3 min leitura
2

Como interpretar laudos de dioxinas e PCBs? – Parte 2 de 2

3 min leitura

Na semana passada começamos a falar sobre este tema (laudos de dioxinas e PCBs). Leia aqui antes de prosseguir.

Neste post vamos focar a interpretação de laudos voltados ao mercado feed (produtos para alimentação de animais de criação), incluindo legislações europeias.

Segue novamente um exemplo de laudos de dioxinas e PCBs:

IN nº 1 (MAPA), de 23/01/2018 – Limites máximos de dioxinas e bifenilas policloradas sob a forma de dioxinas em produtos destinados à alimentação animal

Esta instrução (ver na íntegra aqui) traz o seguinte padrão:

Contaminantes

Produtos destinados à alimentação animal

Limite máximo em ng PCDD/F-TEQ-OMS/kg de alimento1 para um teor de umidade de 12 %

Dioxinas [soma das dibenzo-para-dioxinas policloradas (PCDD) e dos dibenzofuranos policlorados (PCDF), expressa em equivalente tóxico OMS com base nos fatores de equivalência tóxica da OMS (TEF-OMS)

Ingredientes de origem vegetal, incluindo os óleos vegetais e seus subprodutos

0,75 ng TEQ PCDD/F OMS/kg

Ingredientes para alimentação animal de origem mineral

0,75 ng TEQ PCDD/F OMS/kg

Para avaliar o laudo acima, avaliamos o OMS (2005)-PCDD/F TEQ upper-bound.

O resultado do laudo foi 0,1465 ng/kg, inferior a 0,75 ng/kg. Neste caso, o produto está dentro do padrão (seja para ingredientes de origem vegetal ou mineral).

Directive 2002/32/EC of the European Parliament and of the Council of 7 May 2002 on undesirable substances in animal feed – Council statement

A legislação do European Commission (ver aqui na íntegra) é um pouco mais complexa que a do MAPA. Há diferentes padrões conforme o tipo de feed. Seguem abaixo padrões para feeds de origem vegetal e óleos:

Observação: o mesmo padrão é seguido também no GMP+ FSA em seu documento TS 1.5.

Substância indesejável

Produtos destinados à alimentação animal

Limite máximo em mg/kg (ppm) relativo a produtos para alimentação animal com teor de umidade de 12 %

Dioxinas (soma de dibezo-para-dioxinas policloradas (PCDD’s) e dibenzofuranos policlorados (PCDF’s) expressa em equivalente tóxico OMS com base nos fatores de equivalência tóxica da OMS (TEF-OMS)

Feed materials de origem vegetal, exceto óleos vegetais e seus subprodutos

0,75 ng WHO-PCDD/ F-TEQ/kg

Óleos vegetais e seus subprodutos

0,75 ng WHO-PCDD/ F-TEQ/kg

Soma de dioxinas e PCB’s semelhantes a dioxinas (soma de dibezo-para-dioxinas policloradas (PCDD’s), dibenzofuranos policlorados (PCDF’s) e bifenilas policloradas (PCB’s) expressa em equivalente tóxico OMS com base nos fatores de equivalência tóxica da OMS (TEF-OMS)

Feed materials de origem vegetal, exceto óleos vegetais e seus subprodutos

1,25 ng WHO-PCDD/ F-TEQ/kg

Óleos vegetais e seus subprodutos

1,5 ng WHO-PCDD/ F-TEQ/kg

Começando com o padrão de dioxinas, segue o mesmo do exemplo anterior. O resultado está dentro do padrão (abaixo de 0,75 ng/kg).

Sobre o parâmetro soma de dioxinas e PCBs semelhantes a dioxinas, avaliamos o OMS (2005)-PCDD/F+PCB TEQ upper-bound.

O resultado do laudo foi 0,1465 ng/kg, inferior a 1,25 ng/kg (considerando feed material de origem vegetal). Neste caso, o produto está dentro do padrão.

Quer ler mais sobre interpretação de laudos? Dê uma olhada nos seguintes posts:

– Laudos de análises microbiológicas: você sabe interpretar os resultados? [link]
– Dúvida de leitor: unidade de medida em laudos de análises microbiológicas [link]
– Tudo o que você sempre quis saber sobre laudos de migração de embalagens de alimentos [link]

3 min leituraNa semana passada começamos a falar sobre este tema (laudos de dioxinas e PCBs). Leia aqui antes de prosseguir. Neste post vamos focar a interpretação de laudos voltados ao mercado […]

3 min leitura
0

Fatores antinutricionais sob a ótica da segurança de alimentos

3 min leitura

Apesar de inúmeros benefícios, alguns alimentos possuem fatores antinutricionais (FANs), como metabólitos secundários, que nos alimentos de origem vegetal atuam como mecanismo de defesa contra fungos, bactérias, insetos e animais. Estes fatores são chamados de antinutricionais, pois interferem negativamente no processo de digestão e absorção de nutrientes presentes nos alimentos e podem, até mesmo, serem tóxicos, dependendo da quantidade ingerida. O efeito tóxico ou antinutricional pode ocorrer quando os alimentos que os possuem são consumidos crus, sem cozimento.

Grãos, raízes, leguminosas e cereais são aliados importantes da dieta, mas possuem antinutrientes incluindo saponinas, taninos, fitatos, compostos polifenólicos e inibidores de protease. Esses componentes interferem no valor nutricional dos alimentos, reduzindo a absorção de vitaminas e minerais, principalmente cálcio e ferro. Também dificultam a digestibilidade de proteínas e carboidratos, causando toxicidade e distúrbios de saúde e flatulência quando presentes e ingeridos em altas concentrações. Dessa forma, o tratamento térmico é uma das técnicas usadas para reduzir ou inativar os antinutrientes indesejáveis, sob a ótica da segurança.

Na figura abaixo, são apresentados alguns fatores antinutricionais, os alimentos que os contêm e seus principais efeitos:


Os cianetos e saponinas, encontrados em vegetais como grão de bico, ervilhas e feijões, podem ser reduzidos com o processamento a quente e cozimento, mas a inativação desses inibidores é dependente do tempo e temperatura adotados durante o tratamento térmico. Já os inibidores de proteases, como a tripsina, podem ser reduzidos de forma mais eficaz ao se utilizar o método a vapor, a 100°C.

Os oxalatos, encontrados principalmente nas leguminosas, nozes e diversas farinhas à base de grãos, podem ser eliminados com métodos úmidos, com o uso de remolho, fervura e cozimento a vapor. O elevado consumo de oxalato é preocupante, visto que o ácido oxálico pode formar sais insolúveis com cálcio e magnésio, promovendo a formação de cálculos renais.

O remolho em água, previamente ao cozimento, também é uma forma de reduzir os FANs, uma vez que muitos deles são hidrossolúveis e, dessa forma, eliminados.

Portanto, uma alimentação diária variada aliada às técnicas mencionadas, é de suma importância para obtenção de uma dieta segura, evitando o acúmulo dos antinutrientes no organismo.

Autoras: Patrícia Cândido da Silva, Nataly Almeida Marques e Eliane M. Furtado Martins

Leia também: 

Quais são os perigos de uma alimentação à base de plantas?

Referências:

ALSALMAN, F.B.; RAMASWAMY, H. Reduction in soaking time and anti-nutritional factors by high pressure processing of chickpeas. Journal of Food Science and Technology, v. 57, n. 7, p. 2572–2585, 2020.

CHAI, W.; LIEBMAN, M. Oxalate content of legumes, nuts and grain-based flours. Journal of Food Composition and Analysis, v. 18, n. 7, p.723-729, 2005.

DEL-VECHI, G.; CORRÊA, A.D.; ABREU, C.M.P.; SANTOS, C.D.  Efeito do tratamento térmico em sementes de abóboras (Cucurbita spp.) sobre os níveis de fatores antinutricionais e/ou tóxicos. Ciências Agrotecnologicas, v. 29, n.2, p. 369-376, 2004.

GEMEDE, H. F.; RETTA, N. Antinutritional Factors in Plant Foods: Potential Health Benefits and Adverse Effects. International Journal of Nutrition and Food Sciences, v. 3, n. 4, p. 284, 2014.

HIGASHIJIMA, N. S.; LUCCA, A.; REBIZZ, L. R. H.; REBIZZI, L. M. H. Fatores antinutricionais na alimentação humana. Segurança Alimentar e Nutricional, v. 27, 2020.

SAMTIYA, M.; ALUKO, R.E.; DHEWA, T. Plant food anti-nutritional factors and their reduction strategies: an overview. Food Production Processing and Nutrition, v. 2, p. 6, 2020. 

WANG, N.; LEWIS, M.J.; BRENNAN, J.G.; WESTBY, A. Effect of processing methods on nutrients and anti-nutritional factors in cowpea. Food chemistry, v.58, n.2, p.59-68, 1997.

3 min leituraApesar de inúmeros benefícios, alguns alimentos possuem fatores antinutricionais (FANs), como metabólitos secundários, que nos alimentos de origem vegetal atuam como mecanismo de defesa contra fungos, bactérias, insetos e animais. […]

4 min leitura
1

Como interpretar laudos de dioxinas e PCBs? – Parte 1 de 2

4 min leitura

Você já leu um laudo de análise laboratorial de dioxinas? Já se perdeu naquela sopa de letrinhas e números? Pois bem… fique tranquilo que o Food Safety Brazil irá ajudá-lo a desvendar este laudo.

Uma breve introdução sobre dioxinas e PCBs:

  • Dioxinas: É o nome genérico dado a um conjunto de dibenzo-P-dioxinas policloradas (PCDDs) e dibenzo-furanos policlorados (PCDFs). Apresentam-se sob um total de 210 formas (congêneros), sendo apenas 17 tóxicos ou carcinogênicos (aqueles contendo átomo de cloro na posição 2, 3, 7 e 8). São subprodutos da combustão incompleta de matérias orgânicas contendo halogênios e fonte de cloro.
  • PCBs:  É a sigla de Bifenilas Policloradas, um grupo de compostos produzidos até a década de 1980 para uso industrial. São exemplos de usos de PCBs: fluidos dielétricos em transformadores, condensadores e óleos de corte, lubrificantes hidráulicos, lubrificantes hidráulicos, tintas e adesivos.

Dioxinas e PCBs são substâncias químicas diferentes com propriedades e características distintas. Em suma, temos:

Falando especificamente dos PCBs, eles compreendem diferentes tipos de moléculas semelhantes, ao todo 209 congêneres, mas que variam a depender da quantidade de átomos de cloro ligados às cadeias aromáticas e da posição destes átomos. Alguns deles estão abaixo:

Quem estudou química orgânica já deve saber que pequenas mudanças em uma cadeia geram grandes diferenças. E é exatamente o que ocorre aqui. Alguns PCBs induzem respostas bioquímicas e tóxicas semelhantes às das dioxinas. A estas moléculas convencionou-se denominar: dioxin-like PCBs (em bom português: PCBs semelhantes a dioxinas). São eles:  PCB 77, 81, 105, 114, 118, 123, 126, 156, 157, 167, 169 e 189.

Os PCBs que não induzem respostas bioquímicas e tóxicas semelhantes às das dioxinas são denominados non-dioxin-like PCBs (PCBs não semelhantes a dioxinas). São todos os congêneros, exceto os citados acima.

E feita esta introdução, segue abaixo um exemplo de laudo de análise:

Observe o primeiro item: 1, 2, 3, 4, 6, 7, 8-HeptaCDD. Trata-se de uma dibenzo-P-dioxina policlorada (PCDD) — ou seja, um composto pertencente ao grupo das dioxinas — contendo 7 átomos de cloro, distribuídos nas posições 1, 2, 3, 4, 6, 7 e 8.

Outro exemplo, o quinto item: 1, 2, 3, 4, 7, 8-HexaCDF. Trata-se de um dibenzo-furano policlorado — ou seja, um composto pertencente ao grupo das dioxinas — contendo 6 átomos de cloro, distribuídos nas posições 1, 2, 3, 4, 7 e 8.

Vamos avançar.
Há uma legislação brasileira prevendo padrões de dioxinas e PCBs em alimentos. Trata-se da IN nº 160/2022 (Anvisa).
Segue o trecho dela que trata deste tema:

 

Por exemplo, para carne bovina, a legislação prevê limite máximo tolerável (nível aceitável):

  • soma de PCDD, PCDF e PCB: 4,0 pg/g
  • soma de PCDD e PCDF: 2,5 pg/g

 

Para avaliar o laudo, vamos primeiro converter a unidade de medida do padrão, de pg/g (que é o padrão da legislação) para ng/kg (que é o padrão do laudo). Assim, fica… a mesma coisa!

  • soma de PCDD, PCDF e PCB: 4,0 ng/kg
  • soma de PCDD e PCDF: 2,5 ng/kg

 

Agora sim, onde encontrar os parâmetros abaixo no laudo? Veja abaixo:

  • soma de PCDD, PCDF e PCB = OMS (2005)-PCDD/F+PCB TEQ upper-bound
  • soma de PCDD e PCDF =OMS (2005)-PCDD/F TEQ upper-bound

 

Ou seja, se fôssemos considerar o laudo acima*, o produto analisado estaria dentro do padrão:

  • soma de PCDD, PCDF e PCB: 0,02121 ng/kg (< 4,0 ng/kg)
  • soma de PCDD e PCDF: 0,1465 ng/kg (< 2,5 ng/kg)

Nota: O laudo, em particular, trata de uma análise de produto de origem vegetal. O MC12% na frente dos resultados indica isso. O padrão para produtos de origem animal é em função do teor de gordura do produto. Então, considere o explicado acima como uma aplicação teórica.

 

E aí? Ajudei a entender melhor?

Em breve, escreverei outro post voltado a produtos para alimentação animal.

4 min leituraVocê já leu um laudo de análise laboratorial de dioxinas? Já se perdeu naquela sopa de letrinhas e números? Pois bem… fique tranquilo que o Food Safety Brazil irá ajudá-lo […]

7 min leitura
5

Perigos radiológicos em alimentos

7 min leitura

Os perigos radiológicos em alimentos provêm de radioisótopos, também chamados de radionuclídeos. São átomos sujeitos ao processo de decaimento radioativo, liberando assim radioatividade através de partículas alfa, beta e gama. Eventualmente, podem chegar à cadeia produtiva de alimentos, expondo as pessoas à contaminação e gerando efeitos adversos à saúde, cuja gravidade dependerá especificamente do radioisótopo e do grau de radiação ao qual um indivíduo foi exposto.

No entanto, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), os perigos radiológicos são incomuns na cadeia produtiva de alimentos. A grande questão é que quando ocorrem, podem representar um risco de elevada significância, principalmente se a exposição ao risco for prolongada ao longo do tempo.

A ingestão de alimentos ou água com radioisótopos leva a uma contaminação interna na qual o material radioativo irá se depositar no organismo, podendo ser transportado para vários locais, tais como a medula óssea, onde continua a emitir radiação, aumentando a exposição da pessoa à radiação, até ser removido ou emitir toda sua energia (desintegração).

A contaminação interna com radioisótopos é mais difícil de remover do que a contaminação externa.

O consumo de alimentos contaminados com radioisótopos aumenta a quantidade de radioatividade a qual a pessoa é exposta, o que pode provocar efeitos agudos como vermelhidão da pele (eritemas), queda de cabelo e síndrome de radiação aguda, que inclui sintomas iniciais como náuseas, vômitos, dor de cabeça e diarreia. Com o tempo, pode chegar a uma perda de apetite, fadiga e possivelmente convulsões e coma. Em alguns casos, pode provocar doenças graves, inclusive alguns tipos de câncer, como na tireoide e leucemia.

A maioria dos elementos radioativos naturais tem sua origem na crosta terrestre como o Potássio-40 (K-40), Urânio-238 (U-238) e Tório-232 (Th-232), que são elementos radioativos primitivos, ou seja, estão presentes desde a formação da Terra há cerca de 4,6 bilhões de anos.

A população mundial está exposta diariamente à radiação natural, que vem do espaço através dos raios cósmicos e de materiais radioativos que ocorrem no solo, na água e no ar, quase sempre, em quantidades ínfimas e inócuas à saúde.

Porém, a radiação pode ocorrer também devido aos efeitos antrópicos, tendo como exemplos os acidentes nucleares ocorridos em Chernobyl, na Ucrânia, em 1986, quando esta pertencia à URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas) e em Fukushima no Japão em 2011. Em consequência, a superfície de alimentos como cereais, frutas e legumes ou destinados para alimentação de animais para leite ou corte, pode se tornar radioativa devido à deposição de poeira com radioisótopos ou da água da chuva contaminada.

Além do efeito imediato, os locais onde houve exposição aos elementos radioativos se tornarão áreas de risco, uma vez que o solo ficará contaminado. Com o tempo, a radioatividade também poderá ser detectada nos alimentos porque os radioisótopos do solo serão absorvidos pelas plantas, e em seguida, pelos animais que se alimentam delas, chegando à carne, ao leite e derivados, portanto, à cadeia alimentar humana.

O Césio-137 tem um período de semidesintegração de 30 anos, e por isso afeta áreas agricultáveis durante décadas.

Como exemplo, ainda citando o fatídico acidente de Chernobyl, a nuvem de poeira radioativa cujos principais radioisótopos produzidos na reação de fissão (divisão) nuclear do Urânio-235 (combustível nuclear do reator) foram o Iodo-131, Césio-137, Césio-134 e o Estrôncio-90, varreu a Europa e causou a precipitação destes radioisótopos em diversos países da Europa e da Ásia. Isto é mostrado no mapa a seguir, com graves perturbações na produção e no comércio de produtos alimentícios.

Mapa com a nuvem de radiação que envolveu a Europa durante o desastre de Chernobyl em 1986.

Na ocasião do acidente em Chernobyl, o Brasil havia importado carne bovina e leite de países que estavam dentro do raio atingido pela poeira radioativa, como a Alemanha, Holanda e França. Descobriu-se mais tarde que estes alimentos  estavam contaminados com os radioisótopos Césio-137 e Césio-134, potencialmente cancerígenos.

Jornal Correio do Povo de 21 de janeiro de 1988.

Já no acidente mais recente em Fukushima não houve impactos no Brasil, uma vez que não somos um importador habitual de alimentos do Japão. No entanto, naquele país diversos alimentos como carne, chá, cogumelos e verduras cultivados nas proximidades da região de Fukushima, foram identificados com níveis de radioatividade acima do permitido para o consumo, inclusive arroz, alimento tradicional da culinária japonesa, numa fazenda a 60 quilômetros da instalação nuclear.

A experiência em Fukushima mostrou existir dificuldades para rastrear a radiação espalhada pela chuva e o vento, sendo que governos locais em áreas rurais montaram centros de teste para evitar a distribuição de produtos contaminados e a própria população começou a medir radiação por conta própria, usando aparelhos simples.

Jornal Hoje, G1 de 19 de março de 2011.

Seja por origem natural ou antrópica, a água potável ou mineral pode absorver a radioatividade, e assim, contaminar peixes e frutos do mar. Por isso, estima-se que os frutos do mar são os alimentos com radiação natural mais concentrada, e, também, com grande probabilidade de exposição aos acidentes nucleares.

CNN Brasil de 26 de julho de 2023.

Por isso, na análise de perigos radiológicos em alimentos num plano de HACCP, há que se considerar a probabilidade do risco em cada região produtora e em cada alimento específico, levando em consideração a rastreabilidade de sua origem para poder avaliar o histórico de acidentes nucleares na região (lembrando que partículas radioativas podem permanecer ativas por décadas), a proximidade a locais de guarda de lixo nuclear, assim como áreas geográficas onde existam depósitos naturais de minerais radioativos como os uraníferos ou de tório.

Localição georgráfica no Brasil de jazidas de minérios radioativos. 

No entanto, apelando para a obviedade, veja que um peixe proveniente do mar do Japão próximo à região costeira de Fukushima, terá uma probabilidade de contaminação radioativa muito maior que um outro que foi pescado na costa brasileira. Analogamente, grãos provenientes da Ucrânia, onde ocorreu o acidente de Chernobyl, terão uma probabilidade maior do que aqueles cultivados no cerrado brasileiro.

Não há no Brasil uma legislação ou referências específicas para níveis máximos permitidos de contaminação radioativa em alimentos, no entanto, há para água destinada ao consumo humano.

A Portaria GM/ MS Nº 888 do Ministério da Saúde, no Art. 37 dita que “os níveis de triagem usados na avaliação da potabilidade da água, do ponto de vista radiológico, são os valores de concentração de atividade que não excedam 0,5 Bq/L para atividade alfa total e 1,0 Bq/L para beta total, portaria esta que foi analisada no artigo “Análise da nova Portaria MS 888/21 sobre controle e vigilância da água para consumo humano“.

Monitorar água, em especial proveniente de poços artesianos em regiões onde há probabilidade natural de radioisótopos, é muito relevante, e logicamente, caso os níveis radiológicos ultrapassem o que está definido na legislação, o consumo deve ser vetado.

Neste tema é relevante um esclarecimento sobre irradiação, que não deve ser confundida com contaminação radiológica

Numa contaminação radioativa, como visto, há presença de um isótopo radioativo indesejável que é capaz de emitir radiação (alfa, beta e gama) de forma espontânea a partir de seus núcleos instáveis e, assim, causar danos à saúde. Porém, em alimentos que passaram por um processo de irradiação não, pois trata-se da exposição deste alimento à radiação, porém, sem contato direto com os elementos radioativos.

A tecnologia de irradiação de alimentos foi aprovada pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) como segura e é utilizada em cerca de 50 países. Estima-se que o volume de alimentos tratados em todo o mundo por esta tecnologia exceda 500 mil toneladas anualmente, sendo um método eficaz para melhorar a qualidade de produtos alimentícios reduzindo cargas microbianas e aumentando a shelf life.

Esse processo é bastante utilizado em frutas frescas, grãos e vegetais para prevenir o brotamento, retardar a maturação e aumentar o tempo de conservação, uma vez que os alimentos são submetidos a uma quantidade minuciosamente controlada e precisa de radiação. Sugiro neste tema a leitura dos artigos:

  1. Radioatividade do bem: entenda a técnica de irradiação de alimentos
  2. Por uma cultura de segurança de alimentos baseada na ciência: mitos sobre alimentos processados e irradiação

A irradiação não faz com que o alimento se torne radioativo, não compromete a qualidade nutricional e não altera sabor, textura ou aparência do alimento. Além disso, o uso de radiação ionizante é uma opção com menor impacto ambiental, pois não deixa resíduos.

Um alimento irradiado praticamente não sofre qualquer alteração física ou organoléptica, por isso é muito difícil dizer se o alimento foi ou não irradiado.

No Brasil, a regulamentação sobre alimentos irradiados é definida pelo Decreto nº 72.718, de 29 de agosto de 1973, que estabelece normas gerais sobre irradiação de alimentos e pela Resolução ANVISARDC nº 21, de 26 de janeiro de 2001, que aprovou o Regulamento Técnico para Irradiação de Alimentos, estabelecendo os requisitos gerais para o uso da irradiação de alimentos com vistas à qualidade sanitária do produto final. Lembramos que deve sempre haver transparência ao consumidor, pois nos rótulos dos alimentos que passaram por este processo deve constar a frase “alimento tratado por processo de irradiação”, como visto no artigo “Anvisa entende que alimento que passa por raios X deve ser rotulado como irradiado“.

Logomarca utilizada para alimentos irradiados.

Espero que o artigo tenha ajudado a perceber que o tema dos riscos radiológicos não é um bicho de sete cabeças, mas que precisa ser visto com atenção, considerando a necessidade de uma boa análise de riscos em relação à probabilidade de contaminação e rastreabilidade da água e insumos utilizados na cadeia produtiva de alimentos.

Deixe sua opinião, complemente com sua experiência e seu conhecimento, isso é muito importante para nós!

Leia também:

Irradiação e perigos radiológicos em alimentos

FDA permite o uso de irradiação em crustáceos para controle de patógenos de origem alimentar

Perigos radiológicos foram levantados no seu plano HACCP?

7 min leituraOs perigos radiológicos em alimentos provêm de radioisótopos, também chamados de radionuclídeos. São átomos sujeitos ao processo de decaimento radioativo, liberando assim radioatividade através de partículas alfa, beta e gama. […]

4 min leitura
0

Temos que nos preocupar com o risco de nanoplásticos na alimentação?

4 min leitura

Podemos dividir a história humana em períodos, como a Idade do Cobre (de 3500 a.C. até 1200 a.C.), do Bronze (de 3000 a.C. até 700 a.C.), do Ferro (de 1200 a.C. até 1000 a.C.), baseando-se no avanço tecnológico que levou à utilização destes materiais na produção de ferramentas e utensílios, e se continuássemos usando este raciocínio, certamente, agora estaríamos na “Idade do Plástico”.

Chamamos de plásticos uma ampla gama de materiais sintéticos ou semissintéticos que usam polímeros como ingrediente principal, sendo este material muito versátil, permitindo que sejam moldados, extrudados ou prensados em objetos sólidos de várias formas e úteis a muitas finalidades.

Existem, portanto, muitos tipos de plásticos, tais como:

  • PET (Tereftalato de polietileno);
  • PEAD (Polietileno de alta densidade);
  • PVC (Policloreto de Vinila ou cloreto de vinila);
  • PEBD (Polietileno de baixa densidade);
  • PP (Polipropileno);
  • PS (Poliestireno);
  • Outros plásticos.

Não há quem ao longo do dia não utilize um ou muitos objetos de plástico, a começar pela escova de dentes logo no início da manhã, pentes, canetas, brinquedos, baldes, vasilhames, partes da TV, dos automóveis, eletrodomésticos, calçados e milhares de outros exemplos.

Trazendo para a realidade da indústria de alimentos e bebidas, os plásticos predominam como material de embalagem devido a sua versatilidade, como é o caso do polietileno (PE) que é ideal para sacos e bobinas, tem ótima resistência, excelente brilho e transparência e fixa muito bem a solda. Da mesma forma, o polipropileno biorientado (BOPP), que é uma variação do PP, porém com ótima barreira à umidade, oxigênio e gorduras, é bastante usado em embalagens flexíveis de salgadinhos, biscoitos, macarrão e mistura para bolo. Claro que não podemos esquecer o famoso polietileno tereftalato (PET), que é reconhecido pela sua leveza, transparência, resistência mecânica, química e baixo custo, e nem precisa dizer, é muito usado em bebidas como sucos e refrigerantes.

Dados indicam que são produzidas mais de 400 milhões de toneladas de plástico ao redor do mundo anualmente.

Justamente por isso, o plástico pode ser considerado uma marca de nossa atual civilização, e claro, no futuro arqueólogos que escavarem este período irão encontrar muitos objetos feitos com este material. Eles encontrarão também os resíduos que estamos deixando por aí, pois apesar da grande maioria dos polímeros plásticos poder ser reciclada, infelizmente, no pós-uso, ainda seguem para lixões ou corpos d´água, terminando em rios, mares e oceanos.

Diante do uso tão intenso do plástico, surge uma nova preocupação sobre os seus resíduos: eles podem causar danos à saúde humana?

Mas como poderiam se são um material inerte?

Uma forma que vem sendo considerada é via alimentação, por meio da água e dos alimentos.

Em uma recente edição da revista PNAS de 2024, da Universidade de Columbia, Nova York, EUA, os autores descrevem o desenvolvimento de um novo método de espectroscopia que é capaz de detectar partículas de nanoplásticos, ou seja, menores que 1 µm, bem como pode diferenciar sete tipos de polímeros.

Aplicando esta nova tecnologia de análise à água engarrafada, encontraram entre 130 mil e 240 mil fragmentos em um único litro de água, dos quais 90% eram nanoplásticos.

Já em uma outra publicação recente de 2024, pesquisadores da Academia Chinesa de Pesquisa em Ciências Ambientais analisaram microplásticos em tecidos humanos de pulmão, intestino e amígdalas. Suas conclusões foram publicadas na Science of the Total Environment. Em resumo, a pesquisa chinesa coletou amostras de 41 pessoas e com o uso de espectroscopia infravermelha direta a laser, identificaram microplásticos com tamanho superior a 20 µm em todos os tecidos analisados: pulmonar, intestino delgado, intestino grosso e amígdalas.

A identificação do polímero mostrou que as partículas eram feitas de 14 tipos diferentes de polímeros, sendo a maioria cloreto de polivinila (PVC).

Os microplásticos, além dos pulmões, intestinos, amígdalas e rins, podem também ir parar no sangue e na placenta, ao menos foi isto o que concluiu um artigo publicado também em 2024, na revista Scientific Reports, por pesquisadores da Memorial University of Newfoundland, Canadá. Neste artigo canadense os autores analisaram os efeitos que a exposição a microplásticos de PE (polietileno) têm no crescimento fetal e na função placentária em camundongos prenhes, e observaram que a exposição aos microplásticos não afetou o crescimento fetal, mas teve impacto na função placentária. O fluxo sanguíneo da artéria umbilical aumentou 43% em ratos expostos a microplásticos em comparação com os grupos de controle, levando os autores a concluir que “o polietileno tem o potencial de causar resultados adversos na gravidez através da função placentária anormal”.

Ainda há muito o que se pesquisar, mas já se sabe que micro e nanopartículas estão vastamente distribuídas no meio ambiente e são ingeridas na alimentação de humanos e animais, em maior ou menor grau dependendo da localização geográfica e dos hábitos alimentares. Contudo, os potenciais efeitos nocivos à saúde humana ainda requerem estudos mais profundos, sendo este um tema que merece a atenção dos profissionais em food safety.

Leia os artigos originais que foram citados neste post:

Leia também outros posts já publicados aqui no blog:

4 min leituraPodemos dividir a história humana em períodos, como a Idade do Cobre (de 3500 a.C. até 1200 a.C.), do Bronze (de 3000 a.C. até 700 a.C.), do Ferro (de 1200 […]

5 min leitura
0

Análise de lubrificantes – Manutenção preditiva na indústria de alimentos (3)

5 min leitura

No post de hoje, dando continuidade aos anteriores, abordarei a análise de lubrificantes do ponto de vista da manutenção preditiva e como ela pode atuar a favor da segurança dos alimentos.

É importante entender que entre engrenagens, motores, peças e demais componentes que estão interligados, consequentemente existirá atrito.

Os lubrificantes têm o papel de manter a integridade dos equipamentos, reduzindo os impactos do atrito, e com isso aumentando a vida útil dos componentes. O lubrificante industrial forma uma película entre cada componente do equipamento proporcionando o deslizamento fácil entre as partes.

Na imagem abaixo, imagine duas chapas metálicas vistas por meio de uma lente de aumento, onde cada uma das superfícies, quando ampliada, apresenta naturalmente uma superfície irregular. Entre cada chapa há um fluido para atenuar esse atrito.lubrificante - manutenção preditiva

Veja uma animação ilustrando o desenho acima

lubrificante entre chapas

Além da redução do atrito, os lubrificantes também contribuem para:

  • a dissipação do calor gerado durante o atrito;
  • a “vedação” dos maquinários contra poeira ou umidade;
  • a prevenção contra a corrosão dos componentes.

Sabemos que em uma indústria de alimentos o cuidado no uso de lubrificantes deve ser redobrado. É preciso seguir uma série de recomendações, como informações de rastreabilidade, tipo de lubrificante, ponto de aplicação, pois durante a produção, se existir a possibilidade de ocorrer contato incidental entre lubrificante e alimento, isto pode ocasionar consequências graves à saúde do consumidor. Portanto, estes lubrificantes devem ser de grau alimentício (food grade) e certificados de acordo com as normas de higiene exigidas pelos órgãos reguladores (mais informações sobre os lubrificantes de grau alimentício e suas categorias podem ser encontrados nos textos citados no final desse post).

Mesmo com lubrificantes certificados, aprovados e adequados, ainda é preciso fazer monitoramento pela manutenção?

Simplesmente ter um lubrificante adequado não é suficiente. Ele pode ser utilizado incorretamente, em condições impróprias de operação ou com armazenamento inadequado. O foco desse post é justamente abordar os cuidados com os lubrificantes, pois mesmo sendo os corretos, ainda podem ser um problemão se não forem bem monitorados. Além disso, eles podem ser sinalizadores de futuros potenciais problemas quando incluídos nos planos de manutenção preditiva, ou seja, quando se analisa um lubrificante, pode-se predizer as condições do processo.

Análise de lubrificantes na Manutenção Preditiva

A análise de lubrificantes é uma das técnicas preditivas mais utilizadas e comuns, realizada por meio de avaliações em laboratórios de forma rápida e precisa. Ela ajuda a monitorar a condição dos equipamentos.

Com essa análise, é possível detectar a qualidade dos óleos e fluidos utilizados, a saúde dos equipamentos e também a presença de contaminantes. Com isso obtém-se informações de onde atuar para evitar quebras, danos, paradas desnecessárias e consequente impactos no produto acabado.

Se existe atrito, há desgaste!

A análise de lubrificantes também permite que seja possível identificar os primeiros sintomas de desgaste em um equipamento. Essa identificação pode ser realizada por meio de um estudo das partículas sólidas presentes e que ficam misturadas no lubrificante.

O equipamento “respira” o ambiente onde está instalado, ou seja, o lubrificante pode atuar como um termômetro para contaminações. Os contaminantes aproveitam-se de microfissuras, respiros inadequados e abertos de equipamentos, frestas, falhas em vedações, imperfeições nas superfícies dos equipamentos. As fontes de contaminantes mais comuns para um lubrificante são: calor, lodo, ventilação, partículas do ambiente e um dos mais comuns e destrutivos é a água, que pode reduzir a vida útil de um componente em 50 a 70%.

Uma amostra de óleo lubrificante é retirada do equipamento e enviada para análise. Cada amostra estará associada a um relatório que apontará sua qualidade. Vários fatores são avaliados em uma análise de óleo, como por exemplo, cor, aparência, viscosidade, ponto de ebulição, presença de água, contagem de partículas e outros. Os resultados são interpretados considerando as condições de operação do equipamento e as condições ambientais ao seu redor.

O óleo é o “sangue” do sistema e a máquina é o “homem”

Analisar um lubrificante consiste em uma série de interpretações, mas não significa que você deva realizar a mesma ou todas as análises para todos os equipamentos e lubrificantes. Fazendo uma analogia com um exame de sangue, o médico, baseado no relato do paciente, determina quais testes serão realizados. Portanto, com base nas condições de operação do equipamento e no que se deseja verificar, são determinados os testes no lubrificante. Com os resultados verificam-se as tendências e os caminhos para as ações seguintes.

Na manutenção preditiva, a análise de lubrificantes ainda pode ser combinada com a termografia e a análise de vibração, fornecendo ainda mais indícios do estado dos equipamentos e das condições ambientais do processo.

Manutenção preditiva – Análise de lubrificantes e segurança dos alimentos

A relação direta entre a análise de lubrificantes e a segurança dos alimentos pode não ser evidente à primeira vista. Listo abaixo como ambas podem atuar em conjunto:

  • Equipamentos industriais nas instalações em indústrias de alimentos frequentemente utilizam lubrificantes. Se os lubrificantes não forem devidamente monitorados, não há controle de consumo ou monitoramento sobre vazamentos, ou seja, onde foram parar aqueles X litros de lubrificante que deveriam durar X meses?
  • A análise de lubrificantes ajuda a identificar sinais precoces de desgaste ou falhas nos componentes mecânicos. Isso é estratégico para identificar deterioração forçada de equipamentos. Se um equipamento está deteriorando, há um potencial risco de partículas de contaminantes se desprendendo no processo. É hora de realizar uma preventiva no seu equipamento evitando potenciais contaminações no alimento.
  • Presença de contaminantes nos lubrificantes indica sinais ambientais que precisam ser observados sobre o tipo de contaminantes que aparece nos testes. É um forte indício de que as condições ao redor do equipamento precisam ser reconsideradas quanto aos procedimento de limpeza adotados ou até mesmo a falta de limpeza não mapeada, sobre as condições de isolamento e geração de partículas, sobre as condições de temperatura etc.
  • Mesmo um lubrificante certificado e apropriado pode ser comprometido quando exposto a condições inadequadas de uso ou armazenamento. Tambores de lubrificantes mesmo quando fechados devem ser devidamente armazenados. Qualquer água parada na superfície pode ser succionada para dentro do recipiente se houver pressão e calor/frio e falha na devida vedação e respiro. Veja na imagem abaixo:

tambor de lubrificante com água

 

Uma análise de óleo pode ser um bom indicador do seu processo e quando manutenção e qualidade trabalham em conjunto, esses dados são ricos para a segurança dos alimentos.

Gostou do conteúdo? Leia também:

5 min leituraNo post de hoje, dando continuidade aos anteriores, abordarei a análise de lubrificantes do ponto de vista da manutenção preditiva e como ela pode atuar a favor da segurança dos […]

3 min leitura
0

Pesticidas em alimentos: 1 em cada 4 vegetais tem substância proibida ou acima do permitido

3 min leitura

Foi publicado em 06/12/2023 o relatório do PARA – Programa de Análise de Resíduos de Pesticidas em Alimentos, da ANVISA, referente aos anos de 2018, 2019 e 2022.

Os resultados do PARA do período anterior, de 2013 a 2015, foram publicados aqui no blog Food Safety Brazil (veja aqui).

O ciclo 2022 é o terceiro e último ciclo do Plano Plurianual de 5 anos do PARA, que prevê o monitoramento de 36 alimentos, que representam 80% do consumo total de alimentos de origem vegetal no país.

Os principais resultados do PARA foram:

  • 1 em cada 4 (ou 25%) dos alimentos pesquisados apresentam resíduos de pesticidas proibidos ou acima do máximo permitido.

NPC = Não Permitido para a Cultura

LMR = Limite Máximo do Resíduo

  • Com relação ao risco ao consumidor

A Anvisa realizou a avaliação da exposição aguda e crônica a partir de critérios científicos recomendados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e adotados no âmbito do Codex Alimentarius.

 

2.1 Avaliação do risco AGUDO ao consumidor

O risco agudo de 2022 foi menor do que no monitoramento de 2018 a 2019. Além da laranja, ao longo desse ciclo de 5 anos foram encontradas amostras contendo resíduos de agrotóxicos que extrapolaram a DRfA – Dose de Referência Aceitável nos seguintes vegetais:

1 – Uva

2 – Mamão

3 – Maracujá

4 – Pimentão

5 – Couve

2.2 Avaliação do Risco Crônico ao consumidor

A ANVISA entende que simulações sobre o consumo ao longo da vida não apontam para um risco de longo prazo, mesmo se considerarmos um consumidor hipotético que come todos esses alimentos todos os dias. A tabela abaixo mostra a quantidade de pesticidas que vêm sendo expostos ao brasileiro em relação à IDA – Ingestão Diária Aceitável.

Principais recomendações

Em seu relatório resumo do PARA, a ANVISA menciona as seguintes recomendações:

Analisando os resultados do relatório completo do PARA, selecionamos mais algumas informações que consideramos relevantes.

1) Com relação aos pesticidas utilizados:

Dentre os 10 princípios ativos mais detectados no Brasil, 6 deles são PROIBIDOS na Europa. São eles:

  1. Acefato
  2. Bifentrina
  3. Carbendazim
  4. Ditiocarbamatos
  5. Imidacloprido
  6. Procimidona

Veja a tabela abaixo:

  • Segue a lista dos pesticidas mais encontrados nos vegetais pesquisados:

NOTA: O gráfico mostra em amarelo o percentual de amostras com aquele pesticida acima do limite e em verde o percentual dentro do limite.

Incluí neste artigo as 2 figuras acima pois tenho visto nas auditorias que venho fazendo que muitas indústrias fazem análises de pesticidas, mas algumas vezes não sabem quais são proibidos no Brasil e nos países de venda de seus produtos e nem aqueles que foram encontrados em níveis acima do permitido para aquela cultura (aquele alimento).

É importante que os técnicos que atuam em toda a cadeia produtiva do segmento de alimentos, do campo à mesa, orientem e assegurem que as análises dos pesticidas encontrados no alimento que ele atua seja realizada.

As não conformidades identificadas são consideradas infrações sanitárias e devem ser combatidas.

Este blog publicou muitos outros artigos relacionados a pesticidas em alimentos. Dentre eles destacam-se o artigo sobre regulatórios de pesticidas (aqui)  e o artigo sobre como consultar os limites de pesticidas nos alimentos (aqui).

O Relatório do PARA de 2018 a 2022 na íntegra está disponível aqui.

3 min leituraFoi publicado em 06/12/2023 o relatório do PARA – Programa de Análise de Resíduos de Pesticidas em Alimentos, da ANVISA, referente aos anos de 2018, 2019 e 2022. Os resultados […]

3 min leitura
1

Degradação da Ocratoxina (OTA) no café por emprego de temperatura

3 min leitura

Não é de hoje que se fala da presença das micotoxinas nos alimentos advindos do campo (leia aqui). Um reflexo disso é a regulação da ANVISA sobre o tema, por meio da Instrução Normativa (IN) nº 160, publicada em 1º de julho de 2022, que estabelece os limites máximos toleráveis (LMT) destes contaminantes.

As micotoxinas caracterizam-se por serem substâncias tóxicas, produzidas por algumas espécies de fungos, com potencial de contaminar alimentos e, pela ingestão destes alimentos, causar doenças que levam até o óbito de pessoas ou animais.

Hoje falaremos especificamente da micotoxina Ocratoxina A (OTA) e a sua presença no café, precisamente no café cru.

A ocratoxina A (OTA) é originária principalmente de fungos dos gêneros Aspergillus da seção Circundati e Penicillium verrucossum, podendo ter sua origem no cultivo, colheita, transporte e armazenamento dos grãos, que podem criar condições propícias para a produção da micotoxina. Discute-se muito acerca deste contaminante por ser um potencial carcinogênico para o ser humano.

A indústria cafeeira vem sentindo grande impacto com o aumento da presença da OTA na matéria-prima, que é o café cru. Conforme já mencionado, a ANVISA estabeleceu o LMT (Limite máximo tolerável) de várias micotoxinas em alimentos, incluindo a OTA. Para o café torrado e moído, o LMT da OTA é 10 µg/kg (ppb).

Como a indústria cafeeira lida com o desafio de mitigar o risco da presença deste contaminante no produto final? Pois bem, compartilho os resultados de um estudo sobre a degradação da Ocratoxina OTA presente no grão de café cru, pelo uso de temperatura no processo de torra dos grãos.

Para o estudo foram separadas 3 amostras de grãos de café cru, sendo uma amostra de café conilon (Coffea canephora) e duas amostras de café arábica (Coffea arabica) e todas foram submetidas a ensaio laboratorial. Como resultado, foi constatada contaminação de OTA nas duas amostras de arábica, sendo que o conilon estava abaixo do limite de quantificação do método (0,5 µg/kg).


Tabela 1: Resultados de contaminação de OTA no café cru

De posse dos resultado de contaminação da matéria-prima, a próxima etapa foi submeter o material ao processo normal de torra, estipulando como temperatura mínima a faixa de 200ºC a 205ºC.


Tabela 2: Tempo e temperatura aos quais as amostras foram submetidas no processo de torra (tratamento térmico)

Após a torra, foram colhidas amostras do café torrado e encaminhadas para o laboratório para realização das análises.

Os resultados foram extremamente satisfatórios, conforme pode-se verificar abaixo:


Tabela 3: Resultados de OTA após processo de torra (tratamento térmico)

A amostra de conilon permaneceu abaixo do LQ. Já para a amostra do café arábica 1, cuja contaminação inicial era de 8,78 µg/kg, constatou-se que após a submissão ao tratamento térmico de 200ºC, o valor ficou abaixo do LQ (<0,5 µg/kg). Já para o arábica 2, o resultado foi extremamente expressivo, passando de 44 µg/kg para 3,67 µg/kg, representando uma redução de 91,66% no conteúdo de OTA da amostra.

Pode-se concluir, frente ao estudo realizado, que o próprio processo de torra do café é um grande aliado das torrefações para mitigar a crescente presença das ocratoxinas no café, além das Boas Práticas Agrícolas (BPA) e Boas Práticas de Fabricação (BPF), sendo estes últimos tópicos, assunto para outro post.

Leia também:
– Controvérsia sobre acrilamida em café e rotulagem sobre câncer [link]
– Uma xícara de café na ótica dos profissionais de Food Safety [link]
– Proteste detecta quase o triplo do limite da ocratoxina A e seis vezes mais fragmentos de insetos em uma marca testada [link]

3 min leituraNão é de hoje que se fala da presença das micotoxinas nos alimentos advindos do campo (leia aqui). Um reflexo disso é a regulação da ANVISA sobre o tema, por […]

2 min leitura
0

Intoxicação alimentar por atum contaminado: o que aconteceu?

2 min leitura

No final de agosto foi noticiado um surto de origem alimentar em nove creches da região de Campinas, envolvendo 60 pessoas, entre alunos e funcionários das instituições. Os sintomas aconteceram em julho e após as análises concluiu-se que a causa foi o consumo de atum contendo altos níveis de histamina.

A ANVISA, através da Resolução 3124/2023, solicitou o recolhimento do lote do produto, pela seguinte motivação: “Considerando a ocorrência de surto compatível com intoxicação alimentar por histamina após o consumo do alimento, em Centros de Educação Infantil de Campinas, São Paulo, e a confirmação de contaminação do produto com histamina acima dos limites tolerados pela legislação sanitária, evidenciada pelo RELATÓRIO DE ENSAIO Nº RE-TC 03.105/23, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL.”

Trata-se de um lote fabricado em 8 de maio deste ano, com validade até 8 de maio de 2025.

Segundo informações da Secretaria de Saúde de Campinas, as crianças com sintomas de intoxicação apresentaram manchas vermelhas pelo corpo, coceira e sete delas tiveram diarreia.

O que é a intoxicação por histamina?

Intoxicação por histamina também é chamada de intoxicação pela toxina escombróide.

Atuns e outros peixes da família Scombridae, peixes conhecidos como “escuros”, são susceptíveis à formação de histamina por conterem grandes quantidades de histidina livre no tecido muscular. A transformação da histidina em histamina costuma acontecer pela ação de bactérias contaminantes quando os peixes mortos não são conservados e manuseados de forma adequada. É importante que os peixes sejam refrigerados em curto período após sua morte, para evitar esse aumento na concentração de histamina.

Um fator importante é que a histamina não é eliminada durante os processos de cocção durante a fabricação do atum enlatado.

O Brasil e outros países têm um nível máximo permitido de histamina, que é de 100 ppm no tecido muscular.

A intoxicação assemelha-se clinicamente a uma reação alérgica aguda, com a presença de um ou alguns dos sintomas abaixo elencados:

  • Dormência
  • Formigamento
  • Sensação de queimação na boca
  • Erupções cutâneas no tronco superior
  • Queda de pressão
  • Dor de cabeça
  • Coceira na pele
  • Náusea
  • Vômito
  • Diarreia

O quadro costuma ser leve, desaparecendo em poucas horas, mas há relatos de complicações em crianças, idosos ou pessoas com deficiências imunológicas.

Os cuidados com a matéria-prima adquirida, sempre que possível analisando a presença de possíveis contaminantes que possam causar intoxicação alimentar, e a rápida detecção de alterações no produto, com recolhimento de lotes no mercado, podem evitar esse tipo de ocorrência.

Imagino que a questão da histamina seja um desafio para a indústria de pescado, pois pelo levantamento que fiz, as técnicas empregadas para detecção de histamina em peixes podem ser as de cromatografia, que não estão disponíveis para a grande maioria das indústrias de alimentos, pelo seu alto custo e pela necessidade de qualificação de mão de obra. Existem, porém, testes ELISA que podem ser adquiridos pela indústria. Não tenho a informação de seu custo, mas vale o exercício sobre o custo da análise versus o custo da falha interna. Nesse caso, a detecção da falha internamente poderia evitar o adoecimento daqueles que consumiram esse lote e também a exposição da marca na mídia.

2 min leituraNo final de agosto foi noticiado um surto de origem alimentar em nove creches da região de Campinas, envolvendo 60 pessoas, entre alunos e funcionários das instituições. Os sintomas aconteceram […]

3 min leitura
1

ATUALIZAÇÃO: Raios X para detecção de corpos estranhos não são considerados irradiadores de alimentos

3 min leitura

O recente post  “Anvisa entende que alimento que passa por raios X deve ser rotulado como irradiado” causou muita polêmica e comentários nas redes sociais, uma vez que esta não era a interpretação de todo o mercado. De acordo com a resposta de um atendente do Anvisa Atende, havia uma associação direta entre um alimento que passou por raio X e um alimento irradiado, implicando em necessidade de rotulagem deste alimento para informar o consumidor.

Entenda a polêmica

Uma empresa, apenas com a finalidade de ter documentado que não precisaria rotular seu produtos que passam por raio X como irradiados, realizou uma consulta formal à Anvisa, pelo canal ANVISA atende, na expectativa de confirmar o entendimento. Eis que a resposta foi contrária ao senso comum, sendo orientada a rotulagem conforme a RDC Nº 21, DE 26 DE JANEIRO DE 2001.

O ponto que deixou brecha ao entendimento é que:

2.1.2. Alimento irradiado
É todo alimento que tenha sido intencionalmente submetido ao processo de irradiação com radiação ionizante

4.2.Fontes de radiação
As fontes de radiação são aquelas autorizadas pela Comissão Nacional de Energia Nuclear, na
conformidade das normas pertinentes, a saber:
a) Isótopos radioativos emissores de radiação gama: Cobalto – 60 e Césio – 137;
b) Raios X gerados por máquinas que trabalham com energias de até 5 MeV; (cinco milhões de eletrovolts)
c) Elétrons gerados por máquinas que trabalham com energias de até 10 MeV.

Não demorou para as manifestações no LinkedIn serem de questionamento. Até marquei a Anvisa para participar do debate. Vejam algumas interações:

A empresa que fez o questionamento recebeu uma semana depois, espontaneamente, uma atualização, conforme abaixo:

Prezado(a) Senhor(a),

Em atenção à sua solicitação, retificamos a resposta do protocolo 2023193394, tendo em vista que a resposta inicialmente informada foi atualizada.

Deste modo, segue abaixo a resposta atualizada do protocolo supracitado:

Equipamentos de raios-x utilizados na indústria de alimentos para detecção de metais (perigos físicos) não são considerados irradiadores de alimentos.

Alimentos irradiados são aqueles processados em equipamentos (raios-x, raios gama, aceleradores de elétrons) com a finalidade de inibir a germinação, reduzir a carga de microrganismos, controlar patógenos ou infestação e/ou estender o prazo de validade de alimentos perecíveis.

Portanto, para àqueles alimentos que passam por raios-x, com a finalidade exclusiva de detectar perigos físicos, não se aplicam as disposições da Resolução – RDC n. 21/2001.

O que podemos aprender com o caso?

Pelo menos eu aprendi que:

Legislação é elaborada por comitês de profissionais que tem expertise e entendimento em um tema. Por melhor que os textos sejam redigidos, sempre poderão trazer ambiguidades e “zonas cinzentas” de entendimento, pois o que é claro para os experts, pode não ser para a maioria.

Os atendentes de plantão do canal de dúvidas podem fazer intepretações simplistas no seu dia a dia, retornando para a sociedade interpretações equivocadas.

A inteligência, o bom senso e a colaboração são a fortaleza dos novos tempos.

Nem sempre é preciso braço de ferro ou tratamentos indelicados para se obter um retorno.

A Anvisa emite atualização para se retratar.

3 min leituraO recente post  “Anvisa entende que alimento que passa por raios X deve ser rotulado como irradiado” causou muita polêmica e comentários nas redes sociais, uma vez que esta não […]

Compartilhar
Pular para a barra de ferramentas