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Intoxicação por peixes e frutos do mar contaminados por Vibrio vulnificus

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Seguindo relato anterior sobre casos de intoxicação alimentar causada pelo consumo de atum contaminado com altos níveis de histamina, temos mais um texto sobre intoxicação alimentar após consumo de peixe contaminado.

No mês de setembro noticiou-se que uma mulher americana que consumiu peixe malcozido foi submetida a amputação de seus braços e pernas e lutou pela vida permanecendo em coma durante alguns dias. Após estudo do caso detectou-se que a tilápia que ela mesma preparou em casa estava contaminada pela bactéria Vibrio vulnificus.

Vibrio vulnificus é uma bactéria gram negativa, associada ao Vibrio cholerae (cólera) e sua infecção pode causar gastroenterite e septicemia. Está presente em águas oceânicas, associada a várias espécies marinhas, como o plâncton, crustáceos e peixes ósseos, havendo relatos de caso após consumo de ostras, moluscos e camarões. Essa bactéria costuma ser encontrada em águas com temperatura superior a 21ºC, já que não resistem a temperaturas baixas e são sensíveis a variações de pH e temperaturas altas, utilizadas durante o cozimento dos alimentos.

Em pessoas saudáveis, a ingestão dessa bactéria pode causar gastroenterite com febre, diarreia, enjoos, cólicas abdominais, náuseas e vômito. Já em crianças, idosos ou pessoas imunocomprometidas, há relatos de casos mais graves incluindo septicemia, e mais de 60% dos pacientes que apresentam septicemia podem evoluir para necrose e lesões graves em membros, chegando a situações em que a amputação de um ou mais membros se faz necessária. E é uma doença que pode evoluir para o óbito nos grupos de pessoas mais susceptíveis.

A infecção acontece ou pela ingestão de alimentos contaminados e que não passaram por tratamento térmico apropriado ou por contato com a pele uma vez que o Vibrio penetra e pode causar uma inflamação na pele previamente lesionada evoluindo para celulite, lesões vasculares e necrose.

Assim, pensando em prevenção, devemos nos atentar ao preparo desses alimentos marinhos que devem ser cozidos adequadamente. Aqueles frutos do mar ou peixes que tradicionalmente são consumidos crus não devem ser oferecidos a pessoas do grupo de maior risco – idosos, crianças e imunocomprometidos.

Imagem: Terje Sollie

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Vibrio vulnificus, potencial perigo dos frutos do mar

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O Vibrio vulnificus foi descrito pela primeira vez em 1976.

É um bacilo gram-negativo com mobilidade devido à presença de flagelo polar. Não tem capacidade de esporular, é anaeróbio facultativo e termolábil. Esta última condição é essencial para a prevenção da doença.

O tema que pretendo desenvolver neste artigo está relacionado com a possibilidade de transmissão de uma doença muito perigosa causada pelo Vibrio vulnificus.

Os vibrios causadores de doenças mais conhecidos são o V. cholera e o V. parahemolíticus, sendo que o V. vulnificus tem uma frequência muito menor nas infecções, mas tem uma taxa de mortalidade que pode ultrapassar 50% dos casos. Recentemente, uma publicação na internet relatou um caso gravíssimo onde dois fatores estão envolvidos: o V. vulnificus e o consumo de tilápia.

O caso aconteceu com uma pessoa de 40 anos na Califórnia, Estados Unidos da América. Após vários dias de tratamento médico, a pessoa sofreu a amputação de ambas as pernas e braços, como último recurso para salvar a vida. Segundo a história, foi por consumo de peixe cru ou mal cozido.

Revendo a literatura publicada até o momento, esta bactéria é encontrada no ambiente aquático em áreas tropicais e subtropicais, preferencialmente com baixa salinidade e próximas ao litoral, como estuários, rios e lagos, sejam naturais ou artificiais. Há investigações que envolvem a bactéria que afeta a tilápia em lagoas de cultivo, principalmente naquelas onde não são aplicadas medidas sanitárias adequadas, como nas explorações familiares, que depois vendem seu produto em mercados públicos.

Mas mesmo assim, a maior parte dos casos descritos pelos investigadores provêm de produtos do mar que não são peixes, como ostras e outros bivalves marinhos encontrados em zonas costeiras criados natural ou artificialmente. Temperaturas da água superiores a 18°C  e baixa salinidade são propícias à multiplicação de V. vulnificus.

Humanos infectados
A forma de infecção em humanos pode ser através de feridas na pele quando a pessoa entra em água do mar ou em rios contaminados pela bactéria. Esta forma de infecção é chamada de septicemia primária.

Outra forma de infecção é através do consumo de carne de peixe ou frutos do mar, como os citados acima, contaminados pela bactéria.

Além dos sintomas característicos de uma infecção alimentar, como dores abdominais, febre, vômitos, essa bactéria produz uma toxina que entra na corrente sanguínea e atinge principalmente os membros inferiores e superiores (pernas e braços), devido à sua capacidade invasiva do células da parede vascular e a produção de toxina extracelular (citolisina) que inibe o ferro ligado ou não aos eritrócitos, impedindo a oxigenação do tecido muscular.

Como consequência dessa ação, inicia-se e progride um processo de necrose. Nos casos mais graves, foi detectada a elevada capacidade de resistência de algumas estirpes de V. vulnificus aos antibióticos, que se revelaram totalmente ineficazes no controle da bactéria.

Maneira de prevenção
Conforme mencionado no início do artigo, é uma bactéria que não tem capacidade de formar esporos e também é termolábil, o que significa que cozinhar completamente os alimentos mata as bactérias. A bactéria morre quando cozinhada a uma temperatura igual ou superior a 74°C durante 5 minutos. Portanto, a cozedura completa é a melhor e mais eficaz prevenção. Conhecer a origem do produto é sempre uma forma eficaz de reduzir o risco, mas isso não o cancela. Nunca consuma frutos do mar crus (peixes, mariscos e algas marinhas), pois nem o melhor chef do mundo consegue detectar a presença de V. vulnificus em alimentos crus.

Problemas associados
– Fatores contribuintes como a presença de doenças pré-existentes como diabetes, doenças hepáticas ou renais e pessoas com imunidade reduzida complicam muito a situação do paciente
– Aumento da temperatura dos mares e de outras massas de água como consequência das alterações climáticas
– Contaminação nas áreas de cultivo e coleta de moluscos bivalves
– Falta de informação por parte dos consumidores e minimização do risco de consumo de frutos do mar crus
– Resistência aos antibióticos, um processo em constante aumento

Referências: 

https://www.google.com/search?gs_ssp=eJzj4tTP1TdISjPNyjNg9GIvycxJLMhMBAA-KwZK&q=tilapia&rlz=1C1CHZL_esUY977UY977&oq=&aqs=chrome.1.35i39i362j4

https://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1111/raq.12743

https://www.revista.unam.mx/vol.6/num4/art32/abr_art32.pdf (Patógeno oportunista Vibrio Vulnificus)

https://www.google.com/search?q=tilapia+brasileira&rlz=1C1CHZL_esUY977UY977&oq=&aqs=chrome.5.35i39i362j46i39i199i362i465l2j35i39i362j46i39i362j35i39i3

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Uso de barba na indústria e em serviços de alimentação: pode ou não pode?

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Neste post, vou abordar a falta de regulamentação específica em muitos setores de produção e manipulação em alimentos sobre o uso de barba por manipuladores de alimentos.

É importante adotar uma abordagem intuitiva para garantir a segurança dos alimentos, levando em consideração os potenciais riscos associados à presença de barba na indústria alimentícia.

Em post escrito em 30 de dezembro de 2014 por Juliane Dias, as legislações sobre Boas Práticas de Fabricação (BPF) não estão atualizadas até a data atual. Vou comentar algumas das principais legislações existentes sobre o assunto:

RDC 216 de 2004 da ANVISA: principal legislação da ANVISA sobre BPF para estabelecimentos de serviços de alimentação. Estabelece em seu artigo 4, item 4.6.6:

4.6.6 Os manipuladores devem usar cabelos presos e protegidos por redes, toucas ou outro acessório apropriado para esse fim, não sendo permitido o uso de barba. As unhas devem estar curtas e sem esmalte ou base. Durante a manipulação, devem ser retirados todos os objetos de adorno pessoal e a maquiagem.

RDC 275/2002 da Anvisa – Regulamento Técnico de Procedimentos Operacionais Padronizados aplicados aos Estabelecimentos Produtores/Industrializadores de Alimentos e a Lista de Verificação das Boas Praticas de Fabricação em Estabelecimentos Produtores/Industrializadores de Alimentos, estabelece em seu anexo II (check list de inspeção), item 3.1.3:

“3.1.3 Asseio pessoal: boa apresentação, asseio corporal, mãos limpas, unhas curtas, sem esmalte, sem adornos (anéis, pulseiras, brincos, etc.); manipuladores barbeados, com os cabelos protegidos.”

Segundo o dicionário, a palavra barbeado significa:

“ a barba aparada ou rapada”

Assim, estar barbeado significa que um homem removeu completamente ou parcialmente os pelos faciais utilizando uma lâmina de barbear, proporcionando uma aparência de pele suave e sem pelos. Isso pode incluir raspar completamente a barba, deixar apenas um cavanhaque ou manter uma barba aparada e bem cuidada. A escolha de estar barbeado ou não é uma decisão pessoal e pode variar de acordo com as preferências individuais, estilo pessoal ou requisitos profissionais. Acredito que a legislação, por ser do ano de 2002, descreveu o termo incorretamente. O correto, para não ter duplo sentido, é o verbo: raspar a barba, ou seja, fazer a barba totalmente.

Mas melhor nem contar isto para os empresários do setor para não perder o que já alcançamos até agora.

Instrução Normativa n° 5, de 31 de março de 2000 (MAPA), que aprova em seu Art.1°, o Regulamento Técnico para a fabricação de bebidas e vinagres, inclusive vinhos e derivados da uva e do vinho, dirigido a estabelecimentos elaboradores e ou industrializadores.

A IN 05 MAPA não menciona o termo “barba”.

Portaria 78 de 30/01/2009, válida somente para o Estado do Rio Grande do Sul, aprova:

“A Lista de Verificação em Boas Práticas para Serviços de Alimentação, Normas para Cursos de Capacitação em Boas Práticas para Serviços de Alimentação e dá outras providências.”

Em seu anexo I, na lista de verificação:

“Item 7.6. Manipuladores dotados de boa apresentação, asseio corporal, mãos higienizadas, unhas curtas, sem esmalte, sem adornos, sem barba ou bigode e cabelos protegidos.”

A regulamentação do uso de barba por funcionários pelo MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária) tem sido motivo de controvérsia. Embora as diretrizes para a higiene pessoal sejam estabelecidas, as regras específicas sobre o uso de barba não são claras, o que tem gerado interpretações divergentes por parte das empresas.

As legislações do MAPA em relação ao uso de barba pelos funcionários não especificam o uso de barbas para os funcionários quanto para os empregadores. Enquanto algumas empresas adotam uma política de proibição total do uso de barba, outras permitem que os funcionários usem barba desde que sigam as diretrizes de higiene pessoal estabelecidas pelo MAPA. Essa falta de clareza tem levado a diferentes interpretações da lei e, consequentemente, a diferentes práticas adotadas pelas empresas.

A Portaria n° 368, de 4 de setembro de 1997, atualizada pela Norma Interna 01 de março de 2017/MAPA, padroniza a elaboração de produtos de origem animal e refere-se ao assunto de higiene e hábitos higiênicos em seu 6° parágrafo, mas não há menção específica sobre barbas.

Um exemplo de uma divergência por parte do MAPA é a aplicação da IN n° 04, de 23 de fevereiro aplicada na produção de alimentos para rações animal. Ela é específica para as aplicações das Boas Práticas de Fabricação (BPF), como estabelece em seu art. 1°:

Art 1°: Aprovar o Regulamento Técnico sobre as condições higiênico sanitárias e de Boas práticas de Fabricação para estabelecimentos fabricantes de produtos destinados à alimentação animal e o roteiro de inspeção, constantes dos anexos.

Verifica-se que as regulamentações referentes às Boas Práticas de Fabricação (BPF) deixam a desejar em termos de clareza e não especificam se os manipuladores de alimentos devem ou não raspar suas barbas. Para nós, profissionais do ramo, é um desafio exigir a remoção da barba sem respaldo legal.

Portanto, embora não haja uma resposta definitiva sobre se o uso de barbas é permitido ou não, é fundamental priorizar a segurança dos alimentos produzidos.

Estudo da contaminação microbiológica da barbas

Existem estudos que indicam que barbas podem acumular mais bactérias do que a pele limpa, levando em consideração o impacto potencial na segurança de alimentos.
Diz o título do estudo divulgado pela live science:

“A barba dos homens contém mais bactérias nocivas do que a pele dos cães”.

Um pequeno estudo europeu descobriu que a barba do homem é mais repleta de bactérias patogênicas que a parte mais suja do pelo de um cachorro.

Para o estudo, publicado na edição de fevereiro de 2019 da revista European Radiology, os pesquisadores analisaram amostras de pele e saliva de:

– 18 homens barbudos (cujas idades variavam de 18 a 76 anos) e
– Amostras de pele e saliva de 30 cães (cujas raças variavam de schnauzer a pastor alemão),

Os pesquisadores estavam procurando por colônias de bactérias patogênicas para humanos tanto no homem quanto no cão – não em uma tentativa de envergonhar as massas hirsutas, mas testar através da ressonância magnética microrganismos em busca de 6 superbactérias.

Na verdade, eram os humanos os pacientes mais sujos. Não apenas as barbas dos homens continham significativamente mais micróbios potencialmente infecciosos do que a pele dos cães, mas os homens também deixavam os scanners mais contaminados do que os animais.

Como o scanner de ressonância magnética usado para cães e humanos era rotineiramente limpo após o escaneamento do animal, havia uma carga bacteriana substancialmente menor em comparação com os scanners usados exclusivamente para humanos”, escreveram os pesquisadores no estudo.

Os pesquisadores analisaram cães que foram agendados para consultas de ressonância magnética de “rotina” para procurar distúrbios cerebrais e da coluna, escreveram os autores. Como os scanners de ressonância magnética são muito caros para a maioria das clínicas veterinárias, esses testes foram realizados no departamento de radiologia de um hospital europeu que realiza cerca de 8.000 exames de ressonância magnética de pacientes humanos todos os anos.

Os pesquisadores limparam a boca de cada cão em busca de amostras de bactérias e, em seguida, coletaram uma amostra simples de pelo esfregando uma placa especial de coleta de bactérias entre as omoplatas de cada cão (um local “particularmente anti-higiênico” onde infecções de pele são encontradas regularmente, escreveram os pesquisadores). Depois que os cães concluíram seus exames de ressonância magnética, os pesquisadores também coletaram amostras de três pontos do scanner.

Enquanto isso, a equipe também coletou amostras bacterianas das barbas avaliadas. Os barbudos estavam relativamente bem de saúde e não haviam sido hospitalizados em nenhum momento no ano anterior.

Pelo gráfico, 100% dos homens analisados estavam ou tinham contaminação na pele (abaixo da barba) e na saliva, contra 80% dos mesmos locais em cachorros.

Sete dos homens e quatro dos cães testaram positivo para microrganismos patogênicos humanos – o tipo de bactéria que pode deixar uma pessoa doente se colonizar a parte errada do corpo do hospedeiro. Esses microrganismos incluem o Enterococcus faecalis, uma bactéria intestinal comum que é conhecida por causar infecções (especialmente infecções do trato urinário) em humanos, e vários casos de Staphylococcus aureus, uma bactéria colonizadora de pele/mucosa comum que pode viver em até 50% de todos os adultos humanos, mas pode causar infecções graves se entrar na corrente sanguínea.

Imagens das bactérias principais encontradas:

Figura 1 Enterococcus faecalis

Figura 2 Staphylococcus aureus

Agora que estamos cientes de que as barbas são consideradas anti-higiênicas, surge a pergunta: por que chefs e cozinheiros renomados estão adotando estilos de barba elegantes e bem cuidadas, mesmo enfrentando restrições? Por que a ANVISA não os adverte?

No que diz respeito ao perigo físico causado por pelos de barba nos alimentos, que também causa repulsa, a ministra do STF Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, afirmou:

“A distinção entre as hipóteses de ingestão ou não do alimento insalubre pelo consumidor, bem como da deglutição do próprio corpo estranho, para além da hipótese de efetivo comprometimento de sua saúde, é de inegável relevância no momento da quantificação da indenização.

Dessa forma, qualquer tipo de objeto estranho, como o pelo da barba em questão, é considerado prejudicial à saúde humana. Seria prudente alertar as empresas sobre essa questão, a fim de evitar possíveis processos judiciais e repensar suas políticas em relação às barbas. Mas o que dizem as leis trabalhistas a respeito disso? Segundo a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o trabalhador tem o direito de usar barba, a menos que haja uma justificativa plausível, que diz:

Sobre padrões de cabelo, barba e outros aspectos da aparência física, “a jurisprudência trabalhista entende que somente é permitido exigir quando houver justificativa plausível (como para trabalhador da saúde).

Ao analisar a combinação do parágrafo da CLT com a decisão do STF mencionada, compreendo que a alimentação é um assunto de extrema importância para a saúde e, por essa razão, é proibido o uso de barbas.

Este texto explanou a discussão sobre vários aspectos deste assunto polêmico que é a utilização de barbas tanto na indústria de alimentos como em serviços de alimentação. O rigor deve ser sempre nosso, profissionais da área, de garantir que fornecemos e nos responsabilizamos pela produção e elaboração de produtos seguros e higiênicos.

Para obter mais detalhes sobre o uso de barba, sugiro acessar o post da engenheira de alimentos criadora deste blog, Juliane Dias, que está disponível aqui.

Até o próximo post!

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Intoxicação alimentar por atum contaminado: o que aconteceu?

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No final de agosto foi noticiado um surto de origem alimentar em nove creches da região de Campinas, envolvendo 60 pessoas, entre alunos e funcionários das instituições. Os sintomas aconteceram em julho e após as análises concluiu-se que a causa foi o consumo de atum contendo altos níveis de histamina.

A ANVISA, através da Resolução 3124/2023, solicitou o recolhimento do lote do produto, pela seguinte motivação: “Considerando a ocorrência de surto compatível com intoxicação alimentar por histamina após o consumo do alimento, em Centros de Educação Infantil de Campinas, São Paulo, e a confirmação de contaminação do produto com histamina acima dos limites tolerados pela legislação sanitária, evidenciada pelo RELATÓRIO DE ENSAIO Nº RE-TC 03.105/23, do Instituto de Tecnologia de Alimentos – ITAL.”

Trata-se de um lote fabricado em 8 de maio deste ano, com validade até 8 de maio de 2025.

Segundo informações da Secretaria de Saúde de Campinas, as crianças com sintomas de intoxicação apresentaram manchas vermelhas pelo corpo, coceira e sete delas tiveram diarreia.

O que é a intoxicação por histamina?

Intoxicação por histamina também é chamada de intoxicação pela toxina escombróide.

Atuns e outros peixes da família Scombridae, peixes conhecidos como “escuros”, são susceptíveis à formação de histamina por conterem grandes quantidades de histidina livre no tecido muscular. A transformação da histidina em histamina costuma acontecer pela ação de bactérias contaminantes quando os peixes mortos não são conservados e manuseados de forma adequada. É importante que os peixes sejam refrigerados em curto período após sua morte, para evitar esse aumento na concentração de histamina.

Um fator importante é que a histamina não é eliminada durante os processos de cocção durante a fabricação do atum enlatado.

O Brasil e outros países têm um nível máximo permitido de histamina, que é de 100 ppm no tecido muscular.

A intoxicação assemelha-se clinicamente a uma reação alérgica aguda, com a presença de um ou alguns dos sintomas abaixo elencados:

  • Dormência
  • Formigamento
  • Sensação de queimação na boca
  • Erupções cutâneas no tronco superior
  • Queda de pressão
  • Dor de cabeça
  • Coceira na pele
  • Náusea
  • Vômito
  • Diarreia

O quadro costuma ser leve, desaparecendo em poucas horas, mas há relatos de complicações em crianças, idosos ou pessoas com deficiências imunológicas.

Os cuidados com a matéria-prima adquirida, sempre que possível analisando a presença de possíveis contaminantes que possam causar intoxicação alimentar, e a rápida detecção de alterações no produto, com recolhimento de lotes no mercado, podem evitar esse tipo de ocorrência.

Imagino que a questão da histamina seja um desafio para a indústria de pescado, pois pelo levantamento que fiz, as técnicas empregadas para detecção de histamina em peixes podem ser as de cromatografia, que não estão disponíveis para a grande maioria das indústrias de alimentos, pelo seu alto custo e pela necessidade de qualificação de mão de obra. Existem, porém, testes ELISA que podem ser adquiridos pela indústria. Não tenho a informação de seu custo, mas vale o exercício sobre o custo da análise versus o custo da falha interna. Nesse caso, a detecção da falha internamente poderia evitar o adoecimento daqueles que consumiram esse lote e também a exposição da marca na mídia.

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Botulismo e neurotoxina alimentar

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Este artigo trata do botulismo e neurotoxina alimentar. Farei uma abordagem biológica diferente, mas complementar a outros excelentes artigos já publicados aqui na FSB por colegas colunistas.

O botulismo é uma infecção alimentar rara, mas com alta letalidade. Etiologicamente é causada pela toxina de uma bactéria do gênero Clostridium (C. botulinum) amplamente distribuída tanto no solo quanto na água.

Esporulação

Vamos começar com o processo de esporulação. A esporulação pode ser definida como uma forma latente adotada por certas bactérias para sobreviver em condições extremas e inicia-se com a formação do endosporo dentro da célula vegetativa. O endosporo difere da célula vegetativa pela formação de quatro camadas superficiais. A mais externa chama-se exosporium. Dentro dela está a capa dos esporos (ambos formados por proteínas). Dentro deles está o córtex, que é uma camada de peptideoglicanos, e dentro do córtex está o núcleo do esporo e a parede celular normal correspondente à célula vegetativa.

As quatro coberturas adicionais do endosporo fornecem resistência e proteção à célula vegetativa quando as condições externas tornam-se hostis à bactéria. Este processo pode ocorrer em menos de quatro horas. O composto que confere maior resistência ao endosporo uma vez concluído o processo de esporulação é o ácido dipicolínico associado a íons cálcio (dipicolinato de cálcio) e encontra-se no núcleo do esporo.

A esporulação a partir de uma célula vegetativa implica um processo de transformação altamente complexo que envolve a expressão de múltiplos genes com a produção de proteínas em nível mitocondrial, algo que ainda está sendo estudado pelos cientistas, portanto ultrapassa o escopo deste artigo. Mas o que é realmente relevante é que ele transforma uma célula vegetativa hidratada e metabolicamente ativa em um esporo desidratado (o teor de água é de apenas 10% a 25% no centro do esporo) e metabolicamente inerte com muito pouco ou nenhum consumo de oxigênio.

O esporo é uma forma muito eficiente de defesa contra um ambiente hostil e também pode ser ativado quando a bactéria não encontra nutrientes suficientes para continuar com sua forma vegetativa. O esporo tem a capacidade de persistir nesse estado de latência por muito tempo. Existem até estudos que detectaram esporos centenários que então voltam à sua forma vegetativa quando as condições hostis diminuem. Esse processo é chamado de germinação. Quando as condições para as bactérias são favoráveis, esse processo pode ser rápido e atingir o modo vegetativo em apenas 30 minutos.

Mas o leitor pode se perguntar em quais casos é importante levar em consideração o processo de formação do endosporo. Um primeiro esclarecimento é que nem todos os gêneros de bactérias têm essa capacidade. Em todos os casos, trata-se de procariontes gram-positivos, mas para fins de segurança de alimentos, os gêneros Bacillus e Clostridium são de fundamental relevância.

O Clostridium botulinum é o agente que produz a toxina botulínica quando se encontra em sua forma vegetativa, em ambiente sem a presença de oxigênio (anaerobiose) e com nutrientes suficientes para o seu desenvolvimento. É o caso de alimentos em conserva que não foram devidamente preparados.

O caso das conservas caseiras é um dos exemplos típicos. Mas a produção da toxina também pode ser decorrente de processos industriais inadequados. A indústria alimentícia teve que desenvolver procedimentos de esterilização eficazes, como o do leite leite longa vida (UHT), entre outros, para garantir a segurança dos alimentos, sejam eles embalados em potes de vidro, enlatados, ou em outros materiais. Além disso, sempre é preciso levar em  consideração fatores como boa higiene, tempo de cozimento, temperatura superior a 120 graus Celsius, pH adequado ou a combinação desses parâmetros.

A bactéria pode assumir a forma de endosporo, completar o processo de esporulação por tempo indeterminado e voltar a germinar quando as condições forem favoráveis para a produção da neurotoxina. Existem receptores de germinação com a capacidade de detectar a presença de condições adequadas para induzir a germinação. Os esporos germinam rapidamente, dissolvendo suas capas e absorvendo água com sérias consequências para o consumidor. Nos casos mais graves, a toxina afeta o sistema nervoso (neurotoxina) e pode ser letal se não for tratada com urgência. A neurotoxina inibe a formação do neurotransmissor acetilcolina. A toxina é termolábil, ou seja, pode ser inativada pelo cozimento, mas não a bactéria esporulada.

Desde a década de 1980, alguns casos de botulismo infantil foram relatados. Nesses casos, está envolvido o mel produzido pelas abelhas, que contém a forma esporulada que depois germina no aparelho digestivo do bebê, liberando a toxina.

Bioterrorismo

O governo dos Estados Unidos da América, por meio do CDC,  também tomou medidas de contingência face a um ataque terrorista que pode envolver a toxina botulínica como perigo potencialmente letal. Sem tratamento médico imediato, as pessoas com botulismo podem morrer.

A verificação da vida muito longa em forma latente dos esporos também é objeto de estudo dos astrobiólogos.

Referências:

https://www.mayoclinic.org/es/diseases-conditions/botulism/symptoms-causes/syc-20370262#:~:text=El%20botulismo%20es%20una%20afecci%C3%B3n,Clostridium%2

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4098856/

https://cals.cornell.edu/microbiology/research/active-research-labs/angert-lab/epulopiscium-en-espanol/endospora-de-bacterias

Leia também: 

Botulismo alimentar: o perigo das conservas caseiras

Imagem: OPAS 

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Perigos microbiológicos da embalagem de alimentos: você sabe quais são?

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Uma embalagem que vai acondicionar um alimento ou bebida precisa ser uma embalagem segura! Isto quer dizer que todos os perigos razoavelmente esperados devem estar dentro de um nível aceitável para que a saúde do consumidor não seja afetada. Dentre os perigos, não podemos deixar de fora os perigos microbiológicos da embalagem.

Quando estamos realizando análise de perigos de uma embalagem no APPCC, é comum surgir a dúvida: quais os perigos microbiológicos da embalagem? Salmonela, E. coli, S. aureus… quais devem ser considerados?

Como nem a legislação brasileira nem a literatura disponível estabelecem critérios microbiológicos para embalagem de alimentos, é comum pensarmos que não é necessário identificar e controlar. Mas não é verdade!

Na 5ª edição do perguntas e respostas da Anvisa publicado em 2020, ficou claro que apesar de não existir na legislação parâmetros microbiológicos para embalagens, devem ser seguidos os padrões microbiológicos compatíveis com os alimentos com os quais elas entrarão em contato, definidos nas normas de padrões microbiológicos de alimentos, que são atualmente a RDC n. n.724/2022 e Instrução Normativa n. 161/2022.

Desta forma, respondendo à pergunta: quais perigos microbiológicos da embalagem devem ser considerados no APPCC e gerenciados?

A resposta é: os mesmos do alimento que será acondicionado! Sendo assim, devem ser identificados no APPCC para a embalagem os perigos microbiológicos do alimento (ou bebida) conforme a RDC n. n.724/2022 e Instrução Normativa n. 161/2022, avaliado o risco (probabilidade x severidade) e determinados os controles existentes (que em geral estão relacionados com a qualificação do fornecedor).

Vamos ver um exemplo de uma embalagem plástica flexível que acondicionará biscoitos.

1º passo: checar na  Instrução Normativa n. 161/2022 o padrão microbiológico para a categoria “biscoitos”:

2º passo: identificar no APPCC estes perigos (todos para a categoria “biscoitos”)

Embalagem plástica flexível

Perigo Biológico

Salmonella

Embalagem plástica flexível

 Perigo Biológico

Bacillus cereus

Embalagem plástica flexível

Perigo Biológico

Estafilococos coagulase positiva

Embalagem plástica flexível

Perigo Biológico

Escherichia coli

Embalagem plástica flexível

Perigo Biológico

Bolores e leveduras

3º passo: avaliar o risco, determinando a probabilidade (considerar histórico de resultados analíticos, robustez da qualificação do fornecedor etc.) e a severidade (gravidade/danos à saúde) de cada microrganismo.

4º passo: Determinar os controles existentes. Exemplo: Qualificação do Fornecedor

Ao final, é muito importante estabelecer uma sistemática de verificação de atendimento do nível aceitável dos perigos microbiológicos da embalagem.

A indústria de alimentos pode (e deve) exigir do seu fornecedor de embalagem laudos de análise microbiológica. Isso porque é responsabilidade do fabricante de embalagem prevenir a contaminação microbiológica no seu processo garantindo as condições higiênicas desde o recebimento e estocagem de insumos até o transporte da embalagem. Ou seja: condições adequadas de limpeza dos equipamentos, a higiene e hábitos comportamentais dos colaboradores, a limpeza e conservação dos locais de estocagem e a utilização de veículos de transporte limpos e íntegros.

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Infecções por Cronobacter sakazakii terão notificação recomendada nos Estados Unidos

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O Conselho de Epidemiologistas Estaduais e Territoriais (CSTE), um grupo formado por especialistas dos Estados Unidos em colaboração com representantes do FDA e Associação de Laboratórios de Saúde Pública (APHL), publicou no dia 29/06/23 um posicionamento declarando que as infecções por Cronobacter sakazakii passarão a ter notificação recomendada nos EUA.

Em 2022, nos EUA, houve um surto que causou a morte de 2 bebês e acometeu 4 outras pessoas, em 3 estados. O fato gerou um grande recall provocando enorme desabastecimento de fórmulas infantis por meses, visto que a fábrica envolvida produzia fórmula para diferentes marcas. Estas investigações levaram ao atual posicionamento do CSTE.

Atualmente somente os estados de Minnesota e Michigan fazem a declaração, com reportes anuais de 2 a 4 casos apenas. Estima-se que muitos outros casos existam e que não haja o correto levantamento epidemiológico.

O conselho recomenda que infecções invasivas por Cronobacter em bebês sejam notificadas nacionalmente ao Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

Esta recomendação também estabelece critérios padronizados para identificação e classificação de casos para fins de vigilância em saúde pública e orienta a notificação de casos confirmados e prováveis.

Bactérias do Gênero Cronobacter fazem parte da família das Enterobacteriaceae (entenda mais sobre a importância delas aqui) e são encontradas livremente no ambiente. Já foram isoladas em alimentos secos, cereais, carnes, rações, temperos, amidos, chás, água e fórmulas infantis.

O gênero foi denominado Cronobacter em alusão à mitologia grega. O deus Cronos havia sido avisado por seus pais de que seria derrubado por seu filho. Ele então engoliu todos, mas, quando Zeus nasceu, sua mãe o escondeu em Creta. Zeus cresceu, forçou Cronus a vomitar seus irmãos, e venceu seu pai em guerra!

Estas bactérias causam infecções urinárias e em feridas em pessoas de todas as idades, mas os casos mais graves e associados ao consumo de alimentos são em neonatos com menos de 2 meses de vida, onde podem causar meningite – com taxas de 40-80% de mortalidade – e em menores de 12 meses e imunossuprimidos, causando sepse e necrose intestinal.

São bactérias extremamente bem adaptadas a condições extremas, com mecanismos de resistência ao pH do estômago e à desidratação extrema (daí a importância de analisar sua presença em leite em pó e fórmulas infantis). Mecanismos de aderência e invasão da parede intestinal são a principal via de entrada, tendo afinidade com a fibronectina das junções intercelulares intestinais (que são uma barreira de prevenção de entrada de moléculas e bactérias) e contornam as células epiteliais intestinais de indivíduos saudáveis. Outra hipótese é que a presença de lipopolissacarídeos (LPS) nestas bactérias Gram-negativas facilite a ruptura de junções estreitas do intestino, permitindo a invasão destas células por C. sakazakii.  Existem outros mecanismos importantes de adaptabilidade, mas fica para o próximo artigo!

Como a microbiota de recém-nascidos ainda  não está totalmente colonizada, não há uma barreira eficaz na prevenção da invasão por C. sakazakii, que ao invadir o intestino pode atingir a corrente sanguínea, e em casos mais graves, atravessar a barreira hemato-encefálica, causando meningites e algumas vezes, morte. Normalmente, bebês prematuros, imunossuprimidos ou com baixo peso têm maior risco de contaminação.

No Brasil, a Instrução Normativa 161/2022, da Anvisa, prevê que sejam analisadas no mínimo 30 amostras por lote de produção para identificação da presença de Cronobacter spp apenas em amostras de fórmulas infantis em pó para lactentes até seis meses, alimentos para nutrição enteral. Caso tenha dúvidas sobre como interpretar as contagens, veja mais detalhes aqui.

Ficou curioso? Em breve sairá outro artigo sobre este importante patógeno. Enquanto isso, leia também:

·         https://www.cdc.gov/cronobacter/outbreaks/infant-formula.html

·         https://www.foodsafetynews.com/2009/09/the-naming-of-cronobacter-sakazakii/

·         https://www.foodsafetynews.com/2022/03/publishers-platform-what-parents-need-to-know-about-cronobacter-sakazakii-and-infant-formula-today/

3 min leituraO Conselho de Epidemiologistas Estaduais e Territoriais (CSTE), um grupo formado por especialistas dos Estados Unidos em colaboração com representantes do FDA e Associação de Laboratórios de Saúde Pública (APHL), […]

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Quem sugeriu que lavar as mãos era importante?

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Para evitar a propagação de doenças como gripe e coronavírus, talvez a tática menos controversa – e mais eficaz – seja lavar as mãos.

O Food Safety Brazil já escreveu muitos posts que falam sobre a importância da lavagem das mãos (que podem ser lidos aqui), mas você já se perguntou quem sugeriu que lavar as mãos era importante? A técnica que foi amplamente difundida nos anos de covid-19, no século 19 era um escândalo.

Se existisse um “pai” para lavar as mãos, ele seria Ignaz Semmelweis,  o médico húngaro que estava na vanguarda de uma abordagem mais científica da medicina no século 19. Diante de uma maternidade dirigida por médicos (Hospital Geral de Viena) na qual as mortes maternas causadas pela temida febre puerperal eram significativamente mais altas do que na clínica administrada por parteiras, ele começou a ir atrás de respostas.

Os microrganismos ainda não haviam sido descobertos e ainda se acreditava na década de 1840 que a doença se espalhava por miasma – cheiros ruins no ar – emanados de cadáveres em decomposição, esgoto ou vegetação. Os vitorianos mantinham suas janelas firmemente fechadas contra essas forças malévolas. Portanto, não parecia um problema que os médicos estagiários do Hospital Geral de Viena ficassem no necrotério dissecando cadáveres para descobrir o que os havia matado e depois aparecessem na maternidade para fazer o parto sem lavar as mãos.

Um deles acidentalmente foi cortado por um bisturi durante uma dissecação e morreu, aparentemente da mesma febre puerperal que as mães tiveram. Semmelweis levantou a hipótese de que as partículas cadavéricas do necrotério eram as culpadas, e que tais partículas nas mãos dos médicos estavam entrando nos corpos das mulheres durante o parto.

Para testar sua teoria, ele ordenou aos médicos que lavassem as mãos e os instrumentos em uma solução de cloro, uma substância com a qual ele esperava eliminar o cheiro mortal de partículas cadavéricas. Antes do experimento, diz Wahrman, “a taxa de mortalidade de novas mães chegava a 18%. Depois que Semmelweis implementou a higiene das mãos entre o necrotério e a sala de parto, a taxa de mortalidade de novas mães caiu para cerca de 1%.”

Apesar de seu sucesso, sua ideia enfrentou grande resistência e ele teve um fim trágico. Ele perdeu o emprego e acredita-se que tenha tido um colapso nervoso. Ele morreu em uma instituição psiquiátrica, pois os médicos ficaram ofendidos com a sugestão de que poderiam estar causando infecções. A maioria dos médicos em Viena naquela época vinha de famílias de classe média ou alta, e eles se consideravam pessoas muito limpas em comparação com os pobres da classe trabalhadora. Ele os estava insultando quando disse que suas mãos poderiam estar sujas.

Nos 40 anos seguintes, desenvolveu-se uma compreensão dos microrganismos e as atitudes em relação à higiene mudaram gradualmente. Em 1857, enquanto a saúde mental de Semmelweis declinava, Louis Pasteur, famoso pela pasteurização, aumentou a conscientização sobre patógenos e como matá-los com calor. Em 1876, o cientista alemão Robert Koch descobriu o bacilo do antraz, dando início ao novo campo de pesquisa da bacteriologia médica. Cólera, tuberculose, difteria e bacilos tifóides foram posteriormente identificados.

Os cirurgiões começaram a lavar as mãos. O cirurgião britânico Joseph Lister foi pioneiro na cirurgia antisséptica, que incluía a lavagem das mãos, e na década de 1890 e no início da década de 1900, a lavagem das mãos passou de algo que os médicos faziam para algo que todo mundo deveria fazer.

E aí, já imaginou que lavar as mãos é uma ação que tem 132 anos?

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Alerta: Não compre desinfetante fake, consulte a Anvisa

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Tenho recebido várias consultas sobre desinfetante e uma das principais dúvidas é relacionada às fichas técnicas ou boletins técnicos que contêm mensagens confusas.

Primeiramente vamos esclarecer alguns termos.

Detergente: tem função de limpar, ou seja, remover resíduos e sujidades. Podem arrastar microrganismos que estejam aderidos nas sujidades.

Desinfetante ou sanitizante: tem função de reduzir os microrganismos a níveis seguros, ou seja, desinfetar.

Higienização: é o processo de limpeza seguido por desinfecção.

Infelizmente algumas empresas levam muitos profissionais a usar produtos de forma errada, por dizeres dúbios e confusos como o detergente do exemplo abaixo:

Mensagem fake: Indicado para higienização e limpeza de superfícies, equipamentos e utensílios de indústrias alimentícias em geral. O produto auxilia o controle da contaminação por bactérias, fungos leveduras e vírus.

Esse alerta é porque há várias publicações em que o termo HIGIENIZAÇÃO é utilizado erradamente, porque não é realizada a desinfecção, apenas limpeza.

Da mesma forma é confusa a expressão AUXILIA NO CONTROLE DA CONTAMINAÇÃO, se não é desinfetante.

Outros termos usados são: AJUDA NA ELIMINAÇÃO DE BOLORES E BACTÉRIAS, ou qualquer outro microrganismo, só que o produto não tem comprovação de eficácia.

Os produtos que mais geram confusão são os alcalinos clorados, porque podem ser detergentes ou desinfetantes e perante a ANVISA as exigências são muito diferentes.

A legislação brasileira para desinfetantes para indústria de alimentos segue diretrizes americanas e testes AOAC Official method. As principais exigências são a estabilidade do ativo durante o prazo de validade e a eficácia da redução microbiológica de 5 logs para microrganismos selecionados, considerando a concentração e o tempo de contato informado pelo fabricante.

Já para os detergentes, só é necessário indicar a composição e não usar produtos que não estejam em uma lista permitida.

Assim, as diferenças são:

  • Detergente alcalino clorado: atua na remoção de sujidades, quebra de proteínas e branqueamento. Cuidado com o prazo de validade, pois a estabilidade do cloro é de 6 a 9 meses, dependendo das condições de armazenamento.
  • Desinfetante alcalino clorado: além de atuar como detergente alcalino clorado, reduz a carga microbiológica e efetivamente ajuda no controle de contaminação.

Há muitas novidades no mercado com apelo de desinfetante, e minha sugestão é não acreditar em tudo o que você recebe de informação. O melhor é confirmar no site da ANVISA.

É muito simples verificar se o produto é ou não desinfetante:

  1. Faça uma pesquisa na internet usando as palavras chaves: consulta saneantes ANVISA
  2. Escolha a opção de produtos saneantes e verifique se aparece “Consulta/ Saneantes – produtos registrados ou acesse o link consulta.
  3. Digite o nome do produto no campo “nome do produto”. Se aparecer a mensagem: “nenhum registro encontrado”, o produto pesquisado não é desinfetante. Se o produto for um detergente regularizado deve aparecer na consulta pelo notificados. Se o produto for registrado aparece nova tela com todas as informações.
  4. Se houver mais de um produto com o mesmo nome, clique em cima do nome do produto e aparecerão mais detalhes.
  5. Também precisa verificar se a classe terapêutica é DESINFETANTE PARA INDÚSTRIA ALIMENTÍCIA E AFINS.
  6. Para finalizar, verifique a data de vencimento do registro e a situação do produto – deve estar ativo.

Se quiser mais informações consulte a biblioteca de saneantes, que traz todas as legislações relacionadas.

O maior risco de usar produtos desinfetantes é a produção de alimentos com contagem microbiológica acima dos padrões permitidos pelas nossas legislações –  RDC 724/2022 e IN 161/2022 -, ou seja, alimentos não seguros.

Lembre-se: os biofilmes podem ser formados por utilização de desinfetantes abaixo da concentração letal para os microrganismos.

Resumindo: a verificação de registro de desinfetante é fácil e rápida, então garanta que o desinfetante selecionado não é fake.

Leia também:

Você ainda confunde desinfecção com esterilização?

Referência: ehedg

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Intoxicação alimentar massiva a bordo mudou as regras da aviação

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Imagine uma aeronave lotada com 344 passageiros e cerca de 20 tripulantes na qual 197 pessoas começaram a ter simultaneamente náuseas, vômitos, diarreia e cólicas abdominais. Este episódio caótico a bordo foi o ponto de virada para mudar regras de segurança dos alimentos na aviação.

Era 3 de fevereiro de 1975. O Boeing 747 da Japan Air Lines estava indo de Anchorage, Alasca, para Copenhague, Dinamarca. O trecho todo seria Japão – Paris. Noventa minutos antes do pouso programado em Copenhague, os comissários de bordo serviram omeletes de presunto no café da manhã. Uma hora após os passageiros consumirem uma refeição contaminada com estafilococos, começou o horror.

Em terra, cento e quarenta e quatro pessoas precisaram de hospitalização, tornando-se o maior incidente de intoxicação alimentar a bordo de um avião comercial. Trinta estavam em estado crítico. Os outros 53 foram tratados em salas de emergência improvisadas.

Como nenhum dos médicos na Dinamarca falava japonês, e apenas alguns dos passageiros eram fluentes em dinamarquês ou inglês, funcionários que falavam japonês nos restaurantes de Copenhague foram convocados ao hospital para atuar como tradutores.

A causa-raiz do problema

A equipe de investigação foi liderada pelo oficial do Serviço de Saúde Pública dos Estados Unidos, Dr. Mickey S. Eisenberg, do Departamento de Saúde do Estado do Alasca.

Testes laboratoriais de amostras de fezes e vômitos de passageiros, bem como 33 amostras de sobras de omeletes de presunto, detectaram Staphylococcus aureus.  Concentrações elevadas de toxinas produzidas pelos estafilococos também foram detectadas no presunto, explicando o tempo de incubação extremamente curto.

As refeições foram preparadas na International Inflight Catering, uma subsidiária da Japan Airlines. Verificou-se que três cozinheiros haviam preparado as refeições, um dos quais tinha lesões infectadas no dedo indicador e médio da mão direita.  As lesões nos dedos do cozinheiro estavam infectadas com estafilococos. Na época não se contava com testes de DNA, mas o interessante foi que os testes revelaram tipos de fagos idênticos e resistências a antibióticos para todas as amostras, indicando que o cozinheiro era a fonte da contaminação.

O cozinheiro suspeito preparou refeições para três das quatro cozinhas. Ele havia enfaixado os ferimentos, mas não contou ao superior, por considerar um ato banal. Além disso, a administração não verificou se ele estava bem de saúde.

O cozinheiro suspeito preparou todas as 40 omeletes servidas na primeira classe, bem como 72 de 108 para uma das cozinhas do convés principal. Além disso, ele manuseou todas as 108 omeletes para outra cozinha.

De acordo com os microbiologistas, apenas 100 células de estafilococos são suficientes para causar intoxicação alimentar. A logística de alimentação a bordo forneceu condições ideais para que as bactérias crescessem e liberassem toxinas, que induzem fortes náuseas, vômitos, diarreia e cólicas abdominais. Por serem resistentes ao calor, as toxinas não eram destruídas quando as omeletes eram aquecidas.

Antes de serem servidas, as refeições foram armazenadas em temperatura ambiente na cozinha por 6 horas e depois refrigeradas (embora a insuficientes 10°C) por 14 horas e meia. Em seguida, eram armazenadas nos fornos das aeronaves, novamente sem refrigeração, por mais 8 horas. Se a comida tivesse sido mantida adequadamente refrigerada desde o momento em que foi preparada até estar pronta para ser servida, o surto não teria ocorrido.

Como os acidentes aéreos que costumam ter mais de uma causa-raiz, os investigadores da época concluíram o que hoje é senso comum: pessoas com lesões infectadas não devem manipular alimentos e que os alimentos devem ser armazenados em temperaturas baixas o suficiente para inibir o crescimento de bactérias.

Desdobramentos

O incidente teve uma vítima fatal: a do gerente de catering da Japan Air Lines, Kenji Kuwabara, de 52 anos, que cometeu suicídio ao saber que o incidente havia sido causado por um de seus cozinheiros.

Foi apenas por acaso que o piloto e o copiloto não haviam comido nenhuma das omeletes contaminadas, já que a companhia aérea não tinha regulamentos sobre as refeições da tripulação. Como os relógios biológicos dos pilotos estavam no horário do Alasca e não no horário europeu, eles optaram por um “jantar” de bifes em vez de omeletes de café da manhã. Se não tivessem feito isso, talvez não fossem capazes de pousar a aeronave com segurança.

Dali em diante os experts sugeriram que os membros da tripulação do cockpit comessem diferentes refeições preparadas por diferentes cozinheiros para evitar que surtos de intoxicação alimentar incapacitassem toda a tripulação, uma regra posteriormente implementada na aviação comercial.

Em 1977, a OMS publicou o Guide to Hygiene and Sanitation in Aviation e hoje há importantes diretrizes no World Food Safety Guidelines, da International Flight Association.

Mesmo assim, novas ocorrências aconteceram.

Em 1982, dez tripulantes  incluindo piloto e co-piloto da British Airways adoeceram a cerca de 35 minutos de Boston num voo de Lisboa. Descobriu-se que as refeições principais foram diferentes, mas tinha um prato em comum: a sobremesa, um pudim de tapioca. Três dias após o voo, ainda havia 6 passageiros com ocorrência.

Na Austrália, em 1980, o piloto de um avião bimotor sofreu uma intoxicação alimentar e desmaiou nos controles. Um passageiro reviveu o piloto inconsciente, que conseguiu pousar o avião com segurança.

Hoje em dia, empresas de catering que fornecem para as companhias de aviação são em sua maioria demandadas a ter uma certificação em segurança dos alimentos.

Há um filme satírico sobre intoxicação de piloto a bordo, Airplane! (1980), mas no fundo, para quem trabalha com segurança dos alimentos na aviação, isso não tem graça nenhuma.

Referências:

The New York Times

Wikipedia

Daily Mail

Fonte da imagem:  Stuff

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