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Conversa rápida sobre os conceitos Segurança dos Alimentos X Qualidade dos Alimentos e sua aplicação prática

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Vejo muitos profissionais trabalhando os conceitos de Segurança dos Alimentos e Qualidade dos Alimentos como um só ou então como parte um do outro. Na minha opinião, devem ser trabalhados separadamente sempre se complementando.

Muitas vezes, amigos, familiares ou conhecidos me perguntam com o que trabalho. Quando explico, dizem logo Qualidade dos Alimentos! Não que deixe de atuar com este foco, olhar da qualidade será sempre inerente (afinal já era Gestor de Qualidade antes de começar a trabalhar com alimentos). Hoje, o norte é sempre a Segurança dos Alimentos.

Entendo perfeitamente os profissionais da área misturarem até hoje estes conceitos. Muitos enxergam a segurança dos alimentos como um pilar da qualidade. No meu entender, são dois pilares distintos e complementares.

Já vi, inclusive, na descrição de cargos de Gerente de Segurança dos Alimentos algumas atribuições sobrepondo os conceitos.

O melhor é, por exemplo, Gerente de Qualidade e Segurança dos Alimentos.

Muitas vezes as empresas colocam na mesma caixinha estes dois conceitos.

Vale reforçar que eles se completam e não se sobrepõem, pelo menos em conceitos gerais (um bom SGQ irá tratar o assunto como ele merece).

Por falar em SGO, vale dar uma olhada neste artigo:

Requisitos regulamentares e estatutários para atender a um Sistema de Gestão da Qualidade na indústria de alimentos

A Segurança dos Alimentos é sempre inegociável enquanto a qualidade não é, variando de acordo com o nível  de recursos aplicados em cada empresa, grau de maturidade dos colaboradores e dos processos, nicho de mercado e o grau de exigência dos seus consumidores.

É de extrema importância entender a parte inegociável, é isto que diferencia as definições.

Um ponto não tenho dúvida: o padrão segurança dos alimentos aumenta a percepção de qualidade do produto frente ao seu consumidor.

Um adendo importante sobre estes conceitos e que pode ajudar muito a elucidar o meu entendimento sobre o assunto é que eles são a chave para o modo de o Reino Unido lidar com a validade dos produtos alimentícios. O link abaixo traz as informações da agência regulatória do Reino Unido:

https://www.food.gov.uk/safety-hygiene/best-before-and-use-by-dates

Ah, mas por que vamos falar do Reino Unido se estamos no Brasil?

Bem, impossível eu não citar. Foi onde fiz duas especializações recentemente: HACCP Level 5 e Food Safety Management Level 3.

Espero realmente que possamos avançar nestes conceitos. Pensem nos milhares que passam fome e como poderiam ser beneficiados.

Gostaria de me alongar neste assunto mas penso que esta é uma discussão longa que merece ser tratada em um post só para ela.

Bem, vamos voltar aos conceitos…

  • Use-by date: relacionado a segurança dos alimentos.
  • Best before date – relacionado a qualidade dos alimentos.

Sabia que estes conceitos já começam a ser ventilados aqui no Brasil? Dê uma olhada nestas reportagens: aqui e aqui.

No Use-by date, temos que pensar na possibilidade de crescimento microbiano e produção de toxinas além dos níveis permitidos, após a data de validade… Daí o vínculo do conceito com a segurança dos alimentos.

Já no Best before date pensamos nas características sensoriais e organolépticas do produto. Antes do término da data impressa na embalagem, temos um produto padronizado pela indústria (considerando um shelf life bem feito). Após a data podemos ter uma alteração de coloração, crocância e/ou uma diminuição do odor/sabor originais.

Produtos que recebem este tipo de determinação de data de validade não colocam em risco a saúde do consumidor, do ponto de vista microbiano, após o prazo pré-estabelecido. O que temos é uma perda das características do produto de acordo com a padronização estabelecida pelo fabricante. Este é o vínculo com a qualidade dos alimentos.

É importante ressaltar que após a abertura destes produtos, caso exista um odor/sabor acentuado ou aspecto de velho, recomenda-se o não consumo do item.

E como diferenciar? Vamos lá!

Segurança dos Alimentos

Refere-se a práticas e condições que preservam a qualidade dos alimentos para prevenir a contaminação e doenças de origem alimentar durante toda a cadeia produtiva.

As corretas práticas de Segurança dos Alimentos garantem que os alimentos não causem danos ao consumidor quando armazenados, transportados, preparados  ou consumidos de acordo com o uso a que se destinam.

Exemplos de áreas e requisitos da Segurança dos Alimentos:

  • Higiene pessoal
  • Apresentação e cuidados pessoais
  • Controle de pragas
  • Gestão de resíduos
  • Limpeza e higienização
  • Controle e aferição de temperatura em toda a cadeia
  • Identificação e controle de perigos

 Qualidade dos Alimentos

Refere-se aos recursos disponibilizados pela empresa e às características do produto.

Podemos citar: ter aceitabilidade por parte do consumidor, atender as suas expectativas, custo x benefício, estar em conformidade com as legislações específicas e ser lucrativo para a empresa.

Exemplos de características da qualidade dos alimentos:

  • Fatores organolépticos, como aparência, tamanho, forma, cor, consistência, odor e sabor.
  • Rotulagem correta dos ingredientes, informações nutricionais e detalhes do fornecedor / fabricante.
  • Produtos devidamente embalados e lacrados.
  • Existência de um padrão.
  • Padrão de abertura da embalagem – facilidade para o consumidor.

Conclusão

Segurança dos Alimentos e Qualidade dos Alimentos são os dois aspectos mais importantes das empresas que manipulam alimentos.

É importante saber a diferença e ter um Sistema de Qualidade e Segurança dos Alimentos adequadamente  implementado.

Com certeza isto irá manter seus clientes saudáveis, satisfeitos com a marca (talvez até fidelizados) e a empresa longe de problemas legais ou de confiança por parte do consumidor.

Geidemar Ferreira de Oliveira é especialista em Controle da Qualidade e Toxicologia dos Alimentos pela Universidade de Lisboa. 

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Especificação de embalagem: quais parâmetros de segurança de alimentos devem ser definidos?

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Especificação de embalagem, ou de outro material, é um documento formal que tem a função de apresentar os parâmetros que precisam ser cumpridos pelos fornecedores do material. Pode incluir nome do material, legislações aplicáveis, condições de transporte e estocagem, validade, identidade, características sensoriais, e critérios de qualidade e de segurança de alimentos. Há um post muito interessante sobre o assunto que e você pode acessar aqui. Esta responsabilidade geralmente é compartilhada entre P&D (quem desenvolve a embalagem de alimentos) e a Qualidade.

Em geral, na especificação de embalagem, os parâmetros relacionados à qualidade são descritos, mas considerando que haverá contato direto com alimento, precisamos também definir os parâmetros que vão garantir a segurança deste e por conseguinte, do alimento que será acondicionado.

É muito importante que a empresa especifique tais parâmetros e não somente use a ficha técnica (ou especificação) do material elaborada pelo fornecedor.

Como definir os parâmetros de segurança de alimentos que uma embalagem deve atender?

Não há regra. Mas existem algumas premissas que precisamos avaliar para então podermos defini-los de acordo com o tipo de material e alimento ou bebida que será acondicionado.

Uma dica é pensar nas categorias de perigos e contaminantes razoavelmente esperados que podem representar um risco à saúde humana, caso estejam presentes acima dos níveis aceitáveis. A seguir deixo algumas sugestões do que deve ser avaliado e considerado para definir os critérios de aceitação de uma embalagem do ponto de vista de segurança de alimentos.

Parâmetros físicos

Quais perigos físicos são razoavelmente esperados neste tipo de embalagem, considerando sua composição e processo de fabricação? Rebarba ou filamentos de plástico (em embalagens plásticas), fragmentos de vidro (em embalagens de vidro), sujidades? Neste caso, por exemplo, a ausência destes contaminantes pode ser um parâmetro físico.

Quais características físicas e dimensionais da embalagem são necessárias para evitar alguma contaminação posterior? Por exemplo: variação na espessura ou no diâmetro de uma tampa ou corpo de embalagem podem ocasionar falha de selagem, falha de recravação ou falha no fechamento adequado? Esses critérios e valores podem ser parâmetros físicos. Outro exemplo, uma embalagem de alumínio com falha na camada de verniz interno poderá causar microperfurações devido à reação de oxidação do material da embalagem em contato com a bebida, e consequentemente a perda de conservante.

 Parâmetros químicos

Os parâmetros químicos devem estar de acordo com a legislação do tipo de embalagem que irá acondicionar o alimento ou bebida. Em geral deve estar clara nas especificações de embalagem, a exigência de que a composição atenda a lista positiva da legislação aplicável e que sejam evidenciados os laudos dos ensaios de migração completos e com resultados satisfatórios.

Devem ser avaliadas as particularidades de cada embalagem, como por exemplo: em embalagens metálicas pode haver resíduo de óleo lubrificante? Metal exposto por falha no recobrimento da camada de verniz interno? Em embalagens plásticas há resíduo de solvente? etc.

 Parâmetros biológicos

Não há na legislação de alimentos a exigência de que as embalagens sejam submetidas às análises microbiológicas. Tampouco nas legislações de embalagens e materiais de contato da Anvisa, com exceção para embalagens de papel, que possui requisito na RDC 88/16 que torna obrigatório ao fabricante de embalagem celulósica realizar análises microbiológicas preconizadas para a categoria do alimento que será acondicionado.

Entretanto, no Manual de Perguntas e Respostas da Anvisa 5ªed., sobre o tema de materiais de contato, foi dado o direcionamento sobre o assunto na questão 20, deixando claro que apesar de não existirem na legislação parâmetros microbiológicos para embalagens, as empresas devem seguir os padrões microbiológicos compatíveis com os alimentos com os quais entrarão em contato, definidos na RDC 331/2019 e na Instrução Normativa 60/2019.

Diante disso, a empresa deve identificar quais são as exigências microbiológicas para o alimento que será acondicionado e então determiná-las como parâmetros microbiológicos para as embalagens com base em uma avaliação de risco.

Parâmetros alergênicos

A declaração formal da ausência de alergênicos na embalagem é importantíssima! Existem empresas que utilizam látex natural, outras que utilizam como lubrificante óleo de grau alimentício (podendo ser por exemplo à base de soja, de amendoim), entre outros exemplos que vemos por aí. O fabricante precisa comunicar se existe a presença de alergênicos intencionais ou não na sua embalagem, em conformidade com a RDC 26/15. Isso pode também estar na especificação da embalagem.

Lembrando que para quem tem a certificação na FSSC22000, na sua última versão publicada (versão 5.1), o requisito adicional referente à gestão de materiais e serviços, deixou clara a obrigatoriedade de estabelecer um procedimento de revisão de especificações de materiais adquiridos e serviços para garantir a conformidade continuada destas especificações com os requisitos de segurança de alimentos, legais e de clientes. Portanto, tenha implementada uma sistemática de revisões de todas as especificações a fim de que sejam mantidas atualizadas.

Aqui foram sugestões e orientações do que minimamente deve ser considerado para elaborar a especificação do ponto de vista de food safety. Se você tiver alguma outra sugestão, compartilhe com a gente nos comentários.

É necessário garantir que a especificação da embalagem esteja completa de modo que os fornecedores sejam adequadamente comunicados das expectativas do cliente e dos critérios de aceitação relacionados à segurança dos alimentos.

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Como lidar com os erros e a incerteza presente nas medições?

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ENTENDA QUE MEDIÇÕES SÃO IMPERFEITAS

Uma medição perfeita, isto é, sem erros, só pode existir se um sistema de medição perfeito existir e a grandeza sob medição, denominada mensurando, tiver um valor único, perfeitamente definido e estável. Apenas neste caso hipotético ideal, o resultado de uma medição pode ser expresso por um número e uma unidade de medição apenas. Porém, no mundo real, sabe-se que não existem sistemas de medição perfeitos e utópicos.

Aspectos tecnológicos forçam que qualquer sistema de medição construído resulte imperfeito: suas dimensões, forma geométrica, material, propriedades elétricas, ópticas, pneumáticas, etc., não correspondem exatamente à ideal e plenamente fixada.

As leis e princípios físicos que regem o funcionamento de alguns sistemas de medição, como se vê, nem sempre são perfeitamente lineares como uma análise simplista poderia supor.

Por isso, ao realizar medições, é importante ter em mente que estas não são completamente precisas, pois estão associadas a incertezas. Por isso, para analisar os dados de medição, precisamos entender a natureza dos erros associados às medidas.

ERROS DE MEDIÇÃO

Por ser um conceito idealizado, os erros de medição não podem ser conhecidos exatamente. Por esta razão, o que se faz é estimar o erro de medição através da diferença entre o valor medido de uma grandeza e um valor de referência convencionado.

Os erros podem ser aleatórios ou sistemáticos conforme quadro a seguir:

ERRO ALEATÓRIO ERRO SISTEMÁTICO
  1. Ocorre ao acaso, inesperadamente;
  2. É imprevisível e variável, tanto para valores acima do valor médio, quanto para abaixo;
  3. Presumivelmente este tipo de erro se origina de variações temporais ou espaciais, estocásticas ou imprevisíveis, de grandezas de influência. Assim, os efeitos de tais variações são a causa de variações em observações repetidas do mensurando;
  4. Geralmente o erro aleatório pode ser modelado como tendo distribuição aproximadamente normal com média zero;
  5. Na prática, sua média tende a zero à medida que se aumenta o número de dados observados, uma vez que este tende a distribuir-se simetricamente em valores positivos e negativos;
  6. Embora não seja possível compensar o erro aleatório de um resultado de medição, ele pode geralmente ser reduzido aumentando-se o número de observações;
  7. Seu valor esperado é zero.
  1. Pode ser uma ocorrência conhecida e esperada;
  2. O erro sistemático, em medições repetidas, permanece constante ou varia de maneira previsível.
  3. Esses tipos de erros são controláveis tanto em magnitude quanto em direção;
  4. Podem ser avaliados e minimizados se forem feitos esforços para indentificá-los, analisá-los e controlá-los;
  5. O erro sistemático, assim como o erro aleatório, não pode ser eliminado por completo, porém, frequentemente, pode ser reduzido;
  6. Se um erro sistemático se origina de um efeito reconhecido de uma grandeza de influência em um resultado de medição, o efeito pode ser quantificado;
  7. Se o erro for significativo com relação à exatidão requerida da medição, uma correção ou fator de correção pode ser aplicado para compensar o efeito.

 

Estes erros podem derivar de uma série de fatores como perícia e competência do operador, das características do instrumento de medição, das condições ambientais onde a medição é realizada, do método de medição em si ou por outras causas e motivos.

Se o erro de medição fosse perfeitamente conhecido, ele poderia ser corrigido e sua influência completamente anulada da medição.

Contudo, a componente sistemática do erro de medição pode ser suficientemente bem estimada, porém não a componente aleatória. Consequentemente, não é possível compensar totalmente o erro.

O conhecimento aproximado do erro sistemático e a caracterização da parcela aleatória é sempre desejável, pois isto torna possível sua correção parcial e a delimitação da faixa de incerteza ainda presente no resultado de uma medição.

Os erros sistemáticos e aleatórios são muitas vezes influenciados por fontes de erros que estão ligadas basicamente ao operador e ao método, cujos principais tipos de erros são:

  1. Grosseiro: Causados por falta de atenção do operador, por exemplo, anotando um número errado ou trocando uma vírgula de posição. Pode ser causado também pelo mau funcionamento do instrumento, como um dígito falhando ou um ponteiro enroscando. Em medidas elétricas ou de temperatura, uma simples inversão de polaridade já causa esse tipo de erro;
  2. Acidental: Pode ocorrer, por exemplo, durante a medição do consumo de energia elétrica de um aparelho quando há uma queda na tensão de alimentação sem que seja percebida pelo operador, afetando o resultado final. Durante a pesagem de um produto, alguém bate na bancada e trepida a balança. Quando numa titulação, o operador se atrapalha para fechar a bureta;
  3. De inserção: Quando a introdução do instrumento de medição interfere na medida, por exemplo: quando introduzimos um termômetro de vidro em um recipiente com um líquido e a temperatura do termômetro poderá interferir na temperatura do líquido. Isso pode ocorrer também em medições elétricas, ou até mesmo quando medimos alguma peça com um paquímetro ou micrômetro e causamos deformação na peça;
  4. Paralaxe: Esse erro ocorre em instrumentos analógicos, devido ao ângulo de visão do operador em relação à escala do instrumento;
  5. De zeragen: Alguns instrumentos de medição apresentam ajustes de zero. Caso essa zeragem não esteja correta acarretará um erro de medição.

INCERTEZA DE MEDIÇÃO

A palavra “incerteza” significa dúvida, e assim, no sentido mais amplo, “incerteza de medição” significa dúvida acerca da validade do resultado de uma medição. É o valor “X” que pode variar para cima ou para baixo, portanto, ± X.

Devido à falta de palavras diferentes para esse conceito geral de incerteza e para as grandezas específicas que proporcionam medidas quantitativas do conceito, como, por exemplo, o desvio-padrão, é necessário utilizar a palavra “incerteza” nestas duas acepções diferentes.

A incerteza de medição inclui componentes provenientes de efeitos sistemáticos, tais como componentes associadas a correções e a valores atribuídos a padrões, assim como a incerteza definicional.

A incerteza de medição geralmente engloba muitas componentes. Alguns podem ser estimados por uma avaliação do tipo A da incerteza de medição que são obtidos a partir da distribuição estatística dos valores provenientes de séries de medições e podem ser caracterizados por desvios-padrão.

As outras componentes podem ser estimadas por uma avaliação do tipo B da incerteza de medição, que podem também ser caracterizadas por desvios-padrão estimados a partir de funções de densidade de probabilidade baseadas na experiência ou em outras informações.

Geralmente para um dado conjunto de informações, subentende-se que a incerteza de medição está associada a um determinado valor atribuído ao mensurando, portanto, uma modificação deste valor resulta numa modificação da incerteza associada.

APLICAÇÃO PRÁTICA NA SEGURANÇA DOS ALIMENTOS

Suponha que num processo de esterilização você precise de uma temperatura de 130°C para atingir o F0 que permita alcançar a redução de uma determinada carga microbiana a níveis aceitáveis. Porém, há uma incerteza de medição de ± 1°C, assim quando você mede, pode ser que seja 130°C, mas também pode ser 129°C ou 131°C. Você não sabe, há uma incerteza!

O 130°C seria ótimo, o 131°C não seria um problema, mas o 129°C seria insuficiente para a redução logarítmica da carga microbiológica necessária que garantiria a segurança ao produto, ou seja, insuficiente para atingir a letalidade de um microrganismos de referência, tema tratado no artigo “Considerações sobre o efeito térmico na segurança dos alimentos“.

Por isso, se a temperatura mínima necessária é 130°C e há uma incerteza de medição de ± 1°C, indica-se trabalhar com no mínimo 131°C, com isso, na pior hipótese, a temperatura estará nos desejáveis 130°C.

Por isso, quando possível, devido a limitações ocasionadas pela temperatura poderem afetar os produtos em suas características organolépticas, acrescenta-se mais alguns graus como margem, trabalhando-se com limites de segurança e não apenas com os críticos.

Se houver erros de medição conhecidos, fatores de compensação podem também ser acrescidos.

Com isso, garantiríamos a letalidade térmica necessária compensando a dúvida gerada pela incerteza de medição e pelo erro.

Leia também:

  1. 6 Passos Críticos para um Programa de Calibração na indústria de alimentos.
  2. 5 Cuidados com instrumentos de medição
  3. Qual a diferença entre calibrar, verificar e ajustar?
  4. Critérios para escolha de instrumentos de medição

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Critérios para escolha de instrumentos de medição

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Num processo industrial de produção de alimentos e bebidas, muitas vezes é necessário medir e monitorar para, com base nos resultados obtidos, tomar ações a fim de manter os processos sob controle, seja para garantir características organolépticas como controlar as zonas de um forno de biscoitos objetivando obter uma determinada umidade e crocância ou para controlar um PCC como numa esterilização de água de coco num processo hot fill.  Para isso, recorre-se ao uso de instrumentos de medição como termômetros, potenciômetros, medidores de vazão, barômetros, balanças e muitos outros.

Numa medição, portanto, o instrumento utilizado é uma das partes mais importantes, junto com a competência de quem executa a tarefa.

Por isso, a seleção de instrumentos de medição deve ser realizada adequadamente, pois caso seja realizada de forma imprópria, os resultados de medições obtidos podem fornecer uma informação errada, levando a tomada de decisões incorretas, e com isso, gerando produtos não conformes e até mesmo inseguros.

A escolha de um instrumento de medição tem que levar em consideração: 1) resolução, 2) a faixa de medição, 3) a precisão e 4) a exatidão necessárias para atender ao processo.

E é claro, não se deve esquecer os 5 cuidados com instrumentos de medição para garantir que estarão plenamente aptos no momento do uso.

1 – RESOLUÇÃO

A resolução é o valor de uma divisão de um instrumento de medição, portanto, é a menor indicação que pode ser observada no instrumento. Por exemplo: se em em um termômetro, a indicação do valor medido é realizada de 1°C em 1°C, a resolução do termômetro é de 1°C.

Para que a variabilidade de um processo possa ser observada é necessário que a resolução do instrumento de medição seja adequada.

Por isso, se tentarmos utilizar o termômetro citado anteriormente para medir um processo de 50 +/- 1°C, poderíamos ter um sério problema de confiabilidade no resultado e um alto grau de risco de obter medições erradas, pois este termômetro apenas mediria 49°C, 50°C e 51°C, não percebendo as variações de +/- 1°C.

Essa seria uma informação pouco útil e que não nos permite medir a variação requerida no processo.

Por outro lado, com um termômetro com resolução de 0,1°C poderíamos medir muitos pontos a mais: 49,1°C, 49,2°C, 49,3°C, 49,4°C,49,5°C, 49,6°C, 49,7°C, 49,8°C, 49,9°C, 50,0°C, 50,1°C, 50,2°C, 50,3°C, 50,4°C, 50,5°C, 50,6°C, 50,7°C, 50,8°C, 50,9°C, 51,0°C, ou seja, mais de 20 resultados possíveis e uma informação útil para conhecermos a variação do processo.

É recomendável, por isso, que a resolução do instrumento de medição seja de 1/ 10 da tolerância do processo. Assim, para o exemplo utilizado, temos uma tolerância do processo de +/- 1°C e a resolução recomendada seria de 1/10 = 0,1°C.

2 – FAIXA DE MEDIÇÃO

A faixa de medição é aquela que um instrumento é capaz de medir com um nível de precisão informado pelo fabricante, correspondente ao intervalo entre a carga máxima e mínima.

A carga máxima (Max) é a capacidade máxima de pesagem de uma balança, enquanto a carga mínima (Mín) é o valor da carga abaixo do qual os resultados das pesagens podem estar sujeitos a um erro relativo excessivo, acima de 5% da carga.

A seleção do instrumento de medição com a faixa de medição adequada é essencial para medirmos com um nível de erro e precisão adequados.

Para exemplificar, vamos supor que na formulação de um produto seja necessário adicionar 10 g de um determinado conservante e que se utilize uma balança com indicação de 3 kg, porém cujo fabricante informe que a faixa de medição vai de 0,02 a 3 kg, conforme descrito na etiqueta/ tag da placa de identificação do equipamento a seguir.

Temos, então, que o fabricante da balança garante uma precisão dentro da faixa de 20 g até 3kg. Contudo, abaixo da faixa de 20g o erro relativo pode ser considerado significativo, assim não seria apropriada para medir 10g.

É recomendável que o valor a ser medido esteja entre 10% a 90% da faixa de medição do instrumento, por isso, para medir os 10g, deve-se buscar uma balança cuja faixa de medição seja, então, de 0,2 a 200 g.

3 – PRECISÃO

Precisão de medição é o grau de concordância entre indicações ou valores medidos, obtidos por medições repetidas, no mesmo objeto ou em objetos similares, sob condições especificadas.

A precisão de medição é geralmente expressa numericamente por características como o desvio-padrão, a variância ou o coeficiente de variação, sob condições especificadas de medição.

As “condições especificadas” podem ser, por exemplo, condições de repetibilidade, de precisão intermediária ou de reprodutibilidade.

A precisão de medição é utilizada para definir a repetibilidade de medição, a precisão intermediária de medição e a reprodutibilidade de medição.

4 – EXATIDÃO

Já a exatidão de medição é o grau de concordância entre um valor medido e um valor verdadeiro de um mensurando.

A exatidão de medição não é uma grandeza e não lhe é atribuído um valor numérico, então uma medição é dita mais exata quando fornece um erro de medição menor.

A figura a seguir exemplifica a diferença entre exatidão e precisão, na qual várias medidas são feitas e os resultados plotados. Considerando que o centro do alvo seja o valor convencional de certa grandeza e que os pontos pretos sejam as medições realizadas, quanto mais próximo do centro do alvo, mais exata é a medição.

Pode-se observar que a precisão não é uma medida única, mas está associada a um processo ou conjunto de medidas.

Normalmente, em qualquer conjunto de medições realizadas pelo mesmo instrumento no mesmo componente, as medições individuais são distribuídas em torno do valor médio e a precisão é a concordância desses valores entre si.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

  1. Quando for escolher instrumentos de medição, segundo as necessidades de cada processo, levando em consideração os riscos, considere uma análise crítica para avaliar se o instrumento atende plenamente as necessidades, considerando de forma balanceada a resolução, a faixa de medição necessária, assim como a precisão e a exatidão do instrumento;
  2. Lembre-se de que esta análise leva em consideração um determinado instrumento de medição para um determinado monitoramento de processo, portanto, se o equipamento por algum motivo estiver inviável e for ser utilizado um outro, esta análise crítica precisa ser refeita, para avaliar se o novo instrumento também atende plenamente às necessidades do processo.

Não deixe de ler também:

  1. Requisitos e exigências da etiqueta de calibração na indústria de alimentos.
  2. Qual a diferença entre calibrar, verificar e ajustar?

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Qual a diferença entre calibrar, verificar e ajustar?

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E então, você vai calibrar, verificar ou ajustar seus instrumentos?

Estes termos geram alguma confusão, mas são simples e distintos.

Ter instrumentos de medição confiáveis na hora de realizar uma medição é fundamental. Sem isso, torna-se impossível garantir efetivamente o controle sobre os processos industriais, o que pode se revelar um risco, por exemplo, ao controlar o binômio tempo x temperatura num PCC de esterilização, ao pesar um aditivo ou conservante, ao analisar Aw, pH ou tantos outros exemplos possíveis.

Por isso, este tema é tratado em diversas normas de gestão, como no requisito 7.1.5.2 sobre “rastreabilidade de medição” da ISO 9001 sobre gestão da qualidade e no requisito 8.7 sobre “controle de monitoramento e medição” da ISO 22000 para segurança dos alimentos, como visto no artigo “Quando a calibração é obrigatória na FSSC 22000?“.

Em ambas as Normas, está dito que equipamentos de monitoramento e medição devem ser calibrados ou verificados em intervalos especificados ou antes do uso, assim como ajustados ou reajustados, quando necessário.

CALIBRAÇÃO

Calibração é um procedimento experimental por meio do qual são estabelecidas, sob condições específicas, as relações entre os valores indicados por um instrumento de medição ou sistema de medição ou valores representados por uma medida materializada ou um material de referência e os valores correspondentes das grandezas estabelecidos por padrões.

Como exemplos, calibrar permite estabelecer a relação entre temperatura e tensão termoelétrica de um termopar acoplado a um pasteurizador ou a um esterilizador; uma estimativa dos erros sistemáticos de um manômetro um em secador a vácuo; o valor efetivo de uma massa padrão numa pesagem; a dureza efetiva de uma placa “padrão de dureza”; o valor efetivo de um “resistor padrão”.

O resultado de uma calibração permite tanto o estabelecimento dos valores do mensurando para as indicações, como a determinação das correções a serem aplicadas.

O ato de calibrar também pode determinar outras propriedades metrológicas como, por exemplo, os efeitos das grandezas de influência sobre a indicação ou o comportamento metrológico de sistemas de medição em condições adversas de utilização (em temperaturas elevadas ou muito baixas, na ausência de gravidade, sob radiação nuclear, etc.).

O resultado da calibração geralmente é registrado em um documento específico denominado certificado de calibração ou, algumas vezes, referido como relatório ou laudo de calibração, no qual consta o registro oficial de que aquele determinado equipamento foi devidamente calibrado.

Este tipo de documento pode ser representado por um diagrama, declaração, curva ou tabela, sendo que o objetivo é fornecer ao responsável pelo equipamento os erros de medição constatados durante o experimento, permitindo que, em posse destas informações, seja possível corrigi-los no momento em que for utilizá-los, o que torna seu uso mais confiável.

Frequentemente, como seu principal resultado, apresenta uma tabela ou gráfico contendo para cada ponto medido ao longo da faixa de medição, estimativas de:

  1. Correção a ser aplicada;
  2. Incerteza associada à correção.

O certificado de calibração, contudo, apresenta várias outras informações acerca do desempenho metrológico do sistema de medição analisado e descreve claramente os procedimentos realizados, tema que foi bem explorado e que pode ser aprofundado no conjunto de artigos a seguir:

  1. Calibração e análise crítica de certificados – Parte I
  2. Calibração e Análise Crítica de Certificados – Parte II
  3. Calibração e análise crítica de certificados – Parte III
  4. Calibração e análise crítica de certificados – Parte IV
  5. Calibração e Análise Crítica de Certificados – Parte V
  6. Calibração e Análise Crítica de Certificados – Parte VI
  7. Calibração e Análise Crítica de Certificados – Parte VII
  8. Calibração e análise crítica de certificados – Parte VIII
  9. Calibração e Análise Crítica de Certificados – Parte IX

Em função dos resultados obtidos, o desempenho do sistema de medição pode ser comparado com aquele constante nas especificações de uma norma técnica ou outras determinações legais, e com isso, um parecer de conformidade pode ser emitido.

Qualquer entidade pode calibrar instrumentos, desde que disponha dos padrões rastreáveis e pessoal competente para realizar o trabalho.

VERIFICAÇÃO

Calibrar completamente um sistema de medição demanda um volume razoável de trabalho e seu custo pode se tornar proibitivo, se for realizado com muita frequência, além de poder ser desnecessário numa análise contundente de custo x benefício x riscos.

Por isso, para garantir a confiabilidade das medições em intervalos de tempos menores é utilizada uma versão simplificada da calibração na metrologia científica e industrial denominada verificação ou checagem intermediária. Esta é, muitas vezes, realizada pelas próprias empresas, requerendo, no entanto, pessoas competentes e treinadas, além de padrões rastreáveis.

Por exemplo, uma empresa calibra sua balança que é utilizada para pesar um determinado conservante utilizado numa formulação a cada 6 meses, mas semanalmente ela mesma, em posse de massas padrão rastreáveis próximas aos pontos de medição frequentemente utilizados, faz uma verificação, ou seja, verifica se a tal balança está identificando corretamente o peso da referida massa.

Se numa destas verificações, alguma anomalia for detectada, é dado um alerta e o instrumento segue para uma avaliação técnica a fim de ser reajustado e calibrado, mas não haverá 6 meses de potenciais medições erradas, pois semanalmente se verifica, reduzindo significativamente os riscos entre calibrações.

Lembramos que quando um erro destes ocorre, são necessárias ações não só sobre o instrumento de medição para que volte a fazer leituras corretas, mas também nos produtos potencialmente não conformes ou inseguros que porventura tenham sido gerados.

A verificação ou checagem intermediária é, portanto, o fornecimento de evidência objetiva de que um dado item satisfaz requisitos especificados, baseada em padrões rastreáveis.

O procedimento de checagem intermediária é concebido para ser, ao mesmo tempo, de fácil aplicação e eficaz, e consiste em quantificar os erros de medição do sistema em apenas alguns pontos ao longo de sua faixa de indicação, que são comparados aos limites de especificação ou aos resultados das últimas calibrações.

AJUSTE

O ajuste de um sistema de medição, por sua vez, é uma operação corretiva destinada a fazer com que um instrumento de medição tenha desempenho compatível com o seu uso, ou seja, é uma espécie de “regulagem interna” dos sistemas de medição, que visa fazer coincidir, da melhor forma possível, o valor indicado no sistema de medição com o valor correspondente do mensurando.

O ajuste pode ser automático, semiautomático ou manual e deve ser realizado, obviamente, por técnico capacitado especializado no assunto.

Diversos tipos de ajuste de um sistema de medição incluem o ajuste de zero, o ajuste de defasagem (às vezes chamado ajuste de “offset”) e o ajuste de amplitude (às vezes chamado ajuste de ganho).

O ajuste de um sistema de medição não deve ser confundido com calibração. Calibrar é um pré-requisito para o ajuste. Após um ajuste de um sistema de medição, tal sistema geralmente deve ser recalibrado.

Alguns exemplos de ajustes:

  1. Alteração do fator de amplificação (sensibilidade) de um sistema de medição por meio de um potenciômetro interno;
  2. Regulagem do zero de um manômetro por meio de um parafuso interno;
  3. Colocação de uma “tara” em um peso-padrão;
  4. Alteração do fator amplificação (sensibilidade) de um medidor de forças elétricas por meio de um dispositivo interno ao equipamento.

Espero que tenham gostado. Deixem seu comentários e compartilhem com os amigos!

5 min leituraE então, você vai calibrar, verificar ou ajustar seus instrumentos? Estes termos geram alguma confusão, mas são simples e distintos. Ter instrumentos de medição confiáveis na hora de realizar uma […]

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A gordura interesterificada é uma alternativa saudável à gordura trans?

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O programa Replace Trans Fat da Organização das Nações Unidas (ONU) é um incentivo em nível global para a eliminação de gordura trans nos alimentos até 2023. No segundo semestre de 2020, a ONU relatou que mais de 58 países já haviam determinado o seu plano de ação mediante leis que entram em vigor até o final deste ano. A gordura interesterificada tem sido a alternativa mais amplamente utilizada para eliminar ou reduzir o uso industrial de gordura trans. Mas quais são suas características e potenciais efeitos na saúde humana?

Sabe-se que o consumo de gorduras trans está cientificamente associado à doença arterial coronariana, levando ao infarto e AVC, o que causa por volta de 500 mil mortes por ano ao redor do mundo, como citado pela ONU e PAHO (Pan American Health Organization). Os ácidos graxos trans elevam os níveis de colesterol LDL, conhecido como colesterol ruim, além de reduzir o HDL, conhecido como colesterol bom.

No Brasil, a RDC 332, da Anvisa, publicada em dezembro de 2019, e alterada em junho de 2021, determinou que a partir de 1º de julho de 2021 os óleos refinados industriais não podem exceder 2g de gordura trans/100 gramas de gordura total, bem como nos alimentos destinados ao consumidor final ou aos serviços de alimentação. Segundo Anselm Hennis, diretor da PAHO, tal regulamento melhorará a saúde e o bem-estar da população. O Brasil junta-se ao grupo de países nas Américas que já eliminaram o uso de gorduras trans em alimentos: Estados Unidos, Canadá, Chile e Peru.

A substituição da gordura trans tem sido possível pelo uso de óleos refinados por processos diferentes da hidrogenação parcial ou mesmo pelo uso de outras gorduras. Alimentos ultraprocessados como biscoitos, sorvetes e margarinas têm sido fabricados com o uso de gordura interesterificada. Apesar de surgir como uma alternativa às gorduras trans, estudos apontam que a interesterificada também pode aumentar os níveis de LDL, com efeitos mais acentuados observados em indivíduos hipercolesterolêmicos do que em indivíduos saudáveis.

A Sociedade Brasileira de Óleos e Gorduras publicou recentemente um estudo sobre o impacto da gordura interesterificada (SGBOG Informa 08 Edição 2021). No processo de interesterificação ocorre um rearranjo do posicionamento dos ácidos graxos nos triglicerídeos, combinando uma gordura de alto ponto de fusão (ácido graxo saturado) com um óleo vegetal de baixo ponto de fusão (ácido graxo insaturado). O resultado é uma gordura com propriedades plásticas, isenta de ácidos graxos trans.

Apesar das informações sobre o impacto da gordura interesterificada serem limitadas, há indicações de que os efeitos negativos (como acúmulo de colesterol ruim, além do aumento de açúcar no sangue) podem estar relacionados à proporção da mistura de óleo e gordura utilizados no processo de interesterificação.

Segundo a American Society for Nutrition, o uso da gordura interesterificada é uma alternativa viável para eliminação da gordura trans, tanto pelo processo de produção (químico ou enzimático), quanto por suas funcionalidades (ponto de fusão, estabilidade à oxidação, entre outras), mas os estudos atuais ainda não determinaram com certeza os riscos à saúde, existindo lacunas importantes a serem avaliadas.

Por um lado, o setor industrial adapta seus produtos e processos sem gordura trans, e por outro, cabe aos consumidores permanecerem alertas e acompanhar os estudos referentes a todas as alternativas disponíveis.

Leia mais sobre os assuntos relacionados a esse aqui na Food Safety Brazil:

Alegações na rotulagem de alimentos: o que pode e o que não pode?

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Myxosporidium, parasitas de peixes: qual o risco para a segurança do alimento?

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Talvez você já tenha encontrado pequenas partículas de cor escura, localizadas dentro de filés de peixe, principalmente, mas não apenas, em filés de pescada argentina (hake) capturada nas águas oceânicas do Atlântico ou Pacífico ao sul do continente. São protozoários parasitas Myxosporidium, que afetam a aparência dos filés, entre outros atributos, assunto que iremos desenvolver aqui de forma abreviada.

“Os Myxosporidium são considerados o grupo mais importante de protozoários parasitas que afetam os peixes.”

Dentro deste grupo está a espécie Kudoa rosenbuchi, que é facilmente encontrada em filetes de pescada argentina (Merluccius hubbsi).

Esses parasitas produzem histólise nas fibras musculares dos peixes (atividade proteolítica e deteriorante), afetando a textura da carne, conferindo-lhe um aspecto leitoso, conhecido internacionalmente como milkness. Os peixes são infectados pela ingestão de esporos maduros do parasita ou pela ingestão de outros peixes parasitados.

Os parasitas formam cistos nos filés, causando deterioração em sua qualidade. Amaciam a textura, além de serem visíveis no interior da carne. A princípio apresentam uma cor clara, quase branca e depois devido a uma reação de defesa do organismo dos peixes, passam a ter uma cor escura que os torna facilmente visíveis contra a luz de ambos os lados.

Outras espécies de peixes, como Merluccius productus e Merluccius gayi, às vezes apresentam altas concentrações de myxosporidium, o que os faz perder seu valor comercial. Verificou-se que a deterioração da musculatura já começa nos peixes vivos e se acentua após sua captura, quando cessa a resposta defensiva nos peixes (fase post-mortem).

“A infestação começa intracelularmente com os esporos dentro da célula muscular e então invade o espaço extracelular, causando a reação imunológica do hospedeiro”

É aí que começa a formação do cisto, que ficará visível como uma mancha escura de tamanho de um grão de arroz.

Uma vez identificados, os cistos podem ser totalmente removidos com a ponta da faca, na hora do corte dos filés. Geralmente estão agrupados 2 ou mais cistos em um único local, ocupando com maior frequência a área proximal do filé (próximo à cabeça do peixe), embora também possam ser observados na parte distal do filé, em menor quantidade e com menos frequência. Os filés parasitados geralmente apresentam entre 5 e 15 parasitas, embora existam filés com inúmeros parasitas.

A deterioração do filé é acentuada rapidamente quando não são realizadas as devidas medidas de preservação, como manter a temperatura próxima a 0°C.

Qual é o impacto na segurança de alimentos?

A possibilidade de induzir uma reação alérgica em pessoas sensíveis às proteínas do parasita Myxosporidium. Deve-se observar que a alergia se deve às proteínas do parasita e não às proteínas do peixe. Exceto por esse motivo, bifes bem cozidos não representam risco para a saúde do consumidor.

Fontes consultadas:

https://aquadocs.org/bitstream/handle/1834/2010/Rev%20Invest%20Desarr%20Pesq%207%20105-112.pdf?sequence=1

https://www.fbbva.es/microsite/alergiasfbbva/otras-enfermedades-alerástica/39-alergia-al-anisakis-simplex/index.html

https://foodsafetybrazil.org/parasita-anisakis-potencial-perigo-do-sashimi/

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Microplásticos e nanoplásticos em alimentos: como o apoio à ciência auxilia profissionais a avaliar um novo perigo

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Os microplásticos e nanoplásticos em alimentos foram mencionados pela primeira vez como uma questão potencial de segurança de alimentos pela EFSA em um de seus grupos internos de discussões técnicas (EFSA’s Emerging Risks Exchange Network), que é composto por especialistas nacionais de segurança de alimentos. Com base neste trabalho, o Instituto Federal Alemão de Avaliação de Riscos (BfR) solicitou uma análise pela EFSA e em 2011, o Comitê Científico da EFSA publicou guias sobre nanociências e nanotecnologias na cadeia produtiva de alimentos.

Mas o que são microplásticos e nanoplásticos?

A EFSA define microplásticos como pedaços de compostos plásticos que variam de tamanho entre 0,1 a 5000 micrometros (µm), ou de até 5 milímetros para se ter uma melhor ideia.

Há dois tipos de microplásticos:

– microplásticos primários: são plásticos que foram originalmente fabricados para serem desse tamanho

– microplásticos secundários: têm origem na fragmentação de itens maiores, por exemplo, detritos plásticos.

Já os nanoplásticos são pedaços que medem entre 0,001 a 0,1 µm (ou seja, de 1 a 100 nanômetros).

 E qual o real impacto global dos resíduos plásticos nos mares, rios, lagos etc. na segurança dos alimentos?

Dr. Peter Hollman e um grupo de trabalho do ‘Painel sobre Contaminantes na Cadeia de Alimentos (CONTAM)’ da EFSA (European Food Safety Authority) publicaram um estudo sobre partículas microplásticas e nanoplásticas em alimentos. Nesse estudo a EFSA analisou exaustivamente a literatura existente sobre este tópico e revelou que os nanoplásticos requerem atenção especial já que foram identificadas lacunas de dados, conhecimentos, necessidades de recomendações futuras e pesquisas para combatê-los.

Não é novidade para ninguém que existem flutuando nos oceanos de nosso planeta uma grande quantidade de plásticos do tamanho de um país como a França e que esse lixão plástico está constantemente se degradando nos mares em partículas cada vez menores.

Devido a isso, a principal preocupação em relação aos microplásticos e nanoplásticos está no ambiente marinho. Porém, os peixes apresentam altas concentrações principalmente em seus estômagos e intestinos, esses são geralmente removidos e os consumidores não são expostos a eles de forma direta. Já em crustáceos e moluscos bivalves, como ostras e mexilhões, os seres humanos ingerem seu trato digestivo e podem ter alguma exposição a eles. Os microplásticos e nanoplásticos também foram encontrados em mel, cerveja e sal de cozinha.

Geralmente, quando as partículas plásticas se decompõem, elas ganham novas propriedades físico-químicas, aumentando o risco do seu efeito tóxico sobre os organismos.

Uma preocupação potencial em relação aos microplásticos e nanoplásticos é que eles estão entrando na cadeia alimentar através das altas concentrações de poluentes como: bifenilos policlorados (PCBs) e hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (PAHs) que podem se acumular nos microplásticos, bem como os resíduos de compostos utilizados em embalagens como o bisfenol A (amplamente conhecido como BPA).

Os efeitos desses químicos são especialmente problemáticos na fase de decomposição. Aditivos como ftalatos e bisfenol A (BPA) lixiviam-se das partículas plásticas. Estes aditivos são conhecidos por seus efeitos hormonais e podem perturbar o sistema hormonal tanto de vertebrados quanto de invertebrados. Além disso, partículas de tamanho nanométrico podem causar inflamação, atravessar barreiras celulares e até mesmo atravessar membranas altamente seletivas como a barreira hematoencefálica ou a placenta. Dentro da célula, elas podem desencadear mudanças genéticas e reações bioquímicas, entre outras coisas. Alguns estudos sugerem que, após o consumo de microplásticos em alimentos, estas substâncias podem se transferir para os tecidos. Portanto, é importante estimar a sua ingestão média.

Entretanto, a contaminação não é focada somente nos mares. Estudos estimam que um terço de todos os resíduos plásticos vão parar nos solos ou na água doce. Ela pode se originar de outras fontes de contaminação. Ela também pode vir através do solo, já que é muito baixa a porcentagem de plástico que descartamos diariamente e que é reciclado ou incinerado em instalações de resíduos para a produção de energia. A grande maioria dele acaba em aterros e pode levar até 1.000 anos para se decompor. Por lixiviação, essas substâncias potencialmente tóxicas contaminam o solo e a água. Os microplásticos podem até ser encontrados na água da torneira.

Pesquisadores alemães já alertaram que o impacto dos microplásticos nos solos, sedimentos e água doce é muito maior do que a poluição por microplásticos marinhos – estimada de quatro a 23 vezes maior, dependendo do local.

A contaminação também pode vir através de estações de tratamento de efluentes. Como subprodutos desse esgoto são frequentemente aplicados na agricultura como fertilizante, essas milhares de toneladas de microplásticos acabam na superfície terrestre anualmente.

Além disso, um artigo do Science Daily menciona que as superfícies de pequenos fragmentos de plásticos podem carregar organismos causadores de doenças e atuar como vetor de doenças no meio ambiente.

Conclusão

Falta uma definição inequívoca e internacionalmente reconhecida para microplásticos e nanoplásticos.

A EFSA analisou exaustivamente a literatura existente sobre este tópico e concluiu que não existem dados suficientes sobre a ocorrência, toxicidade e destino – o que acontece após a digestão – destes materiais para uma avaliação completa dos riscos. Por exemplo: ainda não há informações sobre o efeito do processamento de alimentos contendo microplásticos.

Os métodos analíticos disponíveis são limitados para identificação e quantificação de microplásticos. Não há métodos disponíveis para nanoplásticos.

Os dados disponíveis sobre a ocorrência de microplásticos em alimentos são limitados a peixes, bivalves, crustáceos, mel, cerveja e sal. Não há dados sobre nanoplásticos em alimentos.

Entretanto, sabemos que os nanoplásticos podem ser produzidos durante a fragmentação de detritos microplásticos e podem originar-se de material de engenharia utilizado, por exemplo, em processos industriais.

Sabemos que as nanopartículas projetadas (de diferentes tipos de nanomateriais) podem entrar nas células humanas, portanto trazer consequências para a saúde humana. Mas são necessárias mais pesquisas e dados para mensurar esses efeitos a longo prazo.

A EFSA ainda não estimou uma ingestão média diária para nanoplásticos, mas mesmo com os dados limitados disponíveis, estimou que uma porção de mexilhões (225g) poderia conter 7 microgramas de microplásticos. Mesmo que esta quantidade de material contivesse a maior concentração de PCBs ou BPA jamais medida, por exemplo, faria uma pequena contribuição para a exposição global a estas substâncias: aumentaria a exposição a PCBs em menos de 0,006%, PAHs em menos de 0,004% e bisfenol A em menos de 2%. Mas este é o pior cenário possível.

Somente microplásticos menores que 150 µm podem translocar (definição genética = mutação em que um fragmento do cromossomo é deslocado para outra posição dentro do genoma) através do epitélio intestinal causando exposição sistêmica. Espera-se que a absorção desses microplásticos seja limitada (menor que 0,3%).

– Somente a menor fração (tamanho < 1,5 µm) pode penetrar profundamente nos órgãos.

Concluindo, ainda é muito cedo para afirmar que os microplásticos e nanoplásticos sejam prejudiciais aos consumidores, mas parece improvável pelo menos para os microplásticos. São necessárias mais pesquisas e dados, sendo importante estimar a ingestão média para seres humanos.

As recomendações da publicação do Dr. Peter Hollman podem ajudar a comunidade científica a construir um quadro mais claro. A pesquisa deve gerar dados sobre a ocorrência de microplásticos e especialmente nanoplásticos em alimentos, seu destino no trato gastrointestinal e sua toxicidade. O conhecimento sobre a toxicidade dos nanoplásticos é particularmente necessário porque estas partículas podem penetrar em todos os tipos de tecidos e eventualmente acabar em células. O estudo também propõe métodos analíticos padronizados para ajudar no monitoramento.

Vejam a importância de se ter entidades presentes, atuantes e sérias no compromisso com a segurança de alimentos para dar suporte aos órgãos públicos e consumidores, assim como a EFSA.

O investimento governamental ou privado em pesquisadores e na ciência abre a oportunidade para a discussão dessas e de outras questões entre especialistas em segurança de alimentos e de outras disciplinas científicas, ajudando na análise e a enxergar os problemas de diferentes perspectivas. Isso permite a nós, profissionais do setor, ter uma visão mais adequada dos problemas emergentes de segurança de alimentos, dando-nos mais subsídios técnicos e científicos para uma adequada tomada de decisão.

Autor convidado: Maurício Kamei

Imagem: Climainfo.org.br

Referências:

(1) EFSA: Microplastics and nanoplastics in food – an emerging issue | European Food Safety Authority (europa.eu)

(2) Programa ambiental das Nações Unidas: Plastic planet: How tiny plastic particles are polluting our soil (unep.org)

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Radioatividade do bem: entenda a técnica de irradiação de alimentos

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A radioatividade é um tema rodeado de polêmica e insegurança, principalmente devido aos acidentes e seus impactos que marcaram a história (Chernobyl – 1986; Goiânia – 1987; Fukushima – 2011). O acidente em Chernobyl, por exemplo, ocasionou o consumo de alimentos contaminados até mesmo no Brasil, após a importação de toneladas de produtos vindos da Europa naquela época. Outro caso é a contaminação de mel nos Estados Unidos até os dias de hoje, 70 anos depois da realização dos testes de armas nucleares durante a Guerra Fria.

A exposição a altos índices de radioatividade está associada a manifestação da síndrome aguda da radiação, além do desenvolvimento de câncer. Diante disso, muitas pessoas associam radioatividade a algo negativo e prejudicial, desconhecendo seu uso na medicina e na área de alimentos, como é o caso da técnica de irradiação. Afinal, como ela funciona e quais os riscos associados ao consumo do alimento irradiado?

Como descrito pela colunista Cíntia Malagutti aqui no blog, a radioatividade é a emissão espontânea de partículas do núcleo do átomo instável em busca de estabilidade. Ela se manifesta como raios alfa, beta e gama, apresentando diferentes potenciais de penetração.

A aplicação da química nuclear na área alimentícia se dá pela exposição de alimentos à radiação a partir de uma fonte radioativa (normalmente césio-137 ou cobalto-60). Esta exposição tem como objetivo aumentar o tempo de conservação dos alimentos por meio de alterações no processo fisiológico dos tecidos vegetais ou no controle de microrganismos (pasteurização a frio ou esterilização), que pode ocorrer com o produto já embalado.

Segundo Luiz Eduardo Rangel, assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), a técnica é ainda pouco utilizada no Brasil e pode ser uma estratégia para obter maior competitividade e sustentabilidade, reduzindo a perda de produtos ao longo de toda a cadeia.

Esse processo é conduzido sem promover o contato direto do alimento com a fonte radioativa, e em doses pequenas incapazes de provocar reações em nível atômico. Dessa maneira, um alimento irradiado não se torna radioativo e, portanto, o seu consumo não apresenta risco radiológico. Já um alimento contaminado por radiação é aquele que entrou em contato e absorveu o material radioativo. Neste caso, o seu consumo representa um grande perigo à saúde.

Dada a relevância da técnica de irradiação na área de alimentos, tal alternativa é uma prática comum ao redor do mundo há alguns anos. Na década de 80, a agência Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos já a havia regulamentado para uso em diversos alimentos, incluindo no controle de Trichinella spiralis em carne suína.

No Brasil, a irradiação em alimentos é regulamentada por três dispositivos legais:

Decreto-Lei nº 72.718 de 29 de agosto de 1973 – Primeiro momento em que se estabeleceu normas gerais sobre o uso da radioatividade pela técnica de irradiação ionizante para preservação de alimentos.

RDC 21 de 26 de janeiro de 2001 (ANVISA) – Estabelece definições e aplicações da irradiação em alimentos. Um ponto muito relevante citado por esta norma é que a técnica não deve ser utilizada em substituição às boas práticas de fabricação ou agrícolas. A RDC 21 de 2001 traz ainda a obrigação de se indicar no rótulo ou em cartaz, no caso de venda a granel, que o alimento foi tratado por processo de irradiação.

Instrução Normativa nº 9 de 24 de fevereiro de 2011 (MAPA), que regulamenta a irradiação como medida fitossanitária na prevenção de introdução e disseminação de pragas quarentenárias.

Além delas, através da Portaria nº 66 de 30 de março de 2021, o MAPA estabeleceu o Grupo de Trabalho Técnico de avaliação de irradiadores multipropósito no Brasil para uso em produtos agropecuários.

Considerando as pesquisas, a FAO indica que as propriedades nutricionais e organolépticas dos alimentos irradiados são mantidas. Além disso, estes alimentos não apresentam risco toxicológico, radiológico ou mesmo microbiológico para o consumo humano.

Diante dos benefícios que a técnica de irradiação pode oferecer para a segurança de alimentos, conforme mencionado por Rangel no evento online realizado pela Amazul (Marinha do Brasil), uma das ações do governo federal é traçar estratégias de comunicação sobre tais vantagens, eliminando o preconceito que se posiciona como uma barreira para sua aplicação.

– Saiba mais sobre o tema: Perigos radiológicos foram levantados no seu plano HACCP?

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Mitos ou verdades em segurança de alimentos?

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Ao longo da sua carreira, você já deve ter ouvido “verdades” do tipo:

  • “Esse alimento é seco (ou desidratado) e a atividade de água é baixa, portanto não preciso me preocupar com perigos microbiológicos”;
  • Temos uma etapa de tratamento térmico onde todos os microrganismos são eliminados”, ou ainda,
  • Se não está na legislação, o perigo não existe”.

Eu já perdi as contas de quantas vezes as escutei e confesso que, em várias ocasiões, desisti de argumentar. Isso porque tais afirmações não podem ser tratadas como verdades absolutas e, se o fizermos, podemos incorrer em um tremendo engano! Não podemos simplesmente perpetuar essa percepção.

Algumas reflexões para nos ajudar:

    • O consumo de especiarias contaminadas com patógenos resultou em 14 surtos de doenças relatados de 1973 a 2010 em todo o mundo;
    • Em 2014-2015 na Suécia, 174 casos de intoxicação alimentar foram relatados devido à contaminação por Salmonella enteritidis de misturas de especiarias vegetais importadas;
    • Surtos causados por Bacillus cereus em pimenta e cúrcuma foram relatados na Dinamarca e na Finlândia em 2010 e 2011;
    • A pimenta branca e preta do Brasil foi colocada em detenção automática pelo CDC (FDA) desde 1986. A revisão dos dados da detenção em 2020 revelou que a contaminação da pimenta brasileira por Salmonella continua a ser um problema. O FDA tem uma avaliação de risco para patógenos em especiarias. Veja aqui;
    • Alemanha e Espanha relataram 6 casos de botulismo de origem alimentar associados ao consumo de peixe seco salgado em novembro-dezembro de 2016;
    • Em 2018, um trabalho publicado na revista Food Microbiology concluiu que o sal marinho contém muitos fungos com potencial para causar a deterioração dos alimentos, bem como alguns que podem ser micotoxigênicos. Veja aqui;
    • Alguns microrganismos, além de deteriorantes, também são patogênicos. Exemplos são Clostridium perfringens (causa comum de deterioração em carnes e aves) e Bacillus cereus (causa comum de deterioração de leite e creme);
    • B. cereus tem sido detectado em numerosas ervas desidratadas, especiarias, preparados para molhos, pudins, sopas, produtos de pastelaria e saladas;
    • O arroz (cru) pode conter esporos de Bacillus cereus, que não são destruídos pelo processo de cozimento;
    • Em produtos de panificação, esporos de Bacillus cereus podem sobreviver à etapa de forneamento – embora a temperatura do forno chegue a cerca de 200ºC, a temperatura no centro do produto não passa de 70ºC;
    • Fungos psicrotróficos, como Aspergillus e Penicillum, que além de deteriorantes são produtores de micotoxinas, já foram encontrados em nuggets de frango congelados (-5ºC), que passam por processo de fritura e cozimento industrial. A causa? A farinha usada para empanar os nuggets;
    • Estudos demonstram que o Geobacillus stearothermophilus, um microrganismo deteriorante, não apenas sobrevive mas pode se multiplicar durante as etapas de fermentação, torração e alcalinização do cacau. Veja aqui;
    • Legislação é apenas uma referência – o fato de um alimento não estar citado em alguma norma de padrão microbiológico, não significa que ele seja isento de perigos. Quando falamos da IN 60/2019 e dos padrões microbiológicos para alimentos prontos para o consumo, a própria ANVISA ressalta a importância de se considerar aspectos técnicos, legais, comerciais, operacionais, entre outros, de ingredientes, aditivos, matérias primas, insumos, pois cada processo pode interagir de forma diferente com o padrão microbiológico do alimento.

Portanto, quando insistimos nas questões do início deste texto e afirmamos que são sempre NA (não aplicável), estamos perpetuando mitos que foram construídos sem muito fundamento ou análise técnica mais abrangente – os exemplos acima mostram que nem sempre os NA são verdades! Um olhar mais apurado para a segurança de alimentos é essencial!

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