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A importância da gestão de crises durante a pandemia

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Nesse momento de incertezas, a gestão de riscos, que está dentro da gestão de crises, tem que ser planejada devido à transmissão acelerada do COVID-19. Os países ocidentais pensaram e se prepararam, com o exemplo vindo do oriente (exemplo: os hospitais temporários em estádios e centros de convenções) para abaular a curva de contágio, gerenciamos os ativos do sistema público de saúde, com esse espaçamento, para não colapsar. Outro exemplo da eficácia do lockdown com quarentena horizontal (drástica) ou vertical (suave), para concatenar a parada de vida do sistema, gradativamente sendo abertas, como serviços essenciais, incluindo a imprensa. No Brasil, vivemos a vertical, sem pessoas apartadas e/ou levando multas exorbitantes e crescentes.

A crise é sem precedentes em fronteiras (180 países em menos de 3 meses), imprevisibilidade (China sabia desde novembro de 2019), culminando com os reflexos sociais, econômicos e culturais. Economicamente é incalculável, pois espera-se que o lockdown vertical (grupos de riscos) venha em breve, só assim conseguiremos contabilizar. Ninguém já fez uma projeção do tamanho da conta que virá para as empresas, advinda da pandemia.

Nesse contexto, você deve estar se perguntando qual o risco de a empresa não se preparar para esse momento? É importante a consciência da instauração do problema e como reagir à crise em curto, médio e longo prazos, por análises de cenários internos e externos e qual posicionamento adotar. Para o de prazo alongado, as empresas terão que repensar para não demitir em massa e haver quebra da cadeia produtiva.

Acredito que a partir de agora, as empresas terão comitês de riscos regulares e alinhados com o planejamento estratégico. Para essa Gestão é necessário formar um Comitê de Crise em todas empresas, independentemente do seu porte.

Outra questão são quais aprendizados que vão ficar para as organizações nessa crise? Em outras palavras, quais impactos positivos podemos ter com esse momento? Creio que um caixa mais saudável e mudanças na gestão com maior competitividade, foco em governança para passar pelas crises com menor sofrimento e a cultura de planejamento para melhor execução.

Temos a ausência de gestão de riscos na maioria da empresas, não atendendo ao que preconiza a norma ISO 31.000. Vemos até que o próprio governo não tem planos claros de contingência.

Por que as grandes nações mundiais não fizeram a gestão de risco em dezembro 2019, quando souberam do novo coronavírus? Todas as nações falharam ao não se preparar desde então. Poderiam ter mitigado os riscos, monitorado viajantes e adquirido equipamentos hospitalares e EPI e comunicado massivamente.

O que não pode faltar em um planejamento de enfrentamento de crise (efeitos da carga viral)? Estabelecer um comitê de crises da organização com sazonalidade de encontros diários, para soltar comunicados para os outros públicos (stakeholders). O comitê de crise é de risco eminente, independentemente do porte, e é super bem-vindo o link entre a gestão de riscos e o planejamento estratégico. É importante, também, o plano de continuidade do negócio. Além de mitigar os impactos para os colaboradores (plano de comunicação) e as ações para públicos externos.

Poderá este momento de crise e confinamento ser também uma oportunidade para repensar o modelo de negócio e a proposta de valor das empresas a longo prazo? Acredito que haverá mais ações de curto prazo nas organizações em relação à parte financeira. Refletir e espelhar nas nossas organizações este doido aprendizado na calamidade interna e conjuntura global. Impactos positivos com muitas lições aprendidas: empresa mantendo um comitê de análise de riscos constante, acoplado ao comitê estratégico; aprender o que é um trabalho colaborativo (factível ser remoto); assim, ler o ambiente diuturnamente entendendo o setor, o ambiente de macro variáveis com oportunidades e ameaças e quais as competências instaladas na organização em tempo hábil de corrigir a rota. Estratégia é um pensamento vivo!

Vemos muitas empresas patinando até mesmo no home office. Gerir pessoas, entender pessoas é um grande diferencial para a sobrevivência dos negócios.

No pós-crise, todos, como pessoas e profissionais, com as suas resiliências e a união da nação, atravessaremos esse momento. “Em alto mar, se alguém ficar sozinho, o tubarão ataca, porém se ficarmos juntos, o tubarão não ataca porque ele vai pensar que a presa é maior que ele”.

Imagem: www.tramaweb.com.br

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Opinião: Coma o que quiser, desde que sua comida não coloque minha vida em risco

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Cada povo tem sua própria cultura, e dela fazem parte os hábitos alimentares e paradigmas que constroem as regras morais sobre o que é certo e digno ou errado e repugnante de se usar como comida, não é mesmo?

Para citar um exemplo pitoresco, numa recente viagem com minha filha de 7 anos, estávamos numa casa tradicional no Peru onde ela viu um monte de porquinhos-da-índia correndo pelo chão, e claro, foi logo pegando um bem fofinho. Este animal lá é chamado de cuy, criam e comem como fazemos com as galinhas. Com jeito contei isso a minha filha, que ficou bem triste ao saber que o animalzinho em suas mãos em breve seria uma refeição.

Há muitos outros exemplos interessantes associados à cultura e religião. Judeus e muçulmanos não comem carne de porco, uma vez que estes animais, apesar de terem o casco bipartido, não são ruminantes, e por isso, tanto o Talmude quando o Alcorão proíbem seu consumo, considerando-os animais imundos. Analogamente, hindus não comem carne, quanto mais de vaca, que consideram sagradas.

Por outro lado há quem considere cães um ótimo alimento, em países como China, Indonésia, Coréia, partes do México, Filipinas, Polinésia e Taiwan. Já eu vejo a pequena Yorkshire que vive em minha casa como uma filha e não como um almoço.

Franceses comem caracóis, que em seu idioma se chama “escargot“, um nome chique para um prato sofisticado e caro. Também comem “foie gras”, que nada mais é do que um “fígado gordo” de ganso ou pato que foi forçosamente alimentado à exaustão, o que levou à hipertrofia lipídica do órgão. Ambos pratos tão admirados na culinária francesa parecem para mim, que não sou tão sofisticado, tão exóticos quanto comer carne de cachorro.

Já os vegetarianos adotam um regime alimentar baseado no consumo de alimentos de origem vegetal, não se alimentando de nenhum tipo de animal, optando alguns por comerem laticínios e ou ovos, outros não.

Regionalmente aqui no Brasil também temos questões assim. Tenho alguns amigos que adoram comer caranguejo, para mim ele sequer parece um alimento; já outros amam uma boa buchada de bode, eu prefiro só olhar.

Num exemplo doméstico, estes tabus se estendem também a que parte comer ou não de um animal. Por exemplo: minha mãe gosta de comer a sambiqueira e o pé da galinha, meu pai adora uma rabada ou um mocotó de boi, já eu não incluo estes pedaços na minha dieta.

Enfim, acredito que já deu para exemplificar que em termos de hábitos alimentares, povos e culturas são bastante ecléticos.

Particularmente, não recrimino a comida de cada povo, afinal cada cultura passou por caminhos, dificuldades, circunstâncias que moldaram seus hábitos alimentares. Porém, um problema surge quando aquilo que uma determinada cultura come coloca em risco os povos de outras culturas.

Quando aquilo que você escolhe comer não coloca em risco apenas a sua saúde, mas também a de outros, isso não é um problema exclusivamente seu, mas de todos.

O Brasil é um grande exportador de proteínas de animais como vacas, frangos e porcos.  Mas para isso, há uma série de cuidados relacionados com a criação destes animais, que incluem todos os cuidados com a ração, tratos sanitários dos plantéis, monitoramento constante para prevenir doenças, vacinação, auditorias internacionais em food safety. Inclusive, se necessário, medidas extremas como o descarte de plantéis inteiros podem ser adotadas caso alguma doença que coloque a saúde das pessoas ou plantéis internacionais em risco seja identificada.

Depois temos todos os cuidados durante o abate, evisceramento e corte destes animais, incluindo rigorosas regras de BPF, o uso de medidas para prevenir riscos baseadas em Planos de HACCP, adoção de modelos de gestão baseados em normas internacionais como a FSSC 22000 ou a BRC com todos os requisitos relacionados, etc.

A adoção de todas estas medidas que fortalecem a sanidade na criação e produção de proteína animal permite a obtenção de produtos seguros, não apenas quanto à saúde do plantéis, mas também para garantir a inocuidade à saúde dos consumidores.

Tudo isso monitorado e registrado numa cadeia de custódia apta à rastreabilidade desde a criação dos animais até o destino de cada animal abatido, permitindo atender a protocolos internacionais de segurança dos alimentos.

E quando se abatem animais coletados na natureza, que muitas vezes são reservatórios de vírus, bactérias e parasitas em mercados sem condições higiênicas controladas, sendo abatidos e esfolados no chão destes locais, criando poças de sangue com restos de fezes e vísceras de animais?

Neste caso aumentamos significativamente a probabilidade de risco, inclusive da introdução de novas doenças ao homem, especialmente vírus, cujas mutações podem vir a permitir uma rota animal-homem, e depois homem-homem, o que é perigoso, causando epidemias, uma vez que as populações não possuem anticorpos para novos vírus.

Estamos em plena pandemia de COVID-19, cujos efeitos são mortes pelo mundo todo, especialmente idosos e imunossuprimidos. Na China, o epicentro do problema, mas onde esta epidemia já está em declínio, já começam a reabrir seus chamados “wet markets”.

Os mercados úmidos são locais onde se vende carne viva, peixe, produtos diversos e muitos outros animais coletados na natureza como cobras, morcegos, ratos, macacos, pangolins, gatos, cães, e tudo aquilo que poderia estar num zoológico, mas que nestes lugares são abatidos sem os devidos cuidados sanitários como já relatado.

Há um abismo em termos de cuidados sanitários entre o que se faz num frigorífico destinado a abater e processar proteínas atendendo aos critérios internacionais para exportação como tantos que temos no Brasil e os mercados úmidos que encontramos especialmente em países asiáticos.

Lembre-se de que alguns dos primeiros casos da epidemia que estamos vivenciando agora foram reportados após os infectados terem estado num destes mercados em Wuhan, a região chinesa onde começou o surto do novo coronavírus.

O comércio de carne desses animais, além de contribuir para a destruição de habitats, faz com que os seres humanos tenham um contato cada vez mais estreito com os vírus que eles carregam e que podem se espalhar rapidamente em nosso mundo ultraconectado pela globalização.

Como exemplo, a cidade de Wuhan é um centro produtor de moda que por isso tem intercâmbio permanente com Milão, de onde a COVID-19 se espalhou pela Lombardia e depois para toda a Europa e o mundo.

Estima-se que existem mais de 1,7 milhões de vírus não descobertos na vida selvagem e quase metade deles pode ser prejudicial aos seres humanos, ou seja, muitos novos vírus ainda podem ser introduzidos e causar todo este caos novamente.

A rota de entrada destes novos vírus pode ser via alimentação, no entanto, elementos patogênicos podem ser transmitidos aos seres humanos durante a captura dos animais, transporte ou abate, principalmente se forem realizados em condições sanitárias precárias ou sem equipamento de proteção como ocorrem nestes citados mercados úmidos. O problema é que é muito difícil interromper uma atividade com 5000 anos de tradição cultural, ao menos para os cidadãos que já tem arraigados estes hábitos alimentares.

Talvez a China precise realizar um grande esforço no sentido de ao menos mudar estes hábitos para as novas gerações, que francamente, poderiam começar por substituir estas fontes de proteínas exóticas pelas vacas, porcos e aves brasileiras, criados dentro de condições sanitárias adequadas, portanto, seguros aos chineses, e também, ao resto do mundo.

Mas não é só na Ásia que existe o hábito tradicional de se alimentar de animais selvagens que podem significar risco à saúde humana.

Aqui no Brasil, por exemplo, em algumas regiões ainda se caça para consumo alguns animais selvagens, como o tatu, e há pesquisas que indicam que algumas espécies são potenciais reservatórios de doenças, entre elas a hanseníase, a leishmaniose e a doença de Chagas.

Há também pesquisas que indicam que o tatu-galinha pode carregar a paracoccidiodomicose (PCM) ou blastomicose sul-americana, causada por um fungo, e esta doença pode ser passada a humanos, pela inalação de partículas infectadas que atingem os pulmões e causam infecção, o que pode ocorrer na captura e ou manejo deste animal.

Felizmente aqui a caça e comercialização destas espécies selvagens é inibida, não temos os tais wet markets como na China, onde estes animais são comercializados livremente, e isso ajuda a inibir um pouco este tipo de consumo. Ainda assim, é um tema que precisa ser trabalhando para levar esclarecimento a quem se arrisca a consumir estes animais.

Por fim, diante da epidemia que estamos presenciando, certamente o mundo precisará, via OMS ou que organização for, rever seus protocolos internacionais de segurança para prevenir, reduzir ou controlar a entrada de novos vírus que possam afetar a espécie humana, o que inclui certamente encontrar a causa ou causas raízes deste tipo de problema.

Lembrando que são casos reincidentes, afinal recentemente tivemos a H5N1 (gripe aviária) em 2004 e a H1N1 (gripe suína) em 2009, e agora estamos com a COVID-19 fazendo vítimas e paralisando toda a economia mundial em 2020.

Fica evidente que um bom lugar para começar a tratativa do problema certamente são os mercados úmidos.

Temos de debater este assunto muito seriamente, pois esta pandemia deixou a sensação de que em termos de segurança à saúde pública, nossos esforços em food safety estão arranhando um tema que pode ter uma profundidade muito maior, justamente relacionada aos hábitos alimentares de alguns, mas que colocam a todos em risco, mesmo quem não se alimenta de animais exóticos.

Este é um texto autoral e não reflete necessariamente a opinião da Associação Food Safety Brazil.

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O perfil de líderes que favorecem a Cultura Food Safety

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O tema deste artigo envolvendo a cultura food safety surgiu a partir do questionamento de um dos leitores do blog: “como lidar com chefes que não dão exemplos sobre hábitos higiênicos”.

A sugestão me chamou a atenção e corri para escrever sobre isso porque é um tema que me fascina e uma questão que recorrentemente surge em grupos de profissionais que atuam na indústria de alimentos e bebidas, demostrando que infelizmente, ainda nos deparamos com pessoas em cargos de liderança, portanto, de decisão, para as quais ainda não “caiu a ficha” de que neste segmento não basta apenas produzir, mas é preciso produzir atendendo especificações técnicas, e acima de tudo, garantindo alimentos e bebidas seguras aos consumidores.

Claro que uma empresa deve contratar profissionais comprometidos com a produtividade e o rendimento, com a máxima do “fazer mais com menos”, de ter foco em cortar custos, em otimizar processos, etc, que são direcionamentos tão necessários num cenário de mercado competitivo.

Contudo, na indústria de alimentos, isso precisa vir sempre somado ao componente qualidade e food safety, de outro forma tudo pode ser posto a perder, pela elevação dos custos de não qualidade como já tratado no artigo Gestão de food safety focada em resultados, ou pior, pela perda de imagem associada a problemas que coloquem em risco a saúde de consumidores, inclusive podendo destruir totalmente uma marca.

Cabe então às organizações no momento de selecionar profissionais, cuidarem ao longo do processo seletivo de escolher pessoas com o perfil apropriado, e veja, aqui não falo apenas daqueles que irão trabalhar diretamente em áreas de qualidade e food safety, mas de qualquer profissional que terá poder de decisão em temas de apoio e suporte à produção de alimentos e bebidas, o que inclui, por exemplo, pessoal de produção industrial, manutenção, compras, etc.

Pois veja:

  1. O pessoal do industrial tem como meta principal produzir a quantidade estipulada num prazo determinado de acordo com a programação de SKUs estabelecida, mas tudo tem que atender especificações e estar livre de contaminantes químicos, físicos e microbiológicos ou de nada adianta;
  2. O pessoal de manutenção tem que garantir o funcionamento do parque industrial com metas de obter a melhor disponibilidade dos equipamentos, os máximos intervalos entre quebras e mínimos tempos de reparo, mas tem que fazer isso enquanto previne a contaminação das linhas de produção e garantindo a segurança dos equipamentos, como visto no artigo TPM a serviço da segurança dos alimentos;
  3. O pessoal de compras tem que comprar matérias-primas, insumos e embalagens pelo melhor preço e prazo, mas sempre respeitando especificações a partir de fornecedores previamente qualificados, capazes de garantir a entrega de produtos seguros ao longo dos abastecimentos.

Ou seja, quando se trata de “desenhar” perfis de cargo na indústria de alimentos e bebidas, não se restringe somente ao pessoal da qualidade a escolha de pessoas que tenham um foco em food safety, ainda mais para cargos de liderança, afinal, estrategicamente não há nada mais verdadeiro do que o velho jargão que diz que “um exemplo vale mais do que mil palavras”, uma vez que líderes dão o rumo das organizações.

Assim, um profissional na posição de liderança que demonstra praticar ações voltadas para segurança dos alimentos, a começar evidentemente pelos hábitos higiênicos e de BPF pessoais, ajudará a partir de seu exemplo a aculturar todo um time.

Analogamente, mas num viés inverso, aqueles líderes que não dão o exemplo colocam todo um programa de Food Safety a perder, porque eles não terão uma conduta moral que lhes permita cobrar o cumprimento de regras de seus subordinados, tornando-se portanto, um elo fraco em todo o processo de segurança dos alimentos de uma organização; em outras palavras, representam risco.

Na definição destes perfis com a estruturação dos papéis que são ocupados pelos cargos nas organizações, como uma boa prática de gestão, devemos planejar o que esperamos dos profissionais em termos de competências e conscientização, sendo que:

Competências são determinadas a partir de conhecimento, experiência e treinamento, já conscientização pode ser facilitada a partir da correta escolha do perfil dos profissionais.

Tratando-se da determinação das COMPETÊNCIAS para um perfil de cargo, a seguir é apresentado um exemplo típico (resumido) para gerente de operações na indústria de alimentos, e veja que são determinadas “especificações curriculares” que direcionam a busca de um profissional que ocupará esta função.

Figura 1: Modelo de descritivo de cargo:

Mas mesmo que uma organização encontre um profissional que se encaixe atendendo devidamente a todas as recomendações da vaga, de nada adianta se não houver conscientização para o tema segurança dos alimentos, afinal, a produção de alimentos seguros deve vir prioritariamente.

A conscientização busca um comportamento onde os indivíduos mesmo quando sem supervisão realizam corretamente suas atividades e tarefas, sabendo que não o fazendo, irão comprometer a qualidade e a segurança dos alimentos, e assim, prejudicar ou causar danos aos consumidores.

A CONSCIENTIZAÇÃO, como se vê, já é um pouco mais complexa de especificar de forma objetiva para auxiliar na realização de recrutamentos, uma vez que está ligada ao comportamento de cada indivíduo. A seguir são apresentadas características que devem ser buscadas, portanto, desejáveis a um profissional que ocupará cargos de liderança na indústria de alimentos e bebidas, justamente porque favorecem a produção de alimentos seguros. Em contraponto, também são apresentadas caraterísticas que são indesejáveis, pois sabotam o programa de Cultura Food Safety em uma organização.

Tabela 1: Características profissionais desejadas e indesejadas:

Obviamente, nem todos indivíduos têm 100% das características positivas ou sabotadoras, mas apresentam um pouco mais de uma ou outra das características apresentadas, inclusive situacionalmente, afinal o ser humano é uma criatura complexa quando se trata de comportamento e sentimentos.

É a predominância das características sabotadoras que se torna um grande problema, e cada uma delas deve ser trabalhada com orientação das organizações, por exemplo via feedbacks, em prol de uma mudança real de comportamento para que que a liderança, de fato, possa exercer da melhor forma seu papel na condução de um time que favoreça a Cultura Food Safety.

Para reforçar a condução de perfis proativos na direção da segurança dos alimentos e integrar times, é aconselhável também que as organizações, quando estruturam metas individuais, utilizem entre diferentes departamentos o uso de metas cruzadas, de forma a incentivar, por exemplo, que equipes de produção industrial persigam metas de produtividade e rendimento, mas sem abrir mão de qualidade e food safety, sendo que se surgirem reclamações, reprocesso e devoluções, haverá um decréscimo de pontuação (penalidade).

Da mesma forma se incentiva via metas que os times de qualidade também atuem em prol de rendimento e produtividade, para que não se tornem meros apontadores de problemas e foquem só a retenção de lotes, mas para que atuem ativamente e preventivamente via análise de riscos, ou corretivamente ajudando times industriais a solucionar problemas da produção.

Então, voltando à questão inicial “como lidar com chefes que não dão exemplos sobre hábitos higiênicos”, acredito que o caminho seria:

  1. Primeiramente, escolhendo melhor o perfil profissional de quem ocupará cargos de chefia na indústria de alimentos, para que sejam pessoas já comprometidas com o tema food safety;
  2. Para os profissionais antigos de casa, que já ocupam estas funções e que carecem desta conscientização no tema, prover treinamentos e uma conversa franca por parte da alta direção, informando de forma inequívoca que precisam mudar de comportamento;
  3. Para aqueles que não mudam de comportamento de jeito nenhum, portanto, não conseguem entender a importância de produzir alimentos seguros e de dar o exemplo a seus liderados neste sentido, talvez não reste opção que não a de substitui-los, uma vez que colocam em risco a saúde de consumidores.

Gostou do artigo? Posso dar uma sugestão para que tenhamos mais profissionais engajados com Food Safety?

Envie gentilmente este artigo aos líderes não engajados para que reflitam e quem sabe revejam seu comportamento; envie também para os departamentos de Recursos Humanos para que considerem estas questões nas contratações; e por fim, para os diretores de empresas de alimentos e bebidas que são os tomadores de decisão.

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Desafios brasileiros para implantação da cultura Food Safety

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Quando contratamos pessoas para trabalhar na indústria de alimentos, bebidas e suas embalagens, visando à produção de alimentos não só dentro de suas especificações técnicas associadas à qualidade percebida, como umidade, textura, sabor, cor, aroma, etc, mas também dentro da condição intrínseca de serem seguros, ou seja, livres de quaisquer tipos de contaminantes, percebemos que os treinamentos normalmente oferecidos são apenas o começo de um trabalho muito mais profundo para se chegar plenamente a um ambiente onde há efetivamente uma cultura voltada a Food Safety.

Numa plena cultura Food Safety os indivíduos são capazes de praticar ações que previnam a contaminação.

Há um desenvolvido olhar de gestão de riscos que ocorre de uma forma natural, o que passa por seguir devidamente procedimentos e regras que cada organização cria de acordo com seu contexto e riscos associados aos seus produtos, suas características e as tecnologias utilizadas, e claro, pela disposição de cada indivíduo em praticar assiduamente hábitos de higiene pessoal e ambiental que passam a ser compreendidos por todos como condições rotineiras necessárias às atividades.

Isso tudo desperta uma cultura efetivamente proativa, que deve ser a marca principal de uma cultura Food Safety, que alerta quando riscos são identificados nas operações e os previnem dentro das rotinas diárias. Tais alertas devem partir de qualquer um, pois todos passam a ter responsabilidades equiparáveis neste tema, em cada uma das diversas e diferentes atividades que realizem, seja num posto operacional, de gestão ou estratégico.

Inicialmente, como regra geral, damos treinamentos aos novos funcionários, como os de integração, e depois, periodicamente fazemos reciclagens, onde nós os levamos para uma sala, passamos alguns slides, tratamos temas como BPF, CIP, HACCP, alergênicos, etc. Até fazemos jogos e dinâmicas de fixação, muitas vezes inclusive dedicamos esforços na criação de “semanas da qualidade”, mas nada garante que o tema foi ou será efetivamente absorvido e fixado, e mais, que será posto em prática pelas pessoas dali em diante em seu dia-a-dia dentro das atividades que realizam.

Falamos aqui de coisas muitas vezes simples, como por exemplo, de BPF pessoal: de não ter barba, bigodes ou costeletas; de cortar os cabelos e mantê-los devidamente dentro de toucas; de ter sempre as unhas limpas, aparadas e sem esmalte; de tomar banho diariamente; de escovar os dentes após cada uma das refeições; de não usar adornos como brincos, anéis, piercings; de não usar perfumes ou desodorantes com odores fortes; de usar os sanitários de forma higiênica, fazendo devidamente as necessidades dentro dos locais apropriados, de não jogar papel no chão e deixar as lixeiras devidamente fechadas; de alertar superiores quando se está com alguma infecção, etc. E claro, de manter as mãos sempre muito bem limpas e higienizadas.

Parece simples, não é?

Parece óbvio que as pessoas que atuam na indústria de alimentos tenham que seguir hábitos higiênicos, não?

A questão começa a se apresentar como um desafio porque o Brasil é um país de dimensões continentais onde a situação da coleta de esgoto é precária e apenas 66% das casas têm acesso à rede, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2018. No Piauí, pior colocado na lista, esse índice é de apenas 7% das residências; em outros 13 estados, o número é menor do que 50%.

Figura 1: Mapa dos domicílios com rede de esgoto pela rede em 2018.

 

Não é uma situação homogênea, há discrepâncias regionais significativas com relação à coleta de esgoto, pois enquanto a região Sudeste tem 88,6% das casas atendidas, a Norte tem apenas 21%.

As diferenças entre o campo e as cidades também são grandes. Cerca de 74% dos domicílios urbanos têm seu esgoto coletado pela rede, mas essa proporção é de apenas 7,4% nas áreas rurais, que recorrem principalmente a fossas (80%).

De tudo o que é coletado, porém, apenas uma parte passa por tratamento. Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (Snis) de 2017, em todo o Brasil, apenas 73,7% do esgoto coletado é tratado. A região Sul é a que mais trata o material que coleta (93,7%), seguida por Centro-Oeste (92,6%), Norte (84,6%), Nordeste (80,8%) e Sudeste (67,3%).

No entanto, se for considerado todo o esgoto gerado no país, coletado ou não, apenas 46% recebe tratamento.

Em relatório de 2018 sobre a situação do saneamento nos 100 municípios mais populosos do país, o Instituto Trata Brasil destacou que 21 deles tratam menos de 20% do volume de esgoto produzido, sendo este assunto o principal gargalo do saneamento básico em nosso país.

E logicamente, a carência de saneamento básico tem impacto direto na saúde das pessoas, pois conforme destaca o Sistema de Informações Hospitalares do SUS, do Ministério da Saúde, houve três milhões de internações por conta de doenças relacionadas à insuficiência de saneamento básico em dez anos, entre 2009 e 2018.

As regiões Norte e Nordeste, que têm as piores taxas de cobertura de saneamento básico, também apresentam as maiores taxas de internação por doenças evitáveis relacionadas à carência de saneamento básico. Enquanto a média nacional é de 65 internações por 100 mil habitantes, no Norte e no Nordeste as taxas são de 110 e 121, respectivamente.

As doenças decorrentes da falta de coleta de esgoto e lixo ou do acesso à água tratada incluem aquelas causadas por contato com fezes, transmitidas por insetos vetores, além de verminoses (helmintíases e teníases), segundo o Ministério da Saúde, ou seja, todos configuram riscos provenientes de manipuladores quando pensamos em segurança dos alimentos.

Ainda de acordo com o Sistema de Informações sobre Mortalidade, também do Ministério da Saúde, essas doenças relacionadas ao saneamento básico inadequado foram responsáveis por 73,4 mil mortes em 10 anos, entre 2008 e 2017.

Podemos dizer que, por isso, temos no Brasil um desafio maior em comparação com países do primeiro mundo onde a questão do saneamento básico já está equacionada, afinal, temos que lidar com uma mão de obra com maior risco potencial de doenças ocasionadas por falta de saneamento básico.

Além disso, naquilo que se refere à cultura Food Safety, teremos um público que por não ter acesso ao saneamento básico em seus lares, se depara com regras na indústria com as quais não está bem familiarizado, afinal, neste cenário, nem todos em seus lares têm banheiros, batentes e pias apropriadas com água tratada e algum detergente e sanitizante.

Qual o reflexo direto disso e que comprova este fato?

Basta dar uma olhada nos banheiros das indústrias e avaliar se efetivamente se mantem de forma satisfatória!

Banheiros são áreas críticas pelos riscos microbiológicos e onde se requer muitas vezes que se gaste muito tempo e energia para garantir um ambiente sanitário minimamente satisfatório, e refletem de forma escancarada, o grau e nível de inserção da Cultura Food Safety numa organização.

Alias, o uso de um banheiro público no Brasil, de forma geral, é sempre um drama, seja num bar, numa lanchonete, numa rodoviária, numa parada de posto de combustíveis, e até mesmo em aeroportos, demonstrando que os cuidados com os hábitos higiênicos ainda são bem precários.

Por isso tudo, as organizações se veem obrigadas a assumir um papel educador, de transformação, propriamente de aculturamento em temas relacionados à higiene pessoal e cultura Food Safety, e eis que aqui surge então um segundo grande desafio para indústria alimentícia brasileira, relacionado ao fato de que, segundo dados de 2005 do IBOPE, no Brasil o analfabetismo funcional atinge cerca de 68% da população, sendo 30% no nível 1 e 38% no nível 2.

Tabela 1: Diferença entre os níveis de analfabetismo funcional:

Nível 1 – Alfabetização rudimentar   Nível 2 – Alfabetização básica
Compreende aqueles que apenas conseguem ler e compreender títulos de textos e frases curtas; e apesar de saber contar, têm dificuldades com a compreensão de números grandes e em fazer as operações aritméticas básicas.

 

Compreende aqueles que conseguem ler textos curtos, mas só conseguem extrair informações esparsas no texto e não conseguem tirar uma conclusão a respeito do mesmo; e também conseguem entender números grandes, conseguem realizar as operações aritméticas básicas, entretanto sentem dificuldades quando é exigida uma maior quantidade de cálculos, ou em operações matemáticas mais complexas.

Somados esses 68% de analfabetos funcionais com os 7% da população que é totalmente analfabeta, temos que:

75% da população não possui o domínio pleno da leitura, da escrita e das operações matemáticas, ou seja, apenas 1 de cada 4 brasileiros é plenamente alfabetizado.

Pois bem, esta é a mão de obra que ocupará grande parte das vagas de auxiliares e operadores na indústria de alimentos e bebidas, e vejam, não é que estes indivíduos não tenham um diploma de “segundo grau”, muitas vezes tal diploma até existe, mas mesmo com tal diploma a capacidade de interpretar textos e de fazer minimamente operações matemáticas é muito precária.

O tema é muito grave, e muitas vezes não se restringe apenas à mão de obra que ocupa postos de base. Em 2012, o Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa divulgaram o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf) entre estudantes universitários do Brasil e este chega a incríveis 38%, refletindo o expressivo crescimento de universidades de baixa qualidade durante a última década.

É claro que isto terá impactos na forma, velocidade e ações necessárias para a implantação de uma Cultura Food Safety. Terá reflexo diretamente ao ministrarmos treinamentos, pois justamente por isso, precisamos usar uma linguagem apropriada para que se atinja uma absorção de conteúdo minimamente aceitável, e é preciso ir além, estas pessoas terão no seu dia-a-dia que ler e entender POPs (Procedimentos Operacionais Padronizados), fazer registros de monitoramento, e outras diversas atividades que requerem interpretar textos e usar, ao menos, a matemática básica.

POPs, por exemplo, precisam ser escritos em linguagem capaz de ser entendida por este público que tem dificuldades em ler e interpretar textos, tema que tratei no artigo “Cuidado para não transformar seu sistema de gestão num cartório!”

Afinal, o que se espera não é apenas a existência de um POP, mas que ele seja útil, e para isso, precisa ser lido e compreendido, e como a capacidade de compreensão por analfabetos funcionais é limitada, há que se recorrer ao uso de figuras, desenhos, fotos, fluxogramas, cores de alerta e palavras muito bem escolhidas para garantir seu entendimento, além, é claro, de treinamentos mais frequentes e que enfatizem especialmente ações essenciais para prevenir contaminações.

A Dra. Lone Jespersen que vem tratando o tema de forma brilhante define Cultura em Food Safety como as atitudes, valores e práticas predominantes relacionadas à segurança de alimentos que são ensinadas direta e indiretamente a novos funcionários pelas organizações.

Contudo, não é apenas uma questão daquilo que é “ensinado”, mas principalmente daquilo que é “aprendido e efetivamente absorvido”, e por isso, de novo, ensinar é apenas a primeira ação de um desafio que é muito maior quando falamos em aculturamento, ação esta que é dificultada, evidentemente, num cenário onde há tantos analfabetos funcionais.

Fora isso, após ensinar regras de food safety, há que se fazer um grande esforço para garantir uma atitude de conscientização, ou seja, a prática daquilo que se aprendeu na teoria, o que pode ser via repetição de treinamentos, exemplo dos líderes, valorização por meritocracia de quem se destaca incentivando ações proativas, orientação e cobrança diária.

Figura 2: Esforços para o avanço de uma Cultura Food Safety.

Todas estas são ferramentas indispensáveis. Com o tempo, se tudo estiver ocorrendo a contento, passamos a ter um comportamento de agir corretamente no que se refere à Food Safety, sem que seja preciso “vigilância ferrenha e constante”, até atingirmos um comportamento coletivo, onde as pessoas de fato praticam regras de segurança dos alimentos, começando indubitavelmente pelos próprios hábitos higiênicos, e isso requer esforço constante e tempo apropriado.

Atingir o comportamento coletivo é fantástico, porque em um ambiente onde todos praticam regras de Segurança dos Alimentos e Higiene, mesmo novos empregados o farão, por verem os colegas fazerem, pois o exemplo direciona ações.

Mas o inverso também é verdadeiro: sem uma sedimentada cultura Food Safety, mesmo novos empregados que acabaram de receber treinamentos não se verão engajados e motivados a seguirem as regras que aprenderam, preferindo seguir o que a “maioria” pratica.

Imagino que o leitor até aqui já percebeu que o tema Cultura Food Safety é imprescindível para garantir a produção de alimentos seguros, mas que sua criação de forma efetiva e robusta é um grande desafio e que sua implementação está longe de ser um mar de rosas, pois além dos problemas estruturais associados à falta de saneamento e educação básica que temos em nosso país que configuram um desafio a mais como visto, temos ainda outros relacionados à natureza humana, de pessoas que não querem mudar seus hábitos, mesmo conscientes de que suas atitudes configuram riscos.

Quem nunca se deparou com os teimosos que insistem em não se adequar às regras de organização, ou com frases típicas como “isso é um exagero”, “sempre fiz deste modo e não vou mudar”, “lá vem esse pessoal da qualidade criar regras para atrapalhar meu serviço”, ou coisas mais ou menos assim?

Em comportamento de times industriais em momentos de mudança, e falo aqui com base na minha experiência pessoal de anos na indústria de alimentos, vejo que há aqueles grupos que vestem a camisa e querem mesmo colocar em prática o que aprenderam, assim como há aqueles que não querem de jeito nenhum mudar seus velhos hábitos, e no meio disto tem uma maioria que “vai na onda”, que vai seguir o que a empresa ditar como regra e o a maioria dos colegas de trabalho vier a fazer. Estes comportamentos típicos se distribuem de forma razoavelmente semelhante a uma  curva de Gauss.

Figura 3: Grupos de engajamento a mudanças.

O segredo é utilizar ao máximo a ajuda do pessoal que efetivamente vestiu a camisa (círculo verde), com ações para potencializar e fazer crescer este grupo, porque eles ajudarão a conduzir os rumos dos demais (círculo amarelo) em prol de um comportamento proativo voltado à segurança dos alimentos. Mas ao mesmo tempo, é preciso monitorar aqueles que não querem cooperar (círculo vermelho), tentando trazê-los ao grupo de ações positivas ou ao menos ao grupo dos que não atrapalham ou configuram riscos, inclusive sob a possibilidade de serem influenciadores e acabarem sabotando todo um programa de criação de Cultura Food Safety, justamente pela influência que também exercem sobre o grupo do círculo amarelo.

Como consequência do não engajamento, a Cultura Food Safety pode realmente configurar aumento da probabilidade de riscos quanto à produção de alimentos e bebidas seguras, tais pessoas algumas vezes precisam ser afastadas de atividades de maior risco como manipulação direta, áreas críticas do processo, pontos críticos de controle identificados em planos de HACCP, postos de liderança justo porque possuem um papel influenciador, e até de áreas susceptíveis à sabotagem como previsto em programas de Food Defense (veja mais em Guia de Food Defense da FSSC 22000 em português).

Finalizo dizendo que este artigo não tem objetivo de assustar o leitor frente aos desafios extras que temos por sermos um país ainda em desenvolvimento, mas de trazer à tona o tema Food Safety no cenário brasileiro. Não basta pegarmos a literatura e os estudos que estão sendo produzidos lá fora apenas, por melhores que sejam, mas há que entendê-los dentro de nossa realidade, adaptá-los, e só assim, trabalharmos para o que efetivamente se deseja com isso, que é a produção de alimentos seguros.

Por fim, lembre que você que foi capaz de ler e entender um texto como este é a exceção em nosso país, por isso, tem uma responsabilidade a mais em cooperar para a implantação da Cultura Food Safety em nossos cenários produtivos de alimentos e bebidas.

Para quem quiser ler um pouco mais:

  1. Cultura de Segurança dos Alimentos: pequenas iniciativas, grandes resultados!
  2. Cultura Food Safety – Caminhos e Desafios da Liderança
  3. O que é cultura e como nossos hábitos transformam as organizações
  4. Cultura de segurança de alimentos: uma jornada
  5. Cultura da Segurança dos Alimentos: 7 práticas vencedoras para definir um tom positivo!
  6. Gestão da cultura organizacional e a segurança dos alimentos
  7. Food Safety para crianças nas escolas – como ensinar boas práticas e garantir que a segurança dos alimentos se torne um hábito desde a infância
  8. GFSI lança paper sobre Cultura de Segurança de Alimentos
  9. Cultura de Accountability na Segurança dos Alimentos
  10. Exemplos para engajamento e alcance da maturidade em Cultura de Segurança de Alimentos

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Você é um pensador ou um fazedor em Food Safety?

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Em pleno início de 2020 provoco a seguinte reflexão: você é um pensador ou um fazedor em Food Safety?

Quantas vezes nos deparamos com situações em que as discussões levam “horas” e saímos com a sensação de nada decidido? Ou então quantas vezes levantamos um determinado problema e ações são imediatamente tomadas sem uma avaliação de uma causa-raiz e uma certeza de um resultado eficaz?

Diante das lutas diárias em Food Safety precisamos lidar com todo o tipo de situação, como revisão de planilhas, controle e distribuição de informação documentada, bloqueio de produtos, controle de materiais, treinamentos, conscientização de pessoas, controle de pragas, ou seja, a lista é extensa e eu poderia escrever aqui ainda uma infinidade de atribuições.

O Pensador

Todas essas atribuições necessitam sim de um pensador, de serem avaliadas previamente quanto aos riscos envolvidos para a segurança de alimentos. Precisamos ser cautelosos: aquela nova proteção de máquina é de aço inox?

O Fazedor

Em contrapartida, a Segurança dos Alimentos exige também um fazedor, exige ser ativo, tomar decisões rápidas, por a mão na massa, ir à linha falar com o operador, organizar aqueles 50 slides para o treinamento de BPF, construir o “enorme” fluxograma do estudo de APPCC.

Diante de uma realidade na qual a evolução está cada vez mais rápida e intensa, o mercado em constante mudança e se atualizando para manter a competitividade, precisamos estar preparados para que ideias, melhorias e necessidades não fiquem apenas na cabeça, passem para o papel e consequentemente sejam aplicadas.

Conseguimos ser equilibradamente ambos? Fica o convite para a reflexão!

Veja também:

Cultura de Segurança dos Alimentos: pequenas iniciativas, grandes resultados!

O que é cultura e como nossos hábitos transformam as organizações

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Alimentos não orgânicos são seguros?

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O nome agrotóxico por si só já assusta o público consumidor, pois traz na formação da palavra a informação de que “estão colocando algo errado na nossa comida”, e é justamente por isso, para evitar este estigma, que quem trata do tema com serenidade buscando evitar alarmismos e julgamentos prévios, prefere utilizar o termo defensivo agrícola ou defensivo fitossanitário.

Vou começar este texto dizendo que o agricultor não usa defensivos agrícolas simplesmente porque gosta, porque deseja, porque é um louco sádico malvadão querendo envenenar as pessoas, e mais, garanto que se pudesse, inclusive não usaria, em parte porque prefere não manipular este tipo de produto que traz riscos em termos de saúde ocupacional, também porque o apelo do orgânico é crescente e abre mercados, mas acima de tudo, porque defensivos agrícolas são caros, são um custo que qualquer produtor evitaria ter, se simplesmente fosse uma questão de opção de uso ou não.

Então por que os agricultores usam defensivos agrícolas? Simples a resposta: porque não se faz efetiva agricultura de larga escala para alimentar quase 8 bilhões de pessoas no planeta sem o uso de tecnologias para controlar pragas e doenças nas lavouras e garantir produtividade.

Defensivos agrícolas são um recurso da agricultura moderna que ajuda a humanidade a evitar a fome.

No final, os defensivos agrícolas agem como os remédios que tomamos para garantir a nossa saúde combatendo doenças e enfermidades, pois da mesma forma, preferiríamos não tomá-los, porque todos podem apresentar algum efeito colateral e são caros, mas quando precisamos e não tem jeito, tomamos sim, assim como também tomamos vacinas preventivas a diversas doenças. Na agricultura, analogamente, ocorre o mesmo.

Utilizando esta analogia, para o uso correto de um remédio, ele deve ser prescrito por um médico, nunca por automedicação, devemos tomá-lo na dosagem indicada e nos horários corretos; da mesma forma, um defensivo agrícola deve ser indicado por um agrônomo competente, segundo a cultura agrícola onde será aplicado, nunca por indicação de um vizinho ou pela escolha própria do agricultor, o que seria uma automedicação, também é claro, na dosagem correta indicada na bula e respeitando-se os prazos de carência entre aplicação e colheita.

Nunca é demais também lembrar a célebre frase de Paracelso, um médico do século XVI:

A diferença entre o remédio e o veneno é a dose.

O tema é cercado de tabus, recentemente o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento brasileiro abriu a possibilidade para que os agricultores do país tenham acesso e possam utilizar novos defensivos e houve muita comoção e desinformação em redes sociais e até na TV, porque é fácil levar o tema para um discurso raso, como se o governo quisesse simplesmente aumentar a liberação de “venenos”.

Alguns canais de comunicação preferem inclusive desinformar a população e criar pânico, como matérias com títulos alarmistas do tipo “Brasileiros consomem 7,36 litros de agrotóxicos por ano”, o que gera muitos likes, mas não contribui em nada para uma discussão madura e séria sobre este assunto.

Na verdade, há cerca de uma década não eram autorizados novos defensivos no Brasil, sendo que surgiram muitas moléculas mais eficientes contra pragas, e que se usadas corretamente, tem um potencial de menor impacto à saúde humana e ao meio ambiente.

Por isso, volto à analogia usada até aqui:

Já pensou se em nossas farmácias só tivéssemos hoje os remédios de 10 anos atrás para cuidar da nossa saúde?

Isso seria melhor ou pior para tratar nossas doenças?

Também foi alardeado que o Brasil é o país onde mais se consomem agrotóxicos no mundo.

A melhor fonte com dados sobre o uso de agrotóxicos é a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e compara o valor investido em pesticidas nos 20 maiores mercados globais e atribui três rankings sob diferentes perspectivas: em números absolutos, número por área cultivada e por volume de produção agrícola.

Então, de fato, o Brasil aparece como o país que mais gastou em defensivos químicos, seguido pelos Estados Unidos, China, Japão e França.

MAIORES CONSUMIDORES DE DEFENSIVOS AGRÍCOLAS EM US$

Mas isso é óbvio, afinal o Brasil é um líder mundial em produção agrícola, batendo recordes ano a ano de produção, chegando a três safras por ano de algumas culturas, somos o país que lidera em produtividade na agropecuária mundial, e deveríamos ter orgulho disto, sendo grandes produtores e fornecedores mundiais de cana-de-açúcar, café, laranja, soja, fumo, milho, carne bovina, suína e de frango, além de uma infinidade de outros produtos que temos a oferecer ao mundo.

Porém, quando olhamos estes números pela eficiência do uso dos defensivos agrícolas, em indicadores que medem o quanto é investido em agrotóxico por hectare plantado, já caímos para um sétimo lugar, atrás do Japão, Coreia do Sul, Alemanha, França, Itália e Reino Unido.

CONSUMO DE DEFENSIVOS AGRÍCOLAS POR ÁREA CULTIVADA EM US$/ HECTARE

Melhor ainda é quando olhamos o que cada país gasta pelo tamanho da produção agrícola que produz, o que é o indicador mais lógico, e aí o Brasil é o 13º da lista, que mais uma vez é liderada por Japão e Coreia do Sul.

CONSUMO DE DEFENSIVOS AGRÍCOLAS POR PRODUÇÃO AGRÍCOLA EM US$/ TONELADA PRODUZIDA

Sobre a efetiva segurança do uso de defensivos agrícolas no Brasil, o Plano Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes em Produtos de Origem Vegetal (PNCRC/ Vegetal) realizado entre 2015 e 2018 mostrou que 92% das amostras de vegetais analisadas estão dentro do nível de conformidade, ou seja, são seguras para consumo.

O PNCRC monitora tanto resíduos de defensivos agrícolas como de contaminantes químicos como arsênio e cádmio e biológicos como micotoxinas e Salmonella, em produtos de origem vegetal, sendo analisadas amostras de produtos nacionais e importados.

Desse valor, 53% não apresentaram nenhum resíduo e contaminante e outros 39% das amostras apresentaram valores abaixo do Limite Máximo de Resíduos (LMR) estabelecido no Brasil.

Já os 8% das amostras que apresentaram situações não conformes se subdividem em 7% que representam problemas associados ao uso resíduos de defensivos agrícolas e 1% que mostraram a presença de contaminantes.

Destes 7% de não conformes quanto ao uso de defensivos agrícolas, temos o uso de produtos não permitidos para a cultura (4,24%), pesticidas acima do limite máximo de resíduos (1,77%) e uso de agrotóxicos proibidos no Brasil (0,99%).

Mas é preciso salientar que o fato de um defensivo agrícola não permitido para a cultura ter sido detectado não significa, necessariamente, risco para a saúde dos consumidores. Isso acontece muitas vezes em pequenas culturas, que não encontram produtos apropriados para a utilização, novamente, porque há dez anos não havia a liberação de novas moléculas (mais eficazes e seguras) para serem utilizadas no Brasil.

Já a detecção de defensivos acima do limite máximo indica que o uso do produto foi inadequado, não seguindo as orientações da bula do produto, o que normalmente ocorre em pequenas propriedades de agricultura familiar, uma vez que a agroindústria melhor estruturada, justamente para ter controle de custos, é bem assessorada por agrônomos para fazer o uso mais eficiente destes produtos, dizer-se-ia, uso pontual, evitando-se gastos desnecessários.

O mais interessante é que estes resultados se assemelham muito aos divulgados pela Autoridade de Segurança Alimentar Europeia (EFSA – European Food Safety Authority) e pela Administração de alimentos e remédios dos Estados Unidos (FDA – Food and Drug Administration), ou seja, neste tema não estamos atrás de ninguém.

Aliás, faço um adendo aqui para dizer que a agroindústria nacional dá um show, já na vanguarda do uso de inteligência artificial, sistemas de detecção de pragas por imagem e drones para aplicação cirúrgica de defensivos agrícolas e outros controles fitossanitários, embarcando na indústria 4.0, o que tornará o Brasil ainda mais produtivo a custos cada vez mais competitivos.

Portanto, voltando ao nosso foco que é food safety, é possível concluir que produtos convencionais, não orgânicos, portanto que usam em seu cultivo defensivos agrícolas, podem sim ser absolutamente seguros, desde que os tratos fitossanitários aplicados na condução e manejo da plantação sigam devidamente suportados por técnicas apropriadas de Boas Práticas Agrícolas, que incluem:

  1. Uso de defensivos agrícolas permitidos e apropriados a cada cultura;
  2. Usar estritamente sob orientação de um agrônomo competente;
  3. Seguir devidamente as bulas quanto à dosagem de cada produto;
  4. Seguir os prazos de carência, que são os intervalos entre as aplicações e colheita;
  5. Ter cuidados e técnicas para prevenir contaminações cruzadas, seja na lavoura/ plantação, house packs ou na logística de distribuição.

A discussão madura e livre de paixões em segurança dos alimentos deve sempre ser precedida de análises baseadas em riscos, medidas de controle, dados estatísticos e epidemiológicos, e acima de tudo em ciência, fora desta concepção há uma visão distorcida superficial de que apenas alimentos orgânicos são bons e adequados.

Não é porque um alimento não é orgânico que ele estará contaminado por agrotóxicos, na verdade, a maior probabilidade é de que não esteja, pois mesmo que eles tenham sido aplicados na plantação, se os tratos fitossanitários foram corretos, até o consumo ele estará livre de residuais ou em níveis já tidos como seguros. 

Inclusive, vale salientar que há uma visão equivocada de que todos orgânicos em termos de segurança dos alimentos apresentam risco zero, quando na verdade um dos riscos mais comumente associados com alimentos orgânicos é o da contaminação biológica, com registro de vários surtos de intoxicação com bactérias ou toxinas produzidas por bactérias, entre os muitos exemplos, podemos citar o surto da bactéria Escherichia coli 0157:H7, que produz uma toxina altamente letal, em pepinos, alface, espinafre e outras hortaliças orgânicas, inclusive levando pessoas  a óbito nos EUA e na Europa.

A gestão de riscos tão necessária para a garantia de alimentos seguros, então, não se limita à superficialidade de acreditar ingenuamente que se é orgânico é bom e seguro e que se usa defensivos agrícolas é ruim e perigoso, mas compreende que ambas as categorias têm diferentes riscos associados, que requerem efetivas medidas de controle, podendo ser seguros ou não, de acordo justamente com a forma como tais riscos são controlados, reduzidos ou eliminados. 

Portanto, produtos agrícolas não orgânicos podem sim ser devidamente seguros, e para avançarmos ainda mais na garantia desta segurança, precisamos agir justamente onde já foram diagnosticados pontos frágeis em que ainda temos não conformidades detectadas e podemos evoluir:

  • Evitar o uso de produtos não permitidos para cada cultura cultivada;
  • 2° Não executar aplicações incorretas e respeitar sempre os prazos de carência para garantir o uso pesticidas dentro dos limites máximos permitidos;
  • 3° Não usar defensivos agrícolas proibidos no Brasil;
  • 4° Prevenir a contaminação cruzada.

Já dentro da indústria, aqueles que fazem uso de produtos de origem agrícola devem considerar em seus processos de qualificação de fornecedores, optar justamente por produtores que fazem uso de Boas Práticas Agrícolas, sendo capazes de, por rastreabilidade apropriada, demonstrarem que seus produtos foram produzidos seguindo devidamente os melhores tratos fitossanitários, e que portanto, são seguros quanto ao uso de defensivos agrícolas, dentro da técnica e responsabilidade necessária ao uso deste recurso.

Para quem quer se aprofundar um pouco mais…

Seguem alguns artigos correlacionados:

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  10. Como consultar os agrotóxicos que podem ser utilizados nos alimentos e quais os limites máximos

Este é um texto autoral e não reflete necessariamente a opinião da Associação Food Safety Brazil.

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Food defense em embalagens suscetíveis de alterações

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Diante do cenário tecnológico e inovador que estamos vivendo em todas as áreas, um mercado que não ficou para trás é o de embalagens. São vários modelos, materiais e cores que informam, induzem, acondicionam e desempenham um papel importante no produto interno. Não é à toa que em alguns casos o custo da embalagem é maior que o do próprio produto contido.

No mercado de alimentos esse setor segue em constante evolução. Com o avanço da tecnologia, embalagens que mudam de cor conforme o grau de maturação do produto ou conforme o quão fresco ele está são só o começo. São almejadas embalagens comestíveis entre outras “facilidades”. O que não pode cair em esquecimento é a principal função da embalagem: conter e proteger o alimento. 

Conter o alimento é um papel fácil de desempenhar, o difícil mesmo é PROTEGER.

O alimento pode ter sua qualidade organoléptica protegida com embalagens à prova de impacto, contendo materiais de alumínio, combinações de polímeros, entre outras “façanhas”. Pode ter sua qualidade microbiológica protegida com atmosferas modificadas, embalagens a vácuo, entre outros métodos de conservação/preservação.

Mas como deve ser a embalagem para que o alimento tenha sua integridade protegida?

Integridade – estado ou característica daquilo que está inteiro, que não sofreu diminuição, que se apresenta ileso, intacto, que não foi atingido, agredido ou alterado.

De modo resumido, essa embalagem deve impedir que um indivíduo mal intencionado altere o produto, evitando ocorrer esses casos divulgados na mídia:

“Irmãos são internados após comer balas com chumbinho”

“Motorista utiliza sonífero em balas”

“Homem vende bombons com sonífero”

Vários desses casos poderiam ser evitados se o consumidor adquirisse o produto no estado em que ele foi projetado para ser comercializado. Digo isso porque quando pensei nas embalagens suscetíveis de alteração, logo pensei em:

 – Balas, bombons e outros com embalagens torcidas para fechar;

– Dados, guarda-chuvas, bolinhas, moedas e outros embrulhados com papel e/ou papel alumínio sem colar as pontas;

– Pães e panetones fechados somente com arames;

– Panetones com caixas hexagonais com fechamento sanfonado.

Não considerei produtos artesanais, pois a maioria tem suas embalagens suscetíveis. Achei interessante abordar produtos industrializados, que em muitos casos tem a cultura Food Defense inserida no seu processo, mas podem ter sua imagem prejudicada e prejudicar um consumidor por não considerar o modelo da embalagem.

Em seguida fui eliminando algumas categorias. Ex: notei que grande parte dos bombons que ainda têm o fechamento com embalagens torcidas são comercializados dentro de uma caixa lacrada, ou seja, é dessa forma que o consumidor deve adquirir esse produto.

Pude perceber também que alguns alimentos são propositalmente projetados para o comércio das embalagens unitárias. Esses têm até uma caixa que abre e se dobra formando um painel de divulgação do produto. Nesses casos não evidenciei probabilidade de alterações.

Entre as gôndolas também encontrei sacos de pão de forma com embalagens lacradas, como os da *imagem em destaque.

*À esquerda uma embalagem passível de violação e à direita uma embalagem lacrada, mesmo contendo o arame para fechamento.

Também notei que determinado bombom que há tempos atrás era comercializado com embalagem torcida passou a ser comercializado lacrado. Nesse caso, a adaptação da embalagem exerceu um papel tecnológico no produto, pois até sua placa de wafer interna se manteve crocante, diferente de como era com a embalagem anterior.

De modo geral, grande parte das empresas estão investindo na qualidade integral de seus produtos. E nem sempre isso requer um grande investimento. Exemplo: aplicar uma gota de cola na caixa. Isso faz com que o consumidor perceba quando ela já estiver aberta.

Ao meu ver, cabe a nós como consumidores valorizarmos essas empresas e darmos preferência a produtos que se importam com nossa integridade.

E você, como acha que esse cenário pode ser melhorado?

 

 

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Inteligência emocional em auditorias de Segurança de Alimentos

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Auditorias não deveriam ser um processo tenso para os envolvidos. Porém, por mais que se tente evitar, isto pode ocorrer, entre outros motivos, porque o auditado, por mais que se diga o contrário, sente-se avaliado, e da mesma forma, o auditor sente-se pressionado.

As equipes multidisciplinares que desenvolveram e implementaram um SGSA (Sistema de Gestão em Segurança dos Alimentos), com todo esforço requerido para implantar BPF, para dar credibilidade técnica aos planos de HACCP, fazer validações de PCCs e PPROs, para criar uma cultura voltada à Segurança dos Alimentos, têm na auditoria um momento clímax de avaliação de seus trabalhos. Muito por isso, o apontamento de fragilidades ou de não conformidades gera frustrações, e aí confunde-se um resultado de caráter profissional com sentimentos pessoais.

E claro, por outro lado, os que não estão familiarizados em auditar talvez não imaginem, mas o auditor também sente-se sob pressão, uma vez que está fora da sua zona de conforto, numa empresa onde ele não conhece todos os “atores” envolvidos, não domina plenamente todos os processos e depende da cooperação de um grupo que pode não ser o mais simpático, atencioso e aberto. Além disso, ele tem muito pouco tempo para avaliar muita informação e sem a chance de errar, sabendo que tem que emitir um parecer conclusivo ao final da auditoria, e por isso, sabe que cada passo que dará estará sendo avaliado e cada frase que emitir estará sendo julgada.

Por isso, auditor e auditado estão num cenário que naturalmente pode ser um gerador de stress emocional, e sabemos que o ser humano exposto a tal situação fica no mínimo desconfortável, ou digamos, “à flor da pele”, e isso é capaz de alterar as emoções e de gerar reações que não seriam observadas numa situação cotidiana nas CNTP.

Somado a isto, tem-se o temperamento natural de cada um, e aqui podem então ser adicionadas as armadilhas e até mesmo as autossabotagens, o que cada um responde, a forma como responde, os gestos faciais, a entonação da voz, a simpatia e a antipatia entre os envolvidos, tudo são elementos que podem desencadear situações conflitantes.

Excesso de orgulho ou prepotência de ambos os lados podem ser fatais, por isso ambos devem acordar previamente a condução da auditoria em sua abertura, quando se expõem todas as regras que serão utilizadas na auditoria, incluindo escopo, critérios de definição de não conformidades, como será a condução, o que se pretende observar, o que se espera dos auditados, e sempre com tom de cordialidade profissional.

Comece bem o “relacionamento” neste momento

A regra geral, ou ideal, é que se evitem ao máximo emoções durante uma auditoria, emoções de qualquer tipo, o que é fácil falar, e, claro, difícil de pôr em prática, pois somos seres humanos e não um robô ou o senhor Spock, um alienígena Vulcano do seriado Star Trek, totalmente provido de lógica e com controle absoluto sobre suas emoções.

É evidente que sempre haverá algum fator emocional, mas temos que nos esforçar para seu controle e contenção, e até mesmo na linguagem oral e escrita devemos evitar emoções e o uso de adjetivos ou adjuntos adverbiais de intensidade ou palavras e expressões que denotem juízo de valor ou julgamento pessoal.

Qualquer informação a mais, especialmente acompanhada de exclamações ou com uso de hipérboles pode gerar muita confusão e contestação, pois não é incomum nas práticas de auditoria situações que configurem verdadeiros embates porque o auditor resolveu adjetivar constatações.

Lembre-se de que a linguagem do auditor é técnica e simples, do tipo “conforme” ou “não conforme”: a prática apresentada atende o requisito” ou “a prática apresentada não atende o requisito”.

Cuidado com excesso de expressões ou uma figuração muito teatral que possa ser mal interpretada, pois muitos dos problemas em auditorias são gerados não pelo que se fala, mas pela forma com que se fala.

Entre demonstrações de boas e más emoções, opte por emoção nenhuma. Mas o pior da emoção na auditoria é quando o auditor se deixa envolver com as constatações, faz caras e bocas, ficando irritado quando o auditado não sabe responder satisfatoriamente, quando a evidência demora para aparecer, ou quando a não conformidade é constatada.

Evite, portanto, palavras que gerem debates infrutíferos de juízo de valor ou emoção durante a auditoria

Por vezes, o auditor até não fica irritado, mas demonstra tristeza ou angústia, ou, ao contrário, deixa transparecer aquele sorriso de canto de boca de satisfação ao detectar uma não conformidade, o que é péssimo para todo o processo de auditoria, pois ele passa a transparecer como um “inimigo” que busca apontar problemas, e não um agregador que buscar avaliar um sistema de gestão.

Todas estas reações estão erradas ou na hora errada, afinal, o auditor não deve se envolver emocionalmente e muito menos deixar transparecer tais emoções. Um auditor profissional sabe que a emoção não faz parte da auditoria e que a conformidade e a não conformidade fazem parte da atividade rotineira, do processo natural de se auditar organizações.

Há inclusive casos piores que podem ser relatados como postura inadequada do auditor, brincadeiras fora de hora, piadinhas feitas com as próprias evidências ou com não conformidades, ironia com o auditado ou mesmo entonações que tem um viés de querer humilhar o auditado, menosprezar ou denegrir a organização auditada.

Concluindo, procure concentrar-se ao máximo, evite distrações, foque a parte técnica da auditoria: BPF, CIP, HACCP, Políticas de Vidros e Plásticos Rígidos, de alergênicos, calibrações, competências e treinamentos, elementos de gestão da norma que estiver sendo referenciada, etc.

Contudo, mesmo que o auditor tenha tomado todo o cuidado durante a fase de preparação para a auditoria, mesmo que se apresente de forma amistosa na reunião de abertura e adote uma postura colaborativa, por vezes, torna-se inevitável a situação de conflito durante uma auditoria.

O conflito pode ocorrer por diferentes motivos, desde questões de divergências simplesmente técnicas, até mesmo por questões do que chamamos de contra-auditoria, que é quando o auditado, por algum motivo, adota ações para atrasar, atrapalhar ou até mesmo impedir o bom andamento da auditoria.

Mesmo que declaradamente o auditado esteja praticando uma contra-auditoria, o auditor deve manter a postura profissional e o controle emocional e não reagir.

Nunca se esqueça de que você, como auditor, é um profissional desempenhando o seu trabalho e a outra pessoa sendo auditada também é. Portanto, não é uma questão de cunho pessoal, não encare desta forma, e como já dito anteriormente, e nunca é demais repetir, não se permita dominar pelas emoções.

A regra geral que você como auditor deve ter em mente é que nunca se deve reagir a uma provocação, ironia, contestação ou ataque de qualquer natureza

Em embates mais ferrenhos, uma saída diplomática caso ocorram situações em que a entrevista ou busca de evidência se tornar insustentável com uma pessoa sendo auditada, é o auditor optar por parar a entrevista e buscar o representante da empresa e/ou o auditor líder (se não for você) e comunicar sem emoção e de forma técnica o ocorrido. Nestes casos, muitas vezes, deve-se substituir o entrevistado/auditado por outro mais “colaborativo”. Mas há relatos em que os ânimos afloraram a ponto de uma auditoria precisar ser interrompida.

Jamais como auditor entre numa discussão, bata boca ou altere o tom de voz com o auditado.

Muito menos, fale algo que possa parecer de alguma forma um tom de ameaça quanto ao resultado da auditoria!

Lembre que auditorias devem se basear nos requisitos da norma auditada (FSSC 22000, BRC, IFS Food, SQF, etc), nas ações concretas efetuadas pelas empresas, nos planejamentos e medidas de controle elaborados e nas legislações sobre segurança de alimentos aplicáveis, mas nunca naquilo que o auditor “acha”, pois não cabem opiniões pessoais ou mesmo provenientes de experiências profissionais, cabe apenas a análise e julgamento se algo está conforme ou não conforme com os critérios adotados pela organização, escopo e referenciais normativos estabelecidos. Ter isso claro e sempre em mente evita uma série de problemas.

Se surgir alguma emoção, o que é natural, pois você não é o Spock, não se desespere, controle-se e sob nenhuma hipótese deixe transparecer ou permita que a mesma afete sua capacidade de julgamento, e baseado em fatos e dados, demonstre ao auditado as evidências que possui ou a lógica de suas constatações, sempre em tom calmo, tranquilo e explicativo.

Um bom auditor, ao adquirir competências para execução de suas atividades, não se prepara apenas tecnicamente, mas também emocionalmente. Ele desenvolve, portanto, a chamada inteligência emocional, para que assim possa ser assertivo e justo, fazendo auditorias completas, pertinentes e eficazes.

Se desejar ler um pouco mais sobre este tema, sugiro o artigo Dicas para que auditado e auditor se comportem como damas ou cavalheiros .

 

Referências:

  • BERTOLINO, M. T. & COUTO, Marcello. Sistemas de Gestão Integrados: ISO 9001 + ISO 14001 + ISO 45001, com foco em resultados, Ed. Qualitymark, 2018;
  • BERTOLINO, M. T. Gerenciamento da Qualidade na Indústria Alimentícia: Ênfase em Segurança dos Alimentos, Ed. ARTMED, 2010.

6 min leituraAuditorias não deveriam ser um processo tenso para os envolvidos. Porém, por mais que se tente evitar, isto pode ocorrer, entre outros motivos, porque o auditado, por mais que se […]

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O novo marco regulatório para avaliação toxicológica de agrotóxicos da ANVISA e as fake news

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A ANVISA publicou, em meados de agosto, o novo marco regulatório para avaliação toxicológica de agrotóxicos.

Particularmente, não gosto do termo “agrotóxicos”, assim como não concordo com “defensivos”, outro termo usado por alguns para os produtos químicos aplicados na agricultura.

Por mais que pareça apenas uma questão de semântica, deixa clara a forma antagônica como o órgão regulador e os fabricantes tratam e enxergam a forma e o uso desses produtos.

E isso é muito ruim!

Como químico entendo que a terminologia correta para a categoria é “pesticidas”, como aliás são chamados nos centros mais desenvolvidos do mundo.

Mas deixando a minha opinião e a forma de nomenclatura de lado, vamos ao que interessa: o novo Marco Regulatório publicado pela ANVISA.

O novo marco chega em um momento no qual o Brasil virou alvo de várias acusações relacionadas à preservação do meio ambiente e da vida, provocadas por uma enxurrada de fake news multiplicadas por pessoas que não são especialistas, mas que se sentem donas de conhecimento exemplar.

Para muitos, a palavra de um “ator global”, de uma “celebridade de canal de receitas culinárias” ou de qualquer “youtuber da moda” tem mais valor do que a de especialistas e doutores que dedicam suas vidas a estudar os efeitos do uso de produtos químicos na produção de alimentos.

Em um país com as condições climáticas como as nossas, o ataque de certos tipos de pragas (especialmente fungos) é muito alto e não há como fazer produção em grande escala sem o uso de produtos químicos.

A produção sustentável passa pelo uso adequado e dentro dos limites legais e está claro para todos que produtos usados em excesso significam aumento de custos, o que ninguém deseja.

Também é preciso lembrar que o que difere uma droga como remédio ou veneno é a dosagem.

O ponto de discussão deveria ser o uso correto e responsável, de acordo com a prescrição de especialistas.

Muitos acham normal se automedicar, mas apontam o dedo para outros que fazem o mesmo. Nosso problema está sempre na terceirização das responsabilidades.

Falando sobre o processo de registro: anteriormente o processo de registro de um produto demorava cerca de 10, 11 anos para ser finalizado porque havia a necessidade de aprovação em 3 instâncias (MAPA, ANVISA e IBAMA) sequenciais e isso fez com que muitas empresas se sentissem desestimuladas a investir porque o prazo para recuperação dos investimentos através da exclusividade da patente ficava curto demais.

Há diversos casos reais sobre marcas que já saíram do mercado sem terem cumprido todos os requisitos de registro, um absurdo!

O governo brasileiro (e aqui não há propaganda!) alterou o modelo para dar maior velocidade às aprovações. Hoje as avaliações são feitas nos três órgãos simultaneamente e não mais como antes, onde um órgão emperrava a ação de outro.

Outra fake news muito divulgada dava conta de que o governo liberou “centenas” de moléculas, quando na verdade o que houve foi a liberação de novos produtos, mas na grande maioria com moléculas já existentes.

A legislação brasileira, nesse aspecto, estava muito defasada com relação a outros países mais desenvolvidos.

Para se ter uma ideia da nossa “atualização”, o arcabouço legal para pesticidas é: Lei 7.802/89 (Lei de agrotóxicos), os Decretos 4.074/02 e 5.981/06 (regulamentam a Lei 7.802), a Lei 10.603/02  (proteção de dados) e a Portaria SNVS-MS nº 3/92 (diretrizes para avaliação toxicológica). Essa última, a Portaria nº 3/92, está vigente há 27 anos e está desatualizada frente ao conhecimento técnico-científico atual, às questões relacionadas ao bem-estar animal e às melhores práticas regulatórias adotadas no mundo.

A harmonização da classificação e rotulagem de produtos químicos foi uma das seis áreas programáticas endossadas pela Assembleia Geral da ONU para fortalecer os esforços internacionais relativos à gestão ambientalmente segura de produtos químicos. O Sistema de Classificação Globalmente Unificado (Globally Harmonized System of Classification and Labelling of Chemicals – GHS), lançado em 1992, na ECO 92, ainda não foi implementado em muitos países.

A Comunidade Europeia adotou o GHS em seu regulamento para classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e produtos, nestes incluídos os agrotóxicos, a partir de 2008, com sua implementação completa em 2017. Os EUA não adotam o GHS como um critério de classificação toxicológica, mas estabeleceram, em 2012, uma fase de transição, com a inserção de símbolos e alertas de perigo oriundos do GHS.

O Brasil implementou o GHS para classificação e rotulagem de produtos e substâncias por meio da Norma Regulamentadora 26 (NR-26) do Ministério do Trabalho.

O cenário global (atualizado) mostra que 53 países implementaram o GHS totalmente e 12 parcialmente.

A classificação toxicológica prevista pela Portaria nº 3/92 não está harmonizada com relação ao que é praticado no mundo.

No Brasil, a classificação toxicológica é feita com base no resultado mais restritivo de todos os estudos agudos de toxicidade oral, dérmica e inalatória, incluindo os resultados dos estudos de irritação cutânea e irritação ocular. Desfechos diferentes, como mortalidade e potencial de irritação, são tratados igualmente.

No GHS os resultados dos estudos toxicológicos de irritação dérmica e ocular e de sensibilização dérmica e inalatória não serão utilizados para fins de classificação toxicológica e sim utilizados para estabelecer a comunicação do perigo dos produtos.

A nova regulação da ANVISA propõe:

  • Adoção de padrões similares de classificação aos adotados por outros países, promovendo a convergência regulatória;
  • Melhorar a comunicação do perigo dos produtos avaliados;
  • Promover a utilização dos métodos alternativos ao uso de animais em experimentação;
  • Tornar as atividades de avaliação dos estudos toxicológicos mais eficientes e priorizar os produtos de baixa toxicidade; e
  • Padronizar a comparação da ação tóxica entre produtos.

A proposta foi construída a partir de consultas feitas em 2011, 2015 e 2016.

O novo marco:

– CP 483/18 – Proposta de Resolução da Diretoria Colegiada – RDC que dispõe as informações toxicológicas para rótulos e bulas de agrotóxicos, afins e preservativos de madeira, no âmbito da Anvisa.

– CP 484/18 – Proposta de Resolução da Diretoria Colegiada – RDC que dispõe sobre os critérios para avaliação e classificação toxicológica, priorização da análise e comparação da ação toxicológica de agrotóxicos, componentes, afins e preservativos de madeira, e dá outras providências.

– CP 485/18 – Proposta de Resolução da Diretoria Colegiada – RDC que dispõe sobre os critérios para avaliação do risco dietético decorrente da exposição humana a resíduos de agrotóxicos, no âmbito da Anvisa, e dá outras providências.

– CP 486/18 – Proposta de Instrução Normativa – IN que estabelece e dá publicidade à lista de componentes não autorizados para uso em agrotóxicos e afins.

Nesse modelo, a avaliação toxicológica é feita com base na avaliação da força e do peso de evidência para fins de identificação e categorização do perigo.

Os principais objetivos do novo marco são: estabelecer os procedimentos para avaliação toxicológica para fins de registro e pós-registro de agrotóxicos, componentes, afins e preservativos de madeira; definir os critérios mínimos e procedimentos para submissão adequada dos dossiês de registro, inclusive com relação a utilização de métodos alternativos e regulamentar a possibilidade de aproveitamento das análises que subsidiaram as decisões de autoridades de outros países para aprovação do produto no país e exigência de estudos realizados em Boas Práticas de Laboratório.

A ANVISA também assumiu o compromisso de redução, refinamento e remoção de exigência de testes em animais de experimentação por substituição por outras técnicas.

Também a avaliação por analogia, quando um produto registrado por uma autoridade externa tem similaridade de medidas e controles, poderá ser usada para subsidiar o registro do produto no Brasil.

Quando houver pedido do requerente do registro, a Anvisa deverá priorizar a análise da avaliação toxicológica dos produtos de baixa toxicidade definidos por esta resolução de acordo com os seguintes requisitos:

I – Não apresentem suspeita de carcinogenicidade, de mutagenicidade, de toxicidade para a reprodução e de desregulação endócrina;

II – Não sejam sensibilizantes cutâneos;

III – Não sejam corrosivos/irritantes cutâneos ou oculares;

IV – Não apresentem efeitos neurotóxicos;

V – Não apresentem efeitos imunotóxicos; e

VI – Que sejam enquadrados como “Não Classificado” quanto à toxicidade aguda.

Também serão considerados produtos de “Baixa toxicidade”:

I – Os produtos da categoria dos agentes biológicos de controle;

II – Os semioquímicos com características que os enquadrem como “Não Classificado” quanto à toxicidade aguda; ou

III – Os produtos microbiológicos sem efeitos adversos relacionados à toxicidade, infectividade ou patogenicidade aos organismos-testes.

A classificação em função da toxicidade aguda deve ser determinada e identificada com os respectivos nomes das categorias e cores nas faixas do rótulo dos produtos, de acordo com o estabelecido abaixo:

I – Categoria 1: Produto Extremamente Tóxico – Faixa Vermelha;

II – Categoria 2: Produto Altamente Tóxico – Faixa Vermelha;

III – Categoria 3: Produto Moderadamente Tóxico – Faixa Amarela;

IV – Categoria 4: Produto Pouco Tóxico – Faixa Azul;

V – Categoria 5: Produto Improvável de Causar Dano Agudo – Faixa Azul; e

VI – Não Classificado: Produto Não Classificado – Faixa Verde.

A Classificação conforme GHS X Portaria 3:

No GHS os resultados dos estudos toxicológicos de irritação dérmica e ocular e de sensibilização dérmica e inalatória não serão utilizados para fins de classificação toxicológica e sim utilizados para estabelecer a comunicação do perigo dos produtos.

Os critérios para classificação dos desfechos de irritação/corrosão também são distintos.

Isso é um enorme ganho com relação à Portaria 3/92!

A identificação dos produtos será feita conforme tabelas abaixo:

Abaixo, um exemplo de rotulagem:

É importante que o uso desses produtos seja cada vez menor e mais eficiente e isso só se faz com pesquisa e atualização de legislação, afinal a ciência, e só ela, pode fazer com que a produção de alimentos no campo seja cada vez mais segura e livre de contaminações.

Nossas vidas e o meio ambiente agradecem!

Mais informações podem ser obtidas em:

Agência Nacional de Vigilância Sanitária, Setor de Indústrias e Abastecimento (SIA) –Trecho 5, área especial 57, Brasília –DF –CEP:71205-050, www.anvisa.gov.br, twiter.com/anvisa_oficial, ANVISA ATENDE –0800-642-9782 e ouvidoria@anvisa.gov.br .

*Todas as imagens (tabelas) têm como fonte a ANVISA.

 

Este é um texto autoral e não reflete necessariamente a opinião da Associação Food Safety Brazil.

7 min leituraA ANVISA publicou, em meados de agosto, o novo marco regulatório para avaliação toxicológica de agrotóxicos. Particularmente, não gosto do termo “agrotóxicos”, assim como não concordo com “defensivos”, outro termo […]

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Adoçantes são seguros? Uma abordagem sob a ótica de Food Safety e Regulatory Affairs

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Existem muitas questões sobre alimentos atualmente, e várias destas questões envolvem aditivos alimentares. Trata-se do debate sobre uso de substâncias químicas em alimentos, como já foi abordado no blog em “Causos” sobre alimentos artesanais, e em O uso de aditivos seguros em alimentos industrializados. Nesta calorosa discussão, destacam-se os edulcorantes, também conhecidos como adoçantes. A pergunta que nunca cala: “Adoçantes são seguros?”.

Infelizmente há muita desinformação e fake news disseminadas, respostas e orientações sem fundamento científico espalhadas pelas redes sociais e pelos diversos veículos de comunicação. O objetivo deste post é destacar informações sob a perspectiva de duas áreas extremamente relevantes no segmento alimentício: Food Safety e Regulatory Affairs.

O que são edulcorantes?

Segundo a Portaria SVS-MS nº 540/1997, edulcorante é substância diferente dos açúcares que confere sabor doce ao alimento. São ingredientes alimentares substitutos de açúcar, os quais apresentam sabor doce muito superior ao da sacarose (açúcar da cana). O aspartame, por exemplo, um dos mais famosos adoçantes, apresenta dulçor 200 vezes maior que a sacarose. Devido a essa característica, os edulcorantes são empregados em quantidades bastante baixas nos alimentos e bebidas.

Os adoçantes contêm poucas ou nenhuma caloria. Um sachê de 800 mg de aspartame possui em média 3 calorias, enquanto uma colher de chá (5g) de açúcar apresenta 20 calorias (referência de rótulos do mercado). Quantas colheres adoçam um cafezinho? Em geral, menos de um sachê de adoçante é suficiente para adoçar o mesmo cafezinho. A economia de calorias é clara! Os adoçantes consistem em relevante ferramenta para o indivíduo que deseja reduzir o consumo calórico ou de açúcar, além do benefício que representam aos indivíduos portadores de diabetes.

Food Safety & Regulatory Affairs

A análise do risco de substâncias químicas em alimentos é um ponto crucial quando se fala de substâncias químicas em alimentos. Recentemente, este tema foi abordado aqui no blog em “Contaminantes em alimentos: o que vem por aí na Agenda Regulatória da Anvisa?”. De acordo com o “Food safety risk analysis – A guide for national food safety authorities” da FAO/WHO (Food Agriculture Organization of United Nations/World Health Organization), a análise do risco é baseada em ciência. Tal ferramenta contribui para a tomada de decisão pela autoridade sanitária.

No Brasil, aditivos alimentares é matéria de competência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária Anvisa, com suporte técnico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MAPA, quando se trata de alimentos e bebidas regulamentados por este órgão. A forma de controle do emprego de aditivos alimentares é a definição de listas das substâncias autorizadas para uso nas diversas categorias de alimentos e bebidas. Também são regulamentadas as quantidades máximas de uso.

O processo regulatório acerca de edulcorantes é algo bastante relevante e precisa ser destacado, a fim de que o debate seja equilibrado por elementos robustos e verídicos. Os adoçantes são uma das substâncias mais estudadas no mundo. Antes de sua autorização para consumo humano, o edulcorante é submetido a inúmeros estudos científicos para comprovação da inexistência de efeitos adversos decorrentes do seu consumo.

O JECFA Joint Expert Scientific Committee on Food Additives é o comitê científico da FAO/WHO (Food Agriculture Organization of United Nations/World Health Organization). O Comitê é responsável pela avaliação de segurança dos adoçantes, e por estabelecer a ingestão diária aceitável IDA, definida como quantidade estimada que o indivíduo pode consumir diariamente todos os dias por toda a vida sem riscos à saúde. A IDA é calculada a partir de ensaios científicos com animais que demonstram a quantidade consumida que não causa efeitos adversos, chamada NOAEL (No-observed adverse effect level). A este valor é aplicado um fator de segurança que reduz em cem vezes a quantidade encontrada no estudo. Em março de 2019, a WHO publicou o vídeo JECFA. Evaluating the safety of food additives, importante divulgação que contribui para destacar a dimensão do trabalho científico por trás da aprovação do uso de aditivos nos alimentos.

Adoçantes são autorizados por autoridades sanitárias de mais de 100 países, incluindo Codex Alimentarius, órgão mundial responsável pela segurança alimentar e proteção à saúde dos consumidores. No Brasil, a RDC nº 18/2008 da Anvisa estabelece a lista de edulcorantes permitidos e seus respectivos limites de uso. Esta lista positiva foi ampliada recentemente pela RDC nº 281/2019.

Os limites máximos de uso são estabelecidos com base na IDA e em estatísticas de consumo alimentar. A IDA e as quantidades máximas de uso são pontos essenciais para demonstrar a segurança de consumo dos edulcorantes. A melhor forma de esclarecer é a demonstração numérica.

Por exemplo, o aspartame possui IDA de 40 mg/kg pc (miligramas por quilograma de peso corpóreo), e seu limite de uso em bebidas sem adição de açúcar (zero açúcar) é de 75 mg/100ml (miligramas por 100 mililitros). Considerando que uma bebida apresente exatamente o limite máximo permitido pela Anvisa, uma lata de 350 ml conteria 262,5 mg de aspartame. Com base na IDA, um indivíduo de 70 kg pode consumir 2.800 mg de aspartame por dia sem oferecer risco à saúde. Logo, seria necessário o consumo superior a 10 latas e meia de 350 ml de refrigerante com aspartame para superar a quantidade segura.

Além disso, é muito importante destacar que na prática, a indústria emprega quantidades de adoçantes extremamente inferiores aos limites máximos autorizados. As quantidades empregadas nas bebidas são geralmente bem abaixo do limite máximo permitido pela ANVISA, principalmente porque os fabricantes utilizam mais de um tipo de adoçante em conjunto, para garantir melhor perfil de sabor e baixa ingestão pelos consumidores (menor exposição). Refrigerantes zero açúcar apresentam em média cerca de 15%-50% do limite permitido (referência rótulos do mercado). Assim, considerando a quantidade real na bebida (50% do limite máximo), um indivíduo de 70 kg precisa consumir cerca de 21 latas de 350 ml de refrigerante sem açúcar para ultrapassar a IDA. E este é ainda um cálculo conservador, usando o “pior” caso.

Em maio de 2018, a ANVISA publicou o Relatório Preliminar de Análise de Impacto Regulatório sobre Rotulagem Nutricional. Em relação aos edulcorantes, o órgão destacou no documento que uma revisão sistemática recente avaliou os resultados de 372 estudos sobre os efeitos de adoçantes em diversos parâmetros da saúde, incluindo riscos de câncer, diabetes, doenças cardiovasculares e ganho de peso. Segundo o órgão, não foram encontradas evidências conclusivas de efeitos deletérios à saúde.  A Anvisa afirmou que, caso existissem estudos científicos que demonstrassem que o consumo de determinado ingrediente alimentar como os adoçantes provoca danos à saúde dos consumidores brasileiros, restringiria a adição dos mesmos aos alimentos e bebidas.

Food safety & Scientific Affairs

Quando se trata de Segurança dos Alimentos, uma palavra-chave é ciência. Portanto, em relação à segurança de consumo dos edulcorantes, é fundamental relatar os elementos científicos que suportam as decisões regulatórias por parte das autoridades sanitárias.

A International Sweeteners Association ISA, organização sem fins lucrativos que representa indústrias fabricantes e usuárias de adoçantes, promove e dissemina as atualizações científicas sobre adoçantes e seu papel na dieta. A organização participa do Codex Alimentarius e é reconhecida pela WHO e por autoridades regulatórias mundiais. No booklet publicado em 2018 “Low Calorie Sweeteners: Role and Benefits – A guide to the science of low calorie sweeteners”, os especialistas da ISA destacam que nas últimas décadas, vários relatórios afirmaram que os adoçantes estão associados a uma série de efeitos adversos à saúde. Entretanto, a evidência para essas alegações foi revisada por agências como a EFSA (European Food Safety Authority) e os experts concluíram que tais alegações são infundadas sob o ponto de vista científico.

Segundo o documento da International Sweeteners Association ISA, a desinformação sobre os adoçantes é baseada na interpretação errônea de dados, extrapolação inadequada de experimentos e uso seletivo de informações. Para os especialistas, falta uma visão abrangente, crítica e equilibrada de todas as evidências científicas disponíveis. Os efeitos alegados não foram encontrados em estudos subsequentes. Logo, a preocupação é injustificada pelas evidências disponíveis. Os especialistas destacam que não há evidências científicas consistentes que vinculem consumo de adoçantes ao câncer, por exemplo. Um estudo do Instituto de Pesquisa Farmacológica Mario Negri na Itália, feito com pacientes, apoia a afirmação de que não há indicação de que os adoçantes podem causar qualquer um dos principais tipos de câncer.

Reforçando mais uma vez a extrema relevância da ciência, também importa colocar que, em julho de 2017, sessenta e seis cientistas internacionais especializados em alimentos, nutrição, dietéticos, endocrinologia, atividade física, pediatria, enfermagem, toxicologia e políticas públicas se reuniram para elaborar um consenso sobre o uso de adoçantes. O resultado foi a publicação Ibero-American Consensus on Low-and No-Calorie Sweetners: Safety, Nutritional Aspects and Benefits in Food and Beverages, cujas principais conclusões são:

  1. Adoçantes são um dos ingredientes alimentares mais amplamente avaliados, cuja segurança foi revisada e confirmada pela WHO e por referências regulatórias mundiais como o FDA Food and Drug Administration e EFSA.
  2. Consumidores, rótulos, lista de ingredientes e rotulagem nutricional: há necessidade de educar consumidores com base nas evidências científicas e processos regulatórios.
  3. Saúde: o uso de edulcorantes em programas de redução de peso com substituição de açúcar por adoçantes pode favorecer a redução de peso e a manutenção da perda de peso dentro de uma dieta moderada. O Guia de Recomendações da Sociedade Alemã de Nutrição publicado em 2013 (German Nutrition Society), afirma que o uso de adoçantes é seguro e recomendado para pessoas que desejam perder peso, sendo uma alternativa interessante no contexto de uma dieta balanceada. Também em programas de controle de diabetes, o uso de adoçantes pode contribuir para melhor controle de glicemia. Adoçantes também proporcionam benefícios para saúde dental.
  4. Informação: é relevante educar profissionais de saúde sobre os processos regulatórios e de avaliação de segurança para aprovação do uso de adoçantes. Este grupo de profissionais é importante fonte de informação para a população.

E o aspartame?

Como citado anteriormente, um dos adoçantes mais conhecidos e utilizados é o aspartame, e, por isso este edulcorante é um dos alvos preferidos pelas correntes de desinformação. Por sua relevância, já foi tema publicado pelo Food Safety Brazil aqui e aqui, mas há espaço para novamente abordá-lo no contexto deste post.

O aspartame foi avaliado toxicologicamente pelo JECFA em 1981, quando foi estabelecida sua IDA. Trata-se de um dos adoçantes mais avaliados do ponto de vista toxicológico, e conta com mais de cem estudos que confirmam a sua segurança, aprovado em mais de cento e vinte países.

A EFSA reconfirmou recentemente a segurança do aspartame. Foi publicado em 2013 o parecer Scientific Opinion on the re-evaluation of aspartame as a food additive. Segundo o painel de especialistas da EFSA, não há qualquer indicação de potencial genotóxico ou carcinogênico associado ao aspartame, bem como não há razão para revisar sua ingestão diária aceitável (IDA) previamente estabelecida.

Ainda sobre aspartame, também cabe comentar que em 2005 foi noticiado um estudo da Itália, sobre a possível associação entre aspartame e a indução de câncer em ratos. Diante desse cenário, a Anvisa publicou o Informe Técnico nº 17/2006 (revisado em 2012), e considerou que não existem dados estatísticos suficientes que comprovem a relação direta entre o desenvolvimento das mencionadas doenças e o consumo de aspartame. Portanto, esse estudo não pode ser considerado conclusivo. A Agência também ponderou que não existem razões de base científica para a adoção de uma medida sanitária restritiva em relação ao uso de aspartame em alimentos e bebidas.

Reflexão final

Sob a ótica regulatória e da segurança de alimentos, a questão dos adoçantes é amplamente estudada e está legalmente amparada pelas mais renomadas autoridades sanitárias do mundo. Os edulcorantes constituem alternativa tecnológica de grande importância quando é necessária a substituição de açúcares nos alimentos e bebidas. Dessa forma, também possuem papel relevante em saúde pública, uma vez que contribuem para a redução de ingestão calórica e de açúcar, além de ser importante recurso para os portadores de diabetes. Frente à relevância deste aditivo alimentar, é cada vez mais importante combater as fake news. Há muita informação que precisa ser divulgada para esclarecimento dos consumidores. E este papel cabe a nós profissionais de alimentos que felizmente temos acesso à informação de qualidade. Fica o convite!

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