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Você conhece o Selo Arte para alimentos artesanais?

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O selo ARTE é a realização  de um antigo sonho de produtores de alimentos artesanais de todo o Brasil.

É um certificado que assegura que o produto alimentício de origem animal (como queijos, embutidos cárneos, pescados e mel) foi elaborado de forma artesanal, com receita e processo que possuem características tradicionais, regionais ou culturais. Pelas peculiaridades dos insumos e procedimentos adotados na elaboração de tais produtos, dificilmente se consegue reproduzir suas características de palatabilidade fora do contexto em que eles são originalmente produzidos.

Para os consumidores, é uma indicação de qualidade, com a segurança de que a produção é artesanal e respeita as boas práticas agropecuárias e sanitárias. Desta forma, os produtos que têm o Selo Arte podem ser vendidos livremente em qualquer parte do território nacional, eliminando entraves burocráticos.

REQUISITOS DOS PRODUTOS ALIMENTÍCIOS ARTESANAIS

Para que os alimentos sejam considerados artesanais, devem preencher os seguintes requisitos:

I. as matérias-primas de origem animal devem ser produzidas na propriedade onde a unidade de processamento estiver localizada ou devem ter origem determinada;
II. as técnicas e os utensílios adotados, que determinem as características do produto final, devem prescindir de dispositivos mecânicos ou eletrônicos, de forma a valorizar o trabalho humano em detrimento da automação.
III. o processo produtivo deve adotar boas práticas na fabricação de produtos artesanais com o propósito de garantir a produção de alimento seguro ao consumidor;
IV. as unidades de produção de matéria-prima, próprias ou de origem determinada, devem adotar boas
práticas agropecuárias na produção artesanal;
V. o produto final deve ser individual, genuíno e manter a singularidade e as características tradicionais, culturais ou regionais do produto, sendo permitida variabilidade sensorial entre os lotes;
VI. o uso de ingredientes industrializados deve ser restrito ao mínimo necessário, vedada a utilização de corantes, aromatizantes e outros aditivos considerados cosméticos; e
VII. o processamento deve ser feito prioritariamente a partir de receita tradicional, que envolva técnicas e conhecimentos de domínio dos manipuladores.

REQUISITOS PARA OBTENÇÃO DO SELO ARTE 

Para obtenção do Selo Arte devem ser atendidos três requisitos básicos:
I. Cadastro no Sistema Nacional de Cadastro de Serviços de Inspeção, Estabelecimentos e Produtos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento;
II. Relatório de fiscalização, emitido pelo Serviço Oficial de Inspeção, que comprove o atendimento às Boas Práticas Agropecuárias.
III. Memorial descritivo do produto (características do produto).

ÓRGÃOS RESPONSÁVEIS PELA CONCESSÃO DO SELO ARTE

No princípio, somente os órgãos de agricultura e pecuária dos Estados e do Distrito Federal eram os responsáveis pela análise dos protocolos de solicitação de Selo Arte e por sua concessão. Atualmente órgãos municipais já podem fazer a emissão. O produtor interessado deve dirigir-se ao Serviço de Inspeção Municipal de sua cidade (Secretaria da Agricultura) e fazer a solicitação.

Veja a lista dos órgãos concedentes no site do MAPA clicando aqui.

REFERÊNCIAS NORMATIVAS PARA TER O SELO

Para consultar todas as normas relativas ao Selo Arte, clique aqui.

O MAPA criou um FAQ bem legal do assunto que pode ser acessado aqui.

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Segurança de alimentos e as redes sociais: como se proteger da desinformação?

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Em um passado nada distante, durante a pandemia, vivemos mudanças de comportamentos em nível mundial sob muitos aspectos. Dentre as principais mudanças, destacaram-se o aumento do consumo de alimentos caseiros, nos primeiros meses da quarentena. Com isso, foram redobrados os cuidados na higienização dos alimentos que colocávamos em casa, pois estávamos insuflados pela apreensão de uma possível transmissão de doenças virais por estes alimentos.

Olhando pelo lado da segurança de alimentos, aumentou a preocupação de consumir alimentos seguros, conforme artigo escrito no jornal da USP ainda em 2020.

No entanto, após a passagem da pandemia, herdamos muitos “especialistas” de redes sociais disseminando informações incorretas que nada têm a ver com utilidade pública. Não que este tipo de desinformação tenha ocorrido somente após a pandemia, podemos ver que este assunto já foi abordado aqui no blog: Mitos sobre alimentos nas redes sociais e Sensacionalismo x realidade.

Mas atualmente não é difícil se deparar com um áudio ou vídeo do amigo da tia, que encaminhou para o primo e tem certeza de que veio de uma fonte confiável, um “shorts” do YouTube ou um “reels” do Instagram. Vídeos nas redes sociais trazem soluções milagrosas para conter a contaminação do alimento, depreciando a segurança de algum produto de uma marca famosa, ou ainda os queridinhos do momento, sobre aumento de imunidade a partir do consumo de certos tipos de alimentos e temperos.

É o caso de um vídeo que orienta a não consumir partes de frutas cortadas de uma fruta contaminada por fungos, porque tal consumo estaria associado à ocorrência de candidíase.

Também há uma publicação sobre a necessidade de se ferver água para coar um café gourmet, com intuito de “eliminar os germes” e consequentemente eliminar a acidez que estes trazem aos grãos de café, inclusive citando grandes marcas de cafés tradicionais, colocando em xeque a segurança destes produtos. Existe ainda “a volta dos que não foram”, falando sobre a quantidade de perninhas de baratas que podem estar nos alimentos, ou ainda a velha mentira da embalagem de leite reprocessada, que por incrível que pareça, nunca sai de cena.

Nessas horas, certificações de reconhecimento internacional, auditorias, cursos de capacitação de toda uma empresa, trabalho de equipes de segurança de alimentos, e todos os controles rigorosos na produção de alimentos seguros podem perder a força a ponto de a marca/produto sofrer impactos na venda.

E fica a pergunta: as empresas estão preparadas para mitigar este tipo de desinformação e entregar uma melhor informação ao consumidor?

A meu ver, profissionais da área de segurança de alimentos precisam e devem trabalhar em conjunto com as áreas de atendimento ao cliente a fim de disseminar informações confiáveis, além de capacitar as partes interessadas e direcionar a correta busca por informação segura. Esta busca pode ser, por exemplo,  pela Biblioteca de Alimentos ; cartilhas da ANVISA; sites do MAPA, EMPRAPA, artigos científicos e todos aquelas fontes que possam trazer clareza e entendimento.

Você saberia dizer como o setor de comunicação e atendimento ao consumidor de sua empresa vem se preparando para trabalhar de forma a multiplicar informações de fontes seguras sobre a segurança de alimentos?

Fábia Carolina Lavoyer Llorente é graduada e mestre em engenharia de alimentos, especialista em segurança de alimentos, coordenadora da ESA e analista da Garantia da Qualidade.

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Será que a alface está limpa mesmo? Sanitização de vegetais

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Você já se perguntou se está lavando adequadamente uma fruta antes de comê-la? Ou quando prepara uma salada de alface, fica em dúvida se foi de fato limpa? Essas perguntas são, além de comuns, muito pertinentes em relação à sanitização de vegetais. Venha entender como garantir um consumo seguro de alimentos in natura.

Frutas, legumes e verduras representam um risco à saúde quando não higienizados de maneira adequada. Isso porque, em grande parte, são consumidos in natura, ou seja, sem cocção ou exposição em temperatura e tempo suficiente para eliminar microrganismos patógenos.

Esses microrganismos estão presentes nestes alimentos devido às técnicas de cultivo, deixando-os suscetíveis à contaminação. Como exemplo destes métodos, podemos citar a adubação por esterco, o uso de água não tratada na irrigação, o contato constante com o solo e insetos, bem como as práticas de transporte.

Independentemente disso, o mais importante é garantir uma sanitização eficiente antes do consumo.

Certo, mas qual é a melhor maneira de se fazer isso?

Para começar, é importante higienizar as próprias mãos e a pia. Já que esses vegetais são para consumo direto, as mãos que os lavam e as superfícies de contato devem estar devidamente limpas com água e sabão, por no mínimo 20 segundos.

Em seguida, iniciar a higienização dos vegetais removendo as sujidades, como terra e outros resíduos. Para isso, lavar sob água corrente. Utilizar uma bucha limpa pode ajudar na remoção de sujeiras. No caso de vegetais folhosos, lavar folha a folha é imprescindível.

Se você não for consumir o alimento de imediato, secar com papel toalha antes do armazenamento vai garantir uma maior durabilidade.

Depois disso, é indicado usar um sanitizante. O Ministério da Saúde indica lavar com hipoclorito de sódio, visto que este produto clorado tem um excelente poder de sanitização.

O Guia Alimentar do Ministério da Saúde indica preparar em uma bacia a diluição de 2 colheres (de sopa) de água sanitária (com 1% de hipoclorito de sódio) para 1 litro de água. Colocar os vegetais de molho por, no mínimo, 15 minutos na solução de hipoclorito preparada.

Tenha bastante atenção ao produto que você adquiriu. A água sanitária para uso em alimentos deve conter apenas hipoclorito de sódio e água. Ou seja, não deve incluir outros alvejantes ou aromas, que podem estar presentes quando o produto é destinado para a limpeza de ambientes.

Além disso, se a concentração de hipoclorito for 2,0 ou 2,5%, reduza para 1 colher de água sanitária para cada 1 litro de água (a maioria das águas sanitárias comerciais tem 2 a 2,5% de hipoclorito de sódio).

Em seguida, lavar em água corrente para remover os resíduos químicos da etapa anterior.

Apesar de termos essas indicações do Ministério da Saúde, as agências americanas não recomendam o uso de produtos químicos. Segundo suas orientações, a limpeza se encerra após a lavagem em água corrente seguida de secagem com papel toalha. O mesmo pode ser observado nas respectivas agências da Austrália e Nova Zelândia,  e Inglaterra.

Entenda melhor os motivos:

Mas outro método também é muito mencionado. Você sabe qual é?

Muitas pessoas utilizam vinagre como sanitizante de frutas e verduras. Existem estudos que avaliam a sua eficácia, mas é importante dizer que não é a indicação do Ministério da Saúde.

Além disso, para ter eficiência de sanitização é necessário uma concentração de 20% de vinagre em água, o que torna este método muito mais caro que a opção com água sanitária.

É natural perguntar: se higienizo minhas mãos com água e sabão, por que não lavar os vegetais da mesma maneira?

O órgão governamental americano FDA (Food and Drug Administration) não recomenda o uso de sabão ou detergente na higienização de vegetais. Segundo suas orientações, os vegetais possuem superfícies porosas, que podem facilmente absorver estes químicos, não sendo possível sua remoção mesmo com o enxágue.

Vale lembrar que até aqueles legumes ou frutas dos quais não se consome a casca, como o melão, devem ser higienizados. Isso porque o uso de uma faca para cortá-los pode levar uma contaminação do lado externo para a parte que será consumida.

Antes de concluirmos, me conte aqui: uma pesquisa de Eliandra Rossi, da Universidade do Oeste de Santa Catarina, demonstrou que mais de 92% das pessoas não fazem a sanitização de vegetais de maneira adequada antes do consumo. E você?

Leia também:

Imagem: Any Lane

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Doenças transmitidas por alimentos: ainda devemos nos preocupar em 2024?

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Recentemente, foi divulgado nos canais de comunicação a notícia de que uma pessoa veio a óbito e mais seis pessoas estão internadas após uma confraternização da empresa em que laboravam. A principal suspeita frente ao ocorrido é que se trata de um episódio de intoxicação alimentar (leia aqui), ou seja, embora o caso ainda esteja sob investigação, tudo leva a crer que se trata de um tipo de doença transmitida por alimentos (DTA).

As famosas Doenças Transmitidas por Alimentos, popularmente conhecidas como DTA ou como Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar (DTHA) costumam ocorrer após a ingestão de alimentos ou água contaminada. Atualmente, em âmbito mundial, são identificadas cerca de 250 DTA catalogadas e que podem ocorrer por meio de bactérias e suas toxinas, vírus, parasitas intestinais oportunistas ou substâncias químicas.

Cabe dizer que a intoxicação alimentar é diferente da infecção alimentar. A intoxicação é uma decorrência das toxinas produzidas pelos microrganismos ainda no próprio alimento. Já a infecção acontece pela proliferação dos microrganismos no hospedeiro, advindos de alimentos que contenham células destes microrganismos.

Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), estima-se que cerca de 600 milhões de pessoas, ou seja, quase uma em cada 10 pessoas no mundo, adoecem e 420.000 morrem todos os anos devido as Doenças de Transmissão Hídrica e Alimentar (DTHA), resultando na perda de 33 milhões de anos de vida saudáveis. As crianças menores de 5 anos carregam 40% da carga de DTHA, com 125.000 mortes a cada ano.

No Brasil, segundo o último dado divulgado pelo Ministério da Saúde, referente ao período compreendido de 2013 a 2022, ocorreram cerca de 6.523 surtos identificados/notificados (média de 652 casos por ano), totalizando 107.513 pessoas doentes, com 12.722 hospitalizações e 112 óbitos constatados em decorrência dos surtos.

Ainda segundo o mesmo material, o top 3 dos agentes de DTA no Brasil é ocupado pela Escherichia coli, correspondente a 32,3% dos casos, Salmonella spp (10,9%) e Staphylococcus sp. (10,8%), seguido de outros, conforme podemos ver no gráfico abaixo:

Fonte: Sinan/SVS/Ministério da Saúde

* Dados preliminares, sujeitos a alterações.

Dentre as fontes mais comuns causadoras das doenças, surge o açaí, alimento campeão com 27,5% do montante, seguido da água (21,5%) e alimentos mistos (12,8%):

Fonte: Sinan/SVS/Ministério da Saúde

* Dados preliminares, sujeitos a alterações.

1. Excluídos registros ignorados, inconsistente e inconclusivos (n = 4.467)

E como podemos evitar?

  • A lavagem das mãos antes da manipulação dos alimentos é essencial;
  • O consumo de alimentos crus, malcozidos e mal-assados é desestimulado;
  • Evitar o consumo de ovo cru, ou preparos que levem ovo cru;
  • Ovos não devem ser lavados antes do armazenamento, somente antes do preparo;
  • Consuma água/ gelo somente de fontes seguras;
  • Alimentos congelados/ resfriados devem ser bem aquecidos antes do seu consumo;
  • Alimentos preparados devem ser mantidos em temperaturas adequadas, antes do consumo, sejam resfriados ou aquecidos.
  • O prazo de validade dos alimentos deve ser checado sempre, bem como o acondicionamento e suas condições físicas, como aparência, consistência e odor.
  • Atenção para pescados e mariscos, que podem conter toxinas ativas mesmo após o processo de cocção.
  • Alimentos crus devem ser separados dos alimentos cozidos ou já preparados para consumo, evitando assim a contaminação cruzada.
  • Para vegetais, frutas e verduras adquiridos, convém desinfetar utilizando uma solução preparada com hipoclorito de sódio (água sanitária).

Leia mais: 

Detalhes sobre o grupo de risco para doenças transmitidas por alimentos

Doenças transmitidas por alimentos podem ter consequências por toda a vida

Registros de doenças de transmissão hídrica e alimentar (DTHA) no Brasil

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Leptospirose – onde entra a segurança de alimentos?

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Semana passada a grande mídia veiculou uma matéria sobre um homem que quase morreu de leptospirose após comer mangas que pegou no acostamento de uma estrada no interior de São Paulo.

O caso

Um motorista de caminhão, durante uma de suas viagens, parou no acostamento de uma estrada no interior de São Paulo, em local próximo a São José do Rio Preto. Recolheu algumas mangas que estavam caídas, descascou duas com os próprios dentes, comeu ali mesmo e levou outras para casa.

Dias depois começou a sentir dores no corpo, teve febre alta, imaginou que seria uma gripe, medicou-se, mas o quadro não apresentava melhora. Chegou a ser internado em estado grave até que um dos médicos pensou em leptospirose, e então concluiu-se que as mangas poderiam ser o alimento causador do quadro infeccioso.

O que sabemos sobre a leptospirose?

A leptospirose é uma doença infecciosa causada pela bactéria Leptospira. Essa bactéria pode estar presente na urina de alguns animais, sendo o rato um dos principais.

O homem ou os animais domésticos podem se infectar quando água contaminada com urina de rato penetra através de mucosas ou pele com lesões ou mesmo pela pele íntegra que fique em contato prolongado com água contaminada.

Por isso, situações de enchentes costumam ser relacionadas à infecção e casos de leptospirose.

O período de incubação, ou seja, tempo entre a infecção até o momento em que a pessoa apresenta os primeiros sintomas, pode variar de 1 a 30 dias e normalmente ocorre entre 7 a 14 dias. As manifestações clínicas variam desde formas assintomáticas até quadros graves. São divididas em duas fases: fase precoce e fase tardia.

Quais são os sintomas?

Os principais da fase precoce são: febre, dor de cabeça, dor muscular e falta de apetite. Por esses sintomas, o quadro é facilmente confundido com um resfriado ou gripe. Também podem ocorrer diarreia, dor nas articulações, alterações oculares.

Em aproximadamente 15% dos casos, a evolução pode ocasionar manifestações graves, como a chamada síndrome de Well (que parece ter sido o caso do homem noticiado nos últimos dias) onde há acometimento dos rins, chegando a insuficiência renal, hemorragia e quadro pulmonar grave, inclusive com risco de morte.

Prevenção

Muitos já devem ter ouvido que latas de refrigerante, cerveja ou outros itens enlatados precisam ser lavados e higienizados antes de abertos, porque podem ter tido contato com urina de rato nos depósitos onde ficaram armazenadas.

As pessoas que residem em áreas com piores condições sanitárias, caso tenham passado por enchentes, e apresentem quadros parecidos com resfriado, costumam ser medicadas já pensando em um possível quadro de leptospirose.

E onde entra a segurança de alimentos, nesse caso do consumo de manga ou em outras situações de contágio?

Podemos pensar nos cuidados como apenas consuma água tratada, lave bem os vegetais e alimentos que serão consumidos crus. O que aconteceu nesse relato, inclusive, poderia ter sido evitado com essa simples prática. Outros cuidados são: deixar a caixa de água tampada, usar botas de borracha se precisar entrar em áreas de inundação, deixar as lixeiras tampadas para evitar acesso de roedores, mas me parece um contrassenso solicitar que latas de refrigerante, cervejas e outros alimentos enlatados sejam lavadas, uma vez que, se pensarmos em controle de pragas em indústrias ou depósitos de alimentos, a presença de ratos não deveria acontecer.

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Favoritos do ano: revisitando os artigos mais lidos de 2023

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A missão do blog Food Safety, criado em 2012, é a de disseminar conhecimento e experiências na área da segurança de alimentos. Este blog conta com a colaboração de diversos voluntários, que são especialistas reconhecidos na área. Eles colaboram com discussões pertinentes e informativas, visando contribuir para o entendimento dos leitores sobre temas importantes relacionados à segurança de alimentos, promovendo assim uma ampla disseminação de informações. Ao longo do ano de 2023 foram publicadas 218 artigos, distribuídos ao longo dos meses.

As principais palavras-chave relacionadas aos títulos dos artigos publicados estão representadas abaixo, e mostram a diversidade dos assuntos frente à temática principal deste blog, “segurança dos alimentos”.

O propósito deste post é apresentar os seis artigos que se destacaram em 2023 por sua relevância e popularidade entre nossos leitores. Estes textos, não só capturaram a atenção dos leitores ao longo do ano, mas também conquistaram um lugar de prestígio no ‘TOP 20’ dos artigos mais lidos de toda a história do blog. Abaixo apresentamos um breve resumo a respeito dos artigos. Clique no título para realizar a leitura completa.

1° Molho pesto artesanal causou tetraplegia por botulismo, em Brasília

O artigo de Juliane Dias, que alcançou 90.139 leituras em 2023, relata a experiência de Doralice Goes, de 46 anos. Ela sofreu tetraplegia flácida devido ao consumo de um molho pesto artesanal contaminado com a toxina botulínica tipo A, produzida pelo Clostridium botulinum. O molho, armazenado em um frasco de vidro fechado a vácuo, foi consumido por Doralice em um domingo, junto com torradas e vinho. Inicialmente sem sintomas, ela começou a sentir fraqueza e outros sinais de botulismo na terça-feira, após a ginástica. Após ir ao hospital com dificuldades para andar, ela sofreu parada respiratória e foi intubada.

O diagnóstico de botulismo foi feito no segundo dia de internação. A Vigilância Sanitária investigou sua casa e o laboratório Adolfo Lutz confirmou a presença da toxina no molho. Doralice, fã de alimentos artesanais, havia adquirido o molho em uma feira em Brasília, sem informações de rastreabilidade ou validade. O fabricante do molho, impactado pelo incidente, encerrou suas operações após o caso.

Este incidente ressalta a necessidade de controles rigorosos de segurança em alimentos artesanais, especialmente aqueles não refrigerados e armazenados em embalagens hermeticamente fechadas. Conhecimento e cumprimento das leis, normas e práticas adequadas de manipulação são cruciais para prevenir riscos como o botulismo.

2° Dicas para prevenir a compra de azeite de oliva fraudado

O artigo de Marco Túlio Bertolino, que alcançou 45.926 leituras em 2023, destaca o azeite de oliva, extraído das azeitonas da oliveira (Olea europaea) como um óleo rico em ácidos graxos insaturados e com antioxidantes como tocoferóis (vitamina E) e polifenóis. Estes componentes são benéficos para a saúde, aumentando os níveis de HDL, o chamado “bom colesterol”. O azeite representa cerca de 3% do consumo humano de óleos vegetais, com um valor econômico significativo no comércio mundial.

Este óleo é apreciado na gastronomia mundial, especialmente em pratos mediterrâneos, e suas características sensoriais variam conforme a região de produção. A cor do azeite varia do amarelo claro ao verde profundo, com os mais verdes geralmente apresentando mais antioxidantes e um sabor mais apimentado.

No Brasil, o consumo per capita de azeite é inferior a 0,5 litro por ano, indicando um grande potencial de crescimento no mercado. As oliveiras requerem condições específicas para crescimento, e a produção de azeite é mais cara comparada à de outros óleos vegetais. A olivicultura faz parte da história humana desde o período neolítico, e as oliveiras podem viver por milênios, com produtividade máxima entre 8 e 50 anos.

O cultivo de oliveiras no Brasil tem aumentado, com a produção de azeite ganhando reconhecimento, apesar de ainda depender de importações. Contudo, o azeite de oliva é um dos alimentos mais fraudados, com adulterações incluindo a diluição em óleos mais baratos. Dicas para evitar comprar azeite fraudado incluem verificar a origem, desconfiar de preços muito baixos, ler rótulos cuidadosamente e preferir produtos nacionais de alta qualidade.

Quais os possíveis riscos microbiológicos do consumo de queijos artesanais feitos de leite cru?

Escrito por um grupo de autores convidados, o artigo alcançou 33.477 leituras, abordando a complexidade e os desafios associados à comercialização de queijos artesanais feitos de leite cru (QALC), particularmente no Brasil. A produção e o consumo de QALC, embora cultural e economicamente significativos, enfrentam preocupações importantes relacionadas à sua inocuidade devido aos riscos microbiológicos.

No Brasil, há esforços dos órgãos fiscais para garantir a segurança desses produtos, mas ainda existem muitos desafios. Questões como a identificação dos patógenos prevalentes, a distribuição espacial desses patógenos, o tempo de maturação seguro e os pontos críticos de controle para uma produção segura são importantes. Além disso, o texto menciona o registro de Indicações Geográficas (IG) em Minas Gerais para QALC, que tem desencadeado debates sobre a redução dos tempos de maturação para facilitar a comercialização.

O artigo também ressalta a incidência de surtos causados pelo consumo de leite e produtos não pasteurizados, citando estudos dos EUA e da Europa que relatam a prevalência de patógenos como Campylobacter spp., E. coli, Salmonella spp., e Listeria monocytogenes em produtos lácteos elaborados a partir de leite cru.

No Brasil, foram relatados diversos surtos humanos associados ao consumo de QALC, envolvendo patógenos como Streptococcus, enterotoxinas estafilocócicas e Brucella spp. Além disso, o texto aborda a presença de outros patógenos como C. burnetii e M. bovis em QALC, que não são rotineiramente verificados no Brasil.

O artigo conclui enfatizando a necessidade de estabelecer requisitos sanitários para a produção de QALC, com o objetivo de proteger a saúde pública. Destaca-se a importância de revisar continuamente as práticas e protocolos de produção de QALC, com um enfoque de Saúde Única, que inclui o controle de agentes zoonóticos, boas práticas agropecuárias e de fabricação, além de educação continuada para produtores e consumidores.

4° “Também errei como consumidora”, diz Doralice Goes, vítima de botulismo

O Top 2 da autora Juliane Dias, com 17.865 leituras, é este artigo, complementar ao primeiro aqui descrito.  Neste artigo Doralice Goes compartilhou sua jornada de recuperação após ficar internada por todo o ano de 2022.

Apesar de seguir um cuidado de fervura de conservas, Doralice não fez o mesmo com o molho. A doença resultou em paralisia total, deixando-a consciente, mas incapaz de se mover, preocupada com suas responsabilidades diárias, como gatos e finanças.

O ponto mais crítico da internação foi quando ela sofreu de acidose e delírios severos após ser desentubada, revelando um diagnóstico negligenciado de baixa oxigenação. Após a confirmação da acidose, ela foi reintubada. Durante a internação, ela não recebeu visitas do trabalho, adicionando ao desafio o lado emocional.

Sobreviver ao botulismo trouxe mudanças significativas na vida de Doralice. Ela ainda enfrenta dores diárias, mudanças corporais drásticas e desafios de mobilidade. Apesar de ter mantido o peso, seu corpo sofreu uma transformação de músculos em gordura. Ela agora está focada na reabilitação e na conscientização sobre o botulismo, transformando sua experiência em uma missão pessoal.

A relação de Doralice com comida permanece a mesma, mas ela agora é mais cautelosa com a procedência e validade dos alimentos, especialmente os artesanais. Ela aprendeu sobre os riscos associados a alimentos não industriais e a importância da rastreabilidade. Ela tem se conectado com outros sobreviventes de botulismo, tentando entender e compartilhar suas experiências. Doralice também planeja escrever um livro sobre sua história, já iniciado em julho.

Uso de barba na indústria e em serviços de alimentação: pode ou não pode?

Elaborado por Angela Klesta, nosso Top 5 apresentou 7.832 visualizações. O artigo discute a falta de clareza nas regulamentações brasileiras sobre o uso de barba por manipuladores de alimentos na indústria e em serviços de alimentação. A principal legislação da ANVISA para os serviços de alimentação, a RDC 216/2004, proíbe o uso de barba por manipuladores, enquanto a RDC 275/2002 e a Portaria 78/2009 do Rio Grande do Sul reforçam a necessidade de asseio pessoal e cabelos protegidos, mas sem mencionar especificamente o uso de barba. O MAPA não especifica regras sobre uso de barba em suas normas, levando a interpretações divergentes por parte das empresas.

A autora comenta que um estudo europeu mostrou que barbas podem conter mais bactérias patogênicas do que a pele dos cães, o que suscita preocupações sobre a higiene em ambientes de manipulação de alimentos. Apesar da reputação anti-higiênica das barbas e do risco de contaminação alimentar por pelos faciais, não há uma proibição clara no setor, e chefs com barbas estilosas ainda são comuns.

No âmbito jurídico, a CLT permite o uso de barba a menos que haja justificativa plausível para proibir, como no caso de trabalhadores da saúde. No entanto, considerando a importância da higiene alimentar, o artigo sugere que a proibição de barbas seria justificável.

O texto conclui ressaltando a responsabilidade dos profissionais de garantir a segurança e higiene dos alimentos produzidos, apesar da falta de regulamentação específica sobre o uso de barba.

6° Principais mudanças no novo Codex Alimentarius 2023

O artigo foi escrito por Franklin Guarisma e alcançou 5.950 visualizações. O autor analisa as atualizações de 2023 no Codex Alimentarius, destacando a importância da segurança dos alimentos e as responsabilidades dos fabricantes de evitar a deterioração dos alimentos, que pode ter implicações econômicas e de saúde.

Em 2023, o Codex Alimentarius atualizou os Princípios Gerais de Higiene dos Alimentos (CXC 1-1969), introduzindo uma nova abordagem de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC), com diretrizes revisadas para sua aplicação. Essas práticas de higiene são essenciais para o controle de perigos alimentares e, para muitas empresas, sua implementação efetiva é suficiente para garantir a segurança dos alimentos. No entanto, nem todas têm a expertise necessária, e uma análise de perigos eficaz é requerida por normas legais.

A principal atualização foi a inclusão de um novo anexo (anexo IV) no documento, que oferece uma ferramenta – uma árvore decisória – para identificar pontos críticos de controle no sistema APPCC, revisada pelo Comitê do Codex sobre Higiene dos Alimentos. A árvore decisória é uma sequência de perguntas que ajuda a determinar os Pontos Críticos de Controle (PCC) em um processo, sendo uma ferramenta útil tanto para autoridades regulatórias quanto para fabricantes, especialmente os de pequeno porte.

A árvore decisória não é obrigatória, mas recomendada para o Princípio 2 do APPCC, envolvendo quatro perguntas a serem respondidas logicamente com “Sim” ou “Não”. Essas perguntas ajudam a identificar se um perigo pode ser controlado por Boas Práticas de Higiene ou se medidas de controle específicas são necessárias.

Em 2024 continuamos comprometidos em promover a disseminação de conhecimento e experiências que possam contribuir significativamente para a segurança dos alimentos e para a saúde dos consumidores em todo o mundo.

Convidamos vocês, nossos leitores, a sugerirem quais tópicos gostariam de ver abordados ao longo deste ano, garantindo que o blog continue sendo uma fonte relevante e atualizada de informações na área da segurança de alimentos.

Imagem: Fauxels

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Tem formol no leite? A resposta é: Não

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Vários amigos me fazem a seguinte pergunta: “tem formol no leite de caixinha ou de garrafa?” Muitas pessoas não entendem por que o leite nessas embalagens não estraga por vários meses e associam isso a colocação de formol. Vou explicar que isso não tem nada a ver com formol.

O leite ordenhado (retirado) das vacas é enviado aos laticínios para produção de vários produtos, sendo um deles o leite ultrapasteurizado, que também tem outras denominações, como UAT, UHT ou longa vida.

Para que o leite ultrapasteurizado permaneça sem estragar por 4 a 6 meses é necessário que o processamento e envase (colocação do leite na embalagem) sejam feitos de forma asséptica, seguindo 4 princípios:

  •       1)      Leite deve passar por um tratamento a altas temperaturas, ou seja, entre 142 e 146ºC, e de forma rápida, por 4 a 6 segundos. Esse tratamento preserva os nutrientes do leite e elimina os microrganismos viáveis que podem ser bactérias, vírus, bolores e leveduras;
  • 2)      A embalagem precisa ser esterilizada dentro da máquina de envase para também eliminar possíveis microrganismos que estejam aderidos;
  • 3)      O enchimento da embalagem com produto precisa ser feito em um ambiente estéril, ou seja, sem microrganismos. O equipamento que faz o envase tem esta condição;
  • 4)      A embalagem precisa ter barreiras de proteção para evitar a entrada de oxigênio e de microrganismos, tornando o produto seguro durante o prazo de validade.

Esse processo é muito bem controlado nos laticínios para que o leite chegue à sua casa de forma segura e saudável, desde que dentro do prazo de validade.

Além disso, a ANVISA exige que qualquer aditivo deve estar listado na embalagem do produto e não há nenhuma embalagem com a mensagem sobre a presença de formol.

Há outro órgão do governo, o MAPA, que também garante que não haja formol no leite.

Outras perguntas e crenças comuns são:

  • “O leite da caixinha é diferente do leite da vaca na fazenda?”

Um pouco, considerando que o cheiro pode mudar devido ao processo de vácuo aplicado ao leite, que retira os odores conhecidos como “cheiro de curral”.

  • “O leite de caixinha não tem gordura/nata? Por que não separa a nata?”

O leite integral mantém o teor médio de gordura do leite da vaca que é de aproximadamente 3%, mas não há separação porque o leite passa por um processo chamado homogeneização. Esse processo quebra as partículas grandes de gordura em partículas tão pequenas que elas ficam dispersas ou diluídas no leite, sem separação de fases.

Os leites desnatados e semidesnatados são reduzidos no teor de gordura para atender demandas dos consumidores.

  • “Nenhum animal precisa de leite depois que deixa de ser filhote. Por isso não precisamos tomar leite.”

O ser humano não pode ser comparado a outros animais em relação a sua dieta, pois tem uma dieta mais rica e temos o poder de transformação dos alimentos. Exemplo é que nenhum animal faz churrasco ou cozinha qualquer alimento para comer. O leite é um alimento muito completo por conter diversos nutrientes.

  • “Eu tenho intolerância à lactose, por isso não posso tomar leite”.

Primeiramente é necessário realizar testes de laboratório para comprovação desta intolerância. Se for confirmada, é possível ingerir leite sem lactose, no qual a molécula de lactose (um tipo de açúcar) foi quebrada em unidades menores e de mais fácil digestão.

É necessário fazer um alerta: alguns “leites”, que dizem substituir o leite de vaca, não contêm os mesmos nutrientes e principalmente o mesmo teor de proteínas que o leite de vaca.

Infelizmente alguns “influencers”, querendo chamar a atenção e ganhar visualizações, estão falando mentiras como se fossem verdades. Cuidado, não acredite em tudo que falam e nem em modismos. É preciso avaliar a qualificação profissional de quem fala.

Um dia minha tia Maria Emília contou-me que tinha ido a uma nutricionista. A profissional falou para ela tirar imediatamente o leite de vaca de sua alimentação porque faz mal. Minha tia, super saudável, respondeu-lhe: “Minha filha, sou saudável aos 85 anos porque tomei leite de vaca a vida toda.”

Espero ter esclarecido alguns pontos sobre o tema, por ser uma profissional com mais de 30 anos de experiência em diversos tipos de indústrias de alimentos e ter grande respeito e admiração pelos produtos lácteos.

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Seu champanhe realmente é um champagne?

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Para poder ser chamado de champagne – ou champanhe, como escrevemos no Brasil – um vinho espumante deve ser produzido exclusivamente na região de Champagne, nas proximidades da cidade de Reims, no oeste da França. Além disso, deve também seguir um método de produção tradicional, além de outras exigências, como usar uvas típicas produzidas na região.

As vitis viniferas tintas Pinot Noir e Pinot Meunier, além da branca Chardonnay, correspondem a quase 100% das cepas plantadas na região de Champagne, que conta com 33.868 hectares.

Trata-se de uma localidade reconhecida pelo selo Appellation d’Origine Contrôlée (AOC), um certificado que corrobora o local como o único produtor original de champanhe no mundo, ou seja, champanhe que realmente é champanhe vem desta região e possui certificação desta AOC.

O método tradicional de produção de champanhe também é conhecido por método champenoise, no qual a primeira fermentação é feita no tanque de inox, porém, a segunda deve ocorrer já dentro da própria garrafa.

O sistema de AOC é muito sério, envolve responsabilidades conjuntas em toda cadeia produtiva, incluindo o compromisso de produtores primários, indústrias e negociadores, além da participação de outros stakeholders como o próprio governo da França, exigindo que as uvas utilizadas sejam exclusivamente cultivadas sob o clima e solos (terroir) desta região referenciada. No entanto, vale a pena o esforço, por agregar valor ao produto e torná-lo um item exclusivo e desejado em todo o mundo.

Mas e se o produto rotulado como “champanhe” sequer for um bom espumante?

Há um escândalo ocorrendo neste momento na França. Suspeita-se que 1,8 milhões de garrafas vendidas como champanhe sejam falsificações à base de vinhos baratos importados, dióxido de carbono (CO2) para dar o perlage (bolhas) e arredondados com licor, sendo vendidas por um preço entre €10 e €20.

Este escândalo caiu como uma bomba justamente por este ser o período de pico de vendas, que compreende as festas de Natal e Ano Novo e envolve a mais notória região produtora de espumantes do mundo.

Segundo a denúncia de uma gerente que atua no setor, Didier Chopin, o CEO na Champlat-et-Boujacourt a 130km a oeste de Paris, detentora de 22 marcas e que exporta para 40 países, com faturamento anual que ultrapassa €10 milhões, é a mente por trás da fraude.

Após a pandemia de Covid-19, em 2022, os preços do vinho explodiram e Didier Chopin, que comprava a bebida no atacado, já que seus 8 hectares de vinhedos cobrem apenas uma pequena parte da sua produção, começou a ter dificuldade em adquirir a bebida. Sua empresa, então, estava sujeita a multas de centenas de milhares de euros caso as encomendas dos supermercados (quase um milhão de garrafas de champanhe por ano) não fossem entregues, daí ele teve a brilhante ideia: fazer um produto “montado” e vender como champanhe.

A receita utilizada para a “montagem” do vinho espumante a princípio é perigosa para a saúde; o sabor e aroma não são os ideais e o mais importante: é uma fraude por enganar o consumidor, vendendo gato por lebre, ou seja, é uma mistureba gaseificada vendida como se fosse um autêntico Champagne e assim não cumpre as regras de denominação de origem.

Há também uma linha de suspeitas que sugere que o produto não seria montado, mas ainda assim, não poderia ser chamado de champagne, por estar fora da região AOC, pois havia na linha de produção caixas com rolhas “Grand vin de Champagne” sendo destinadas a garrafas usadas em produtos de fora do perímetro.

A Direção Geral da Concorrência, Consumo e Controle de Fraude (DGCCRF) francesa foi contatada e as análises do produto estão em andamento. Enquanto isso, o Ministério Público aguarda a recepção do processo da DGCCRF antes de abrir uma investigação formal e apurar responsabilidades.

Alguns supermercadistas franceses já retiraram as garrafas das marcas controladas por Didier Chopin de suas gôndolas para não se arriscarem a ter o nome envolvido neste escândalo.

A história ainda está em andamento. É preciso aguardar o desenrolar do caso para conhecer o tamanho e a natureza real do problema, mas se o escândalo realmente se confirmar, será um dos maiores casos de fraude no setor, comprometendo a integridade da garantia de origem na região de Champagne.

De minha parte, já sendo bairrista, sugiro irmos tomando os espumantes brasileiros que são excepcionais e estão ganhando o mundo por sua qualidade, aroma e sabor.

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Fraude no azeite de oliva: o que você precisa saber

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O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), por meio de uma operação realizada entre 20 a 24 de novembro de 2023, apreendeu mais de 6.000 garrafas de azeite de oliva falsificado e inutilizou mais de 16.000 litros de azeite proveniente de importação, que foi considerado impróprio para o consumo (leia aqui).

Segundo dados históricos e o próprio MAPA, o azeite de oliva é o segundo alimento mais fraudado em todo o mundo, ficando atrás somente do pescado (veja aqui). Por ser considerado um produto nobre, com valor agregado, sua suscetibilidade à fraude é alta e, de certa forma, a fraude é simples de ser realizada.

Primeiramente, vamos entender o que é a fraude nos alimentos, também conhecida como food fraud. Ela consiste basicamente em adulterações intencionais nos alimentos visando ganho econômico. A fraude pode ocorrer por substituição, adição, falsificação ou por informação falsa ou enganosa na rotulagem.

Para o azeite, a fraude mais comum é a diluição do azeite extra virgem em algum outro tipo de óleo de menor valor, sendo utilizado comumente o óleo de soja, por conta de seu sabor mais neutro, às vezes com emprego de corantes e aromatizantes para que se assemelhe ao produto final.

Cabe salientar que nas prateleiras existem alguns tipos de azeite com denominação de “óleo composto”. Neste caso vale atenção, porque muito embora não se trate de um azeite de oliva puro, a comercialização do óleo composto é permitida, não sendo caracterizada como fraude, uma vez que a informação da denominação de venda está claramente apresentada ao consumidor, não o induzindo ao erro.

Mas como identificar os produtos adulterados?

Existem alguns pontos de atenção que precisam ser levados em consideração na hora da aquisição, entre eles:

Características físico-químicas – Para o azeite, levamos em consideração a acidez (abaixo de 0,8%) e o índice de peróxidos, que aponta o estado de oxidação inicial do azeite. Para o extra virgem, o índice de peróxidos deve ser menor ou igual a 20 miliequivalentes de oxigênio ativo por quilograma de gordura (mEq O2/kg).  Não é considerada uma medida isolada para prevenção. Uma vez que a fraude pode advir do próprio rótulo, deve ser combinada com outras medidas.

– Dê preferência para empresas que concentram seu processo em um único ambiente fabril (esmagamento e envase), uma vez que quanto mais houver terceirização de etapas, mais suscetível à fraude o azeite estará;

– Desconfie de preços abaixo do valor do mercado – este item é de extrema importância, uma vez que justamente por ser um produto de valor considerável, o azeite é passível de fraude.

– Por último, mas não menos importante, a avaliação sensorial é fundamental para identificar a fraude após a aquisição do azeite, já que este tem odor e sabor bem característicos.

– Para o olfato, o azeite de oliva, assim como um bom vinho, tem notas marcantes. Essas notas remetem a campo ou ao pomar, com toques de folhas, ervas frescas, frutos e especiarias. Já para o paladar, o azeite extra virgem pode exibir 3 características diferentes, podendo trazer ao paladar notas de tom frutado, amargo e picante. Justamente por essas características marcantes, ao ser misturado com óleos com odor e sabores mais neutros, as notas sensoriais podem ser enfraquecidas, facilitando a percepção da fraude.

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E o sal tem prazo de validade?

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Desde tempos imemoriais, os humanos usam o sal como conservante. Na verdade, preservar alimentos com sal é mais antigo do que os registros escritos. Nossos ancestrais salgavam carne, peixe, vegetais e até frutas para evitar que se deteriorassem rapidamente. O sal preserva os alimentos, retirando a água livre dos alimentos, por osmose. Na verdade, este é um uso muito inteligente, pois todos os seres vivos – incluindo os micro-organismos – precisam de água. Ao adicionar sal aos alimentos, privamos os micro-organismos da água de que necessitam, impedindo-os de se multiplicar. Considerando isso, você provavelmente nunca parou para se perguntar: mas o sal vence, ou seja, ele tem prazo de validade?

Quanto tempo dura o sal?

Acredite ou não, ele dura indefinidamente. Ou seja, o sal puro (apenas cloreto de sódio) durará para sempre. Mas muitas das variantes de sal contêm compostos e ingredientes além do cloreto de sódio. O chamado sal do Himalaia, por exemplo, obtém sua cor rosa a partir de impurezas minerais. Já o sal marinho não refinado contém vestígios de algas. O sal iodado contém iodo, que é nosso sal de cozinha comum. Todos eles também contêm agentes anti-aglomerantes que podem se degradar com o tempo, causando aglomeração.

Como saber se o sal está impróprio para o consumo?

Lembre-se, o sal puro não vence, isto é, não perde a validade. Ainda assim, há momentos em que você provavelmente vai querer jogá-lo no lixo porque sua qualidade diminuiu. Identificar o sal que já passou do seu auge não é tão fácil quanto saber a diferença entre ovos frescos e vencidos, mas você saberá quando o vir.

Por exemplo, o sal pode absorver o cheiro de outros produtos ou absorver os aromas dos alimentos que você cozinhou. Se ele tiver cheiro estranho, você pode descartá-lo para não transmitir esse cheiro aos alimentos que tempera.

As pessoas que vivem em climas úmidos, especialmente perto de corpos d’água, às vezes descobrem que houve formação de aglomerados no sal. Isso é resultado da umidade e do tempo (lembre-se de que os agentes anti-aglomerantes degradam-se com o tempo). Embora não faça mal a você, pode ser mais difícil retirá-lo do recipiente. E, finalmente, se você for amaldiçoado com insetos em sua despensa e alguns acabarem no sal, jogue tudo no lixo.

Texto traduzido e compilado, você pode lê-lo na íntegra clicando aqui.

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Quanto de hormônio há no frango que você come?

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A carne de frango está consolidada como uma das fontes proteicas mais presentes na dieta brasileira. Devido a sua qualidade nutricional, facilidade de preparo, disponibilidade e custo, em média, cada brasileiro consome 45 kg de frango por ano, seja in natura (inteiro ou em pedaços) ou nas mais variadas formas como salsichas, nuggets, linguiças, mortadelas, alimentos prontos etc.

A carne de frango está entre os alimentos mais completos em nutrientes necessários para uma alimentação saudável, pois é uma importante fonte de proteína, aminoácidos essenciais e vitaminas, além de possuir baixo teor de gordura.

No entanto, ainda há alguns tabus a respeito do consumo desta ave, pois não raramente, ministrando aula, ao tratar o tema dos perigos potenciais em alimentos, alguns alunos ainda alardeiam sobre o risco dos “hormônios” na carne de frango.

Em rodas de conversa informal a história fica ainda mais espetacular. Numa ocasião, uma pessoa afirmou com toda a certeza que é devido aos hormônios injetados no frango que atualmente as crianças estão “amadurecendo” mais cedo. Quando retruquei o disparate, ouvi que, por eu ser “químico”, era suspeito, pois estaria sendo cúmplice da indústria de alimentos.

O fato é que para muitos desinformados, o frango ser tratado com hormônio já virou uma verdade difícil de contestar, mas como sou persistente, neste artigo tento mais uma vez desfazer este grande mito.

INVIABILIDADE DO USO DE HORMÔNIOS EM FRANGOS

Afinal, o que são hormônios?

Hormônios são moléculas químicas proteicas mensageiras que desempenham funções específicas como regular o crescimento, o desenvolvimento sexual e o metabolismo, desempenhando, portanto, um importante papel ligado a respostas fisiológicas, morfológicas e bioquímicas.

Por serem moléculas proteicas, caso ingeridas, os hormônios seriam quebrados pelo aparelho digestivo mediante a atuação das enzimas, como parte do processo normal de digestão. Por isso, não há como fazer administração oral (pela ração) de hormônio para os frangos.

Por isso, a aplicação de hormônios precisaria ser intravenosa, o que seria uma tarefa inviável, pois imagine injetar doses hormonais em planteis que variam de 30 a 150 mil aves por lote.

Para completar, hormônios carecem de um tempo de latência para sua atuação e resposta funcional no organismo, sendo que em média este tempo é de cerca de 60 a 90 dias. Porém, como os frangos são abatidos em torno de 42 dias, não haveria tempo hábil para que os hormônios produzissem qualquer efeito.

Por todas estas razões expostas, simplesmente não existe nenhum hormônio comercialmente viável e disponível no mercado mundial para uso em avicultura.

Mesmo que fosse viável, o uso de hormônios pela indústria avícola infringiria acordos com diversos stakeholders como empresas, atacadistas e países, considerando que a indústria é altamente auditada e inspecionada, sobretudo, devido aos contratos do mercado internacional business to business. Se, de alguma forma, a indústria tentasse fraudar estes acordos, correria o risco de perder uma fortuna pelo cancelamento de embarques, sanções, multas e outras penalidades, pois só em 2022 exportamos 4,82 milhões de toneladas de frango, gerando receita de US$ 9,7 bilhões.

A eficiência da cadeia produtiva do frango, que engloba produtores de grãos, fábricas de rações, transportadores, incubatórios, criadores de pintos, granjas de engorda, abatedouros e frigoríficos, permitiu ao Brasil se tornar o 2° maior produtor mundial, chegando a 14,5 milhões de toneladas, sendo que 66,8% ficam no mercado interno, e com o restante que é exportado, o país atualmente se posiciona como maior exportador de carne de frangos do mundo, atendendo mais de 150 países, devido à qualidade e segurança da carne produzida em solo brasileiro.

Atualmente, os maiores compradores de carne de frango in natura do Brasil são a China (US$ 776 milhões), Emirados Árabes Unidos (US$ 334 milhões) e Japão (US$ 274 milhões).

Os frangos são aves com crescimento rápido porque são muito eficientes em transformar ração em proteína (carne), fruto de décadas de pesquisa e desenvolvimento da ciência avícola no Brasil e no mundo.

Esta celeuma sobre hormônios em muito se deve justamente ao espanto quando se toma conhecimento do tempo necessário entre o nascimento do pinto e o abate do frango, comparando uma ave de roça (capoeira), criada solta, com o frango de granja, pois a primeira leva até 180 dias em média para se desenvolver, enquanto a segunda poderá estar pronta para abate em 28 dias, preferencialmente, não devendo ultrapassar 42 dias para evitar custos excedentes.

Este espetacular crescimento gera perplexidade e dúvidas nos leigos, e claro, surge na crendice popular a tese do hormônio em frangos. Mas se o frango não recebe hormônio, como pode ocorrer este milagre do crescimento?

A resposta a esta pergunta considera três elementos fundamentais, que juntos fazem com que os animais cresçam saudáveis e ganhem peso rapidamente:

1 – MELHORAMENTO GENÉTICO

Este primeiro elemento trata da escolha de aves com as características desejáveis, como, por exemplo, menos gordura corporal, maior carcaça, em especial na região peitoral, e, que consigam ganhar peso facilmente.

Ao longo do tempo esses animais foram sendo escolhidos, os melhores eram cruzados com os melhores, passando suas características desejáveis a seus filhotes e assim por diante.

Para se ter uma ideia, em 1930, um frango de corte brasileiro era comercializado quando atingia o peso médio vivo de 1,5 kg, com cerca de 105 dias de idade; em 2002, o peso médio saltou para 2,3 kg e sua idade caiu para 42 dias; atualmente os frangos podem atingir até 4 kg e a partir de 28 dias já estão prontos para o abate.

2 – NUTRIÇÃO

O segundo elemento é a nutrição, cujo controle nas grandes granjas é muitas vezes computadorizado e automatizado, fazendo-se uso de muito know-how e tecnologia.

Estudos que consideram questões nutricionais e metabólicas nos permitem saber qual a melhor composição da ração para cada fase do crescimento do frango, conhecendo-se exatamente o quanto de cada ingrediente da ração que é formada basicamente por milho, farelo de soja, vitaminas e minerais, será necessário para que ele consiga crescer o máximo possível em cada etapa de seu breve período de vida.

Também podem ser usados como promotores de crescimento probióticos, prebióticos e simbióticos  junto a nutrição das aves, porém isto não tem nada a ver com hormônios.

  1. Probióticos são constituídos por microrganismos benéficos que são adicionados na ração com o intuito de melhorar a saúde intestinal dos frangos, promovendo melhor integridade da mucosa intestinal, maximizando a absorção de nutrientes e estimulando o sistema imunológico destas aves;
  2. Prebióticos são componentes alimentares como fibras não digeríveis que estimulam seletivamente a proliferação ou atividade de populações de bactérias desejáveis no intestino, beneficiando o indivíduo que hospeda essas bactérias;
  3. Simbióticos combinam prebióticos e probióticos com o objetivo de potencializar os efeitos benéficos de cada um deles, podendo, inclusive, ser direcionados às diferentes regiões “alvo” do trato gastrintestinal: os intestinos delgado e grosso.

A cada fase de vida do frango a ração vai sendo modificada, otimizando-se o aproveitamento e a conversão em proteína que refletem no crescimento da ave, e desta forma, é possível garantir que se obtenha o potencial máximo de crescimento.

Outra questão óbvia e indispensável que compõe a nutrição é que a água esteja sempre disponível aos frangos, que seja potável e livre de contaminantes, com atenção a sua temperatura que não deve ser superior a 24°C, pois assim pode haver diminuição do seu consumo. Cuidado também com os bebedouros que devem estar sempre em boas condições de uso, limpos, com altura ajustada ao tamanho das aves e com vazão adequada.

A água deve estar disponível durante todo o dia às aves, pois considera-se que a quantidade de água ingerida é, em média, o dobro da quantidade de ração consumida no mesmo período.

3 – MANEJO AVÍCOLA

O terceiro elemento é o correto manejo do frango na granja, na qual também se aplicam muitas tecnologias buscando-se o óbvio: que o frango cresça o máximo no menor intervalo de tempo possível.

Para crescer bem e rápido, o frango, além de boa alimentação, precisa de conforto térmico e espaço que lhe proporcionem bem-estar.

Para que os frangos consigam ganhar o peso máximo desejado, eles não devem se estressar. Para isso, todas as variáveis operacionais são controladas minuciosamente, incluindo o espaço disponibilizado por ave, temperatura, umidade, velocidade do vento (3,5 m/s) e a iluminação ambiente.

O galpão para as aves de corte deve ser mantido em condições sanitárias, livres de animais machucados ou doentes, e, também livre de pragas vetoras de doenças.

Para cada faixa etária do frango, as necessidades ambientais são diferentes, por isso, vão sendo ajustadas conforme a ave vai se desenvolvendo, e, em paralelo, são realizados os ajustes na composição da ração como já mencionado.

Para finalizar

A produção de frangos de corte é cercada por muita tecnologia, incluindo empresas de genética e laboratórios em todo o mundo que trabalham para aperfeiçoar continuamente as linhagens de frangos para garantir um alto desempenho, com saúde, conforto animal, junto com o apoio das fábricas de rações que buscam desenvolver produtos saudáveis e de máxima conversão, resultando em frangos prontos para abate a partir de 28 dias, permitindo alimentar milhares de pessoas com proteínas de excelente qualidade.

Frangos não são tratados com hormônios!

O consumidor poderá eventualmente encontrar algumas embalagens contendo o selo “sem uso de hormônios”. Entretanto, serve apenas para combater o mito de que a carne de frango tem hormônio, visto que todos os frangos são livres da adição de hormônios, estando esta informação escrita na embalagem ou não.

Portanto, espero que após este artigo fique definitivamente claro que não há hormônios no frango que você consome, exceto, é claro, aqueles provenientes do próprio metabolismo da ave, e que se você possui uma filha assim como eu, e ela está se tornando mocinha, isso se deve simplesmente ao curso natural, à chamada puberdade, nada tendo a ver com o frango que ela consome.

Mande este artigo para seu amigo que tem certeza de que frangos são tratados com hormônios, ajude a acabar com esta desinformação, que prejudica em muito um dos setores mais importantes do agronegócio brasileiro, fonte de divisas para nossa economia.

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Por uma cultura de segurança de alimentos baseada na ciência: mitos sobre alimentos processados e irradiação

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Recentemente, o ITAL (Instituto de Tecnologia de Alimentos) lançou o Brasil Food Trends 2030, um guia que apresenta diretrizes para o futuro da alimentação no país. Dentre todas as informações compartilhadas, uma em particular chamou minha atenção e merece ser discutida neste espaço:

“A cultura da segurança de alimentos como fator contra a proliferação de informações falsas e sem fundamento científico”.

Essa afirmação ressalta a importância de disseminar o conhecimento sobre a segurança dos alimentos em todas as esferas governamentais e na sociedade em geral. Recentemente, neste blog, discutimos equívocos comuns, como a interpretação errônea de que alimentos submetidos a raio X devem ser rotulados como irradiados. Outros tópicos também já foram abordados aqui:

Essas crenças equivocadas são apenas alguns exemplos do que se espalha amplamente, muitas vezes de forma não embasada em evidências científicas sólidas.

Neste artigo, pretendo apresentar exemplos concretos desses equívocos e, mais importante ainda, fornecer fundamentações científicas para corrigi-los. O objetivo é contribuir para uma compreensão mais sólida da segurança de alimentos, capacitando as pessoas a tomar decisões corretas em relação aos alimentos que consomem.

A frase “Quanto mais processado é o alimento ‘mais porcaria tem dentro” é incorreta e simplista, pois não considera a diversidade de alimentos processados, as necessidades individuais, os avanços tecnológicos na indústria alimentícia e o equilíbrio na dieta. A nutrição é complexa, e generalizar todos os alimentos processados como prejudiciais não é preciso nem justo.

Em vez disso, é importante fazer escolhas conscientes dentro de uma variedade de alimentos, considerando as necessidades pessoais e diretrizes nutricionais adequadas. O debate sobre alimentos ultraprocessados destaca a necessidade de definições claras e evidências sólidas, enfatizando a importância de orientações práticas para os consumidores e informações nutricionais claras nos rótulos dos alimentos. Os consumidores têm o poder de decisão sobre sua alimentação e a transparência na informação nutricional é fundamental.

Quanto à frase “Irradiação de alimentos causa câncer”, cabe ressaltar que a irradiação de alimentos é um processo no qual os alimentos são expostos a radiações ionizantes, como raios gama ou elétrons, para eliminar microrganismos patogênicos, insetos e assim retardar sua deterioração. Esse processo ajuda a melhorar a segurança dos alimentos processados e a prolongar sua vida útil. A irradiação de alimentos é regulamentada por órgãos de segurança alimentar em muitos países para garantir que seja realizada de forma segura e dentro de limites aceitáveis de dosagem. Vários estudos científicos e organizações de saúde, como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos, consideram a irradiação de alimentos segura quando realizada de acordo com as regulamentações estabelecidas.

A legislação que regula a irradiação de alimentos no Brasil é a Resolução RDC 21/2001, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA). Esta resolução estabelece os regulamentos técnicos para a irradiação de alimentos e fornece diretrizes específicas sobre como o processo deve ser conduzido, incluindo limites de dose de radiação, requisitos de rotulagem, embalagem e outros aspectos relacionados.

As indústrias implementam programas de pré-requisitos, com destaque para o sistema APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle), que se baseiam na avaliação de probabilidade e severidade relacionadas ao risco para a saúde dos consumidores. Estas práticas estão sujeitas à fiscalização por parte de órgãos governamentais, como a Anvisa e o MAPA, desempenhando um papel fundamental na garantia da segurança dos alimentos que chegam até você.

A aceitação de informações incorretas por parte dos consumidores pode ser influenciada por variáveis psicológicas e pela disposição individual para a mudança. Mais precisamente, a predisposição à influência social desempenha um papel significativo na aceitação de informações falsas online, especialmente quando as pessoas estão em um período de transição alimentar, pois se tornam mais receptivas e propensas a absorver informações e considerar conselhos de terceiros.

Se você gostou deste conteúdo, fique ligado para mais notícias e informações em futuras postagens.

Imagem em destaque: foto de Yan Krukau

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Isso aí é salmão ou truta salmonada?

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A família dos salmões é uma das mais antigas famílias de peixes e remonta há mais de 100 milhões de anos. Estes peixes são considerados espécies-chaves, ou seja, sobre as quais se apoia toda uma rede de vidas de um ecossistema.

O salmão adulto é apreciado como alimento por focas, tubarões, baleias, lobos, ursos, e claro, por nós, seres humanos.

Trata-se de um peixe extremamente versátil que pode ser consumido das mais variadas formas, seja cru, como é muito comum na culinária japonesa, até grelhado, frito, assado no forno, em forma de bolinhos, com legumes ou molhos, de acordo com as preferências individuais. Além disso, são ricos em ômega 3 e fonte de proteínas e potássio, bem como de vitaminas D, B3, B6, B12, fósforo e magnésio.

salmão do Atlântico e as 5 espécies de salmões do Pacífico (real, sockeye, coho, keta e o rosa) são peixes carnívoros, migradores e nativos das águas frias do Hemisfério Norte.

  1. Salmão do Atlântico (Salmo salar, L.), chamado assim justamente porque enquanto o Pacífico é o lar de várias espécies de salmão, o Atlântico abriga apenas esta única espécie, que muito provavelmente é aquela que você encontra nos supermercados do Brasil. Praticamente todos os salmões do Atlântico disponíveis comercialmente são cultivados. Possui peso médio de 4 – 5,5 kg;
  2. Salmão chinook (Oncorhynchus tschawytscha), também conhecido como “salmão real”, considerado por muitos como o que possui o melhor sabor, porém, é o mais raro do Alasca. Eles têm um teor de gordura alto e carne que varia de branco para uma cor vermelha profunda. Possui um peso médio de 8 – 9 kg;
  3. Salmão sockeye (Oncorhynchus nerka) é conhecido como “salmão vermelho” pela sua carne vermelha-laranja brilhante e sabor rico e profundo, sendo a segunda espécie de salmão mais abundante no Alasca. Possui um peso médio de 2 a 4 Kg;
  4. Salmão coho (Oncorhynchus kisutch) às vezes é chamado de “salmão prateado” ou simplesmente “prateado” devido à cor de sua pele. O seu tamanho médio, a boa cor vermelho brilhante da sua carne e sua textura extremamente delicada lhe garantem a preferência entre os chefs de cozinha. Possui um peso médio de 4 a 5 kg;
  5. Salmão keta (Oncorhynchus keta) às vezes é chamado de “salmão cão”, devido aos dentes da frente dos machos serem maiores do que nos outros salmões. O salmão keta produz o melhor e mais apreciado caviar de salmão do mercado (ikura em japonês). Possui peso médio de 3 a 6 kg;
  6. Salmão rosa (Oncorhynchus gorbusha) é o de menor tamanho, mas constitui o estoque natural mais abundante. Eles são às vezes chamados de “humpies“, “corcunda” ou “salmão jubarte” por causa da corcova distinta que os machos desenvolvem nas costas quando vão desovar. Possuindo uma carne de cor muito clara e um menor teor de gordura, são muitas vezes enlatados, mas também vendidos frescos, congelados e defumados. Possui um peso médio de 1,5 a 2,0 kg.

Cerca de 99% do salmão do Atlântico comercializado mundialmente é produzido em cativeiro, enquanto cerca de 80% dos salmões do Pacífico são normalmente pescados em estado selvagem.

Na natureza, os salmões, seja qual espécie for, têm uma vida que é uma verdadeira epopeia, seguindo a programação de seus genes que garantem a sobrevivência da espécie. Nascem nas águas doces dos rios, depois vão viver nas águas salgadas dos mares e, anos depois, voltam exatamente para o mesmo rio, às vezes a apenas alguns metros de onde nasceram, para pôr ovos de cor âmbar, brilhantes e translúcidos e, enfim, morrer, numa missão que inclui nadar até 1500 km, subindo no sentido contrário ao das correntes dos rios, enfrentando obstáculos, a gravidade em elevações de até 2 mil metros, e para completar, lobos, ursos e pescadores no caminho querendo comê-los.

O salmão tem a capacidade de nadar contra a corrente com uma velocidade média de 6,5 km/ h, além disso, são capazes de saltar até aproximadamente 3,7 m de altura, permitindo-lhes superar os obstáculos em seu caminho.

Como não é um peixe propício para a salga, como é o caso do bacalhau, seu transporte deve ser bem refrigerado para garantir sua preservação, requerendo cadeia de frio, elevando as dificuldades logísticas, e consequentemente, os custos operacionais, o que torna o preço do pescado natural praticamente inviável para ser trazido de seus habitats naturais para o hemisfério sul, fora que estes habitats sozinhos não produzem o que é requerido pela demanda internacional de consumo atual.

Por esse motivo, praticamente 100% do salmão consumido no Brasil é criado em cativeiro, em condições adaptadas que buscam recriar os estágios de vida do peixe em seu ambiente natural, portanto, certamente, não é este disputado com os ursos, lobos e focas, mas de uma criação provavelmente no Chile.

Sobre bacalhau, leia: Aprenda a escolher um bacalhau de qualidade

PRODUÇÃO EM CATIVEIRO DE SALMÃO

A Noruega foi o país pioneiro que inventou na década 60 a produção em cativeiro do Salmo salar, o nome científico do salmão do Atlântico, que atualmente representa a segunda maior indústria do país, atrás apenas do petróleo.

Como se vê, não existem salmões nativos na América do Sul, porém, nos anos 80 foram introduzidos no Chile, justamente por conta das similaridades geográficas com a Noruega.

Nos dias atuais, o Chile produz 900 mil toneladas por ano na Patagônia — dos 2,3 milhões de toneladas da produção mundial —, tornando-se o 2° maior produtor de salmão de cativeiro do mundo, atrás apenas do país escandinavo.

As exportações de salmão do Chile somaram mais de US$ 4 bilhões em 2020 representando 6% das exportações totais e só perdendo para o cobre. Para comparação, os vinhos chilenos responderam por US$ 1,5 bilhão.

Chile e Noruega são responsáveis por mais de 70% do salmão consumido no mundo.

Atualmente, o Brasil é o terceiro maior importador de salmão chileno, atrás apenas dos Estados Unidos e do Japão.

A COLORAÇÃO DO SALMÃO

O salmão quando nasce, diferentemente do que muitos pensam, naturalmente não possui a cor salmão (laranja-rosada), ele tem uma carne de cor branca: o que o deixa com aquela coloração característica é a bioacumulação do pigmento natural astaxantina, produzido por diversas microalgas.

Na cadeia alimentar do salmão, essas microalgas servem de alimento para crustáceos como pequenos camarões e lagostins (motivo pelo qual esses animais também possuem a coloração alaranjada) que, por sua vez, são comidos pelos salmões.

Como a dieta do salmão selvagem é muito variada, pode existir uma enorme variedade de cores, desde totalmente branco ou um cor-de-rosa suave até um vermelho vivo, dependendo da espécie, habitat e hábitos alimentares.

Muitos peixes armazenam a astaxantina na pele e nos ovários, mas só os salmões a armazenam também nos músculos. Dessa forma, o peixe acumula o pigmento em sua carne, adquirindo a tonalidade que foi batizada segundo seu nome e que lhe é tão característica.

A astaxantina também influencia o cheiro e o sabor da carne do salmão, que, apesar de gordurosa, não tem o mesmo sabor forte que peixes como arenques e cavalas, igualmente gordos, possuem.

No cativeiro ele não se alimenta de pequenos camarões e lagostins, mas de ração. Então, para que mantenham a cor que os caracteriza no ambiente natural, os peixes são alimentados com uma ração contendo astaxantina ou cantaxantina (um pigmento semelhante), que pode ser tanto de fonte natural, extraído de algas, quanto sintético.

Porém, para a produção em larga escala de salmões, é mais comum a utilização do aditivo sintético, mais barato, que é produzido a partir de derivados de petróleo.

No entanto, em tese, não há nenhum problema de food safety nisso, lembrando que vários outros produtos também têm substâncias oriundas do combustível fóssil, incluindo cosméticos (principalmente maquiagem), medicamentos (aspirina e pomadas), base para gomas de mascar (pode ter ou não), etc.

RISCO DE FRAUDE NO SALMÃO

No mercado consumidor de salmão de cativeiro, como explicado, “colorido artificialmente”, nos deparamos com um concorrente: a truta salmonada (Oncorhynchus clarkii clarkii),  um peixe eurialino do gênero Oncorhynchus, sendo uma subespécie da truta e membro da família  dos salmonídeos.

O salmão e a truta são peixes bastante semelhantes (ambos da família Salmonidae), porém a última  adaptou-se melhor às águas doces de regiões montanhosas do Brasil. Ambos os peixes são muito ricos em proteínas e outros nutrientes, tais como ômega 3 e vitamina B12.

Em geral, as trutas não se alimentam de crustáceos, apresentando, naturalmente, carne de coloração branca, porém, existem produtores que incluem astaxantina em suas rações, fazendo com que o peixe também desenvolva uma tonalidade salmão, daí o nome truta salmonada.

Até aí não há nenhuma irregularidade. O problema ocorre quando alguns estabelecimentos vendem aos seus consumidores truta salmonada como se fosse salmão, já que aquela é mais barata, e neste caso, temos uma fraude econômica.

Esta fraude não é muito fácil de se perceber pelos consumidores, principalmente quando o peixe é consumido pronto ou na forma de sushis/sashimis.

Sobre fraudes em alimentos, leia também:

DIFERENÇAS BÁSICAS ENTRE O SALMÃO E A TRUTA SALMONADA

Todas as diferenças entre salmão e truta salmonada são muito sutis. Assim, a menos que seja um grande especialista, dificilmente um consumidor detectará num prato pronto se o peixe servido é um salmão ou uma truta salmonada. Por isso, tão importante frequentar estabelecimentos honestos que garantem a rastreabilidade de suas matérias-primas, insumos e ingredientes.

Porém, seguem algumas dicas das diferenças mais marcantes entre salmões e trutas salmonadas que podem ajudar:

  1. Pintas na pele – A truta salmonada possui algumas pintas avermelhadas, mas ao contrário do salmão, é uma diferença que só é possível identificar se os peixes forem servidos com a pele;
  2. Fibras – A truta salmonada possui fibras mais firmes, diferente do salmão, que possui fibras bem suaves;
  3. Sabor – Tanto o sabor da truta quanto o do salmão são marcantes, não precisando de muito tempero, porém, normalmente, o salmão é um pouco mais intenso;
  4. Formato do peixe – A truta tem uma forma mais arredondada do que o salmão, o que, em termos de aproveitamento do peixe, faz dele um peixe mais versátil, de onde se conseguem os melhores filetes;
  5. Espinhas – A truta tem menos espinhas do que o salmão e são mais fáceis de remover.

DICAS NA HORA DA COMPRA DO SALMÃO

No final, ao comprar um salmão, é extremamente importante que ele esteja seguro, ou seja, livre de contaminantes ou iniciando processos de deterioração. Seguem algumas dicas úteis para sua compra:

  1. Para que realmente seja salmão e não uma truta salmonada, prefira estabelecimentos sérios, honestos e que mantenham a rastreabilidade daquilo que comercializam;
  2. O peixe deve estar fresco, mantido sob refrigeração ou sobre uma espessa camada de gelo;
  3. Dê preferência àqueles que estão por baixo, evitando escolher o peixe que está por cima dos outros, pois ele não está em contato com o gelo;
  4. O peixe não pode apresentar manchas, nem conter furos e cortes em sua superfície.
  5. As escamas têm que estar firmes e resistentes e de coloração translúcida e brilhante;
  6. A pele tem que estar úmida e bem aderida;
  7. O corpo do peixe deve estar firme e resistente;
  8. O peixe deve exalar um cheiro de mar e a cor deve estar viva, de acordo com a espécie escolhida;
  9. Os olhos não podem apresentar pontos esbranquiçados no centro, devem estar brilhantes e ocupar toda a cavidade ocular;
  10. A parte interna das brânquias deve estar brilhante e vermelha, apresentando vasos sanguíneos cheios e fixos e não apresentar mucos como um líquido pastoso.
  11. No salmão em postas é importante observar se a carne está com a cor homogênea entre rosa e laranja, textura firme e com um fresco aroma de mar;
  12. No salmão defumado, no qual o peixe é submetido a um procedimento de conservação, defumado em lenha e essências aromáticas, o ideal é que a defumação seja recente. A parte central é a de maior qualidade, enquanto as postas próximas ao rabo são mais secas e salgadas. O salmão defumado deve ser mantido sempre refrigerado.

RISCO DE PARASITAS (ANISAQUÍASE)

A anisaquíase é uma parasitose intestinal provocada por vermes nemátodes da família Anisakinae, nomeadamente Anisakis simplexAnisakis physeteris e Pseudoterranova decipiens, que habitualmente são  adquiridos após a ingestão de frutos-do-mar ou peixes crus.

Felizmente, a anisaquíase ainda é uma doença rara, mas que, devido à crescente popularização dos pratos à base de peixes crus ou mal cozidos, tais como sushis, carpaccios de salmão, salmão defumado ou ceviches, tende a se tornar cada vez mais descrita.

No Japão, país com maior incidência dessa verminose, a taxa anual de infecção é de 3 casos novos para cada 1 milhão de habitantes, o que significa, aproximadamente, 400 novos casos por ano.

Nos países ocidentais, a incidência da anisaquíase é praticamente desconhecida. No Brasil, por exemplo, não há casos registrados de anisaquíase, entretanto, o verme já foi encontrado pela vigilância sanitária em diversos tipos de peixes, tais como anchova, bacalhau, cavala, dourado, peixe-espada e vieiras, por isso, não se pode descartar a hipótese de que as pessoas estejam sendo infectadas, mas o diagnóstico não esteja sendo feito.

O risco de anisaquíase existe, mas a probabilidade ainda é baixa no Brasil.

As melhores medidas preventivas são a cozedura do peixe a uma temperatura no mínimo de 70°C, ou congelamento a -20ºC por um período mínimo de 72 horas, ou a -35°C por no mínimo 24 horas, lembrando que o processo de defumação não elimina o parasita.

POR FIM…

O salmão é um peixe nutricionalmente muito rico e organolepticamente gostoso, por isso, tão apreciado na culinária.

O peixe de cativeiro, como mais comumente encontramos no Brasil, se criado seguindo boas práticas de manejo na aquicultura, é um excelente alimento, nutritivo e seguro.

A truta também é um ótimo peixe, só é fraude se for comercializada como sendo salmão.

Escolha bem o seu salmão para que esteja dentro das condições de frescor e tome cuidado para não levar truta salmonada em seu lugar, a menos, é claro, que deseja comer truta e não salmão.

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Intoxicação alimentar por atum contaminado: o que aconteceu?

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No final de agosto foi noticiado um surto de origem alimentar em nove creches da região de Campinas, envolvendo 60 pessoas, entre alunos e funcionários das instituições. Os sintomas aconteceram em julho e após as análises concluiu-se que a causa foi o consumo de atum contendo altos níveis de histamina.

A ANVISA, através da Resolução 3124/2023, solicitou o recolhimento do lote do produto, pela seguinte motivação: “Considerando a ocorrência de surto compatível com intoxicação alimentar por histamina após o consumo do alimento, em Centros de Educação Infantil de Campinas, São Paulo, e a confirmação de contaminação do produto com histamina acima dos limites tolerados pela legislação sanitária, evidenciada pelo RELATÓRIO DE ENSAIO Nº RE-TC 03.105/23, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL.”

Trata-se de um lote fabricado em 8 de maio deste ano, com validade até 8 de maio de 2025.

Segundo informações da Secretaria de Saúde de Campinas, as crianças com sintomas de intoxicação apresentaram manchas vermelhas pelo corpo, coceira e sete delas tiveram diarreia.

O que é a intoxicação por histamina?

Intoxicação por histamina também é chamada de intoxicação pela toxina escombróide.

Atuns e outros peixes da família Scombridae, peixes conhecidos como “escuros”, são susceptíveis à formação de histamina por conterem grandes quantidades de histidina livre no tecido muscular. A transformação da histidina em histamina costuma acontecer pela ação de bactérias contaminantes quando os peixes mortos não são conservados e manuseados de forma adequada. É importante que os peixes sejam refrigerados em curto período após sua morte, para evitar esse aumento na concentração de histamina.

Um fator importante é que a histamina não é eliminada durante os processos de cocção durante a fabricação do atum enlatado.

O Brasil e outros países têm um nível máximo permitido de histamina, que é de 100 ppm no tecido muscular.

A intoxicação assemelha-se clinicamente a uma reação alérgica aguda, com a presença de um ou alguns dos sintomas abaixo elencados:

  • Dormência
  • Formigamento
  • Sensação de queimação na boca
  • Erupções cutâneas no tronco superior
  • Queda de pressão
  • Dor de cabeça
  • Coceira na pele
  • Náusea
  • Vômito
  • Diarreia

O quadro costuma ser leve, desaparecendo em poucas horas, mas há relatos de complicações em crianças, idosos ou pessoas com deficiências imunológicas.

Os cuidados com a matéria-prima adquirida, sempre que possível analisando a presença de possíveis contaminantes que possam causar intoxicação alimentar, e a rápida detecção de alterações no produto, com recolhimento de lotes no mercado, podem evitar esse tipo de ocorrência.

Imagino que a questão da histamina seja um desafio para a indústria de pescado, pois pelo levantamento que fiz, as técnicas empregadas para detecção de histamina em peixes podem ser as de cromatografia, que não estão disponíveis para a grande maioria das indústrias de alimentos, pelo seu alto custo e pela necessidade de qualificação de mão de obra. Existem, porém, testes ELISA que podem ser adquiridos pela indústria. Não tenho a informação de seu custo, mas vale o exercício sobre o custo da análise versus o custo da falha interna. Nesse caso, a detecção da falha internamente poderia evitar o adoecimento daqueles que consumiram esse lote e também a exposição da marca na mídia.

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Microplásticos são encontrados no coração humano, e agora?

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Recentemente, algumas matérias em jornais de grande circulação noticiaram a primeira detecção de microplásticos no coração humano. Coincidência ou não, também aconteceu a publicação de uma matéria que descreve a presença de partículas de microplástico após o aquecimento no micro-ondas de embalagens plásticas utilizadas para a alimentação infantil.

Quando pesquisamos sobre os microplásticos, encontramos informações recentes, dos últimos 15 anos. Os pedacinhos de plástico com tamanho inferior a 5 milímetros são chamados de microplásticos. Eles são formados a partir da decomposição de peças plásticas maiores, na sua maioria provenientes de embalagens plásticas descartáveis.

As partículas de plástico são eliminadas no ar, na água e no solo e já foram encontradas em diferentes regiões do planeta Terra, como na Amazônia, Everest, em aves, peixes.

Essas partículas podem interferir na vida dos animais, por ficarem acumuladas no estômago, dando a sensação de saciedade a eles, entre outras alterações metabólicas ainda em estudo.

Se associarmos essa questão à segurança de alimentos, concluímos que estamos ingerindo microplásticos com comida. Eles estão na água que bebemos, nas frutas, nos frutos do mar e até na maquiagem do dia a dia. Apesar disso, as pesquisas sobre os impactos do produto na nossa saúde ainda são limitadas.

O que sabemos sobre o efeito dos microplásticos na saúde humana?

Como os estudos epidemiológicos tendem a ser longos, as informações ainda são escassas, mas há estudos que demonstram processos inflamatórios relacionados à presença de plástico no intestino humano, inclusive demonstrando que pessoas com doença inflamatória intestinal têm uma concentração maior de microplásticos nas fezes do que indivíduos considerados saudáveis.

Há relatos de microplásticos nos pulmões, glóbulos vermelhos, inclusive impactando a capacidade de transportar moléculas de oxigênio.

Ainda não se sabe qual a quantidade de plástico ou a concentração considerada tóxica, nem se há alguma substância pior do que outra.

É possível evitar os microplásticos?

Grande parte dos microplásticos são provenientes dos materiais descartáveis que são utilizados em grande escala na indústria de alimentos. Buscando diminuir a quantidade desses microplásticos no meio ambiente, tanto para melhorar a condição da fauna quando para evitar possíveis efeitos indesejados aos humanos, precisaríamos de um trabalho conjunto, entre setor industrial, órgãos públicos, população e pesquisas sobre o assunto.

Conseguimos substituir esse plástico em grande escala? Conseguimos fazer um trabalho de reciclagem desse material de forma massiva? A população, inclusive a infantil, precisa ser apresentada e engajada na questão de separação do material reciclável. Os órgãos públicos podem ser envolvidos no processo destinando áreas adequadas para que esse lixo seja separado e encaminhado à reciclagem, junto com iniciativas privadas, de forma que todo o lixo reciclado possa ser separado e não destinado a aterros.

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Food Safety na Netflix!

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Semana passada estreou no Netflix o esperado documentário Contaminação: a verdade sobre o que comemos.

Baseado no livro Poisoned: The True Story of the Deadly E. Coli Outbreak that Changed the Way Americans Eat, (de Jeff Benedict), a obra examina a indústria alimentícia dos EUA e falhas sistêmicas que levam a surtos de DTAs frequentes e a consequências mortais.

Alguns casos famosos são abordados de forma clara, apresentando o chocante resultado sobre a vida de consumidores:

  • Escherichia coli O157:H7 em hambúrguer mal passado da rede Jack In Box (já escrevemos sobre isso neste post)
  • Salmonella na manteiga de amendoim da Peanut Corporation of America
  • Escherichia coli em espinafre e alface romana (já escrevemos sobre este tema neste post)

‘Contaminação’ serve como um apelo à ação para que as autoridades, indústrias e produtores de animais assumam sua responsabilidade em garantir a segurança dos alimentos.

Veja o trailer do documentário aqui.

Ficha técnica

Título: Contaminação: A Verdade Sobre o que Comemos
Título original: Poisoned: The Danger in Our Food
Gênero: Documentário
Duração: 83 min
Direção: Stephanie Soechtig
Lançamento: 2023
País: EUA

Quer conhecer outras obras que tratam do tema? Dê uma olhadinha neste post.

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Aprenda a escolher um bacalhau de verdade

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Para surpresa de alguns, não existe uma espécie de peixe chamada bacalhau, pois damos este nome a alguns peixes pertencente à família Gadidae, que passam por um processo de desidratação por salga e secura.

O que o título deste artigo chama de “qualidade” é que o bacalhau, de fato, seja um tipo de peixe que possa ter esta denominação, sem fraudes, e em segundo lugar, que esteja livre de contaminantes ou deterioração, portanto, seja seguro.

De forma geral, os peixes que processados dão origem ao bacalhau possuem alto teor proteico e baixo valor calórico. Uma porção de bacalhau cru com cerca de 100 g possui em média 140 calorias, 25 g de proteína e gordura total inferior a 4 g, sendo considerado um peixe magro. Também fornece ômega 3 e as vitaminas A, D, E, B2, B6 e B12, além de manganês, magnésio, fósforo, cálcio, potássio e sódio.

O bacalhau pode compor pratos e ser servido nas mais diversas formas, seja em postas, pedaços, desfiado, em bolinhos, em caldos, tortas e em saladas, podendo ser cozido, grelhado, e de preferência, regado com um bom azeite e acompanhado de uma boa taça de vinho.

Sobre vinho e azeite, leia também:

Este artigo trata justamente desta iguaria, tão apreciada na culinária internacional, chamado de stockfish para os anglo-saxônicos, baccalà para os italianos, bacalao para os espanhóis, morue para os franceses, codfish para os ingleses, bakaliáros para os gregos, bakalar para os croatas, kabeljauw para os holandeses, tørfisk ou klippfisk para os escandinavos, saltfiskur para os islandeses, e claro, bacalhau para os povos de língua portuguesa, incluindo nós, brasileiros.

Os portugueses elevaram o preparo do bacalhau ao estado da arte, com diversas receitas desenvolvidas como à Gomes de Sá, com natas, à Brás, à lagareiro, ao Zé do Pipo e muitas outras,  e eles criaram a sua própria definição, “bacalhau não é peixe nem carne, bacalhau é bacalhau“.

Do ponto de vista técnico, o que chamamos de bacalhau é um peixe salgado e seco, elaborado com peixe limpo, eviscerado, com ou sem cabeça e convenientemente tratado pelo sal, contendo não mais do que 40% de umidade.

Por ter sido desidratado, concentra propriedades nutricionais, e devido a este fato, em média, 1 kg de bacalhau pode equivaler a 3 kg de peixe fresco.

Dentro destas características, existem 6 tipos diferentes de peixes salgados e secos no mercado brasileiro:

  1. Gadus morhua, habita o Atlântico Norte, conhecido popularmente como bacalhau do Porto, tem postas altas e claras e se desfaz em lascas tenras quando cozido, sendo perfeito para a culinária;
  2. Gadus macrocephalus, muito parecido com o primo do Atlântico Norte, porém habita o Pacífico Sul. Sua carne é ainda mais branca, porém não se desmancha em lascas tão uniformes;
  3. Gadus ogac, conhecido como bacalhau da Groelândia. Esta espécie não é comumente importada pelo Brasil;
  4. Ophiodon elongatus, conhecido como Ling, possui uma carne clara, tem uma espessura mais estreita e mais rígida e firme;
  5. Pollachius virens, conhecido com o Saithe, tem a carne mais escura ou mais amarelada, com sabor mais forte e desfia facilmente depois de cozido, sendo uma opção recomendada para bolinhos e recheio de tortas;
  6. Brosmius brosme, chamado de Zarbo, é um peixe pequeno e claro, com postas pequenas e com menos intensidade de sabor, de carne mais fibrosa, também uma opção para bolinhos e recheio de tortas.

Os três primeiros peixes são produtos de maior valor agregado devido a sua aparência e sabor, reconhecidos como verdadeiros bacalhaus, e os três últimos são espécies que possuem menor valor comercial e não podem ser chamados de bacalhau, mas de “peixe tipo bacalhau”. Por isso, é comum serem alvos de fraude econômica nos pontos de venda quando se tenta vender uns pelos outros.

Mas isso não significa que Ling, Saithe ou Zarbo não sejam bons peixes para o consumo, pois nutricionalmente são, podendo ser apropriados a muitas receitas como bolinhos, recheio de tortas e caldos, mas não são boas opções culinárias quando se requer postas que soltem lascas firmes, que são, geralmente, as características mais apreciadas nos verdadeiros bacalhaus.

CLASSIFICAÇÕES DE QUALIDADE E FORMAS DE COMERCIALIZAÇÃO

Os bacalhaus podem ainda ser classificados em 3 categorias comerciais quanto a sua qualidade percebida:

  1. Imperial, que é a melhor classificação e significa que o peixe está bem cortado, escovado e curado. O Porto Imperial é exemplo do melhor dos melhores bacalhaus;
  2. Universal, uma classificação que identifica o bacalhau que apresenta pequenos defeitos, muitas vezes decorrentes da captura ou pesca, em função das redes e anzóis, mas que não chegam a comprometer sua qualidade, visto que o sabor é o mesmo do Imperial;
  3. Popular, que apresenta manchas e falta de pequenos pedaços extirpados pelo arpão, redes ou anzóis, mas obviamente, assim como os outros, isento de problemas de food safety.

Este tipo de pescado pode chegar aos mercados consumidores em quatro condições que requerem diferentes técnicas de processamento:

  1. Fresco, distribuído especialmente para a Europa, primeiramente para a Noruega, Dinamarca, Suécia e Holanda, países que estão próximos das áreas de produção. O mais apreciado é o chamado Skrei, Gadus Morhua já adulto, pescado em Lofoten após migrarem do Ártico para o Mar da Noruega para procriarem;
  2. Seco sem salga, considerado o produto mais nobre, produzido no arquipélago de Lofoten, seguindo a tradição herdada dos vikings: seco ao vento frio do Ártico por três meses,  não tem seu corpo aberto e nem recebe sal, tal como o conhecemos no Brasil;
  3. Salgado sem cura, também chamado de bacalhau verde. Neste caso, no máximo 2 h depois de pescado, o peixe deve ser descarregado nas fábricas situadas nos cais dos portos para degola e limpeza das tripas, para só então, já sem cabeça e vísceras, ser lavado e espalmado, tendo retirado dois terços da espinha central, depois empilhado em grandes fardos com sal em camadas onde permanece ao menos por 8 dias, ao fim dos quais fica com aproximadamente 16% de sal e entre 51 – 58% de umidade. Nesta condição é exportado, sobretudo para Portugal, onde é submetido ao processo final de secagem;
  4. Salgado e seco, como conhecemos mais popularmente no Brasil. A salga é uma das mais antigas técnicas de conservação de alimentos, cujo método se baseia na utilização do cloreto de sódio (NaCl) que possui uma dupla ação: desidratar por diferença de pressão osmótica entre o meio externo e interno, e penetrar na carne, baixando a atividade da água.

UM POUQUINHO DE HISTÓRIA

A história do bacalhau é milenar, os registros mais antigos falam de sua manufatura na Escandinávia ainda no Século IX, especialmente onde atualmente fica a Islândia e a Noruega,  pelos povos que conhecemos como vikings, considerados os pioneiros na pesca do Gadus morhua, espécie farta nos mares por onde navegavam.

O clima seco e frio favorecia seu processamento, por isso apenas secavam o peixe ao ar livre, até que perdesse quase a quinta parte de seu peso e endurecesse como uma tábua, para ser conservado e depois consumido aos pedaços nos longos e rigorosos invernos da região e nas viagens que faziam pelos oceanos.

A cidade de Kristiansund, na Noruega, tornou-se um lugar importante de compra de bacalhau, lá chamado de klippfisk, peixe precipício, pois era seco nos penhascos de pedra dos fiordes.

Os bascos, povo que habitava as duas vertentes dos Pirineus Ocidentais, utilizavam outra técnica para a conservação, a salga, realizando o comércio deste peixe curado, salgado e seco, o que também apurava o sabor.

Foi, portanto, na costa norte da atual Espanha e fronteira com a França, que o bacalhau começou a ser salgado e depois seco nas rochas, ao ar livre, para que fosse melhor conservado e facilitasse seu transporte e comércio.

Devemos aos bascos,  como se vê, o comércio do bacalhau, fazendo com que o produto ganhasse notoriedade e se difundisse por novas fronteiras, em especial na Península Ibérica, chegando aos reinos que compunham a Espanha, Galícia e Portugal.

Justamente por estar seco e salgado, o que aumenta a shelf life, o bacalhau foi uma revolução na alimentação, afinal, na época os alimentos perecíveis como os peixes estragavam facilmente pela precária conservação e tinham sua comercialização limitada, lembrando que a geladeira só surgiu no século XX.

Assim, o bacalhau se tornou um protagonista essencial para as grandes navegações. Por volta do século XV, os portugueses “descobriram” este produto, que se tornou a solução para oferecer às tripulações das naus e caravelas uma alimentação mais saudável durante as longas viagens marítimas.

O bacalhau durante as navegações tornou-se tão presente que passou até a ser chamado pelos portugueses de “fiel amigo”.

A cidade do Porto foi a primeira a receber e preparar o bacalhau que os pescadores buscavam nas águas geladas da Terra Nova, Islândia e Groenlândia, por isso, ainda hoje, a cidade de Porto é a capital culinária do bacalhau.

Rapidamente, o consumo do bacalhau se espalhou também entre a população de Portugal, tornando o país um dos maiores consumidores do tradicional pescado, por isso, o país também foi o primeiro importador do bacalhau da Noruega.

Os portugueses comem cerca de 70.000 toneladas de bacalhau por ano, num país com 10 milhões de habitantes, o que resulta, em termos médios, que cada português come 7 kg de bacalhau por ano.

Em Portugal, diz-se, há mais de 365 maneiras de cozinhar bacalhau, uma para cada dia do ano.

Os portugueses levaram o hábito culinário de comer bacalhau para suas colônias em diversos continentes, assim ele chegou  ao Cabo Verde e Angola na África, Macau na Ásia, e claro, aqui no Brasil na América do Sul, onde é muito requisitado, mas sua demanda cresce especialmente na quaresma, um período entre a Quarta-Feira de Cinzas e o Domingo da Páscoa, devido a uma tradição na qual os católicos renunciam ao consumo de carne vermelha em respeito à crucificação de Jesus Cristo.

Convenhamos que deixar de comer carne vermelha para apreciar um bom bacalhauzinho não é assim um sacrifício, não é mesmo?

Provavelmente, por tradição cultural, no Brasil o nome “Porto” passou a identificar o bacalhau de melhor qualidade, ou seja, aquele proveniente da cidade do Porto que era comercializado nos portos das capitais do Rio de Janeiro e Salvador.

Atualmente, só em Portugal, o bacalhau movimenta 420 milhões de euros por ano (mais de um bilhão e 900 milhões de reais), mas a indústria portuguesa também alimenta o mercado internacional. Para se ter uma ideia, cerca de 25% de toda a produção portuguesa de bacalhau é exportada, e destes, mais de um terço são para o Brasil.

O bacalhau corresponde a cerca de 10% da indústria de pescados do mundo.

Atualmente, para garantir uma pesca sustentável, na qual se pesque a cada ano mantendo matrizes para que se reproduzam para o próximo período de pesca, vários países assinam tratados internacionais de controle da pesca, com o objetivo de assegurar a reprodução e a preservação do “Príncipe dos Mares”.

CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS BACALHAUS

Como se viu até aqui, nem todo peixe seco e salgado é um bacalhau de fato, pois para ser considerado bacalhau, o peixe deve pertencer a uma dessas três espécies: Gadus morhua (bacalhau do Porto ou Cod),  Gadus macrocephalus (bacalhau do Pacífico) ou Gadus ogac (Babalhau da Groelândia).

As fraudes mais comuns ocorrem quando outros peixes são rotulados e/ ou vendidos como bacalhau sem de fato serem, o que pode ocorrer especialmente com  o Ophiodon elongatus (Ling), Pollachius virens (Saithe) e Brosmius brosme (Zarbo).

Mas como saber qual espécie o consumidor está adquirindo? A tabela a seguir pode ajudar a identificar as principais diferenças entre cada uma destas espécies:

Peixe Gadus morhua Gadus macrocephalus Gadus ogac Ophiodon elongatus Pollachius virens Brosmius brosme
Nome popular Bacalhau do Porto Bacalhau do Pacífico Sul Bacalhau da Groelândia Ling Saithe Zarbo
Características do produto salgado Largo e com postas altas, coloração palha uniforme, pele se solta com facilidade. Largo e com postas altas, coloração bem clara, pele se solta com facilidade. Largo e com postas altas, coloração clara, pele se solta com facilidade. Produto claro, estreito e alongado. Produto de coloração mais escura, tom amarelado e até acinzentado e um pouco fibroso. Pequeno e alongado, considerado o menos característico a bacalhau.
Sabor Muito saboroso. Muito saboroso. Muito saboroso. Sabor suave. Sabor mais forte. Menos sabor.
Características após cozido Quando cozido se desfaz em lascas bem-feitas. Se desfaz em lascas, mas não tão bem quando o Gadus mohua. Se desfaz em lascas, mas não tão bem quando o Gadus mohua. Permite um bom corte, produto firme, porém, lascas pequenas. Quando cozido, desfia e é mais fibroso, forma lascas que se desmancham. Quando cozido, desfia ou forma lascas mais duras e fibrosas.

De fato, se você não é um especialista, será difícil identificar visualmente, porém, a Instrução Normativa Nº 1 de 15 de Janeiro de 2019, determina que os fabricantes informem na rotulagem os nomes científicos das espécies das famílias dos peixes utilizados para produtos salgados.

É importante comprar um bacalhau devidamente embalado e rotulado, com sua respectiva rastreabilidade, pois assim se poderá efetivamente saber que peixe está comprando.

CUIDADOS QUANTO À SEGURANÇA DOS ALIMENTOS

Quanto a questões associadas a food safety, independentemente se o peixe comprado é um bacalhau ou um peixe tipo bacalhau, esteja atento a estas características:

  1. Ausência de coágulos e manchas de sangue ou de fígado afetado;
  2. Ossos claviculares expostos, com rasgo do músculo;
  3. Excesso de sal aderente ao peixe;
  4. Deficiência de salga;
  5. Muco na face dorsal, em consequência de o peixe não ter sido devidamente lavado antes da secagem;
  6. Pegajoso na face dorsal, com desorganização da textura, resultante do excesso de calor;
  7. Manchas avermelhadas, devido à alteração provocada pela existência de bactérias halofílicas;
  8. Bolor de qualquer cor;
  9. Manchas amarelo-alaranjadas, devido à alteração provocada pela existência de colônias de fungos halofílicos;
  10. Coloração anormal, devido à existência de manchas de cor não característica ou coloração, em todo o peixe, que não seja própria do processo tecnológico de fabricação;
  11. Odor nitidamente desagradável, indicativo de decomposição ou não característico da espécie ou do tipo de tratamento a que o peixe foi submetido;
  12. Aspecto cozido, em decorrência da alteração na textura do peixe resultante da decomposição do tecido adiposo, devido à ação enzimática, resultante da armazenagem deficiente em temperatura e/ ou arejamento.

Cuidado ao servir crianças e idosos, pois mesmo que tenham declarado no rótulo a ausência de espinhas, o bacalhau pode apresentar eventuais espinhas, pois a regra fala da ausência de mais de uma espinha por kg de produto com dimensão maior ou igual a 10 mm em comprimento ou maior ou igual a 1 mm em diâmetro.

Outro ponto importante é o cuidado também com o armazenamento, pois o peixe salgado seco deve ser armazenado e transportado sob temperatura máxima de 7° C, justamente para manter sua qualidade e evitar eventuais crescimentos microbiológicos.

POR FIM…

A conclusão é que vender como bacalhau aquilo que decididamente não é bacalhau configura fraude, um crime contra as relações de consumo, pois o consumidor é levado a acreditar que está adquirindo um peixe de maior valor comercial e está levando outro inferior.

Analogamente e obviamente, um bolinho feito com peixe tipo bacalhau não é um bolinho de bacalhau, mas de peixe tipo bacalhau.

Por isso, para não cair na fraude, é importante que o consumidor leia as embalagens, conheça as principais espécies de peixes sagados e secos comercializados no Brasil e entenda as diferenças entre eles para que não seja enganado e leve par casa gato por lebre, ou melhor, não leve “tipo bacalhau” por bacalhau”.

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Dicas para prevenir a compra de azeite de oliva fraudado

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O azeite de oliva é obtido pela prensagem das azeitonas, os frutos da oliveira, Olea europaea. As olivas contém até 25% de óleo, sem colesterol, como todo óleo vegetal, rico em ácidos graxos insaturados que são benéficos para incrementar os níveis de HDL (Lipoproteínas de alta densidade), o chamado “bom colesterol”. Também  são uma boa fonte de ácidos graxos essenciais que nosso organismo não sintetiza, contêm antioxidantes naturais como tocoferóis (vitamina E) e polifenóis que se mostram efetivos contras os processos biológicos oxidativos, e claro, possuem substâncias aromáticas que tornam o azeite de oliva sensorialmente especial e único.

O azeite representa em torno de 3% do consumo humano de óleos vegetais e seu valor econômico representa cerca de 15% do comércio mundial de oleaginosas, o que indica ser um produto de alto valor agregado.

O azeite de oliva é muito apreciado na gastronomia internacional, possuindo, dependendo de seu terroir, atributos sensoriais que conferem e combinam notas de tom frutado, amargo e/ ou picante, sendo indispensável em pratos mediterrâneos, indo muito bem com frutos do mar, bacalhau e molhos acompanhando massas.

É possível encontrar azeites de oliva com uma gama de cores que vai do amarelo claro ao dourado profundo e ao verde. Quanto mais clorofila estiver presente no óleo, mais verde será o produto e estes tendem a ter mais antioxidantes e um sabor apimentado mais intenso, com um leve toque de amargor.

O consumo atual per capita de azeite de oliva pelos brasileiros ainda é muito baixo, inferior a 0,5 litro por ano, o que demonstra seu potencial de crescimento no mercado nacional, considerando especialmente o grande interesse pelo produto extravirgem. Já os países que mais o consomem são a Grécia com 22 litros per capita por ano e a Itália com 12 litros.

As oliveiras precisam de sol, terreno inclinado e pedregoso, além de 200 horas de temperatura abaixo de 10°C por ano. O custo para implantação dos pomares gira entre R$ 20 mil e R$ 25 mil por hectare, considerando que os principais gastos são com as mudas e a correção do solo.

Uma oliveira começa a produzir apenas depois de três anos e meio e pode viver por milênios, porém, sua produtividade máxima é atingida a partir dos 8 até os 50 anos de idade, e em média, produz cerca de 10 a 40 quilos de azeitonas por ano, o que após processo equivale a cerca de 2 a 8 litros de azeite.

Os investimentos necessários e a baixa produtividade fazem com que os custos de produção do azeite de oliva em média sejam maiores do que o de outros óleos vegetais, como por exemplo, derivados de soja, canola, girassol ou milho. Por isso, logicamente, o azeite de oliva é um produto mais caro que os demais.

UM POUQUINHO DE HISTÓRIA

Acredita-se que o cultivo de oliveiras é um dos mais antigos da história, tendo início ainda no final do período Neolítico entre 5000 – 3500 a.C., mas a primeira evidência histórica com menção ao azeite de oliva está no Código de Hamurabi, o conjunto de leis regidas na Mesopotâmia, datado de 2.500 a.C., área localizada entre os rios Eufrates e Tigre, onde hoje fica o Iraque. Depois, via trocas comerciais, o produto foi levado para as países do Mediterrâneo que passaram a produzi-lo e se tornaram uma referência.

A cidade grega de Atenas deve o seu nome à deusa que a protegia, mas também das oliveiras. Segundo os registros, os atenienses a escolheram após uma espécie de competição entre os deuses para conquistar sua simpatia, na qual Atenas ofereceu-lhes uma oliveira que poderia gerar lenha, fogo para iluminar e alimento, então, depois deste presente magnífico, os cidadãos a elegeram para representá-los.

Também foi em Atenas que surgiu a tradição de presentear atletas vencedores com coroas de oliveiras, sendo que os ramos eram recolhidos com facas de ouro e este era o prêmio máximo concedido aos ganhadores, fazendo o papel das atuais medalhas.

O Império Romano, que durou de 27 a.C. até 476 d.C, ocupando mais de 5 milhões de quilômetros quadrados e abarcando 70% da população mundial em sua época, difundiu o consumo do azeite e da azeitona.

A Bíblia traz mais de 300 referências sobre azeite e oliveiras, como o ramo carregado pela pomba até Noé para demonstrar que havia terra seca para o desembarque de sua família e dos animais era de uma oliveira, assim como a árvore que cresceu no túmulo de Adão.

Enfim, a cultura das oliveiras faz parte da história humana desde a antiguidade até os dias atuais. Na missão da Apollo 11, que ocorreu em 1969, quando o astronauta Neil Armstrong fez o seu breve passeio pelo solo Lunar, lá deixou um ramo de oliveira, por ser considerado um símbolo mundial de paz.

CULTIVO NO BRASIL

Atualmente, segundo o Conselho Oleícola Internacional (International Olive Council, ou IOC) são produzidos um total de 3,2 milhões de toneladas de azeite de oliva por ano, com a Espanha respondendo por 40% desta produção, seguida pela Itália com 22% e a Grécia com 14%, mas ao todo, cerca de 59 paíse produzem azeite de oliva como pode ser visto neste link.

No Brasil, o azeite de oliva chegou junto com os portugueses, uma vez que faz parte da cultura gastronômica daquele povo. Já as oliveiras foram trazidas ainda durante o século XVI também pelos portugueses e o produto obtido era utilizado inicialmente como combustível para as lamparinas. No entanto, tinha uma qualidade tão boa quanto o português, e por isso, a Coroa Portuguesa proibiu a produção brasileira, além de ordenar a destruição dos olivais, pois prejudicaria as exportações para esta colônia.

Muito provavelmente devido a este fator, mais o desinteresse por investir nesta cultura que tem retorno financeiro entre 7 e 10 anos, criou-se um paradigma que o clima brasileiro não era apropriado para o cultivo da planta, mas hoje já se sabe que isto não é verdade. Este cenário vem mudando gradativamente, pomares de oliveiras vêm sendo plantados no Brasil desde 1950 e a produção começou a engrenar nas últimas décadas.

Apesar de marcas nacionais estarem surgindo, a produção de azeite de oliva no Brasil ainda engatinha, somos um gigante na exportação de gêneros agrícolas, porém, em azeite de oliva dependemos das importações, ocupando a posição de segundo maior importador do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos.

Dados do Conselho Oleícola Internacional mostram que em 2020 o Brasil importou 104 mil toneladas de azeite de oliva e bagaço de oliva, 20% a mais que no ano anterior, o que representa quase a totalidade do consumo nacional, mas o pouco que já produzimos tem alta qualidade e vem ganhando reconhecimento e premiações.

Um azeite produzido no Rio Grande do Sul venceu a categoria de melhor azeite do hemisfério Sul no prêmio EVO IOOC Italy 2022.

O volume produzido no Brasil diretamente a partir das oliveiras, e não da diluição do produto importado, cresceu 773% nos últimos cinco anos no Rio Grande do Sul, o Estado que lidera com 70% da produção nacional, que saiu de 58 mil litros em 2018 para o recorde de 448,5 mil em 2022.

A olivicultura ocupa quase 6 mil hectares de 321 produtores em 108 municípios gaúchos, sendo que 3,4 mil desses hectares já estão produtivos, com oliveiras de idade superior a 4 anos. Além do Rio Grande do Sul, grande parte dos olivais do Brasil estão localizados na Serra da Mantiqueira, na divisa de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo.

Os pomares em todo o Brasil ocupam cerca de 10 mil hectares e, até 2025, o Instituto Brasileiro da Olivicultura (Ibraoliva) espera que a área de cultivo possa dobrar e alcançar 20 mil hectares.

O PROBLEMA COM AS FRAUDES

No entanto, infelizmente, o azeite de oliva está no pódio entre os alimentos mais fraudados no Brasil e no mundo. Isso acontece porque o azeite de oliva reúne características que o tornam muito atrativo aos “malandros”: um cenário de demanda em alta, escassez do produto, alto valor agregado e preços elevados.

Só em 2021, como exemplo, 24 marcas irregulares foram interceptadas em ações do MAPA e da ANVISA em São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará, Goiás, Paraná e Santa Catarina, incluindo produtos sem registros, fraudados, clandestinos e contrabandeados.

Fábrica clandestina que adulterava azeites importados da Espanha interditada por agentes da 82ª DP (Maricá) no Rio de Janeiro, em 2021.

O consumo de azeite de oliva “alterado”, em geral, não representa uma ameaça direta à saúde, sendo uma fraude de viés econômico com o propósito de enganar os consumidores que pagam mais pelos benefícios alimentares do azeite de oliva, mas acabam levando outros óleos vegetais mais baratos e com outra composição de nutrientes e sensoriais.

Apesar dos danos à saúde por este tipo de fraude serem raros, para a gastronomia isto é um grande problema, pois no preparo de receitas, além dos atributos nutricionais, o uso do azeite de oliva é necessário para conferir notas sensoriais próprias a diversos pratos.

Porém, no início dos anos 2000, foram identificados indícios, de casos raros e absurdos, de óleos vegetais adulterados com óleo velho de motor, visando escurecer o produto para “parecer mais” com azeite de oliva. Neste caso, pode carrear contaminantes químicos que colocam em risco a saúde dos consumidores.

Quando há fraude, não há controle, e se não há controle, há espaço para riscos em segurança dos alimentos, pois fraudadores que desejam enganar consumidores não se preocupam com contaminantes ou regras de boas práticas de fabricação.

TIPOS DE AZEITE DE OLIVA

Para entender os motivos por trás das fraudes no azeite de oliva é preciso conhecer os tipos de azeite e como eles são obtidos. Em linhas gerais, são divididos em quatro categorias:

  1. Extravirgem, obtido na primeira prensa das azeitonas bem formadas em temperatura ambiente, sem uso de calor ou processos químicos e sua acidez deve ser inferior a 0,8%;
  2. Virgem, passa por alguns processos adicionais que incluem calor para garantir a retirada total do óleo presente no interior dos frutos, o que eleva um pouco a acidez do produto, ficando entre 0,8 e 2,0%;
  3. Lampante, obtido a partir de azeitonas muito fermentadas ou machucadas, cuja acidez supera os 2%. Seu gosto é forte e desagradável, o que o torna inapto para consumo, sendo mais apropriado como combustível, inclusive, o nome “lampante”, vem do uso no passado para acender lamparinas;
  4. Tipo único, no qual o lampante passa por refinação via processos físico-químicos e depois é misturado com o azeite virgem, tornando-se apto para ser comercializado para fins alimentícios.

A fiscalização do azeite de oliva no Brasil tem como base a Lei nº 9.972/2000, regulamentada pelo Decreto Federal 6.268/2007 e pela Instrução Normativa do MAPA nº 1/2012, que estabelece o regulamento técnico do produto.

Um dos primeiros fatores que ajuda a entender as fraudes tem a ver justamente com essas classificações, pois uma classificação indevida, visando, por exemplo, considerar com o extravirgem o que não é, caracteriza uma fraude.

Apesar de existirem testes laboratoriais para determinar se um azeite é virgem ou extravirgem, os tipos considerados mais “nobres”, a avaliação sensorial realizada por um grupo de analistas treinados para detectar problemas no gosto, no aroma e nos demais aspectos do azeite de oliva ainda é a melhor ferramenta.

A Espanha, Portugal, Itália e a Grécia, por serem grandes e tradicionais produtores já possuem um sistema de avaliação sensorial bem padronizado, enquanto o Brasil ainda dá os primeiros passos nessa área, mas vem avançando rapidamente.

AS FRAUDES MAIS COMUNS

A adulteração mais comuns no azeite de oliva acontece quando o sumo da azeitona é diluído em outros óleos mais baratos, como o de soja, uma vez que o fato deles serem muito parecidos e se misturarem bem ajuda a enganar os consumidores.

Contudo, as fraudes estão se tornando cada vez mais complexas e sofisticadas, com um amento de fraudes associadas a misturas de azeite de oliva de várias classificações, como os virgens e os extravirgens, adulterações com o óleo do bagaço da oliva ou até o uso de azeite lampante em altas proporções ou mesmo puro em alguns produtos.

DICAS PARA EVITAR COMPRAR AZEITE DE OLIVA FRAUDADO

  1. Priorize as marcas cuja extração e o envase do azeite de oliva acontecem no mesmo local, pois geralmente são mais seguros do que aqueles que são envasados por terceiros que compram a granel para reenvasar, onde pode ocorrer manipulação indevida e diluição;
  2. Desconfie sempre de preços muito abaixo da média, pois trata-se de um produto nobre, de baixa produtividade. Lembre-se de que uma oliveira precisa de um ano inteiro para produzir de 2 a 8 litros de azeite, portanto, pela lógica, não tem como ser muito barato;
  3. Confira a lista de produtos já aprendidos em ações do MAPA ou ANVISA, na qual constam produtos que foram associados a fraudes ou contrabando;
  4. Fique atento à embalagem que deve preferencialmente ter vidro escuro para melhor proteção dos produtos de boa qualidade;
  5. Sempre leia o rótulo. Informações como “óleo composto” ou “tempero misto” são expressões que indicam que o produto não se trata de um verdadeiro azeite de oliva e foi misturado propositalmente a outros óleos vegetais, como o de soja ou de girassol. No entanto, neste caso não há fraude, o produtor está informando no rótulo.

Termino este texto indicando que experimentem os produtos nacionais, pois os esforços com a qualidade para se firmar no mercado têm sido intensos, fato que já vem dando literalmente bons frutos, azeites de oliva excepcionais e de alta qualidade.

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Molho pesto artesanal causou tetraplegia por botulismo em Brasília

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Tomate, amêndoas, alho, manjericão, azeite e sal. Tudo isso num frasco de vidro fechado a vácuo, ou seja, numa condição favorável para crescimento de microrganismos que dispensam o oxigênio para se multiplicarem, como o Clostridium botulinum. Este molho pesto artesanal causou tetraplegia flácida, num drama contado em detalhes no post Sobrevivente de botulismo conta sua história de superação e sequelas, sobre Doralice Goes, de 46 anos.

A embalagem estava lacrada e foi aberta no momento do consumo. Foram consumidas apenas 3 colheres de sopa desse molho, acompanhadas de torradas e vinho, num domingo à noite. A segunda-feira foi um dia normal. Na terça, ela foi para a ginástica pela manhã e no final, mais ou menos às 11 horas, sentiu fraqueza e taquicardia. Mesmo assim, seguiu para o seu trabalho. No caminho, já sentia as mãos e pés formigando. Por volta das 15h, as colegas de trabalho de Dora perceberam que ela estava falando “com a língua enrolada” a ponto de não ser compreendida e  então foi dirigindo sozinha ao hospital, chegando lá às 17h. Logo ao estacionar, notou que não conseguia mais caminhar normalmente e foi se apoiando nos carros estacionados até a entrada. Trinta minutos depois ocorreu a parada respiratória, paralisia total (tetraplegia) e ela precisou ser intubada. Dali iniciou sua jornada de internação e recuperação que durou todo o resto do ano de 2022.

No segundo dia de internação, um jovem neurologista conseguiu fazer o diagnóstico do botulismo, doença rara e com sintomas que causam fácil confusão. A midríase (pupila completamente dilatada), consciência plena e paralisia flácida fechavam o quadro.

O parecer médico fez o hospital acionar a Vigilância Sanitária do Centro Oeste e esta disponibilizou o soro antibotulínico para administração imediata. Houve uma diligência à casa da vítima para perícia da “cena do crime”, a geladeira. As amostras recolhidas foram o molho pesto ingerido, mel, salmão defumado artesanal e um atum que seria de um dos gatos de Dora.

Foram longos 60 dias de espera para ter o resultado divulgado pelo Laboratório Adolfo Lutz, em São Paulo. As análises (veja na imagem abaixo) confirmaram que a única amostra implicada foi de fato o molho pesto. A toxina botulínica identificada foi a de tipo A.

As toxinas do C. botulinum agem nas membranas pré-sinápticas das junções neuromusculares, bloqueando a liberação da acetilcolina e a transmissão do impulso para a contração muscular.

Laudo do Instituto Adolfo Lutz, único laboratório no Brasil que realiza o bioensaio para toxina botulínica  em camundongos

A origem do produto

Apreciadora de alimentos artesanais, Dora sempre frequentou a Feira da Praça 13, em Brasília, cujo slogan é “compre de quem faz”.  Especializada em produtos artesanais e orgânicos, oferece uma diversidade de produtos in natura e processados, de origem animal e vegetal.

O frasco de vidro não tinha data de validade ou informações de rastreabilidade, fato que não era percebido pela consumidora, que já era compradora assídua. A única informação na rotulagem sobre cuidados de segurança de alimentos era “Após aberto, consumir em até 3 dias”. Depois ela descobriu que tinha sido produzido perto do Natal, ou seja, tinha pouco menos de um mês de vida, à temperatura ambiente.

O local de fabricação do produto foi inspecionado após a confirmação do teste positivo: era a cozinha da residência do fornecedor. Parte dos frascos era de reaproveitamento. Maiores detalhes não puderam ser compartilhados pela vítima que colaborou com este post, uma vez que há ações da Vigilância do Centro-Oeste que ocorrem em sigilo.

Dora sabe por terceiros que o fabricante ficou muito abalado com a notícia e providenciou assistência psicológica a ela por quatro sessões enquanto hospitalizada. Desde dezembro, ele tirou a página do ar e disse ter parado de produzir alimentos e encerrado a empresa. O advogado da vítima descobriu que foi aberta uma outra empresa com novo CNPJ em outro segmento.

Em relação à feira, fiz contato com um dos curadores, que preferiu não se identificar. O retorno foi que os produtores são independentes, não são ligados aos organizadores, sendo cada um responsável pelo que manipula. A feira possui Alvará e é fiscalizada. Segundo informação do contato, “alguns produtores têm Alvará Sanitário e algumas categorias que são liberadas por lei não têm” (sic).

Depois do incidente, a Vigilância Sanitária local promoveu treinamento com os produtores. Uma cartilha de BPF foi também distribuída e a organização disse estar à disposição para outras iniciativas preventivas. Dora também ganhou um exemplar da cartilha.

Era um risco previsível

A combinação de matéria-prima vegetal, que pode conter esporos de C. botulinum, embalagem com baixo teor de oxigênio, tratamento térmico suave e não controle da acidificação é uma equação potencialmente fatal bastante conhecida na engenharia de alimentos. A previsibilidade do risco de botulismo nestas condições é o motivo da existência de leis e práticas preventivas de controle de processo deste tipo de alimento no Brasil e no mundo.

Não se trata de forma particular de “culpar” uma ou outra matéria-prima ou método de fabricação. Há muitas décadas esses riscos são conhecidos e há tecnologias muito eficazes para seu controle – desde que os fabricantes tenham ciência e recursos para agir. O “segredo” é fazer um tratamento térmico e uma acidificação controlados para impedir a sobrevivência de células e a germinação de esporos e, consequente, a produção de toxinas. Os recursos para executar este controle podem ser incompatíveis com a realidade de uma produção artesanal, que em muitos casos, na verdade, são caseiras (entenda-se: feitas numa cozinha residencial, e do ponto de vista legal, informais).

Em 2014. nos EUA, houve um surto relatado pelo CDC envolvendo duas jovens que consumiram molho pesto da mesma lata. Ou seja, também um alimento envasado em anaerobiose,  comparável ao vidro do molho de Brasília, que causou tetraplegia. Um escritório de advocacia americano que acompanhou o caso levantou pontos importantes para ajudar a analisar o caso do Brasil:

– Os produtos eram manipulados na cozinha da casa dos proprietários, sendo vendidos no “stand” da fazenda e em locais não registrados

– Os produtos eram de baixa acidez

– Ingredientes: dentes de alho crus e sal moídos eram usados no processador de alimentos. Folhas frescas de manjericão e azeite eram  adicionados e depois misturados com pinoli e queijo parmesão.

– Os ingredientes eram processados em pequenos lotes e adicionados a uma panela grande devido ao tamanho limitado do processador de alimentos. O começo do lote poderia ficar parado por até uma hora em temperatura ambiente antes de ser colocado nos frascos.

– Novos frascos eram limpos colocando-os em uma máquina de lavar louça doméstica no ciclo quente com detergente e alvejante. Os frascos eram então enchidos com água e colocados no micro-ondas até à fervura. As tampas eram mantidas em água quente até o uso.

-Os ingredientes foram misturados sem aquecimento para formar um molho e depois colocados em potes quentes. As tampas foram aplicadas e os frascos foram colocados em uma unidade de enlatamento em banho-maria.

– A água na unidade de enlatamento foi fervida e o produto foi aquecido. Não foi utilizado termômetro. Os frascos foram deixados para esfriar, a vedação ao redor da tampa foi verificada e o produto foi rotulado para distribuição.

-O rótulo não incluía uma declaração completa de ingredientes, código de lote, data de validade nem uma declaração “Perecível, manter refrigerado”.

– O pH era de 5,3 e a atividade de água foi de 0,965.

– O produto testou positivo para toxina botulínica tipo B

– Outros produtos do mesmo lote foram testados e deram negativo

– O relatório concluiu que o produto foi produzido em “condições inseguras em cozinha residencial”.

Por que os surtos por C. botulinum são tão pontuais, a ponto de num mesmo lote não haver outras embalagens positivas ou outras vítimas?

Segundo o engenheiro de alimentos Marcio Scucuglia, especialista em processos térmicos, “existe uma combinação de fatores necessários para disparar um surto, com destaque à própria quantidade do microrganismo (dependente da qualidade de matéria-prima e do seu manuseio), processo envolvido (manuseio, tempo entre processamento, processo térmico) e as condições do produto entre o preparo e o consumo (tempo e temperatura, anaerobiose)”.

Ele também pondera que como nem sempre é possível controlar as condições de manutenção e uso do alimento pelo consumidor após sair da fábrica. A tecnologia de conservas baseia-se na identificação e mitigação dos riscos, assegurando o desenho e controle dos processos térmicos inerentes à esterilidade comercial suportado pela garantia da qualidade (matéria-prima, limpeza e desinfecção, Procedimentos Operacionais Padronizados, treinamento).

Controles e legislação

Alimentos não refrigerados que são embalados em frascos hermeticamente fechados com pH maior que 4,6 e atividade de água acima de 0,85 correm o risco de favorecer a formação da toxina C. botulinum e devem ser fabricados de acordo com legislações específicas.

No estado de São Paulo há a Portaria 130/2020, que estabelece os requisitos essenciais de Boas Práticas de Fabricação (BPF) para alimentos de origem vegetal fabricados sob a forma artesanal, no âmbito do Estado de São Paulo.

Entre vários requisitos, é obrigatório implementar Procedimentos Operacionais Padronizados para higienização dos vegetais, tratamento térmico, acidificação (com medição de pH), manutenção preventiva.

A grande reflexão é se o fabricante do molho tinha conhecimentos e recursos (termômetro, pHmetro) e seguia os procedimentos acima. Ainda mais considerando que a legislação não é aplicável ao Distrito Federal e, portanto, seria só uma “inspiração” para as práticas adequadas.

Em nível nacional, contamos com a RDC Nº 726/22, que dispõe sobre os requisitos sanitários dos cogumelos comestíveis, dos produtos de frutas e dos produtos de vegetais.  Ela determina que o palmito em conserva e os produtos de vegetais não esterilizados com líquido de cobertura acidificado devem atender ao limite máximo de pH de 4,5.

Assim, para a prevenção de casos trágicos como o da sobrevivente Doralice, pessoalmente acredito que algumas perguntas a serem feitas por quem se aventura a se tornar um novo fabricante de produtos caseiros/artesanais de alto risco como conservas vegetais e temperos são:  estou disposto a estudar leis e normas e me tornar capaz de atender os requisitos técnicos de segurança dos alimentos? Terei recursos para aplicar as melhores práticas de manipulação? Farei estudos de prazo de validade? Caso conclua que seguir as legislações seja “muito pesado para um pequeno produtor, e ainda uma burocracia”, o empreendedor deve repensar se não seria melhor a migração do negócio para outro segmento que não impacte a saúde e as vidas humanas.

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Sobrevivente de botulismo conta sua história de superação e sequelas

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Dois dedos do pé direito. Durante três meses estas foram as únicas partes do corpo da sobrevivente de botulismo,  Doralice Goes,  que se movimentavam sutilmente e com muito esforço, e permitiam a comunicação dela por “alfabeto” entre os médicos e sua irmã, precisando de horas para formar uma frase.

A conquista seguinte, após 3 meses, foi abrir os olhos. Sobrevivente que superou muitas adversidades, ela contraiu botulismo em 23 de janeiro de 2022 e passou 10 meses em uma UTI.

Mesmo sem poder movimentar um músculo, ela podia ouvir tudo que acontecia ao seu redor, e tinha as sensações táteis todas preservadas no leito, como dores, frio, coceira, dormências… sem poder falar ou reagir. Sentia o toque das pessoas. Também passou pelo desespero de ouvir médicos e especialistas ao seu redor não saberem o que ela tinha e até julgando que estava inconsciente.

Por nove meses ela respirou por traqueostomia e enfrentou as muitas complicações de um corpo imóvel. Até evacuar era um desafio, requerendo injeções dolorosas de neostigmina nas pernas por seis dias seguidos para estímulo dos movimentos peristálticos.

Ela teve infecção hospitalar por bactéria resistente, KPC, Klebsiella Pneumoniae Carbapenemas, ficando completamente isolada. O quarto passou a ser identificado com uma faixa vermelha no piso e então se tornou uma “barreira sanitária”, pois todos da equipe médica e os visitantes tinham que se paramentar e desparamentar para estar em contato com a paciente. Durante os dois primeiros meses ela passou por  nove plasmaferese (pois este é o tratamento para Síndrome de Guillian Barré) e quatro transfusões de sangue. A conduta médica só mudou quando saiu o laudo confirmando a presença de toxina botulínica.

Aos sete meses de internação, houve uma tentativa de liberá-la dos respiradores, o que foi uma decisão precoce, pois teve três dias de vômitos, alucinações e insônia por acidose ácida e foi intubada novamente.

As dores das cãibras, que eram resposta à retomada de movimentos, não passavam com o uso de morfina. A sonda GTT que a alimentava chegou a vazar internamente, causando uma infecção que parou seus rins.  Foram dois meses e meio de hemodiálise.

Ainda adquiriu Covid-19 e realizou drenagem nos pulmões.

Hoje, aos 46 anos, ela tem catarata e precisa operá-la, cirurgia não coberta pelo seu plano de saúde. Não se sabe se esta foi causada pelo longo período de uso de corticóides ou por conta do botulismo.

Em um segundo hospital, com sessões de fisioterapia diárias ela foi recobrando os movimentos, a começar pelo pescoço. Durante a UTI a paralisia foi classificada como aguda de quatro membros. Atualmente tem os membros inferiores afetados por uma lesão axonal crônica, que a leva a uma condição de PNE para voltar a dirigir.

Para se colocar em pé novamente foram necessários nove meses como ilustra a imagem deste post, acima.

Doralice em sessão de hemodiálise

Perdas além da saúde física

No último eletroneuromiograma foi evidenciado que ela ainda possui neuropatia axonal crônica. Isso significa que perdeu neurônios e teve que fazer novas conexões. Na prática ela está “conquistando” a tetraparesia, ou seja, apesar da fraqueza, dores e formigamentos por todo o corpo, retoma, com esforço, a capacidade dos movimentos.

Afastada de seu trabalho como servidora pública e técnica do TJDFT, a vida de Dora é se reabilitar, e realizar palestras motivacionais e de conscientização sobre botulismo. Sua rotina intensa inclui fisioterapia motora e pulmonar, clínica da dor com fisiatra (que inclui agulhamento seco, máquinas de choque, analgesia, laser, dentre outros), atendimentos para liberação miofascial, canoagem e natação adaptada, além de Pilates.  Tem acompanhamento psicológico semanal. Por conta de seu quadro, diariamente toma uma lista de medicamentos. Visualizando o longo prazo, a advogada optou por não requerer aposentadoria por invalidez e usufruir do direito de afastamento.

Doralice deve mais de R$ 400.000,00 ao plano de saúde, por coparticipação. Também um boleto que ficou em aberto no período de internação, da ordem de dois mil reais iniciais, “cresceu” e está em mais de R$ 38 mil, sem negociação com o banco. Há dias em que não tem recursos para pegar o Uber ou renovar o plano de uma das suas atividades de reabilitação. As dívidas só crescem, pois boa parte das atividades são particulares.

O site de vendas online que possuía não está mais ativo.

O processo judicial para reparações perante o fabricante, como sabemos, é lento e custoso. Então ela abriu uma vaquinha virtual para recuperar estas e outras despesas.

https://www.vakinha.com.br/vaquinha/prejuizos-do-botulismo-alimentar

Tratar do tema do desgaste emocional é uma tarefa bastante limitada aqui nesta publicação, devido à sua abrangência e complexidade.

Diagnóstico difícil

Entre o horário de consumo do alimento contaminado e os primeiros sintomas foram aproximadamente 36 horas. Começou com cansaço extremo após um treino da academia.  Foi trabalhar sentindo as mãos e pés formigando. No meio da tarde as colegas de trabalho de Dora perceberam que a servidora estava falando “com a língua enrolada” a ponto de não ser compreendida e ela então foi dirigindo, sozinha, ao hospital. Ao chegar lá, notou que não conseguia mais caminhar normalmente e foi se escorando nos carros do estacionamento até a porta. O caso foi tratado como AVC e ela prontamente encaminhada para uma tomografia. Durante o exame, teve crise de vômito e parada respiratória, sendo intubada e iniciando a paralisia total.

Confusos, os médicos começaram a trabalhar hipóteses como AVC de tronco, ou uma expressão grave da Síndrome de Guillian Barré, associada com dengue e chicungunha. Também cogitaram reação vacinal. Por ser uma doença rara e ter sintomas comuns a outras enfermidades, os médicos se atêm em um primeiro momento a doenças mais prevalentes, o que dificulta o diagnóstico e ação rápida.

Foi só no segundo dia de internação, que um jovem neurologista, ao avaliar suas pupilas dilatadas e ao perceber que estava consciente, fechou o diagnóstico de botulismo. Como Dora mora na Capital Federal, o soro, que é armazenado no Centro de Vigilância Epidemiológica, chegou a tempo de impedir a parada cardíaca.

Ela conhece mais sobreviventes, que também relatam que ao chegar ao hospital não tiveram o diagnóstico inicial correto. Em um caso, um jovem foi diagnosticado com sinusite e solicitado que retornasse para casa, parando de respirar ainda no caminho, mas houve tempo de ser socorrido. Em outro, os sintomas foram associados ao consumo de drogas.

Nesta imagem está a caixinha cinza com o soro antibotulínico que salvou a vida de Dora

Quer saber mais detalhes sobre o caso? A série continua aqui: Molho pesto artesanal causou tetraplegia por botulismo em Brasília 

Aqui abordamos a contaminação, o processo investigativo e o alimento implicado.

Para contratar a Doralice para ministrar palestras em empresas, escreva para palestrabotulismo@gmail.com

Todas as imagens deste post foram enviadas e autorizadas por Doralice Goes.

5 min leituraDois dedos do pé direito. Durante três meses estas foram as únicas partes do corpo da sobrevivente de botulismo,  Doralice Goes,  que se movimentavam sutilmente e com muito esforço, e […]

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