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Contaminação dos petiscos pet – o que podemos aprender?

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Na última semana de agosto alguns casos de intoxicação e óbitos de cães começaram a ser investigados, e veio a correlação com o consumo de petiscos possivelmente contaminados.

No dia 6 de setembro o MAPA publicou o ofício 424/2022, com informações a respeito das investigações preliminares sobre a morte dos cães.

O que diz o MAPA:

“Investigações do Mapa detectaram o envolvimento inicial dos lotes AD5053C22 e AD4055C21 – denominação de venda: PROPILENO GLYCOL USP – adquiridos da empresa XXX nos casos de intoxicação de animais por ingestão de produtos da empresa YYY.

Quais fatos já foram publicados sobre o caso:

Foi detectado, em análise laboratorial, monoetilenoglicol, em dois lotes da matéria prima propilenoglicol de um fornecedor da empresa fabricante dos petiscos. O monoetilenoglicol é tóxico e não utilizado em produtos destinados à alimentação. Seu uso é comum em sistemas de refrigeração, baterias de carro. O composto usado como matéria prima seria o propilenoglicol que tem função umectante.

Vale ressaltar que o monoetilenoglicol também estava envolvido nos casos de intoxicação e óbito dos consumidores da cerveja Backer em 2019.

Partindo para segurança de alimentos, se já temos o segundo caso envolvendo o mesmo composto, a presença de etilenoglicol em alimentos, como podem ser feitas avaliações, monitoramento, verificações que diminuam o risco de contaminação por ele?

E para complementar o problema temos uma irregularidade nesse fornecedor do propilenoglicol, conforme informado pelo MAPA:

Considerando que embora rotulados como se tivessem sido fabricados pela empresa XXX, o estabelecimento é apenas um depósito cujas atividades econômicas licenciadas não envolvem a fabricação de produtos para alimentação animal, motivo pelo qual o empreendimento não possui registro no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento na área de alimentação animal, tampouco apresentou registros em órgãos fiscalizadores.”

Aqui entra a IMPORTÂNCIA do processo de homologação de fornecedores. O fornecedor foi auditado ou respondeu a questionário de autoavaliação? Quais documentos foram solicitados para a homologação? Como determinar a criticidade do fornecedor e como deve ser feita a sua avaliação?

E para finalizar o documento do MAPA:

“… ressalta-se que a referida empresa não poderia ter comercializado, indicando ser sua, a fabricação de lotes de terceiros, muito menos ter comercializado para alimentação animal, produtos que não atendessem os critérios técnicos de identidade e qualidade de produtos para alimentação humana, animal ou que possuíssem grau farmacêutico

Entendemos o ponto da não conformidade cometida pela empresa fornecedora dessa matéria prima; e como aconteceu o recebimento desses lotes pela empresa fabricante dos petiscos? Essa matéria prima tinha uma especificação que não foi atendida nesses dois lotes? Existiam laudos de análise acompanhando esses lotes? É uma matéria prima que podemos considerar crítica? Como é feita avaliação da criticidade dela no Plano APPCC? E entendendo a criticidade, determinar como o processo de homologação deve ser realizado.

A FSSC 22000 descreve que as matérias primas, ingredientes e materiais de contato devem ser avaliadas segundo alguns itens, como características químicas, físicas, biológicas, modo de produção, origem, embalagem, entrega. Com essa avaliação bem feita no Plano APPCC podemos nos cercar de alguns cuidados. Conseguiríamos nesse caso identificar a contaminação do propilenoglicol com monoetilenoglicol?

Com o intuito de trazer maiores informações sobre o caso, algumas perguntas foram feitas à perita assistente Angela Busnelo Klesta, que nos informou que o etilenoglicol não faz parte do processo de produção de petiscos para pet. A empresa tem dois fornecedores de polietilenoglicol, cada lote fornecido é acompanhado de um laudo de análise e que não é possível detectar o monoetilenoglicol no recebimento do polietilenoglicol nas condições em que empresa trabalha, já que essa detecção é feita por uma análise que utiliza metodologia sofisticada, a HPLC.

A fabricante dos petiscos pronunciou-se rapidamente, iniciando o recolhimento de todos os seus produtos do mercado nacional e se manifestou por meio do seu site e redes sociais, solicitando o recall de todos os seus produtos junto aos consumidores.

Lembrando que outras indústrias que tenham adquirido propilenoglicol do fornecedor citado devem deixar de usar o produto e caso tenham fabricado alimentos com essa matéria prima, também precisam proceder o recolhimento e recall, como lembrado nesse trecho do documento do MAPA:

“As empresas fabricantes de produtos para alimentação animal registradas no Mapa também devem identificar os produtos fabricados com o uso dessas matérias primas e, caso encontrem, devem fazer o recolhimento no comércio atacadista e varejista. Os procedimentos deverão ser comunicados aos serviços de inspeção de produtos de origem animal de cada jurisdição, para controle e ações complementares do Mapa”

No dia 8 de setembro foi publicado novo ofício do MAPA, o 955/2022, determinando que as empresas fabricantes de produtos para alimentação animal devem se manifestar através do seu responsável técnico em até 72 horas, sobre presença dos lotes do propilenoglicol investigados em suas empresas. Caso existam, devem ser segregados e sua utilização suspensa; devem realizar rastreabilidade das ordens de produção a partir de janeiro de 2022, buscando a presença desses lotes nos seus produtos, informar ao MAPA caso encontrem e o último ponto:

Sugerimos fortemente que revisem seus procedimentos de seleção de fornecedores e recebimento de matérias primas, principalmente voltados ao propilenoglicol

Temos aqui um case interessante, para tratarmos inclusive internamente.

Fazemos avaliação de criticidade de matérias primas e outros insumos? De acordo com a criticidade, qual o processo de homologação realizado? Ele é cumprido? É refeito com alguma periodicidade? Os fornecedores são acompanhados com relação a documentação, ou uma vez homologados nunca mais questionados? Como é conferida esta documentação? Há algum fornecedor com o processo de homologação pendente ou com alguma pendência importante? Quais seriam nossas possíveis fragilidades?

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Segurança de Alimentos, Segurança Alimentar e o futuro

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Com origem no termo inglês “food safety”, a segurança de alimentos é a garantia de que o alimento possua a condição necessária para chegar ao consumidor final sem risco de lhe prejudicar a saúde. Para isso, utilizam-se práticas para evitar a contaminação dos alimentos, que podem ser aplicadas em residências e em indústrias. A preocupação com a segurança de alimentos ocorre tanto pela necessidade de uma empresa permanecer no mercado, hoje e no futuro, como também por demanda do consumidor.
Para garantir que somente alimentos seguros sejam comercializados, deve haver a implantação de programas que gerenciam a qualidade e a segurança de alimentos. Dessa forma, a padronização desde o cultivo, fabricação e manipulação até o consumo tornaram-se de extrema importância. O consumidor final, ao longo das décadas vem se tornando mais exigente, forçando a criação de novas legislações, com normas mais rígidas de acordo com os critérios adotados em cada país.

Todos os estabelecimentos que manipulam alimentos devem ter o compromisso de elaborar e aplicar um Manual de Boas Práticas de Manipulação, conforme regulamentos próprios para a atividade que exercem. Existem normas para indústrias e para serviços de alimentação.
A segurança alimentar (do inglês “Food Security”) é a garantia de acesso à alimentação para todas as pessoas, envolvendo políticas públicas que possibilitem alimentos com preço justo, qualidade nutricional e quantidades apropriadas para uma vida saudável.
Alguns aspectos que podem aumentar os índices de fome, miséria e subnutrição, como mudanças climáticas, aumento da população, conflitos políticos, crise no setor alimentício e restrições para importação e exportação podem levar a sociedade a um estado de insegurança alimentar, ou seja, quando parte da população não possui acesso a alimentos de forma a satisfazer as suas necessidades.
Com o surgimento de uma pandemia global, o mundo está cada vez mais atento à segurança dos alimentos. Com isso, espera-se que num futuro próximo, melhore a qualidade dos alimentos, reduzindo a disseminação de doenças transmitidas por alimentos.
A ISO 22000:2018 – Sistemas de Gestão da Segurança de Alimentos – surge com o objetivo de harmonizar os requisitos do sistema de gestão de alimentos em nível global, contribuindo com a garantia da segurança de alimentos, abrangendo todos os processos da cadeia alimentar.
A implementação da ISO 22000:2018 ou de outras normas internacionais por estabelecimentos produtores de alimentos é de extrema importância, pois isso assegura que as organizações estão seguindo padrões internacionais de produção de alimentos para garantir a qualidade e evitar danos à saúde dos consumidores.
Uma tendência para o futuro são as hortas orgânicas residenciais, que podem refletir uma nova maneira de pensar em alimentação saudável.

A necessidade da implantação de novos padrões produtivos e de consumo mais saudáveis para a humanidade e para o planeta enquadram-se diretamente nas questões da segurança alimentar, como a erradicação da pobreza, agricultura sustentável, saúde e consumo de produções responsáveis.
Além disso, com a adequada padronização do alimento, implantação de políticas públicas adequadas, medidas sanitárias e novas legislações, é possível também reduzir impactos ambientais e focar em uma maior sustentabilidade, garantindo para as futuras gerações, maior qualidade de vida.

Em um mundo onde a cadeia de fornecimento de alimentos é tão complexa, não existe espaço para algum incidente envolvendo a segurança, pois além dos impactos na saúde pública, existem impactos relacionados com o comércio e a economia. Portanto, é necessário enraizar e disseminar a cultura da segurança de alimentos, assim como a de segurança alimentar, e mostrar que qualidade e segurança do alimento é responsabilidade de todos.

Giovanna Maria Hernandes é graduanda em Engenharia de Alimentos pela UNICAMP. Foi bolsista no ITAL e prestou serviços administrativos para empresa de consultoria em segurança de alimentos. Tem experiência nas áreas de rotulagem e certificações, vendas, educação e gerenciamento de equipe. 

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Cultura de Segurança de Alimentos: plano de ataque

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Já sabemos que a cultura é um tema importante na área de segurança de alimentos, visto que este requisito está nas principais normas certificadoras atuais. Como uma pessoa que gosta de pessoas e dessa interação, achei mais do que interessante aprofundar-me no tema, que é muito mais amplo e envolve mais estudo e conhecimento do que estamos acostumados. Não se trata simplesmente daquele treinamento anual de Boas Práticas de Fabricação com os assuntos repetidos. Muitas vezes nem os slides da apresentação são renovados de um ano para o outro (e eu me incluo nessa). Trata-se de conhecer e conquistar o seu público, entender o que ele precisa e fornecer a ele estas informações tão importantes. Bem, mas para não parecer clichê e falar aquilo que todos os outros textos já falam, vou aqui colocar um pouco da minha experiência pessoal, o meu plano de ataque, que também pode funcionar para você.

Inicialmente, é importante pensar para além das normas. Vamos pensar no que é de fato relevante: o manipulador de alimentos precisa estar atento para preocupar-se com suas ações para segurança de alimentos. Ele precisa estar presente, mesmo em uma comunidade em que vemos muita dispersão. Por isso, é preciso entrar no mundo dele e conquistá-lo. Pense em si mesmo como um influenciador de pessoas (o que de fato será o seu papel agora) e vamos partir daí.

Como um influenciador, precisamos gerar engajamento em nosso público por meio de conteúdo interessante. Então, assim como um influenciador, o primeiro passo é conhecer seu público. Aí é interessante pensar na faixa etária dos colaboradores, escolaridade, hobbies da cidade ou região em que estão inseridos, se eles têm acesso à internet ou não. Isso pode dar ideias de como você vai poder se aproximar do pessoal, seja com ideias para conteúdo ou para ferramentas de divulgação do seu material.

Além disso, não podemos deixar de pensar em um cronograma para seus temas. E aí é uma situação muito pessoal, você precisa entender o que cabe no seu tempo e espaço, além dos assuntos que são relevantes para o meio em que você está inserido. Sabemos melhor do que ninguém que a Segurança de Alimentos estende-se em uma infinidade de temas. Por isso é importante entender o que vai causar maior impacto. Pegue o APPCC, seu programa de BPF, todos os seus desdobramentos e veja onde seu calo está apertando mais. Parta de assuntos que são interessantes e que vão causar impacto no seu processo.

Definidos os temas, o cronograma para tratar desses temas com os colaboradores, quem é seu público, agora é hora de produzir o conteúdo. E aí o negócio é deixar a criatividade rolar. Na minha experiência pessoal, sabendo que pessoas têm diferentes formas de aprendizado, gosto de trabalhar o mesmo tema em diferentes formatos, por exemplo: em imagens em edital, propondo um jogo online, fazendo um vídeo curto engraçado, mandando um áudio no grupo da empresa, escrevendo um e-mail. As formas de fazer são infinitas. Dicas importantes nessa etapa: procure ajuda de outras pessoas, elas podem contribuir com ideias ou ferramentas que você nem imaginava. Se sua empresa possui uma ESA (Equipe de Segurança de Alimentos), que tal envolver a equipe na elaboração dos temas? Por aqui estou implantando isso e os resultados estão sendo muito positivos. Além disso, explore todas as ferramentas disponíveis. Hoje em dia, com a internet, temos uma infinidade de ferramentas para explorar, muitas delas gratuitas, como sites para desenvolver jogos, uma vasta gama de imagens, vídeos sobre os temas, ferramentas para escrita de newsletter. Enfim, tudo para ajudar no processo criativo.

Por fim, além de passar o conteúdo para os colaboradores, a etapa mais importante é receber o retorno deles a respeito das informações absorvidas. Para isso, é fundamental que haja diálogo e que você receba de alguma forma esse feedback importante. Minha sugestão é fugir de formulários prontos e quadrados que lembram as avaliações dos tempos de escola. Prefira uma abordagem presencial, uma aproximação, uma conversa descontraída e perguntas de fácil compreensão para que a pessoa consiga contribuir com todo o conhecimento dela. É normal que haja um estranhamento de início, que as pessoas fiquem nervosas quando forem questionadas, por isso é importante explicar o que você está fazendo e por que está fazendo.

Para concluir, vamos acompanhar um resumo deste plano de ataque. Sabendo da importância do desenvolvimento da cultura de segurança de alimentos, precisamos de um plano de ataque para alcançar nosso público. Utilizando as técnicas de influenciadores, vamos então: conhecer nosso público, definir os temas relevantes, pesquisar e utilizar ferramentas variadas para as abordagens programadas e buscar o diálogo para verificar o conhecimento que foi absorvido pelo público. Assim temos a possibilidade de implementar um ciclo PDCA, com melhoria contínua a partir do feedback recebido. Minha dica de ouro final é a seguinte: pessoas são a razão pela qual nos importamos com segurança de alimentos e também são as responsáveis por colocar os princípios de segurança de alimentos em prática. Leve isso sempre em consideração quando estiver planejando seus conteúdos e ações, procure aprender mais sobre abordagens, comunicação e relacionamento com as pessoas, isso só pode trazer bons frutos para seu trabalho.


Natália Vendramini dos Reis é e
specialista em Engenharia e Gestão da Produção pela Unicesumar e engenheira química pela Universidade Estadual de Maringá (UEM). Atuou na indústria de alimentos nas áreas de processos e produção. Veio parar na Garantia da Qualidade por acaso e desde então está sempre buscando aprender mais sobre o tema.

Imagem: foto de cottonbro

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Crossing over de cultura de segurança dos alimentos e cultura organizacional

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Nos dez anos do Food Safety Brazil, trago uma reflexão para todos nós da cadeia de alimentos. É hora de mergulhar de cabeça no tema cultura de segurança dos alimentos. A questão é: não podemos fazer isto somente do ponto de vista técnico.

O blog já nos proporcionou alguns momentos interessantes falando de cultura de segurança dos alimentos. Insights podem ser vistos aqui.

A cultura de segurança dos alimentos deve ser o princípio básico dentro da cultura organizacional em todas as empresas que produzem, transformam, armazenam ou transportam alimentos, incluindo seus fornecedores. Deve ser, mas não é. Na verdade estamos longe disto.

Cultura de segurança dos alimentos não está na ótica do princípio na maioria das organizações, não está na base do DNA,  infelizmente. O que vemos, por vezes, é a segurança dos alimentos elencada na lista de valores da empresa, dentro da sua cultura organizacional.

Vale lembrar que estar nesta lista está longe de dizer que tem o seu peso reconhecido.

Princípio tende a ser inabalável, imutável, enquanto valores são maleáveis, mudam com o passar do tempo, inclusive sob a ótica da cultura instaurada na organização.

A cultura organizacional será a responsável por direcionar os caminhos da empresa através do planejamento estratégico e seus objetivos, balizados pela missão, visão e os valores.

Sendo assim, não seria correto a cultura de segurança dos alimentos ser o caminho orientador da cultura organizacional?

Na teoria sim, na prática nem tanto…

Pense: o que a alta direção faz para difundir e enraizar a cultura de segurança dos alimentos na organização? Provê todos os meios necessários? Colaboradores realmente capacitados? Conversa ou promove ações para todos os colaboradores com a frequência mínima necessária? Mede o nível desta cultura dentro da organização? É o pilar nas tomadas de decisões (principalmente as de grande impacto financeiro)? É exemplo nas suas ações?

Na maioria dos casos, a resposta é não para todas as perguntas acima.

A ação que deve ser priorizada neste momento é fazer a alta direção entender que a implantação da cultura de segurança dos alimentos é o caminho para a perpetuação e saúde financeira da empresa. Ainda é muito difícil este entendimento.

Vejo o conceito de cultura de segurança dos alimentos ser citado com frequência atualmente, porém somente pelo corpo técnico, principalmente por motivos de certificações no âmbito GSFI.

Temos que entender que enquanto o tema ficar enclausurado e não galgar voos até os donos, CEO, diretores, presidentes, acionistas, enfim, quem está a frente do negócio, a cultura de segurança dos alimentos continuará a caminhar a passos muito lentos.

Acredito que cabe a nós, corpo técnico, fazer parte desta mudança.

Precisamos fazer chegar ao andar de cima as informações financeiras referentes ao tema.

Podemos, por exemplo, citar as perdas com reprocessamentos e retrabalhos, perdas operacionais, absenteísmo, rotatividade de funcionários, food fraud e, claro, a possibilidade de recall.

Não tenho a menor dúvida de que todos os itens citados acima terão melhorias nos seus indicadores, ou redução da probabilidade de ocorrer, com a implantação, disseminação e perpetuação da cultura de segurança dos alimentos.

O que deve estar em jogo sempre é o valor que a empresa possui frente aos seus consumidores. Isto é intangível, é o maior ativo que se tem e a alta direção sabe disto, mesmo que por vezes as ações se mostrem em direção contrária.

Afinal, já não se priorizou o financeiro em vez da segurança de alimentos?

Muitas vezes a empresa opera com um desenho propício para isto acontecer, com ou sem aval da equipe técnica.

Aquela história de que no papel é lindo, mas na prática…

Cabe a alta direção demonstrar que todas as áreas da empresa, incluindo o setor administrativo, manutenção e empresas terceirizadas, devem atuar em sintonia, em prol do crescimento contínuo da cultura e segurança dos alimentos. Ganham todos.

A cadeia de alimentos inteira se fortalece e, o principal, a população tende a receber um alimento mais seguro do ponto de vista sanitário.

Entendo que, no cenário atual, é obrigação do profissional de segurança dos alimentos mostrar seguidamente os benefícios da cultura de segurança dos alimentos dentro da organização. Este é o único caminho para alavancar o assunto.

A semente já foi plantada pelas atualizações das normas internacionais focadas em segurança dos alimentos. A alta gestão é parte intrínseca do processo.

Não percam a oportunidade de levar o tema para uma reunião da alta direção, principalmente para as de planejamento ou demonstração de resultados, irá fazer toda a diferença.

Aproveite as “perdas financeiras “ atuais da organização, por falta de uma cultura de segurança dos alimentos, e canalize isto para as oportunidades da matriz SWOT. Trabalhe KPI específicos para estas perdas e não deixe de quantificar tangivelmente e intangivelmente um possível recall.

Estes números saltam aos olhos e tendem a um choque de realidade entre a cultura organizacional e cultura de segurança dos alimentos. É aqui que entra o crossing over destas culturas. Devem ser intimamente entrelaçadas e servirem de alicerce uma para a outra.

Alguns exemplos práticos do ganho financeiro das organizações com uma forte cultura focada na segurança dos alimentos:

  • Na Austrália, o foco na cultura resultou em uma redução de 70% nas reclamações de clientes e uma redução de 45% nos acidentes com afastamento em uma empresa de médio porte.
  • Nos EUA, em uma grande empresa produtora de alimentos, houve uma redução de 35% nas reclamações de clientes, redução no turnover de 23% para 12%, 50 por cento de redução na ocorrência de incidentes reportáveis além da melhoria de 32% na sua eficiência.
  • Também nos EUA, foi realizada uma pesquisa entre os 17.000 funcionários de uma empresa de distribuição de alimentos após foco na cultura e 91% se sentiram conectados aos valores da empresa, 91% entenderam como eles contribuíram para o sucesso da organização e 82% sentiram que a gerência se preocupava com seu bem-estar.

Sobre recall podemos citar:

  • De acordo com dados do FDA, a causa-raiz de recall – cerca de 26% da ocorrência – é o não cumprimento dos POPs e 32% estão ligadas a treinamentos inadequados. Estes e outros dados podem ser visualizados aqui.

Aos profissionais técnicos que atuam na cadeia dos alimentos e ainda não implantaram o conceito de cultura e segurança dos alimentos na cabeça ou aos que já possuem e não praticam, não percam tempo, é urgente.

Não tenho receio nenhum de dizer que a cultura organizacional, na área de alimentos, não irá sobreviver, a longo prazo, como ela é atualmente. Quem conseguir fazer este entrelaçamento com a cultura de segurança dos alimentos mais habilidosamente e rapidamente estará muito a frente, colherá frutos financeiros e encantara ainda mais seus consumidores.

A certeza é que estas culturas alinhadas têm um poder gigante de fidelizar, além de trazer mais segurança ao consumidor final. Verdadeira relação de negócios com ganhos bilaterais.

Geidemar Oliveira é farmacêutico industrial pela UFOP, especialista em Controle da Qualidade e Toxicologia dos Alimentos pela Universidade de Lisboa e MBA Gestão Empresarial pela FGV. Tem trabalhos realizados em cozinha industrial, catering, indústria de alimentos e grandes eventos nacionais e internacionais.

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Manhêêê… O leite acabou!

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Sim, crianças. E sim, moças, rapazes e adultos jovens. Aproveitem para beber bastante leite enquanto tem. Aproveitem, porque vai acabar. Nada alarmante, porém. Exceto para quem bebe leite, claro. Na real, é a vida como ela é. E eu explico.

Funciona assim: os preços sobem, por variáveis econômicas ou sazonais já bem conhecidas. Ou por lobby dos produtores mesmo, o que não é de se espantar em um país com moral tão flexível quanto o Brasil. A bola da vez é o preço internacional do milho, junto à entressafra. Com a disparada dos preços, o consumo cai e as ofertas voltam. Bom… pelo menos sempre foi assim, até que se popularizou de vez uma solução “jenial” nesta nova temporada. Fico imaginando os roteiristas deste filme planejando tudo: “a gente mistura leite bom com sobra (resto) da produção, dá um nome de batismo bem técnico para isso, mantém os preços do leite lá em cima para quem pode pagar (elitizando o consumo) e vende esse troço para quem não pode. A gente ainda pode dizer que é nutritivo e que reduz o prejuízo ambiental”. Tudo verdade, exceto que a motivação não é nobre. Lançar soro de leite como efluente não tratado nunca foi preocupação para a maior parte dos produtores de leite, exceto pelo que querem fazer crer agora. Tampouco nunca foi prioridade tratar o soro para comercializá-lo como tal, com forte apelo nutritivo, dado que a prioridade sempre foi o resultado imediato e o “pessoal que mexe com leite” nunca foi muito chegado em investir em novas tecnologias. “Leite se vende sozinho”, dizem.

Daqui para a frente vai ser cada vez mais comum ver o composto lácteo ganhando espaço nas gôndolas. Sim! COMPOSTO LÁCTEO! Aquela misturinha mequetrefe, meio a meio, de leite e soro, feita para enganar o trouxa que não lê rótulo. O “trouxa”, neste caso, é a imensa maioria de nossa da população. Recebi ontem uma pesquisa da FIESP, de 2017, cujo dado principal sobre hábito de leitura dos rótulos no Brasil informa que 53% leem (somente 23% com regularidade). Destes, 70% se interessam pela data de validade. Em resumo, a mensagem ainda não chega. Sobretudo em um país com apenas 92% de alfabetizados, muitos dos quais analfabetos funcionais. “Ah… mas não é fraude”, dizem. De fato, não é. Está escrito na embalagem que não é leite. E, mesmo para quem a lê, é cansativo conviver com as letras pequenas. Somos o país que criou a “dúzia de dez” na comercialização de ovos. Reduzimos o rolo de papel higiênico de 40 para 30, a barra de chocolate para 90g e abro comentários para quem quiser lembrar de inúmeros outros exemplos. Reduz-se a quantidade, mantêm-se os preços. É a reduflação, novo verbete nacional.

O quão mais estamos sujeitos a perdas de padrão na indústria e expostos a alimentos inseguros? A busca obsessiva pela redução de custos, que hoje mistura soro ao leite, poderá fazer o que amanhã? Aceitar matérias-primas de qualidade inferior e procedência duvidosa, de fornecedores não homologados? Empregar profissionais menos qualificados pagando menos por isso? Recusar-se a oferecer capacitação adicional, limitando-a a treinamentos obrigatórios? Instalar equipamentos sem preocupações com acabamento sanitário ou com sua manutenção preventiva? Reduzir a frequência das sanitizações, a concentração de químicos ou seu tempo de contato?

Um dos motivos pelos quais me apaixonei pela filosofia é o livre pensar. Ele carrega consigo uma “quase irresponsabilidade” deliciosa, caracterizada por estimular o questionamento onde a doutrinação, os dogmas e o autoritarismo vêm fazendo enormes estragos. Assim, pensemos: queremos leite ou vamos aceitar todo o lixo da moral deturpada de chefes de cartéis, donos de oligopólios, coronéis do agronegócio e políticos, todos mancomunados em conluio?  E quando bradarem também os extremistas religiosos, xenófobos, homofóbicos, racistas e afins? Hoje é composto lácteo. Amanhã pode ser a sua liberdade.

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Encontrando brechas em segurança de alimentos

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Há pouco tempo iniciei um novo emprego em uma indústria de alimentos e durante uma auditoria interna foi constatada a existência de uma brecha em uma das portas de acesso à área produtiva. O resultado foi uma Não conformidade pelo não atendimento a um item básico exigido pela norma ISO/TS 22000 Requisito 5.2: “Aberturas feitas para entrada de matérias-primas devem ser projetadas de modo a minimizar a entrada de corpos estranhos e pragas”.

De acordo com o dicionário, brecha é qualquer abertura estreita que permita a passagem de luz e ar; fenda, fresta. Para muitos de nós que trabalhamos com produção de alimentos seguros, as frestas ou brechas não são bem-vindas pois dependendo de onde elas estão localizadas, podem servir de passagem de pragas, facilitar vazamentos e outras situações desagradáveis. Por essa razão, tão logo elas sejam identificadas, devem ser fechadas. Nenhuma brecha deve ser ignorada ou menosprezada pois quanto mais tempo ficar aberta, maiores são as chances de problemas.

Trazendo para um outro significado, as brechas também podem significar o momento certo e oportuno para algo. Vendo por essa ótica, podemos nos deparar com muitas brechas em nosso dia-a-dia, que às vezes não conseguimos perceber de imediato. Um exemplo: em momentos descontraídos e longe da nossa rotina diária, juntos aos nossos círculos de amizade ou familiares, podemos aproveitar as brechas para comentar sobre a segurança de alimentos e mostrar a importância desse tema.

Quem é pai, mãe ou tio de crianças e adolescentes também tem diante de si o melhor público e as melhores oportunidades para difundir e ensinar tudo aquilo que às vezes é nosso maior desafio sobre conscientização e orientação sobre questões relacionadas à segurança de alimentos. Quem aí não precisou repetir algumas vezes o mesmo treinamento de BPF para colaboradores que insistem em não absorver aquilo que é ensinado?

Muitos textos interessantes sobre diversos temas são encontrados aqui no blog Food Safety Brazil. Hoje  conseguimos facilmente compartilhar em nossas redes sociais com apenas um clique, fazendo com que nossos amigos virtuais também tenham acesso a esse conteúdo tão precioso.

Durante uma reunião de trabalho com a diretoria, é possível aproveitar uma brecha para reforçar a preocupação da empresa com algo que muitas vezes é ignorado ou deixado para segundo plano. Nem sempre isso é possível, mas não custa tentar.

Tivemos recentemente uma pandemia global que causou inúmeras perdas econômicas e de vidas, mas nunca antes foi tão comentado o tema da prevenção contra contaminação microbiológica. E aproveitando a brecha, é mais um ótimo momento para usarmos essa experiência sentida na pele para falar sobre contaminação cruzada e perigos biológicos nos alimentos com nossos colaboradores e manipuladores de alimentos.

Estamos em um ano eleitoral. Teremos a chance de escolher nossos governantes e diante de muitas propostas que serão apresentadas, poderíamos aproveitar a brecha para colocar isso em questão: de que forma a política pode beneficiar a população para conseguir segurança alimentar com segurança de alimentos?

Já vimos aqui que a qualidade e segurança dos alimentos andam de mãos dadas e exatamente por conhecermos a importância disso é que vale a pena aproveitarmos as brechas para abordar esse tema. Todos esses exemplos citados anteriormente são apenas alguns de tantos outros que podem ser usados como “a hora certa e momento certo” para falarmos de algo que para nós da área de alimentos é tão comum que nem paramos para pensar que esse é um mundo desconhecido e distante para muitas pessoas.

Agora, lanço alguns questionamentos: você já teve oportunidades para falar sobre a segurança de alimentos e difundir a cultura de segurança de alimentos onde você trabalha, onde você mora ou em ambientes que costuma frequentar? Quantas vezes você perdeu a deixa para tocar nesse assunto? Você anda se lamentando porque temos ainda tantos problemas de reclamações de clientes, surtos alimentares, recalls e denúncias a respeito de alimentos inseguros em pleno século XXI?

Em relação às brechas, não percam tempo: algumas devem ser fechadas e outras podem ser aproveitadas.

José Gonçalves de Miranda é tecnólogo agroindustrial de alimentos, especialista em Segurança de Alimentos e auditor líder FSSC 22000

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O caso Daily Harvest: 500 pessoas contaminadas por crumbles de lentilha nos EUA

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No dia 17 de junho de 2022 a startup bilionária americana Daily Harvest anuncia um recall alarmante: suas lentilhas francesas causaram a contaminação de mais de 500 pessoas, que apresentaram reações adversas após o consumo do alimento. Isso foi logo depois de seu recente lançamento em abril de 2022. Os sintomas com início súbito são dores estomacais e abdominais. Alguns pacientes tinham enzimas hepáticas elevadas, cerca de 12 vezes acima da faixa normal.

O apelo por sustentabilidade, saúde e nutrição dos alimentos à base de plantas (plant-based) leva as pessoas à escolha destes produtos e fez com que a empresa fosse avaliada em US$ 1,1 bilhão. A facilidade para compra e preparo do produto é a grande sacada para o alto número de venda, reflexo da vida atribulada atual. O consumidor compra no site, recebe o produto congelado e o prepara em poucos minutos.

A pergunta é: como uma empresa deste porte é capaz de fornecer lentilhas contaminadas? A resposta ainda paira no ar. Como o FDA,  agências estaduais e vários laboratórios independentes, além de especialistas em microbiologia, segurança de alimentos e toxicologia não conseguem detectar o problema? Seria isto algo indecifrável? Será que a empresa sabe e não deseja informar? Então, eis a questão.

No dia 16 de junho de 2022 a colunista deste blog Juliane Dias escreveu o texto: “Quais são os perigos de uma alimentação à base 
de plantas?” parecendo prever o que aconteceria no dia seguinte com o anúncio do recall da Daily Harvest.
Alguns destes perigos citados por Juliane estão sendo avaliados e até o momento não existem comprovação da causa de tantas 
contaminações.

Estão sob investigação a contaminação por:
- Microorganismos patógenos (E. coli, Salmonella, cyclospora e Campylobacter), Norovírus e enterotoxinas, assim como 
Klebsiella, Clostridium perfringens e Enterobacter cloacae, sendo que as últimas 3 podem causar colecistite (inflamação da vesícula 
biliar);

- Produtos químicos como solventes, alguns suplementos alimentares e produtos químicos como tetracloreto, paraquat 
(herbicida utilizado em plantio, altamente tóxico e proibido em mais de 100 países, incluindo o Brasil) e produtos químicos 
industriais que causam hepatite tóxica do fígado;

- Toxinas como lectina, ervas e suplementos como black cohosh, cáscara, aloe vera, chaparral, confrei, kava e ephedra que 
causam doenças do fígado e da vesícula biliar;

– Micotoxinas que são produzidas por certos tipos de mofo podem contaminar grãos armazenados e entrar nos alimentos quando esse grão é usado. As micotoxinas podem afetar o fígado, o pâncreas e a vesícula biliar;

– Alérgenos como ovo, soja, leite e glúten que podem causar danos ao aparelho gastrointestinal;

– Hepatite A, B e E que são responsáveis por causar insuficiência hepática aguda.

Em nota da fundadora e SEO Raquel Dari, publicada em 01 de julho de 2022, foram descartadas as hipóteses de hepatite A, Norovírus, micotoxinas incluindo aflatoxinas, patógenos de origem em alimentos incluindo: Listeria, E. coli, Salmonella, Staphylococcus aureus (Staph), B.cereus e Clostridium Species e os principais alérgenos, incluindo ovo, soja, leite e glúten.

Então, o que causou a contaminação de tantas pessoas? Sugiro algumas hipóteses:

– Contaminação do produto causada pelo óleo de cozinha. O produto deve ser refogado em óleo de cozinha e esta mistura pode causar uma reação química de alguma substância  tóxica do produto em reação com o óleo.

– Contaminação por produto químico: utilização do anticongelantes monoetilenoglicol e dietilenoglicol encontrados nas cervejas produzidas pela cervejaria Backer ou outros produtos químicos utilizados no processo de congelamento. São 4 tipos de métodos utilizados para congelamento: por ar, por contato, por imersão ou por aspersão com líquidos resfriados, sendo que todos eles utilizam o contato direto com o produto.

– Outro produto químico sugerido de contaminação são os herbicidas utilizados no cultivo. O FDA pesquisa o Paraquat. O Paraquat tem um dos maiores valores de toxicidade aguda entre os herbicidas comerciais. Sua dosagem letal oral em humanos é de cerca de 35 mg/g, podendo resultar na morte em 24 horas após a ingestão, inalação ou exposição cutânea. Muitos herbicidas utilizados no mundo inteiro são tóxicos e uma gama deles podem ser pesquisados neste caso.

– Falha no estudo de riscos pré-lançamento de novo produto: a empresa pode ter falhado no estudo de riscos realizado antes do lançamento do novo alimento. A previsão de ganhos comercias e em atender as expectativas do mercado muitas vezes prejudica este estudo porque é uma corrida contra o tempo para colocar o produto à venda.

Inúmeras hipóteses podem sugerir a contaminação e a forma como os recalls são conduzidos pelo FDA é digna de ser utilizada pelas empresas no Brasil. Além dos vários anúncios do órgão para alertar a população também encontrei no site da empresa o seguinte aviso:

Clicando em details here abrirá o ícone onde está a descrição do caso e a atualização recente dos últimos acontecimentos.Informar ao consumidor é eticamente correto  e dentro da legalidade.

Uma startup como a Daily Harvest nos EUA, com tantos recursos para fornecer produtos seguros é capaz de pecar em seus controles internos e externos? Será que esta empresa também está focada apenas em cumprir protocolos de qualidade e não analisa criteriosamente os perigos integrados ao seu processo produtivo? Segurança de alimentos é o sistema necessário para avaliação geral de todos os componentes que fazem parte de um processo. A corrida pela lucratividade tem deixado muitos empresários cegos e alheios a isto.

Avaliar os riscos antes da produção de um lançamento é um fator predominante para quem atua na área. Pecar por excesso de zelo, atrasar um lançamento para conhecer todos os riscos envolvidos é a grande contribuição da área no fornecimento de alimentos seguros.

Estudar riscos de processo, investigar, esquecer um pouco de papéis,  caminhar na fábrica, inspecionar áreas críticas, investigar possíveis causas de perigos, conhecer fornecedores, fazer análises estabelecidas pela legislação do produto é presentear a vida com seu olhar crítico!

 

Links relacionados:

https://foodsafetybrazil.org/quais-os-perigos-de-alimentacao-a-base-de-plantas/

https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/01/16/entenda-as-diferencas-entre-o-monoetilenoglicol-e-o-dietilenoglicol-encontrados-em-cervejas-de-belo-horizonte.ghtml

https://www.foodengineeringmag.com/articles/100254-daily-harvest-debuts-plant-based-crumbles-in-2-varieties

https://www.bloomberg.com/news/articles/2021-11-15/daily-harvest-nabs-1-1-billion-valuation-as-lone-pine-invests

https://www.daily-harvest.com/content/french-lentil-leek-crumbles-advisory#

https://www.nbcnews.com/health/health-news/daily-harvest-sued-illnesses-lentil-crumbles-rcna35759

https://www.fda.gov/food/outbreaks-foodborne-illness/investigation-adverse-event-reports-french-lentil-leek-crumbles-june-2022

https://help.dailyharvest.com/en_us/categories/our-food-HkedZ7CqN

https://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2020/06/10/interna_gerais,1155364/caso-backer-saiba-como-a-policia-detectou-causa-de-contaminacao-de-ce.shtml

 

4 min leituraNo dia 17 de junho de 2022 a startup bilionária americana Daily Harvest anuncia um recall alarmante: suas lentilhas francesas causaram a contaminação de mais de 500 pessoas, que apresentaram […]

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Segurança de alimentos em feiras de negócios

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Depois de dois anos de pandemia, agora no mês de maio aconteceu a APAS Show – conhecida como a a maior feira de alimentos e bebidas da América Latina. A APAS (Associação Paulista de Supermercadistas) é a organizadora da feira, que é voltada às indústrias ou empresas que vendem e prestam serviços para as redes de supermercados.

A degustação de alimentos e bebidas em feiras como essa é frequente e é muito utilizada como forma de demonstração dos produtos.

Enquanto visitava alguns stands, pude observar quais e como os alimentos eram servidos e alguns cuidados que as empresas têm com esse assunto. O principal foco da feira é comercial, fazer novos clientes, apresentar o produto para compradores de diferentes estados do Brasil, trazer lançamentos, mas será que as empresas ou os departamentos de qualidade são requisitados nessa preparação?

Por exemplo: para os alimentos que são preparados e servidos, as pessoas que fazem esse trabalho receberam treinamento? Usam roupas adequadas? Os cabelos estão protegidos com toucas? Os recipientes onde os alimentos são servidos estão higienizados? São próprios para acondicionar alimentos? Nos casos de alimentos quentes, fritos, há uma preocupação em acondicionar esses alimentos em embalagens próprias, pensando em migração de possíveis contaminantes químicos desse material de contato?

Outros pontos podem ser avaliados também – como esse alimento está acondicionado? A cadeia de frio foi preservada quando é necessária? Se for um alimento fracionado, em quais condições isso aconteceu?

A ideia é mostrar que a segurança de alimentos precisa ser avaliada previamente, durante a organização da participação nas feiras. O setor da qualidade e/ou segurança de alimentos deve ser acionado, participar das reuniões com marketing, P&D ou quem organiza as atividades dos stands. E ter responsabilidade quanto aos cuidados de BPF, realizando treinamentos com os manipuladores e com aqueles que irão servir os alimentos. Deve verificar os locais onde os produtos serão acondicionados, preparados, disponibilizados aos consumidores; quais os utensílios e equipamentos serão utilizados, como devem ser higienizados. Esses cuidados podem evitar contaminação desses alimentos ofertados, o que certamente causaria uma grande dor de cabeça à empresa.

Imagine só fazer uma rastreabilidade depois de receber vários contatos via SAC informando que após uma dessas feiras, alguém ingeriu o alimento X e passou mal? Como são servidos muitos alimentos em diferentes stands, fica até difícil identificar a procedência do problema, mas certamente alguém será contatado e se tiver todos os cuidados prévios na preparação bem descritos, ficará mais fácil rastrear, avaliar e estudar possíveis riscos.

Imagem: https://apasshow.com/

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Qual limite devo adotar para matérias estranhas rígidas em alimentos?

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Matérias estranhas rígidas podem ser introduzidas na cadeia produtiva de alimentos a qualquer momento, começando pela fonte primária no campo. Podem também ser inerentes ao produto, como os caroços na indústria de processamento de doces e geleias ou um osso ou dente de uma carcaça no segmento frigorífico. Existem ainda muitas outras fontes:

  1. Pedras e sujeira comumente encontradas em frutas, legumes e outros alimentos que são cultivados perto do solo;
  2. Metal comumente associado a atividades de manutenção ou processamento, como operações de corte, fatiamento, laminação, moagem, extrusão ou mistura, bem como materiais de embalagem ou recipientes, como fragmentos de metal, grampos e pregos;
  3. Partes de ferramentas inapropriadas como visto no artigo Perigos físicos e o uso de estiletes na indústria de embalagens e de alimento;
  4. Joias, adornos e itens pessoais resultantes de más práticas de manipulação;
  5. Plásticos rígidos ou outros contaminantes de materiais de embalagem, recipientes ou ambiente de processamento;
  6. Lascas de madeira de paletes ou material de embalagem;
  7. Descamação da tinta de estruturas ou equipamentos suspensos.

Veja um pouco mais sobre perigos físicos no artigo Perigos Físicos na mira da indústria de alimentos.

A RDC 14/2015, que trata de limites de tolerância para matérias estranhas em alimentos, acabou de ser revogada. Agora está valendo a RDC 623/2022 (se quiser saber o que mudou clique aqui).

Segundo esta Resolução, entre outros contaminantes, são consideradas matérias estranhas aquelas indicativas de riscos à saúde humana capazes de causar danos ao consumidor, abrangendo objetos rígidos.

Contudo, na atual resolução e na anterior que foi revogada, os limites dimensionais para objetos rígidos permanecem os mesmos, conforme apresentado na seguinte tabela:

DIMENSÃO TIPOS DE OBJETOS RÍGIDOS
Iguais ou maiores que 7 mm na maior dimensão. Objetos rígidos, pontiagudos e ou cortantes que podem causar lesões no consumidor, como fragmentos de osso ou de metal, lasca de madeira e plástico rígido.
Iguais ou maiores que 2 mm na maior dimensão. Objetos rígidos que podem causar lesões no consumidor, como pedra, metal, dentes, caroço inteiro ou fragmentado.

Quando leio e releio estes limites, confesso que eles não fazem muito sentido lógico no meu entendimento, mas posso estar errado e se um leitor ou alguém que participou da elaboração desta RDC souber me explicar num comentário, agradecerei.

Explicando meu ponto de vista

Objetos pontiagudos e/ ou cortantes, portanto perfurocortantes, são capazes de causar sérios danos, podendo perfurar e cortar a boca de um consumidor. Se forem engolidos, poderão causar danos ainda mais sérios como uma perfuração no esôfago, estômago, intestino ou reto, mas para este tipo de corpo rígido o limite na RDC é mais tolerante, sendo determinado um valor igual ou maior que 7 mm.

Neste caso dos perfurocortantes, podemos exemplificar com pedaços de fio partidos de sistemas de corte a fio, metal fresado de rolos moldadores ou de pás de mistura esbarrando em tanques ou reatores, pequenos parafusos, farpas de paletes, resíduos diversos de manutenção industrial etc.

Já para objetos rígidos não perfurocortantes, o limite é mais rígido, determinado como igual ou maior que 2 mm. Não que estes não sejam um problema, pois são, podendo, por exemplo, fazer um consumidor quebrar um dente ao morder um material duro ou levar a um engasgamento.

Aqui podemos exemplificar com carepas metálicas, pingos de solda, bilhas de rolamento, porcas, pedrinhas, o dente de uma cabeça de porco, caroços duros de frutas etc.

É preciso considerar que a maioria dos corpos estranhos que não sejam perfurocortantes, se engolidos podem ser expelidos sem tratamento, mas alguns, justamente pelo risco de causar danos como é o caso dos perfurocortantes, precisam ser removidos por endoscopia, por cirurgia ou manualmente.

Justamente esse é o ponto que não faz muito sentido no meu entendimento: o limite para corpos estranhos perfurocortantes que possuem um maior potencial de dano ao consumidor é mais tolerante do que para os corpos rígidos com menor potencial.

Matérias estranhas rígidas, além de um problema no que se refere à saúde dos consumidores podem também ser uma dor de cabeça para as organizações trazendo prejuízos econômicos, tema tratado no artigo Corpos estranhos em alimento geram dano moral mesmo sem ingestão.

Nesta perspectiva, os limites estabelecidos pela norma tornam-se ainda mais sem sentido. Imagine-se diante de uma reclamação de consumidor ou na frente de um juiz num eventual processo. Qual seria a real viabilidade de aceitarem a explicação de que um corpo estranho pontiagudo que perfurou a boca de um consumidor está dentro do limite legal aceitável por ter 5 ou 6 mm, uma vez que a RDC dá como limite 7 mm para perfurocortantes?

Há outras inconscistências. Veja que se uma empadinha contiver um caroço de azeitona perdido, isso seria um problema, pois tem mais do que 2 mm. Já  um pedaço de fio de aço de 6 mm parecendo uma agulha, caracterizando um perfurocortante, estaria dentro do limite permitido pelo regulamento.

Talvez esta nova RDC devesse ter tratado separadamente tipos de matérias estranhas rígidas, categorizando em metais (perfurocortantes ou não), caroços, madeira, plásticos rígidos, dentes e ossos, pedras etc. Em cada caso, deveriam ser definidos os limites dimensionais, considerando os potenciais impactos de cada um destes materiais na saúde dos consumidores, as particularidades dos processos onde tais riscos são gerados, e também a capacidade de ação preventiva das tecnologias existentes para um efetivo controle.

Na prática, tenho observado que muitos profissionais ignoram o limite de 7 mm usando como referência 2 mm. Afinal, quando se analisam perigos de corpos rígidos, é improvável que se possa predizer se serão perfurocortantes ou não, e claro, por um princípio de proteção ao consumidor, se opta pelo limite mais restritivo.

Então, na adoção de sistemáticas de controles, exemplificando com a utilização de uma peneira para conter perigos de objetos rígidos, opta-se por uma malha ou chapa perfurada de no máximo 2 mm. Analogamente, ao se colocar um detector de metais numa linha industrial, opta-se por um que seja capaz de detectar corpos de prova de materiais ferrosos, não ferrosos e inox de no máximo 2 mm.

Por isso, se há riscos de contaminação com corpos rígidos, independentemente da dimensão, é preciso tomar ações preventivas para que eles não cheguem até os alimentos (tema dos artigos Tudo o que você sempre quis saber sobre medidas de controles de perigos à segurança dos alimentos – Perigos físicos e TPM a serviço da segurança dos alimentos, que aborda o assunto objetivando evitar estes perigos durante atividades de manutenção).

Se concordou, discordou ou se tem uma explicação boa para estes limites da RDC, deixe aqui seu comentário!

Leia também:

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Manual de Boas Práticas para auditados – Parte 2

3 min leitura

Continuamos aqui com novas dicas de comportamento e práticas para auditados, os profissionais que recebem auditorias. Caso não tenha lido a parte 1, clique aqui.

 4. Saber delegar responsabilidades

“Isso aí é coisa da Qualidade!” Isso é familiar pra você?

Essa é uma falha enorme em qualquer Sistema de Gestão, além de (infelizmente) ser bastante comum. Direcionar toda a responsabilidade de assuntos relacionados à Segurança de Alimentos ao departamento de Qualidade simplesmente impossibilita o estabelecimento de qualquer Sistema de Gestão minimamente operacional (sim, você pode eventualmente conseguir um certificado, mas ele será apenas um papel na parede). Isso ocorre geralmente por um erro na concepção da Alta Direção e diversas vezes também dos responsáveis pelo depto. de Qualidade.

Fica a reflexão: Substituindo Segurança de Alimentos por Segurança do Trabalho… Quem é responsável por garantir que o trabalho seja realizado de forma segura? É o Técnico de Segurança do Trabalho ou são todos os funcionários?

Bem… a solução é muito simples. Delegar responsabilidades dentro da companhia, desde responsabilidades gerenciais até operacionais. Todos devem se sentir responsáveis pela segurança do produto. Em resumo, deve-se criar uma Cultura de Segurança de Alimentos (tema bastante tratado neste blog, por exemplo: aqui, aqui, aqui, aqui e aqui).

 

5. Ser aberto a melhorias

“Ao evitar os erros estamos evitando também a nossa evolução”.  Creio que ninguém aqui goste de errar, porém precisamos admitir que somos falíveis. E, como na frase acima, precisamos saber aprender com as falhas que cometemos, e utilizar para o nosso crescimento (usando outro aforismo, “fazer do limão uma limonada”). Este é o antigo, mas sempre atual conceito da melhoria contínua.

Bem… tudo isso é lugar comum, ok? Sim, mas infelizmente é bastante frequente empresas e auditados adotarem uma postura refratária durante a auditoria. Este comportamento advém de diversos fatores, e reflete na maioria das vezes, não apenas a visão de um profissional, mas a cultura organizacional. Este outro post fala muito bem sobre este tema, mas adicionando um relato particular. Vejo bastante este tipo de visão (atuando há anos como auditor) em indústria de grande porte com estrutura corporativa.

Para saber mais sobre mudanças em cultura organizacional, recomendo a leitura do livro “Você é o que você faz: Como criar a cultura da sua empresa”, lançado em 2021.

O recado que gostaria de deixar para os auditados é: não tenham medo de não conformidades. Elas não são coisa de outro mundo. E também, o auditor não é um vilão. Elas devem ser vistas como oportunidade de reflexão e de melhorar o Sistema de Gestão de vocês.

 

6. Saber questionar

O auditor não é dono da verdade, assim como os auditados também não são.

Independentemente do nível de qualificação do auditor, o processo de auditoria possui dificuldades inerentes, que passam por exemplo, pelo fato de diversos requisitos normativos serem subjetivos. Isso pode trazer uma infinidade de possíveis interpretações em uma mesma sentença, o que leva a questionamentos de ambas as partes.

Quando estes embates técnicos ocorrem, é importante que o auditado saiba como agir. Se você não concorda com o ponto do auditor, questione a ele, de forma educada sempre (recomendo a leitura deste post), em que ponto da norma ele está se baseando. Caso o auditor esteja atuando fora destas linhas, utilize seus argumentos.

Ressalto aqui um argumento que deve ser proibido “isso nunca foi solicitado / apontado em outra auditoria”.  Cada auditoria é uma auditoria, e cada auditor é um auditor. Estando dentro do escopo de aplicação da norma, está tudo certo.

Procurem ao máximo resolver a questão durante a auditoria, mas caso o auditor se mostre inflexível e você tenha convicção quanto ao seu ponto, solicite reversão à certificadora. A Revisão Técnica irá avaliar esse pedido e poderá acatar ou não.

 Espero que tenham gostado das dicas!

Quero ouvir a opinião de vocês. Exemplos são bem-vindos, assim como sugestão de novos tópicos. Quem sabe vem por aí uma Parte 3. Até logo!

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