual de Goiás, 2010. Especialista em Gestão de Segurança dos Alimentos, Centro Universitário SENAC, 2017. Especialista MBA Executivo em Gestão da Produção e Qualidade, Universidade Candido Mendes, 2018. Especialista em Tecnologia dos Alimentos, Universidade Estácio de Sá, 2018. Graduando em Tecnologia em Gestão da Qualidade, Universidade de Salvador, 2020. Graduando em Tecnologia em Gestão da Produção Industrial, Universidade Norte Paraná, 2021.

2 min leituraSabemos que atualmente a disponibilidade de linha, também conhecida como “asset intensity”, é um importante indicador para as indústrias, pois mede o quanto o negócio está sendo bem gerido, o […]

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Fontes interessantes com dados úteis para análises de risco

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Durante o XV Simpósio Internacional ABRAPA sobre Fraude em Alimentos os palestrantes trouxeram uma série de fontes que podem ser interessantes para o levantamento  de dados durante as nossas análises de risco, que destaco abaixo:

IAFP – International Association for Food Protection

A associação traz um fórum para os profissionais de Food Safety compartilharem informações com elaboração de uma série de conteúdos atualizados, porém a maioria só está disponível para membros que se disponham a pagar a inscrição em dólares!

https://www.foodprotection.org/

FORC – Food Research Center é um centro de pesquisas nacional com o apoio da FAPESP que apoia uma série de iniciativas de mestrados e pós-doutorados com foco no auxílio aos desafios das indústrias.

No site, é  possível acessar conteúdos gratuitamente, entre os quais destaco o link para a TBCA – Tabela Brasileira de Composição de Alimentos – que traz a informação dos valores nutricionais para alimentos in natura e já processados, como a nossa feijoada por exemplo!

Também vale dar uma espiada no site “Alimentos sem Mitos” que traz posts técnicos, mas com uma linguagem mais simples.

http://www.usp.br/forc/

http://alimentossemmitos.com.br/

http://nware.com.br/tbca/

O palestrante Don é colaborador do site Food Safety Talks que traz uma série de podcasts sobre os mais variados temas e muito conteúdo grátis.

http://foodsafetytalk.com/

Espero que gostem desse monte de informação e se divirtam tanto quanto eu ao descobrir coisas novas e visões de diferentes lugares!

Autora: Nathália Gouveia Federico, engenheira de alimentos

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Destaques do XV Simpósio Internacional ABRAPA – Fraude em Alimentos

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No último dia 3 de junho, o blog Food Safety Brasil acompanhou o XV Simpósio Internacional ABRAPA – Fraude em Alimentos e para quem não conseguiu participar, segue um resumo com os destaques das palestras.

A associação buscou trazer uma visão diferenciada do tema com os palestrantes Roy Fenoff que é militar e professor criminal atuando com fraude em alimentos e Donald Schaffner, especialista em microbiologia e modelos matemáticos.

A primeira palestra “Managing food fraud” trouxe as definições de fraude, visando ganho econômico e não necessariamente risco à saúde, bem como as possibilidades mais comuns de fraude: substituição de ingredientes, contaminação, roubos, erros de rotulagem, diluição , falsificação, melhoradores não autorizados. Foram destacadas as diferenças entre Food Fraud, Food Defense, Food Quality e Food Safety, sendo que as duas primeiras são afetadas de forma intencional e as duas últimas não.

Considerando sua formação, Roy trouxe a abordagem de fraude sob os aspectos de um crime, no qual o triângulo principal possui três pilares: um lugar, uma vítima ou alvo e um criminoso. Para entender o crime ou uma fraude devemos entender esses três elementos e para evitá-los também devemos atuar em um dos três.

Quando pensamos em proteger um lugar devemos pensar em instituir um administrador que seja responsável por ele. Quando observamos o alvo é necessário definir um guardião e por fim, no caso do criminoso, existiria a figura do protetor (handler). Usando o exemplo da fraude de carne de cavalo nos produtos de carne bovina, o palestrante demonstrou quem estava no triângulo do crime. Os alvos eram os consumidores, governos e as empresas, o lugar foram as 14 empresas na Europa em 9 países e os guardiões estabelecidos eram as empresas, os governos, as agências reguladoras da Inglaterra e os colaboradores em toda cadeia de suprimentos.

Crimes normalmente acontecem quando existe ou um criminoso potencial ofendido, ou a ausência de um guardião capaz ou um alvo disponível.

O objetivo principal nunca deve ser identificar uma fraude, mas sim PREVENIR que ela aconteça, por isso deve ser feito o mapeamento das oportunidades de fraude e identificação dos melhores guardiões e suas lacunas. A dificuldade em fazer um mapeamento profundo é que a quantidade de dados disponíveis para serem considerados é infinitamente menor do que realmente existem, já que as fraudes são pensadas para não serem descobertas, da mesma forma que sabemos que o cartel de drogas existe, mas não existem dados oficiais disponíveis sobre eles.

Destacou-se que a tecnologia sempre será uma excelente aliada, porém sem a correta identificação das necessidades, haverá um investimento desnecessário, pois nem sempre é possível analisar tudo e todas as possibilidades de fraudes.

Importante sempre pensar em aumentar as formas de vigilância, pois até mesmo o efeito psicológico pode ter efeito na inibição do crime. Por exemplo: uso de câmeras de segurança falsas e a disponibilização de um canal de denúncias anônimas, além de um robusto treinamento de código de ética.

Para finalizar a palestra, Roy deixou um link para participação em uma pesquisa sobre o momento das empresas com relação à fraude.

A segunda palestra – “A microbial risk assessor looks at food fraud”  – trouxe a abordagem de que o princípio de Pareto ou Regra 80/20 também se aplica aos dados conhecidos sobre fraude nos alimentos, sendo que 80% dos efeitos são causados por 20% das causas.

A detecção de fraudes normalmente ocorre por dicas ou denúncias feitas anonimamente, o que torna mais difícil um levantamento confiável.

Para demonstrar o príncipio de Pareto, observam-se os seguintes dados com base nas informações disponíveis na USP Food Fraud Database e FDPI EMA Database:

– 60% das fraudes conhecidas são causadas por 24% dos tipos de produtos: óleos vegetais, especiarias, leite e adoçantes;

– 78% das fraudes conhecidas são causadas por 29% dos tipos de fraudes:  diluição ou substituição e uso de aditivos não aprovados.

Lembrando que normalmente a substituição é realizada de forma parcial, ou seja, o risco não necessariamente estará  presente em toda a produção, o que torna ainda mais difícil sua detecção.

Para finalizar, o palestrante fez um paralelo entre a análise de risco feita para microbiologia e para food fraud:

Avaliacão do risco: deve ser feita com base em dados científicos, avaliação da dimensão do risco.

Comunicação do risco: processo social  e psicológico

Gestão do risco: avaliar o que pode ser e será feito com o risco. Não é uma decisão científica, existem fatores políticos envolvidos.

Considerando o uso de modelos matemáticos para predizer o acontecimento de fraudes, os que apresentam melhores resultados são aqueles em que são conhecidos países de origem e tipos de fraudes, além da interferência do comportamento econômico.

Na segunda parte do simpósio foi apresentado o panorama atual de fraude no mundo e os depoimentos do pessoal das indústrias com as ações que estão sendo feitas.

A consultora Elisabete Martins destacou que fraude de alimentos já é uma prática antiga que ocorre desde a Idade Média especialmente em especiarias, vinhos e azeites. Atualmente azeite e especiarias se mantêm na lista e se juntaram a eles leite, mel e pescados.

Mundialmente dois eventos foram marcantes na mudança de postura com relação à fraude: melamina no leite, que incidiu ainda em food safety com a morte de 6 crianças e o uso da carne de cavalo. Após esse último, grandes mudanças foram feitas no sistema de controle da Europa, além da condenação de duas pessoas. Em 2015 foi criada a unidade nacional de crime alimentar e a operação Opson que investigou produtos com suspeitas de fraudes.

Nos EUA também houve grandes mudanças na abordagem de fraude a partir de 2016, com foco nos requisitos do FSMA. Da mesma forma, as normas GFSI também incluíram requisitos para avaliação de vulnerabilidade e estratégia para prevenção como parte do escopo.

No Brasil, os principais casos divulgados foram o leite com ureia em 2003 e mais recentemente a operação Carne Fraca. As consequências desses eventos foram laboratórios banidos, além de maior controle pelo MAPA com os programas de autocontrole. Também está em tramitação a revisão do código penal e de defesa dos consumidores para que fraude em alimentos se torne crime hediondo.

A palestrante apresentou os resultados de uma pesquisa realizada pela Universidade de Nebraska, na qual foram  apresentados aos consumidores azeites de diferentes origens para que fossem avaliados com relação à aceitação e também disposição de valores a serem pagos. Em um segundo momento, foi disponibilizado um artigo sobre fraude em azeites de origem italiana e novamente os produtos foram apresentados. A percepção dos consumidores mudou principalmente com relação ao produto de origem italiana, porém de forma geral, com relação ao produto também houve redução no valor percebido.  Ou seja, não é somente uma empresa que é afetada em casos de fraude, mas sim o mercado como um todo.

Para finalizar, a palestrante trouxe os principais desafios para um efetivo controle de fraude, destacando-se a importância de um alinhamento “top down” e a conscientização com foco em proteção dos alimentos.

Durante a mesa redonda, a representante da Seara, Marisete Cerutti apresentou os principais tipos de fraudes em carnes, destacando que negligência em processos críticos também caracteriza fraudes:

– Uso de CMS em substituição a carnes de maior valor;

– Uso de água, gelo ou mistura líquida em maior quantidade;

– Divergência de origem, com troca de embalagem ou etiqueta;

– Aditivos não autorizados, como ácido sórbico;

– Uso de corantes para mascarar problemas;

– Rotulagem incorreta como prazo de validade ou origem adulterada;

– Produtos roubados reutilizados, vencidos.

Uma vez que o Brasil é o segundo maior produtor e o maior exportador de aves no mundo, o mercado sofreu grande impacto com as Operações Carne Fraca e Trapaça havendo fechamento de 21 plantas, impedimento de exportação e redução de vendas e de lucro.

A palestrante Cristina Mosquim, da Viva Lácteos, mostrou os impactos no setor de laticínios após as Operações Ouro Branco e Leite Compensado e destacou as principais fraudes para o setor:

– Diluição com água;

– Teor de proteína mascarado;

– Uso de reconstituintes de densidade (para compensar adição de água) com amido, sacarose, cloretos;

– Adição de ureia para manter estabilidade do produto durante longos trajetos;

– Adição de produto Arla 32 – agente redutor com presença de 32,5% de ureia;

– Adição de soro de leite;

– Adição de peróxido de hidrogênio para acerto de acidez, quando o leite não fica adequadamente resfriado.

O representante da Nestlé, Donizeti Cezari, relatou a necessidade da realização do maior recall devido ao impacto da carne de cavalo presente nos produtos. A Nestlé possui mais de 160 mil fornecedores em nível mundial e 695 mil fazendas habilitadas e definiu um programa de prevenção de food fraud em todo o mundo. As compras de matérias primas foram centralizadas em 3 grandes centros e as matérias primas mais suscetíveis à fraude são:

– Carne;

– Peixe;

– Especiarias;

– Ervas;

– Cereais e

– Vegetais.

Dessas, as mais processadas apresentam a maior dificuldade de identificação.

O programa de prevenção da empresa é focado em auditoria de fornecedores e certificações.

A empresa JBS, representada por Maria Emilia Raucci à frente da área de qualidade desde 2015, destacou que o processo de prevenção à fraude teve o envolvimento de todas as áreas da empresa e grande suporte de TI. O desafio de conscientização de mais de 30 mil colaboradores com diversas culturas espalhados no Brasil envolveu treinamentos de pessoas-chaves e um reforço no sistema de rastreabilidade e uso de tecnologia. O sistema atual utilizado por eles é o Decernis e no mínimo semestralmente é atualizado.

Todos os processos são informatizados e todas as unidades acessam simultaneamente a entrada de dados relevantes aos pontos de vulnerabilidade (aproximadamente 30 dados por segundo!!!) através de tablets.

Com o uso de tecnologia “big data” todos os dados são enviados para os servidores onde são feitas avaliações estatísticas.

O foco nos treinamentos foi dado na definição do código de conduta e ética e reforçado que cada tarefa do colaborador tem impacto no alimento que será destinado para sua própria família.

Já o palestrante Edson Souza, do Carrefour, falou sobre as principais fraudes identificadas nos produtos de marca própria:

– Falsificação em atum (uso de diferentes espécies), azeite e vinagre;

– Ocultação em rotulagem de informação de zero glúten em pão de queijo;

– Substituição em requeijão por amido;

– Diluição em leite e álcool;

– Rotulagem indevida em vegetais orgânicos.

Destacou também os pilares do programa de prevenção:

– Rígido controle de qualidade no recebimento (estão disponíveis nos pontos de recebimento fichas técnicas completas contendo inclusive fotos dos produtos com estado de degradação avançado);

– Realização de testes nos produtos de marca própria;

– Coletas nos pontos de venda para análises laboratoriais e

– Treinamento e auditoria nas lojas.

O sistema de rastreabilidade também se apresenta bastante robusto com a disponibilização de QR Codes nas embalagens para que os consumidores tenham acesso a informações técnicas dos produtos,  origem e transporte.

De forma geral, foi possível perceber grande engajamento das empresas com relação ao uso de tecnologias no combate à fraude, ficando ainda a esperança do mesmo esforço no fator humano para garantirmos cada vez confiança nas operações dos produtos brasileiros.

Autora: Nathália Gouveia Federico, engenheira de alimentos

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Nutricionistas: recomendação ou obrigação? Uma análise dos parâmetros da Resolução CFN nº 600, de 25 de fevereiro de 2018

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Em fevereiro de 2018, o Conselho Federal de Nutricionistas publicou a Resolução CFN nº 600 que, conforme descrito no próprio texto, “dispõe sobre a definição das áreas de atuação do nutricionista e suas atribuições, indica parâmetros numéricos mínimos de referência, por área de atuação, para a efetividade dos serviços prestados à sociedade e dá outras providências”.

Entre os temas abordados, a referida norma estabelece a carga horária técnica semanal máxima para nutricionistas e determina parâmetros entre o número de refeições fornecidas e o número de profissionais nutricionistas indicados ao devido atendimento.

Essa resolução causou enorme repercussão, especialmente no mercado de refeições corporativas, por estabelecer como carga horária máxima semanal para o profissional nutricionista 30 horas, aquém das 44 horas semanais que são o parâmetro geral comum da legislação trabalhista brasileira. Além disso, estabeleceu novas referências, que exigem maior número de profissionais em função do número de refeições fornecidas. Como exemplo, os parâmetros da Tabela 1 da Resolução, que engloba refeições coletivas para empresas, instituições, unidades prisionais, comissárias, hotelaria, seguem abaixo.

Tabela 1. Serviços de alimentação coletiva (autogestão e concessão) em: empresas e instituições, hotéis, hotelaria marítima, comissarias, unidades prisionais e similares.

Observações:

1 – Para fins de cálculo do número de grandes refeições, considerar que dez pequenas refeições equivalem a uma grande refeição.

2 – Nas Unidades de Alimentação e Nutrição (UAN), manter nutricionista na supervisão das rotinas de produção e distribuição de refeições, inclusive as que funcionam 24 horas/dia.

3 – Os parâmetros descritos na Tabela 1 se aplicam para os serviços centralizados, descentralizados e mistos.

4 – Em caso de serviço descentralizado, ter também nutricionista responsável pela supervisão da distribuição das refeições na unidade/cliente, conforme os parâmetros numéricos de referência estabelecidos em norma própria do Conselho Regional de Nutricionistas (CRN).

5 – A carga horária técnica semanal refere-se à atuação de cada nutricionista para atendimento às atribuições, considerando a complexidade do serviço.

6 – Os casos não previstos na tabela ficarão a critério da análise do Conselho Regional de Nutricionistas (CRN).

Muito se questionou sobre a viabilidade dessa recomendação pois caso haja realmente a exigência do atendimento a esses parâmetros, a demanda por profissionais nutricionistas aumentará muito, o que, provavelmente, pela lei da oferta e da procura, ensejará em maior remuneração aos profissionais, não necessariamente proporcional à qualidade do trabalho executado. Implicará também no aumento instantâneo do número de postos de trabalho sem aumento proporcional do número de profissionais disponíveis, provavelmente causando maior dificuldade na manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos estabelecimentos, além da dificuldade em preencher esses postos de trabalho, principalmente em regiões remotas, onde há escassez de mão de obra especializada, e em horários não convencionais de trabalho.

Ao mesmo tempo em que essa resolução parece visar garantir melhor controle dos processos de manipulação de alimentos, exigindo maior supervisão técnica, ela aumenta significativamente a demanda por profissionais da classe que esse Conselho representa, os nutricionistas, expandindo os potenciais postos de trabalho desses profissionais. Até que ponto essa ação prioriza uma questão ou outra não é possível precisar, bem como não é possível afirmar que essa ação melhorará a qualidade do atendimento nutricional prestado.

No entanto, em consulta por e-mail realizada por mim ao Conselho Federal de Nutricionistas, visando certificar a obrigatoriedade do atendimento a esses parâmetros e o grau de flexibilização possível, a resposta recebida deixou claro: os parâmetros da Resolução nº 600/2018 são uma recomendação, não havendo obrigatoriedade no atendimento. Segue a resposta emitida por e-mail pelo CFN em 31 de outubro de 2018:

A Resolução CFN nº 600/2018 indica parâmetros numéricos mínimos de referência, por área de atuação, para a efetividade dos serviços prestados à sociedade. Esclarecemos que o número de nutricionistas é recomendado em função das atividades obrigatórias a serem realizadas. Contudo, por serem parâmetros não há uma obrigatoriedade apesar de ser o mínimo esperado.

É competência legal dos Sindicatos de Nutricionistas o estabelecimento de honorários a serem cobrados, orientações sobre carga horária, contrato e condições de trabalho. Para mais esclarecimentos sobre o assunto, recomendamos contato com o sindicato do seu Estado ou a Federação Nacional de Nutricionistas (FNN) (www.fnn.org.br).

Conforme sugestão do CFN, estendendo a consulta à Federação Nacional de Nutricionistas – FNN – sobre a obrigação legal de atender a Resolução nº 600/2018, a resposta recebida da Federação por e-mail em 01 de novembro de 2018 confirma o já informado pelo CFN:

Quem cuida e determina a atuação do profissional são os conselhos regionais e o CFN que é o conselho federal, a FNN cuida das questões trabalhistas.

A informação passada pelo CFN está correta, não existe lei ou legislação que obrigue as empresas a seguir referente ao número de refeição, existe uma recomendação.

Isso possibilitou perceber que essa Resolução CFN nº 600/2018 recomenda parâmetros, no entanto sem obrigatoriedade de atendimento. Isto não exime as empresas do cumprimento de toda a legislação sanitária cabível e do atendimento adequado de todas as atividades pertinentes exclusivamente ao profissional de Nutrição. Então, pelo menos por enquanto, o que se conclui é que a exigência legal (e consequente fiscalização) não se dará sobre os números estabelecidos como parâmetros na Resolução CFN nº 600/2018, mas sim permanecerá sobre as ações sanitárias legais e o atendimento às Boas Práticas de Fabricação e todos os controles regulamentados nas legislações sanitárias pertinentes ao fornecimento de refeições coletivas.

Ana Dias é graduada em Comunicação Social,  com pós-graduação em Marketing, Comunicação e Eventos e cursos em  Gestão da Segurança de Alimentos, Boas Práticas de Fabricação, Ferramentas da Qualidade para Gerenciamento de Processo, Fundamentos da Segurança Alimentar, Normas e Padrões de Qualidade, Boas Práticas no Transporte, Distribuição e Serviços, Análise de Riscos, Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle, dentre outros. 

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Hidrocarbonetos policíclicos aromáticos no Processamento de Produtos lácteos (HPA)

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Henrique B. Rocha1, Simone L. Q. de Souza1,  Renata S. L. Raices1

 

1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos

 

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) a característica lipofílica dos HPAs proporciona que estes sejam dissolvidos rapidamente e transportados por lipoproteínas das membranas celulares. Foi verificado através de estudos toxicológicos e epidemiológicos que certos HPAs são mutagênicos, potencialmente genotóxicos, teratogênicos, imunotóxicos, causadores de doenças cardiovasculares e neurológicas e carcinogênicos para os humanos (sabe-se que mais de  30 HPAs e seus derivados apresentam efeitos carcinogênicos) (WHO, 2005).

De acordo com a Agência de Proteção Ambiental Americana (EPA) 16 HPAs devem ser monitorados e regulados: Acenafteno (Ace), Acenaftileno (Aci), Antraceno (Ant), Benzo(a)antraceno (BaA), Benzo(a)pireno (BaP), Benzo(b) fluoranteno (BbF), Benzo(g,h,i)perileno (BPer), Benzo(k)fluoranteno (BkF), Criseno (Cri), Dibenzo(a,h)antraceno (DBA), Fenantreno (Fen), Fluoranteno (Fla), Fluoreno (Flu), Indeno (1, 2, 3 – cd) pireno (InP), Naftaleno (Naf), e Pireno (Pir). A International Agency for Research on Cancer (IARC) destaca o BaP como cancerígeno ao homem e também tem priorizado uma regulação e o monitoramento de 4HPAs (Criseno, Benzo(b)fluoranteno, Benzo(k)fluoranteno, Benzo(a)pireno) (IARC, 2012).

Sendo o leite e os produtos lácteos extremamente utilizados e importantes na alimentação do homem e em especial, de crianças e idosos em sua dieta, é salutar avaliar o nível de contaminação de tais produtos. E, essa ocorrência vai depender de qual é o tipo de produto, qual o método de processamento e também da forma de preparo para consumo. Sabe-se que o processamento térmico de alta intensidade pode propiciar a pirólise de compostos orgânicos formando HPAs (YEBRA-PIMENTEL et al., 2015).

Em trabalho realizado por Naccari et al. (2011) foi observado que o tratamento térmico utilizado pode propiciar a formação de HPAs. Foi verificada a presença de 16 HPAs em leite integral, pasteurizado, UHT, semidesnatado UHT. Dos 16 investigados nas diferentes amostras de leite, foram encontrados os seguintes HPAs: Fen, Ant, Pir, BaA, Cri, BkF, BaP e BPer. Ao comparar-se a concentração total dos 8 HPAs nas amostras de leite integral UHT (7,75 ng g-1) e leite semi-desnatado UHT (5,94 ng g-1 de leite), verificou-se que no leite integral UHT foram observadas as maiores concentrações de HPAs, provavelmente devido ao maior teor de gordura. Em função dos resultados obtidos, atribuiu-se a presença de Fen, Ant, Pir, BaA, BaP e BPer a diferentes fontes de contaminação, provavelmente relacionadas à poluição ambiental na região, entretanto, Cri e o BkF foram encontrados apenas em amostras de leite pasteurizado e leite UHT, que sofrem tratamento térmico.

No preparo de fórmula infantil, a utilização da técnica de secagem por pulverização com alta temperatura (a temperatura do ar de entrada é 137-204°C e a temperatura do ar de saída é de 104°C) pode levar a um aumento na concentração de HPAs segundo estudo de Cho e Shin (2012) que determinaram a concentração de 7 HPAs no mercado da Coreia. Encontraram BaA, Cri, BbF, BkF, BaP, DBA e BPer, numa faixa de 0,064 a 0,968 ?g kg-1.

Segundo Esposito et al. (2015), 6HPAs foram determinados em Mussarela defumada de Bufalo da Campana. Técnicas diferentes de defumações foram estudadas pelos autores. As técnicas de defumação revelaram alto nível de contaminação. Na casca do queijo mussarela, que foi diretamente exposta a fumaça (queima de madeira), a concentração de B(a)P variou de <0,8 mg kg-1 a 28,2 mg kg-1 e a soma de 4HPAs foi 26,2mg kg-1. Avaliaram também a defumação utilizando para tal papel liso e corrugado, onde observaram que usando o papel liso os resultados foram semelhantes ao do uso da madeira. Entretanto, altas concentrações foram obtidas com o uso de papel corrugado, a saber: 247,9 mg kg-1, 498,7 mg kg-1, 410,7 mg kg-1 e 177,8 mg kg-1 para B(a)P, B(a)A, B(b)F e Cris, respectivamente. Valores estes muito elevados.

Naccari et al. (2008) realizaram um estudo com queijo provolone defumado, onde as concentrações de HPAs no queijo defumado por meio de métodos naturais foi superior (B(a)P: 0,46-1,13 mg kg-1e B(a)A: 1,38-9,29 mg kg-1) aos encontrados em amostras aromatizadas Liquid-smoked (B(a)P: 0,085-0,32 mg kg-1; B(a)A: 1,20-2,98 mg kg-1).

Gul et al. (2015) encontraram B(a)P em 90% e 30% das amostras de queijo defumado e não defumado, respectivamente, em queijo Circassiano defumado e não defumado, de mercados turcos e destacaram que os HPAs de maior concentração e predominância foram Naf e Ace.

A fim de avaliar a interferência da altura em que os queijos permanecem nos defumadores, amostras de queijo Herreño defumado e não defumado foram comparadas. Em todas as amostras de queijos defumados foram detectados BaA, Cri + trifenileno, em especial naquelas onde os queijos foram colocados exatamente na pluma da fumaça (GUILLÉN et al., 2011).

Diante do exposto, é necessário que estudos experimentais com variedades de produtos lácteos em diferentes formas de processamento e de consumo sejam desenvolvidos. Assim como, mais pesquisas no campo da bioquímica (in vivo, in vitro) em conjunto com a química analítica, a fim de  nortear com mais certeza as rotas metabólicas, em que, HPAs de menor ou maior número de anéis aromáticos perfazem o organismo, e até que ponto causam os temidos efeitos carcinogênicos, genotóxicos e mutagênicos ocasionados pela contaminação durante ou após a ingestão de alimentos.

 

 

Referências

CHO H.S.; SHIN H.S. Evaluation of polycyclic aromatic hydrocarbon content and risk assessment for infant formulae in Korea. Food Science Biotechnology, v.2, p.1329-1334, 2012.

ESPOSITO, M. et al. Influence of different smoking techniques on contamination by polycyclic aromatic hydrocarbons in traditional smoked Mozzarella di Bufala Campana. International Journal of Dairy Technology, v. 68, n. 1, p. 97-104, 2015.

GUILLÉN, M. D. et al. Contamination of cheese by polycyclic aromatic hydrocarbons in traditional smoking. Influence of the position in the smokehouse on the contamination level of smoked cheese. Journal of Dairy Science, v. 94, n. 4, p. 1679-1690, 2011.

GUL, O.  et al. Evaluation of polycyclic aromatic hydrocarbons in Circassian cheese by high-performance liquid chromatography with fluorescence detection. Journal of Food Composition and Analysis, v. 37, p. 82-86, 2015.

INTERNATIONAL AGENCY FOR RESEARCH ON CANCER, IARC. Agents Classified by the International Agency for Research on Cancer. Monographs. v. 1-103. Last updated 22 February, 2012.

ISHIZAKI, A. et al. Determination of polycyclic aromatic hydrocarbons in food samples by automated on-line in-tube solid-phase microextraction coupled with high-performance liquid chromatography-fluorescence detection. Journal of Chromatography A, v.1217, p.5555–5563. 2010.

LAPOLE, D. et al. Milk and urine excretion of polycyclic aromatic hydrocarbons and their hydroxylated metabolites after a single oral administration in ruminants. Journal of dairy science, v. 90, n. 6, p. 2624-2629, 2007.

NACCARI, Clara et al. PAHs concentration in heat-treated milk samples. Food research international, v. 44, n. 3, p. 716-724, 2011.

NACCARI, Clara et al. Levels of benzo[a]pyrene and benzo[a]anthracene in smoked “Provola” cheese from Calabria (Italy). Food Additives & Contaminants: Part B, v.q, n.1, p. 78-84, 2008.

PURCARO, G. et al. Overview on polycyclic aromatic hydrocarbons: occurrence, legislation and innovative determination in foods. Talanta, v.105, p. 292-305. 2013.

ROSE, M. et al. Investigation into the formation of PAHs in foods prepared in the home to determine the effects of frying, grilling, barbecuing, toasting and roasting. Food and Chemical Toxicology, v. 78, p. 1-9, 2015.

WHO – WORLD HEATH ORGANIZATION. Summary and conclusions of the sixty-fourth meeting of the joint FAO/WHO Expert Committee on Food Additives. Rome: WHO, 47p., 2005.

YEBRA-PIMENTEL, I. et al. A critical review about the health risk assessment of PAHs and their metabolites in foods. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, v. 55, n. 10, p. 1383-1405, 2015.

 

 

Este texto foi enviado pelo professor Adriano Cruz, da IFRJ. Você também tem um trabalho para compartilhar? Escreve para o Food Safety Brazil: redacao@foodsafetybrazil.org.

5 min leituraHenrique B. Rocha1, Simone L. Q. de Souza1,  Renata S. L. Raices1   1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Programa de Pós-Graduação em Ciência […]

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Perfil dos treinamentos de Boas Práticas de Fabricação aplicados no Brasil

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Em setembro de 2018, realizei uma pesquisa para mapear o perfil dos estilos de treinamentos aplicados nas indústrias e demais processadores de alimentos. Você que acompanha o Blog Food Safety Brazil deve ter visto essa publicação.

Sabemos que os treinamentos de Boas Práticas de Fabricação são obrigatórios e devem ser ministrados no mínimo na integração do colaborador(a) e depois com uma reciclagem anual. É através desses treinamentos que o colaborador(a) conhece ou relembra as regras e procedimentos para garantir a produção de alimentos seguros e atendimento à legislação. Mas cumprir essa agenda de treinamentos é quase sempre um grande desafio para o time de Qualidade e Segurança de Alimentos, pois nem sempre estão à disposição os recursos necessários para que os treinamentos aconteçam da forma planejada. Você já deve ter passado por alguma das seguintes situações: falta de orçamento, falta de tempo disponível para treinamento – já que a prioridade é produção, falta de recursos, falta de engajamento e disposição dos colaboradores (que pensam: “mais uma vez esse treinamento”).

O objetivo da pesquisa era entender o panorama atualizado das formas de treinamentos de BPF utilizadas hoje pelas indústrias de alimentos no Brasil e como esses treinamentos estão sendo aplicados:  quais as metodologias, as formas de avaliação do conhecimento, sua eficácia e se existe inovação ou não. Em um momento no mundo em que a tecnologia é dominante e indispensável, será que as empresas que trabalham com alimentos estão fazendo uso dela e conseguindo inovar na sua forma de capacitar seus colaboradores? O resultado da pesquisa revelou que não. Ainda somos muito conservadores quando falamos de capacitação dos nossos times. É o que vamos revelar abaixo, com o resultado da pesquisa.

Mapeando o perfil de pesquisados, dos 170 respondentes, 80,5% eram profissionais da indústria de alimentos, 12,8% consultores ou auditores, 6,12% relacionados a serviços de alimentação e 0,61% vendas. Em relação ao número de funcionários, empresas com até 100 funcionários foram as que tiveram maior número de respondentes, seguidas pelas com mais de 1000 funcionários.

Figura 1 – Número de funcionários das empresas participantes

Quando questionados sobre a forma utilizada nos treinamentos nos últimos 2 anos, 46% dos respondentes afirmaram que utilizam métodos tradicionais, em sala de aula, com ou sem dinâmicas, para realizar os treinamentos de Boas Práticas de Fabricação. Aproximadamente 33% realizam atividades interativas, com dinâmicas, teatro e vídeos. 9,11% incluem palestras ou cartilhas educativas para capacitar seus times, e somente 3,4% utilizam métodos que envolvam tecnologia (cursos online, EAD, jogos, etc).

Figura 2 – Formas de treinamentos

Foi dada a opção para as pessoas marcarem se usavam mais de um método na capacitação dos times. A maioria dos participantes da pesquisa, 58%, relataram que utilizam métodos combinados. Também foram citadas outras formas de treinamentos como dinâmicas de grupo, quizz com brindes, treinamento on the job, Diálogos de Qualidade e Segurança de Alimentos.

A carga horária, em sua maioria (55%), é de 1 hora e são realizados na integração do funcionário, com reciclagem anual.

Figura 3 – Carga horária e frequência dos treinamentos

Esses dados nos mostram que o modelo principal utilizado nas empresas que processam alimentos é o tradicional: treinamento anual, em sala de aula, com duração de 1 hora, usando recursos extras como dinâmicas, vídeos, jogos. A média de participação nos treinamentos foi de 88%, variando entre 30% a 100%. Isso demonstra que algumas empresas têm mais dificuldade que outras para conseguir realizar os treinamentos de BPF. A gestão dos treinamentos é feita majoritariamente pelo time de Qualidade (58%), seguido por RH (25%), depois com gestão compartilhada entre Qualidade e RH (14%) e por último por terceiros (4%). Na maioria das respostas, o controle dos treinamentos é manual, com uso de planilhas Excel (89%). Somente 11% dos respondentes utilizam algum tipo de software para fazer a gestão dos treinamentos. Alguns dos softwares citados foram JoinRH, RM, Adata, RH, Fortes RH, Humanos, SAP, Senior, Stratws.

Quanto à avaliação de eficácia, esta é feita na sua maioria por meio de prova individual ou auditoria em chão de fábrica. 19% não realizam avaliação de eficácia.

Figura 4  – Avaliação da  Eficácia

Certamente hoje talvez esse seja o modelo possível de acontecer, considerando os obstáculos que todos que trabalham com qualidade e segurança de alimentos enfrentam quando precisam capacitar o time de manufatura (faltam recursos, disponibilidade de tempo, orçamento). A prioridade é a produção, e retirar um colaborador da linha de produção para participar de um treinamento exige muita negociação. Para conseguir atender o plano anual de treinamento, portanto, este é compactado para o tempo de uma hora, o que teoricamente teria menor impacto na produção. Mas como fica a eficiência dos treinamentos? Será que é afetada? E no dia-a-dia da fábrica, será que existem desvios por falta de capacitação dos times? Será que a falta de capacitação dos colaboradores provoca outros impactos na produção com maiores perdas e maiores custos? Ficam as reflexões.

Todos os modelos abordados na pesquisa cumprem o objetivo de levar conteúdo relevante para os colaboradores e cumprir o plano anual de treinamentos, mas também temos a expectativa de que promova uma transformação cultural na empresa relacionada aos requisitos de Qualidade e Segurança de Alimentos.  Por isso, vimos que muitas empresas usam diferentes recursos para capturar a atenção dos colaboradores. Foram comentados o uso de vídeos, quiz, jogos, dinâmicas. Mas para mim, o uso desses modelos significa que estamos fazendo mais do mesmo, e não realmente inovando. Considerando que estamos vivenciando uma revolução tecnológica, falando de Educação 3.0 e Indústria 4.0, estamos ainda longe de realmente inovar na forma de capacitar os colaboradores na indústria de alimentos.

Estamos ouvindo falar cada vez mais de uso de Inteligência Artificial, Robótica, Realidade Virtual Aumentada, Educação Online na educação. Outros modelos que já estão sendo utilizados é Ensino Híbrido e U-Lead: Human-Machine Interactions, além da Gamificação, que tem um poder gigante de criar engajamento e participação ativa.

Uma reflexão que faço em relação ao resultado dessa pesquisa é que nós, profissionais da área de Qualidade e Segurança de Alimentos, precisamos influenciar cada vez mais a alta direção para investir em capacitação dos seus times. Qualquer valor investido em treinamento não pode ser considerado como gasto, mas sim como investimento. O retorno virá na forma de maior produtividade, redução de perdas, redução de retrabalho, redução do risco de um recall, maior satisfação dos clientes e consumidores, atendimento às leis e organismos regulamentadores. Devemos mostrar esses ganhos e reforçar nosso poder de influência para conseguir os recursos necessários para os treinamentos de Boas Práticas de Fabricação e real qualificação dos colaboradores.

E agora convido vocês à ação. Para continuar a evoluir na jornada de capacitação em Boas Práticas de Fabricação precisamos nos reinventar todos os dias. E a primeira ação que os convido a fazer é um assessment (verificação) da eficácia dos treinamentos de BPF em sua empresa. Avaliem como está sendo sentido pelos colaboradores. E uma dica é começar pelos líderes. Esteja aberto aos feedbacks positivos e negativos. Escute o seu cliente. Você pode ter boas surpresas ou bons insights. Algumas perguntas que você pode fazer: o que você acha dos treinamentos de BPF? Você teria alguma sugestão de como podemos melhorar? Inclua o colaborador no processo de melhoria dos treinamentos de BPF. Faça com ele. Em paralelo, busque conhecer mais as novas metodologias aplicadas à educação e como poderiam ser utilizadas na sua empresa. Eu tenho certeza de que você vai aprender coisas novas e poderá aplicá-las nas próximas turmas de formação em Boas Práticas de Fabricação em sua empresa. Enjoy!

Lillian Glory é engenheira de alimentos, mestre em Tecnologia de Alimentos e trabalha como gestora de Qualidade e Food Safety há 20 anos em grandes indústrias nacionais e multinacionais. 

5 min leituraEm setembro de 2018, realizei uma pesquisa para mapear o perfil dos estilos de treinamentos aplicados nas indústrias e demais processadores de alimentos. Você que acompanha o Blog Food Safety […]

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