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Desafios e práticas de Segurança de Alimentos no abate e processamento de jacarés

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O abate e processamento de jacarés no Brasil é uma atividade única, que exige uma série de adaptações para garantir a segurança dos alimentos, diferentemente do que ocorre com o de animais mais comuns, como bovinos, suínos e aves. Nesta entrevista exclusiva com uma profissional especializada*, exploramos os principais desafios, práticas de higienização e regulamentações envolvidas no abate e processamento de jacarés, proporcionando uma visão detalhada desse processo que é ainda pouco conhecido.

A partir dessa conversa, fica claro que o controle rigoroso desde a criação até o abate é fundamental para assegurar a qualidade e a segurança microbiológica da carne de jacaré. As práticas adotadas, embora semelhantes em alguns aspectos às de outros abatedouros, têm suas particularidades, especialmente devido às características biológicas dos jacarés e às condições específicas de seu manejo.

1) Quais são os principais desafios relacionados à segurança de alimentos durante o abate de jacarés, especialmente em comparação com o abate de outros animais mais comuns como bovinos e aves?

Além de todos os itens habituais, determinados pelo plano de autocontrole para garantir a inocuidade do que é produzido, há vários desafios a serem encarados, ao se tratar da segurança de alimentos no abate de crocodilianos, alguns semelhantes e outros bastante distintos de outras espécies:

– Chegada dos animais: Os animais são transportados da criação ao frigorífico em veículos adaptados. Ao chegarem são acomodados em baias de espera, onde permanecem em jejum, apenas com água potável. Esse jejum pode durar entre 18 e 72h, pois os jacarés são pecilotérmicos e, em temperaturas mais baixas, o metabolismo dos jacarés cai, desacelerando o esvaziamento do trato gastrointestinal. A quantidade de trocas de água nessa baia também varia de acordo com a temperatura ambiente.

Foto 01 – Baia de espera

– Abate: Após a inspeção ante mortem os animais são liberados e encaminhados para uma baia de recepção, dentro da sala de abate, dotada de água hiperclorada, com teor de cloro entre 3 e 10 ppm.

Foto 02. Baia de recebimento sala de abate

Na sangria, quando ocorre o içamento do animal a nória, é feita a introdução de um algodão embebido em água hiperclorada na cloaca dos jacarés, também para evitar o extravasamento de conteúdo. É válido descrever aqui a forma como a sangria é realizada. Nos outros animais de açougue, a sangria ocorre no pescoço bilateral, para seccionar os grandes vasos da região como carótida e jugular. Já no caso dos crocodilianos, a sangria ocorre através de uma secção profunda na região occipital (“nuca”) de modo a cortar todos os plexos venosos locais. Após essa operação, ocorre a secção da medula e a desmielinização da medula, com estilete, com o objetivo de impedir com que os nervos sejam capazes de conduzir corretamente as mensagens para o cérebro e evitar movimentos espasmódicos contínuos.

Foto 03 – Sangria

– Temperatura ambiente: A temperatura da sala de abate é sempre inferior a 16ºC. No setor de miúdos e desossa, as temperaturas devem ser sempre de 14ºC ou menos.

Portanto, o grande desafio relacionado à segurança dos alimentos é padronizar as atividades de inspeção e autocontrole, uma vez que é um segmento que carece de maior arcabouço regulatório do MAPA. O grande esforço dos agentes privados que atuam nesse segmento é validar suas atividades junto aos órgãos de fiscalização sanitária.

2) Como é feita a inspeção sanitária dos jacarés antes e depois do abate, e quais são os principais patógenos de preocupação nesse tipo de processamento?

Os animais chegam ao frigorífico acompanhados do documento de transporte (o DTA – Documento de Trânsito Animal ou a GTA – Guia de Trânsito Animal, dependendo de cada caso de transporte) e com base neste documento serão elaboradas a escala de abate e as fichas de baia. O auditor fiscal federal agropecuário (AFFA), do SIF/MAPA, realiza a Inspeção Ante Mortem, observando a presença de lesões externas ou alterações comportamentais. Após isso, os animais são liberados para abate.

Na sala de abate as carcaças passam por inspeção, observando a presença de alterações ou lesões macroscópicas. Se existirem alterações na cor da carcaça, odor diferenciado, formação de abcessos, as carcaças devem ser encaminhadas ao DIF (Departamento de Inspeção Final) e avaliadas caso a caso, dando julgamento e destino adequado ao produto. Na inspeção de linha dos jacarés não há uma divisão pré-estabelecida em legislação, como acontece por exemplo no setor de aves, que possui inspeção de Linha “A” para “interna”, Linha “B” para “vísceras e miúdos” e Linha “C” para “externa”.

Foto 4 – Inspeção de carcaça
Foto 5 – Inspeção de miúdos

Os miúdos são avaliados junto à carcaça e depois de desprendidos vão para mesa, onde serão lavados, separados e inspecionados individualmente, sendo observada qualquer alteração em sua cor, tamanho, consistência ou espessura de cápsula.

Foto 6 – Escorrimento de miúdos após inspeção

Na legislação brasileira, não estão descritos achados pós mortem ou o destino das carcaças, parte de carcaças ou órgãos afetados. Dessa forma, qualquer situação diferente do esperado fisiologicamente, é avaliada com cuidado.

Foto 7 – Após liberadas, carcaças ficam na câmara de resfriamento.

Por serem abatidos animais criados em situação controlada e relativamente jovens (entre 24 e 36 meses), praticamente não há a ocorrência de helmintos. Dessa forma, o principal patógeno é a Salmonella spp que é um gênero de microrganismos que podem estar presentes normalmente no trato gastrointestinal dos jacarés, e geralmente não causam danos à saúde animal, mas pode haver consequências para saúde humana caso haja consumo de carne com presença de espécies ou sorotipos patogênicos.

3) Existem práticas específicas de higienização adotadas no processamento de jacarés para garantir a segurança do produto final? Como essas práticas se comparam com as usadas em outros tipos de abatedouros?

A higienização de um abatedouro frigorífico de crocodilianos é bastante semelhante à das outras espécies, de certa forma até mais simples. A coagulação sanguínea é mais rápida e a quantidade de gordura presente no abate é muito menor, comparadas às espécies dos animais de açougue como bovinos e suínos. Na sala de abate, durante as operações não são observadas grandes quantidades de sangue, conteúdo gastrointestinal e gordura, como de praxe na rotina de outros abatedouros, então o abate está sempre com uma aparência “limpa”. Essa situação operacional mais controlada facilita a remoção de matéria orgânica de superfície para melhor eficácia da etapa seguinte, a sanitização, em atividades de higienização pré-operacional.

Com relação ao APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle), a planta em que atuo possui apenas um PCC, em sua análise de risco, que é biológico e tem como objetivo controlar a contaminação cruzada do conteúdo gastrointestinal, biliar e da glândula paracloacal para a carcaça.

Foto 8 – Abertura da cavidade

Foto 9 – Toalete e PCC 1B (Contaminação Fecal, Biliar e da Glândula Paracloacal)

Foto 10 – Desossa

4) Como as condições de criação e manejo dos jacarés antes do abate influenciam a qualidade e a segurança microbiológica da carne?

Não há como dissociar a forma que esses animais foram criados da qualidade e segurança dessa carne.

Os jacarés são criados desde a incubação, com alimentação controlada e de qualidade, sem acesso a ambientes ou alimentos externos que possam trazer parasitas ou contaminantes. A água da criação é utilizada toda em ciclo fechado, sendo realizada a filtração natural e biorremediação. Dessa forma, são desenvolvidas bactérias positivas, que decompõem as toxinas e evitam a proliferação de microrganismos nocivos.

Outro aspecto importante é em relação ao bem-estar animal. Existe um rigoroso controle e procedimentos operacionais bastante rígidos que buscam manter o estado de bem-estar animal durante todo o processo, desde a incubação até o abate e isso afeta a qualidade e segurança da carne de maneira muito positiva.

Foto 11 – Ovoscopia
Foto 12 – Criação Controlada

5) Quais são as regulamentações específicas que orientam o abate e o processamento de jacarés no Brasil, e como elas garantem a segurança dos alimentos para o consumidor final?

Temos as legislações ambientais, que regulamentam e dispõem sobre a criação e a comercialização de partes e produtos, no geral específicas e adaptadas aos crocodilianos.

O maior desafio ocorre no processo de abate, pois não existem normas específicas e os crocodilianos são incluídos na categoria dos pescados. As orientações gerais para todas espécies em relação aos procedimentos de abate, inocuidade, bem-estar etc. são as que servem de parâmetros.

Nenhum dos produtos comestíveis é regulamentado, por isso são utilizadas as normas para pescado em sua obtenção.

Nota: as fotos anexadas ao texto supracitado foram cedidas pela profissional entrevistada, oriundas de seu arquivo pessoal, portanto deve-se respeitar os direitos autorais e de propriedade intelectual.

*Nossa entrevistada é Thaís Cristina Vieira Vianna, médica veterinária, especialista em Gestão de Segurança de Alimentos, Tecnologia de Carne e Derivados e Medicina Veterinária de Animais Silvestres. Responsável Técnica, responsável pelo Controle de Qualidade em abatedouros frigoríficos há 18 anos e consultora em entrepostos, açougues e supermercados há 12 anos. Atualmente é médica veterinária da Caimasul, abatedouro frigorífico de crocodilianos.

Leia também:

É necessário enxágue após sanitização das instalações e equipamentos em abatedouro frigorífico (aves)?

7 min leituraQuais são os maiores desafios no abate de jacarés? Descubra nessa entrevista inédita do blog sobre o assunto com uma profissional autoridade no abate de crocodilianos.

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Intoxicação alimentar em festa de formatura atinge mais de 400 pessoas

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No início de julho de 2024, foi noticiada a intoxicação alimentar de mais de 400 convidados que estiveram presentes no jantar da festa de formatura da Faculdade de Medicina de Taubaté, município do interior de São Paulo.

Os relatos são de sintomas gastrointestinais, como vômitos, diarreia, náuseas, febre, incluindo pessoas que precisaram ser hospitalizadas. Um dos pacientes foi diagnosticado com norovírus, que passou a ser o principal suspeito como agente causador destes casos de intoxicação alimentar.

A empresa responsável pelo buffet do jantar colocou-se à disposição para acompanhar as investigações do caso, mas já respondeu em suas redes sociais e inclusive pelo site Reclame Aqui, conforme trecho abaixo:

“Protocolo de Higiene e Segurança:
A XX (nome da empresa) segue rigorosos protocolos de higiene e segurança em todos os eventos que organiza. No caso específico deste evento, uma nutricionista acompanhou todo o manuseio dos alimentos, e o fornecedor de buffet adotou todas as medidas de higiene exigidas pelas normas sanitárias. No entanto, não podemos descartar a possibilidade de que o problema tenha ocorrido fora do nosso controle.”

Os norovirus foram os primeiros agentes virais ligados a doenças de sintomas gastrointestinais, mas por muito tempo sua relevância foi secundária, sendo o rotavírus o agente de maior importância nesses casos.

Não é o primeiro relato desse vírus como agente causador de doença gastrointestinal em pessoas em eventos. No inicio de 2009, houve relato de surto de gastroenterite durante um cruzeiro de luxo.

O norovirus é transmitido através de água ou alimentos contaminados e é um importante causador de gastroenterites no Brasil. Pode ser detectado por testes moleculares, tanto em fezes de pacientes acometidos com sintomas gastrointestinais quanto em água e alimentos, possíveis fontes de contaminação.

É um vírus com presença comum em locais confinados ou de contato próximo, como eventos, asilos, hospitais, isso porque a transmissão de pessoa para pessoa ocorre com facilidade e diferentemente de outros vírus, os adultos também podem ser acometidos.

Existem poucos relatos de intoxicação alimentar em festas de formatura, com completa investigação do caso e detecção dos agentes causadores. Fazendo uma busca, encontrei:

  • Formatura da 53ª turma de direito da Faculdade de Uberlândia, em 2006, causada por Salmonella, porém o buffet defendeu-se dizendo que as amostras foram coletadas quatro dias após o evento, sendo que no dia da festa os alimentos não se apresentavam contaminados;
  • Mais de 100 pessoas com sintomas de intoxicação alimentar na cidade de Icó, no Ceará, em 2020, sem que eu encontrasse o agente causador;
  • Formatura da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade de Londrina, em 1998, também sem maiores informações sobre o caso.

Eventos, festas ou mesmo o caso do cruzeiro são situações em que os alimentos são preparados em grande quantidade, nem sempre respeitando processos seguros de preparação, como temperatura de cozimento, higienização de superfícies e utensílios e por pessoas que podem não ter recebido todos os treinamentos relativos às boas práticas de manipulação de alimentos. Estes fatores são possíveis causas de contaminação de alimentos que podem provocar intoxicações alimentares.

Estudos completos desses casos, com participação da Vigilância Sanitária e de outras entidades, com investigação e isolamento do agente causador, seriam importantes formas de prevenção para que novos casos não aconteçam.

Imagem: Julia Kuzenkov

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Contaminação microbiológica em poços artesianos

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Um leitor compartilhou sua preocupação sobre a qualidade da água de um poço utilizado para consumo há quase quatro décadas. Recentemente, análises revelaram a presença de bactérias coliformes e aeróbicas na água coletada, gerando dúvidas sobre a segurança dessa água e sobre quais as medidas apropriadas para sanar o problema.

Causas da contaminação microbiológica em poços

A contaminação microbiológica em poços pode ocorrer devido a vários fatores:

  1. Infiltração de águas superficiais: Poços mal vedados permitem a entrada de água de superfície contaminada.
  2. Proximidade de fontes de poluição: Sistemas sépticos, como esgoto não tratado, podem se infiltrar no solo; resíduos animais e áreas agrícolas próximas podem contribuir para a contaminação.
  3. Formação ou presença de biofilmes: Bactérias podem formar biofilmes nas paredes do poço, ou nas telas, colunas de bombas e bombas, dificultando a erradicação da contaminação. As trepidações durante o bombeamento podem fazer com que os biofilmes se desloquem, liberando as bactérias coliformes.
  4. Manutenção inadequada: Falta de limpeza e desinfecção regular, ausência de manutenção e/ou troca de tubulações, conexões antigas ou inapropriadas, além de filtro sujos e bombas danificadas ou sujas, podem permitir o crescimento de bactérias.

Em muitos casos, será necessário realizar testes de integridade e perfilagem ótica (filmagem do interior do poço) para mapear os principais pontos de melhoria e identificar as causas da contaminação. Em um estudo realizado na Austrália, em 2015, foram identificadas fontes com maior incidência de contaminação. Os testes de integridade e a visualização por câmera revelaram que o poço revestido de aço estava em más condições, apresentando corrosão e laminação severas (figura C). Além disso, havia árvores nas proximidades (figura A), cujas raízes penetraram através de aberturas nas juntas de PVC (figura B).

 

A CETESB monitora a qualidade das águas subterrâneas em poços tubulares e nascentes desde 1990, no Estado de São Paulo. O relatório de 2023 indicou que 46,7% das amostras apresentaram não conformidades nos parâmetros microbiológicos, principalmente coliformes totais e E. coli.

Outra pesquisa, realizada no sul do Brasil para avaliar a qualidade e a segurança hídrica em áreas rurais e urbanas, analisou amostras de água coletadas entre 2013 e 2021. Os resultados mostraram que, nas áreas rurais, 77,54% das amostras de água estavam contaminadas por coliformes e 44,5% por Escherichia coli. Além disso, 20,95% das amostras contaminadas estavam correlacionadas com a quantidade de chuvas. Nas áreas urbanas, 10,95% das amostras continham coliformes e 2,53% continham E. coli, com 9,33% das amostras contaminadas associadas à precipitação. A presença de cloro residual livre foi verificada em 14,38% das amostras rurais e em 56,13% das amostras urbanas, indicando variações significativas na qualidade da água tratada.

 

Com estas informações, fica mais claro que a qualidade da água é comprometida pela ausência de manutenção, limpeza, fatores pluviométricos, alterações físico-químicas e pelo impacto de atividades humanas. Assim, ausência de tratamento de desinfecção no poço e na linha de distribuição são fatores críticos se a destinação é o consumo de água potável.

Tipos de poços e riscos associados

Os poços são classificados como fontes de água bruta e o sistema de captação dessas águas é chamado Solução Alternativa Coletiva (SAC) ou Individual (SAI), e essas águas geralmente não passam por tratamento, podendo não atender aos parâmetros de potabilidade para consumo humano conforme Portaria GM/MS nº 888/2021.

A qualidade da água varia conforme o tipo de poço e sua infraestrutura:

Poço “caipira” (cacimba/escavado): Comum em áreas rurais, perfurado manualmente e revestido com tijolos ou concreto. Capta águas superficiais, com profundidade média de 20 metros, sendo suscetíveis a contaminações sazonais e atividades industriais ou agropecuárias próximas.

Poço semi-artesiano: Capta água de reservas mais profundas (20 a 50 metros), utiliza bombeamento para extração e sistemas de filtragem de águas subterrâneas. Possui risco moderado de contaminação, dependendo da profundidade e localização.

Poço artesiano: Capta água de reservas muito profundas (50 a 2000 metros), geralmente sem necessidade de filtros. Apresenta baixo risco de contaminação microbiológica e física, sendo geralmente mais seguro para consumo.

É de suma importância seguir as normas brasileiras (ABNT) para construção de poços até mesmo para fazer melhorias e adequações necessárias. A ABAS (Associação Brasileira de Águas Subterrâneas) disponibiliza algumas recomendações, normas e entidades profissionais e técnicas no seu site para auxiliar nos requisitos e caminhos fundamentais para garantir a potabilidade da água.

Medidas de controle

A Portaria GM/MS nº 888/2021, assim como as legislações anteriores que disciplinavam os padrões de potabilidade da água no país – as já superadas Portaria Nº 2.914/2011 e Portaria de Consolidação Nº 5 (Anexo XX) – inclui a necessidade de um Plano de Segurança da Água -PSA (link) e o monitoramento por meio de análises laboratoriais periódicas para garantir a conformidade com os padrões de qualidade.  

Para prevenção da contaminação é importante adotar os controles mínimos:

  • Desinfecção: Implementar sistemas de cloração para eliminar contaminações microbiológicas e garantir o teor mínimo de cloro residual livre em toda a extensão do sistema de distribuição (reservatório e rede) e nos pontos de consumo.  A portaria descreve os controles no processo de desinfecção da água por meio da cloração e de outros agentes como cloraminação, isocianuratos, ozônio e luz ultravioleta para manancial subterrâneo e superficial
  • Limpeza de caixas d’água e reservatórios:  para evitar formação de biofilmes.
  • Manutenção preventiva:

(i)      Limpeza e desinfecção periódica do poço e reservatórios para evitar a formação de biofilmes. Técnicas de limpeza incluem a utilização de escovas mecânicas e a aplicação de soluções desinfetantes.

(ii)    Inspeções regulares para identificar e corrigir problemas, como rachaduras no revestimento, falhas na vedação, selos ou tampas danificadas, além de defeitos de construção que podem permitir a entrada de contaminantes como conduíte elétrico e outras conexões.

  • Monitoramento da qualidade: Realizar análises frequentes para monitorar a qualidade da água. O plano de amostragem deve incluir a definição dos pontos de coleta, número, frequência das coletas, parâmetros analisados, conforme a Diretriz Nacional do Plano de Amostragem da Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano. Importante reforçar que as análises devem ser realizadas por laboratórios especializados que apresentarem um programa de qualidade conforme a NBR ISO/IEC 17025.
  • Registro e documentação:  Todos os controles de limpeza, manutenção, construção e análises laboratoriais devem ser registrados e Procedimentos Operacionais Padronizados (POP) devem estar em documentos escritos.

Interpretação dos resultados 

A detecção de todos os microrganismos patogênicos na água é trabalhosa, demorada e cara. Por este motivo, seguir a análise conforme o artigo 27 da Portaria GM/MS nº 888/2021 assegura a potabilidade da água.

Embora as bactérias coliformes possam indicar problemas no poço, a amostra de água pode ter sido contaminada durante o processo de coleta. Além disso, é importante considerar que as torneiras de amostra podem ser um potencial fator de contaminação ou formação de biofilme. Avalie a substituição do ponto de coleta, que pode estar contaminado com biofilme.

Analisar o histórico dos resultados microbiológicos é fundamental, pois as coletas podem ter sido realizadas em diferentes épocas do ano e a contaminação pode ser sazonal, principalmente em épocas de muita chuva.

Coliformes Totais: são bactérias de vida livre encontradas no solo, água e plantas, sem necessariamente indicar poluição fecal. Usar apenas coliformes totais para avaliar a qualidade da água, especialmente de fontes individuais, pode superestimar os riscos à saúde.

– Água não tratada (água in natura): A presença de coliformes totais pode não estar relacionada diretamente à poluição fecal, mas serve como um alerta para possível contaminação da fonte;

– Saída do tratamento: O monitoramento de coliformes totais após a desinfecção avalia a eficiência do tratamento. A presença desses microrganismos indica a necessidade de medidas corretivas;

– Sistema de distribuição: Mesmo após um tratamento eficaz, a água pode se deteriorar durante a distribuição. A presença de coliformes totais no sistema de distribuição pode indicar falhas na desinfecção e na infraestrutura, necessitando de investigação e correção.

O artigo 27 ressalta que quando detectadas amostras com resultado positivo para coliformes totais, ações corretivas devem ser adotadas e amostras devem ser coletadas em dias imediatamente sucessivos até que revelem resultados satisfatórios. E para os sistemas de distribuição, as novas amostras devem incluir no mínimo uma recoleta no ponto onde foi constatado o resultado positivo para coliformes totais e duas amostras extras, sendo uma a montante e outra a jusante do local da recoleta.

Escherichia coli: o mais preciso indicador da contaminação da água por material fecal, sendo a sua presença um indicio da ocorrência de microrganismos patogênicos.

– Saída do tratamento: a presença na saída do tratamento, após o processo de desinfecção, explicita a deficiência desse processo empregado e exige medidas imediatas para correção do problema.

– Sistema de distribuição: a detecção de contaminação na água do sistema de distribuição é um sinal inequívoco de tratamento insuficiente da água ou de (re)contaminação fecal durante a distribuição dela. Nesse caso, tornam-se necessárias ações corretivas para o reestabelecimento da normalidade.

Nos casos de resultado positivo para Escherichia coli em manancial subterrâneo, o artigo 31 recomenda seguir o processo de desinfecção da água por meio da cloração ou outros agentes, garantindo os tempos de contato e as concentrações residuais na saída do tanque de contato em relação aos pH e temperatura conforme as orientações presentes na portaria. Após este tratamento corretivo, assegure a concentração residual mínima de cloro no sistema de distribuição (reservatório e rede) até o ponto de consumo.

Bactérias aeróbicas: Embora a maioria não seja patogênica, sua presença em grandes quantidades pode indicar condições que também favorecem a presença de patógenos.  A análise tem o objetivo de monitorar a eficiência de tratamento da ETA em sistemas SAC com mananciais superficiais, conforme o Artigo 29, se a média geométrica móvel dos últimos 12 meses for igual ou superior a 1.000 Escherichia coli/100mL.

Se a eficiência de remoção for inferior a 2,5 log (99,7%) em pelo menos quatro amostragens mensais, deve-se monitorar mensalmente cistos de Giardia spp. e oocistos de Cryptosporidium spp. durante os próximos 12 meses. O monitoramento de esporos de bactérias aeróbias pode ser interrompido ao iniciar o monitoramento de (oo)cistos.

Deve ser atendido também o padrão de turbidez para a garantia da qualidade microbiológica da água (artigo 28). O motivo é que o cisto de protozoário apresenta características (como dimensões e carga elétrica superficial) que o torna passível de ser removido em processos de clarificação da água, como coagulação, floculação, sedimentação e filtração. Tais indicações são referendadas por agências como a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos e a Organização Mundial da Saúde e têm sido incorporadas em padrões de potabilidade em diversos países, como Estados Unidos, Canadá, Nova Zelândia e Brasil

Diante das informações apresentadas, fica evidente que a qualidade da água de poços artesianos pode ser comprometida por diversos fatores. A detecção destas contaminações microbiológicas destaca a necessidade de medidas corretivas imediatas e de um monitoramento conforme estabelecido pela Portaria GM/MS nº 888/2021. É essencial realizar desinfecções adequadas, preferencialmente utilizando cloração, e assegurar a concentração residual mínima de cloro até o ponto de consumo. A implementação de um plano de segurança da água e a consulta a profissionais especializados são passos essenciais para a manutenção da qualidade e a prevenção de contaminações futuras.

Leia também:

– O que são coliformes fecais e quais os riscos à saúde [link]

– Coliformes Totais e Coliformes Termotolerantes: qual a diferença? [link]

– Uma estrela do “Hall da Fama” dos patógenos: Escherichia coli O157:H7 [link]

– Como saber se a água que estamos consumindo é segura? [link]

– Pseudomonas aeruginosa: um perigo na água mineral [link]

– Plano de segurança da água e a segurança de alimentos [link]

– Dicas para elaboração do POP de potabilidade da água [link]

– Análise da nova Portaria MS 888/21 sobre controle e vigilância da água para consumo humano [link]

– A água contaminada no Brasil e sugestões para reduzir o problema na indústria de alimentos [link]

Referências:

– CETESB: Relatórios de qualidade das águas subterrâneas  [link]

Plano de Segurança da Água- Ministério da Saúde  [link]

Revisão do status de risco de poços de abastecimento de águas subterrâneas por meio do rastreamento da fonte de contaminação por coliformes [link]

– Guidelines for drinking-water quality, 4th edition, incorporating the 1st addendum [link]

– Coliform bacteria in well-water [link]

– What to Do about Coliform Bacteria in Well Water [link]

– Be Well Aware – Protect and clean your well [link]

– Padrão de Potabilidade e Mudanças [link]

– Partes constituintes e tecnologias de tratamento de água [link]

Vigilância e Controle da água para consumo Humano- Ministério da Saúde [link]

Juliana Lanza é engenheira de alimentos, especialista em Gestão de Qualidade e Segurança de Alimentos (Unicamp) e pós-graduada em MBA de Gestão de Qualidade e Produção (FGV). Atuou em grandes indústrias na área de produção, controle e garantia da qualidade, e tem mais de 14 anos na implementação de sistemas de qualidade e auditorias.

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Diferenças e semelhanças da rotulagem do frango nos EUA e Brasil – parte 2 de 2

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No primeiro post deste tema (rotulagem do frango), apresentamos e discutimos as informações do painel principal. Dando continuidade, agora abordaremos o leiaute e as informações do painel secundário do produto estadunidense.

Abaixo segue a foto da embalagem (painel secundário) do produto Whole Young Chicken with Giblets – Frango Inteiro com Miúdos – que será alvo das explicações adiante. O produto escolhido possui selo Orgânico, Antibiótico Free, uso de tecnologia de “resfriamento por ar – air-chilled”, OGM Free, frangos criados ao ar livre, com dieta 100% de produtos de origem vegetal.

Figura 1 – Painel Secundário – Frango Resfriado (com miúdos) – Orgânico

Painel secundário rótulo EUA
Painel secundário rótulo dos EUA – arquivo pessoal

Rotulagem Nutricional (Nutrition Facts)

Com relação à rotulagem nutricional, com a vigência da RDC nº 429/2020, que dispõe sobre a rotulagem nutricional dos alimentos embalados, e da IN 75/2020 que estabelece os requisitos técnicos para declaração da rotulagem nutricional nos alimentos embalados, podemos comparar o modelo dos EUA com o brasileiro (Figura 2).

Figura 2 – Modelo de tabela nutricional brasileira (ANVISA)

Tabela nutricional brasileira – IN 75/2020  (Imagem: O Globo)

É possível notar semelhanças e diferenças de informações entre os países:

  Brasil EUA
Informação nutricional por 100g X
Informação nutricional pela porção (xxx g) X X
Valores diários (VD) fornecidos pela porção (xxx g) X X
Frase padrão de % VD para uma dieta de 2.000 calorias por dia ou similar X
Presença de outros micronutrientes como Vitamina D (mcg), Ferro (mg), Cálcio (mg) e Potássio (mg)

X
Presença de nutrientes como carboidratos (g), açúcar total (g), açúcar adicionado (g), proteínas (g), gorduras totais (g), gorduras saturadas (g), gorduras trans (g), fibras alimentares (g), sódio (mg) X X
Colesterol (mg) X
Porção em g X – (oz)

Instrução de Manejo Seguro (Safe Handling Instruction)

Na rotulagem do frango dos EUA, temos uma declaração sobre Food Safety, que traduzida para o português, ficaria da seguinte maneira:

Este produto foi preparado com carne e/ou carne de frango inspecionada e aprovada. Alguns produtos podem conter bactéria que poderia causar doença se o produto for manejado incorretamente ou cozido de forma inapropriada. Para sua proteção, siga essas instruções abaixo de manejo seguro:

  • Mantenha refrigerado ou congelado. Descongelar na geladeira ou em micro-ondas.
  • Mantenha a carne ou carne de frango crua separada de outros alimentos. Lave a superfície de trabalho (incluindo tábuas de corte), utensílios e mãos depois de tocar carne ou carne de frango crua.
  • Cozinhe bem.
  • Mantenha alimentos quentes aquecidos. Refrigere as sobras imediatamente ou descarte.

Para essa informação com instruções de uso, preparo e conservação, temos no Brasil, de forma semelhante, as informações dispostas pela RDC 13/2001 – Regulamento Técnico para Instruções de uso, preparo e conservação na rotulagem de carne de aves e seus miúdos crus, resfriados ou congelados.

Outra informação no rótulo sobre segurança dos alimentos que encontramos é:

Cook meat thoroughly (Cozinhe bem a carne): Cook product to an internal temperature of 185ºF as verified by a meat thermometer. (Cozinhe o produto a uma temperatura de 185ºF (ou 85ºC) verificada por um termômetro de carne.

Todavia, consultando um outro rótulo de carne de frango dos EUA, observado na mesma viagem, percebi que essa informação pode variar, conforme descrição abaixo:

Uncooked (crua): For safety, MUST be cooked to an internal temperature of 165ºF as measured by used of a meat thermometer. (Por segurança, DEVE ser cozida até a temperatura interna de 165ºF (ou aproximadamente 74ºC) conforme medido pelo uso de um termômetro de carne).

Sobre essa instrução, não temos no Brasil, para rotulagem do frango, nenhuma orientação obrigatória específica sobre a temperatura interna segura para o consumo. A empresa pode até colocar isso no rótulo, mas é facultativo. A referida declaração feita nos EUA, em minha opinião, tem uma correlação direta com o HACCP/APPCC, servindo como um elo de comunicação para firmar a responsabilidade do próximo elo da cadeia em eliminar ou reduzir o perigo (Salmonella sp) a níveis seguros, conforme os termos do Codex Alimentarius.

Ingredientes 

Por estarmos comparando um produto cárneo in natura e não temperado/ industrializado, é possível não notarmos diferenças. O único ponto mais peculiar desse item é o fato de a informação sobre os miúdos contidos dentro da carcaça ter uma “possibilidade de ausência de partes”, conforme discorremos no post anterior 1/2.

Indústria Brasileira  

Enquanto no Brasil os rótulos dos produtos devem conter a expressão “Indústria Brasileira” em caracteres destacados conforme Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964 e Decreto nº 1.593, de 21 de dezembro de 1977, nos EUA, ao menos para produtos ligados ao USDA, temos a expressão HATCHED, RAISED & HARVESTED IN USA, que traduzido para o português seria NASCIDO, CRIADO e COLHIDO NOS EUA.

Conclusão

No aspecto de produção de carne de frango, considerando os assuntos regulatórios de rotulagem, o Brasil muito se assemelha aos padrões dos EUA. Embora tenha sido possível notar algumas diferenças entre ambos, é preciso afirmar que existem particularidades para cada país. Contudo, em ambos os países, nota-se a preocupação com a segurança dos alimentos em forma de alerta ao consumidor nos rótulos.

4 min leituraNo primeiro post deste tema (rotulagem do frango), apresentamos e discutimos as informações do painel principal. Dando continuidade, agora abordaremos o leiaute e as informações do painel secundário do produto […]

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A dupla face das bactérias Acinetobacter nos alimentos

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Geralmente associadas a infecções hospitalares e presentes em ambientes de assistência à saúde, algumas espécies de Acinetobacter têm chamado a atenção pela sua presença em outro domínio: a área de alimentos. Embora historicamente negligenciadas no contexto dos patógenos alimentares clássicos, as investigações recentes debatem a importância da presença de Acinetobacter spp. em alimentos tanto para a saúde como para a indústria de alimentos.

Estudos atuais revelaram a sua prevalência em diversas fontes alimentares, desde produtos frescos a alimentos processados. Além disso, o frequente isolamento de estirpes de Acinetobacter multirresistentes e produtoras de biofilme levanta preocupações sobre sua atuação como reservatório de genes de resistência a antibióticos na cadeia alimentar.

O impacto de Acinetobacter na segurança de alimentos, no entanto, permaneceu relativamente inexplorado por décadas, até que foi verificado que esse micro-organismo pode ser capaz de atuar tanto como um potencial patógeno alimentar, apresentando diversos fatores de virulência, quanto como um produtor de substâncias antimicrobianas, inibindo outras bactérias (Figura 1). Esse lado pouco conhecido e controverso poderia desempenhar, no futuro, um papel na preservação e na segurança de alimentos.

 

Figura 1 O “jogo duplo” de Acinetobacter em alimentos

 

Substâncias antimicrobianas (SAM) são compostos com a capacidade inata de inibir o crescimento de outros micro-organismos. As bacteriocinas formam um subconjunto de substâncias antimicrobianas, composto por proteínas ou peptídeos sintetizados via ribossomos e com atividade antimicrobiana. Diferentes bactérias inócuas (como Lactococcus lactis) ou potencialmente patogênicas (como Staphylococcus aureus) são potenciais produtoras de bacteriocinas. Algumas espécies de Acinetobacter, conhecidas pela sua versatilidade e capacidade de adaptação, também desenvolveram mecanismos para produzir SAM, que podem ter um potencial de aplicação na indústria de alimentos.

Diferentes SAM produzidas por Acinetobacter spp. já foram descritas e exibiram um espectro de ação notável, com atividade inibitória contra vários patógenos de origem alimentar, tais como Listeria monocytogenes, Salmonella spp. e Escherichia coli, podendo torná-las, portanto, promissoras armas na luta contra doenças de transmissão hídrica e alimentar.

No entanto, a utilização de substâncias antimicrobianas na indústria de alimentos apresenta inúmeros desafios e um longo caminho a percorrer. Preocupações relacionadas à segurança (visto que Acinetobacter é uma bactéria patogênica), à conformidade regulatória e à aceitação pelos consumidores são considerações fundamentais que devem ser abordadas por meio de pesquisas rigorosas.  Além disso, os esforços para otimizar os processos de produção, aumentar a estabilidade e mitigar potenciais efeitos colaterais seriam essenciais para desbloquear todo o potencial destes agentes antimicrobianos naturais.

Em uma época em que os consumidores exigem cada vez mais alimentos minimamente processados, com prazo de validade prolongado e sem aditivos químicos, compostos naturais oferecem uma alternativa sustentável e eficaz. A incorporação de substâncias antimicrobianas, como as produzidas por Acinetobacter spp., em sua forma purificada, em materiais de embalagem de alimentos, revestimentos ou diretamente em produtos alimentícios poderia prevenir a deterioração microbiana, aumentar a segurança e prolongar a vida útil, reduzindo assim o desperdício de alimentos e garantindo uma maior satisfação do consumidor.

Até o momento, poucas bacteriocinas são aprovadas e comercializadas para uso em alimentos, como por exemplo, a nisina e a pediocina PA-1.  Porém, com mais pesquisas, inovação, investimentos e colaboração entre o meio acadêmico, a indústria e as agências reguladoras, estes compostos naturais produzidos por diferentes tipos de bactérias têm um futuro promissor dentro das práticas de preservação de alimentos.

Por Marcelo Soares de Moraes 1,2, Gustavo Luis de Paiva Anciens Ramos 3, Janaína dos Santos Nascimento1                                                              1Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Laboratório de Microbiologia; 2Universidade Estácio de Sá, Campus Angra dos Reis, Departamento de Biomedicina; 3Universidade Federal Fluminense, Departamento de Bromatologia, Faculdade de Farmácia.

Referências:

Ababneh, Q., Al-Rousan, E., & Jaradat, Z. (2022). Fresh produce as a potential vehicle for transmission of Acinetobacter baumannii. International Journal of Food Contamination, v. 9, n. 1, p. 5.

Carvalheira, A., Silva, J., & Teixeira, P. Acinetobacter spp. in food and drinking water–A review. Food Microbiology, 95, 103675, 2021.

Choi, D., Bedale, W., Chetty, S., Yu, J. H. Comprehensive review of clean?label antimicrobials used in dairy products. Comprehensive Reviews in Food Science and Food Safety, v. 23, n. 1, p. 1-21, 2024.

Damaceno, H. F. B., Freitas Junior, C. V., Marinho, I. L., Cupertino, T. R., Costa, L. E. O., & Nascimento, J. S. Antibiotic resistance versus antimicrobial substances production by gram-negative foodborne pathogens isolated from minas frescal cheese: heads or tails?. Foodborne Pathogens and Disease, v. 12, n. 4, p. 297-301, 2015.

Karampatakis, T., Tsergouli, K., Behzadi, P. Pan-genome plasticity and virulence factors: a natural treasure trove for Acinetobacter baumannii. Antibiotics, v. 13, n. 3, p. 257, 2024.

Lucidi, M., Visaggio, D., Migliaccio, A., Capecchi, G., Visca, P., Imperi, F., Zarrilli, R. Pathogenicity and virulence of Acinetobacter baumannii: Factors contributing to the fitness in healthcare settings and the infected host. Virulence, v. 15, n. 1, p. 2289769, 2024.

Mary, N., Aarti, C., Khusro A., Agastian, P. Optimization of antibacterial substances production from Acinetobacter baumannii strain LAN1, an isolate of buffalo milk. The Pharma Innovation Journal, v. 7, p.  51-555, 2018.

Monteiro, R. C., Malta, R. C. R., Rodrigues, G. L., Ramos, G. L. P. A., Nascimento, J. S. Acinetobacter baumannii: a known pathogen, a new problem. Germs, v. 31, n. 13, p. 381-384, 2023.

Nisa, M., Dar, R. A., Fomda, B. A., & Nazir, R. Combating food spoilage and pathogenic microbes via bacteriocins: A natural and eco-friendly substitute to antibiotics. Food Control, v. 149, p.109710, 2023.

Sharma, V., Aseri, G. K., Bhagwat, P. K., Jain, N., & Ranveer, R. C. Purification and characterization of a novel bacteriocin produced by Acinetobacter movanagherensis AS isolated from goat rectum. Food Frontiers, v. 3, n. 1, p. 172-181, 2022.

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Destaques do IX Encontro dos Profissionais da Garantia da Qualidade – 1

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O tema deste ano do IX Encontro dos Profissionais da Garantia da Qualidade foi “Encarando demandas Intensas”.

E foi um evento super intenso! Com tanto conteúdo apresentado em 2 dias de evento, vou dividir este relato em alguns posts, para que os leitores possam aproveitar ao máximo, como tive oportunidade!

O dia começou com um café entre amigos, da cadeia de fornecedores de suprimentos, consultorias, indústrias e órgãos regulatórios.

A primeira palestra foi apresentada por Alex Fernandes, Head de Qualidade da General Mills, que trouxe sua experiência em grandes indústrias e reflexões sobre a importância da qualidade, como consumidores, fabricantes e auditores.

O palestrante questionou como olhar para a cadeia de produção com empatia, colocando-nos no lugar de consumidor final, para usar da melhor forma as experiências reais dos operadores e responsáveis pela qualidade.

Remover a mecanicidade de fluxos e processos gera engajamento e conectar-se com seres humanos de todas as esferas da empresa traz a qualidade para outro patamar, saindo apenas de planilhas de Excel e reclamações de consumidores.

Qualidade é sobre relacionamentos. E como nos relacionamos com problemas, processos e negócios, e, como contribuímos é que faz diferença. Com as redes sociais, a velocidade de resposta mudou e a forma como temos que nos relacionar com a qualidade, com foco no cliente, abordagem de processos e principalmente como nos relacionamos com os problemas, para usá-los como oportunidade de aprendizagem e melhoria para evitar recorrência.

Em emergências, muitas vezes é preciso tomar decisões com base no que é urgente e importante e, às vezes, não com o melhor custo, nem pelo caminho ideal. A direção define a política, seguindo as normas ISO, mas a política de qualidade não está ligada diretamente ao diretor e sim à cultura das empresas e esta sim direciona e engaja.

Atender às normas não é a missão de indústrias de alimentos. A política de qualidade tem que ser focada em cultura de segurança e em inovar continuamente com parceiros, fornecedores, áreas de compras e negócios.

Envolver os funcionários em ações de abertura de processos para visitas das famílias e dias de campo, como ações de vendas em grupos, mostra para eles que o que é produzido é para suas próprias famílias e como é estar na pele do outro, o que traz um engajamento e alinhamento entre as áreas.

Normas são muito importantes e são um meio para um fim. Certificados são importantes desde que eles tragam evolução e compromisso com maturidade e mudanças, não somente para ter um quadro na parede.

A qualidade deve ter uma jornada que permeie todas as áreas, participando dos processos, políticas, agendas de inovação e vendas, sem ter que ser imposta.

Em seguida, Camila França, da Hygiena, apresentou o tema “Conectividade e Digitalização em Food Safety: descomplicando e facilitando a rotina”.

Ela mostrou como lidar com soluções integradas, em nuvem, entre monitoramento de limpeza, resultados de controle de produtos dos dados, visualizando as tendências e pontos de melhoria nos processos.

Trouxe uma boa dica, para olharmos sempre com criticidade para os dados, pois nem sempre a informação original chega ao decisor. Muitas vezes o operador ou coletor dos swabs constata uma falha, toma ações corretivas e retesta o processo, enviando apenas o último resultado, o que pode levar à alteração da tendência original. Sem saber destes dados originais, muitas vezes o decisor não planeja ações preventivas, não visualiza uma necessidade de ampliação de planos de amostragem, deixando de fazer uma gestão efetiva, orientada por dados.

Em seguida, tivemos a apresentação da Merieux, falando sobre padrões microbiológicos,  como interpretar a RDC 724, 22 e IN 161.

A empresa explicou como devem ser os planos de amostragens. Eles devem seguir o que está na norma, mas no artigo 8 há uma exceção. Ela permite que planos de amostragem alternativos sejam seguidos, desde que tenham sido validados e haja um relatório aprovado!

Amostras qualitativas podem ser agrupadas (o famoso pool), compondo um teste, mas o método também precisa estar validado.  E que esta estratégia não pode ser utilizada para amostras quantitativas.

Enfatizou que o artigo 6 explica que quando são encontrados resultados fora da especificação, é importante abrir um plano de investigação e, quando necessário, avaliar os processos térmicos, fornecedores, BPF e fazer análises em paralelo com laboratórios de referência, para checar os processos e BPL.

Em breve publicaremos mais sobre este IX Encontro, que foi um evento incrível!

Acompanhe a série por aqui.

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Botulismo alimentar: o perigo dos alimentos em conserva e enlatados

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De origem bacteriana, o botulismo é uma doença grave, não contagiosa, causada pela ação de uma potente neurotoxina produzida pela bactéria Clostridium botulinum (C. botulinum), comprometendo a segurança de diversos alimentos, principalmente conservas e alimentos enlatados. Entre os tipos de doenças causadas pela toxina, as mais conhecidas em humanos são o botulismo alimentar, o botulismo infantil e o botulismo por feridas.

O C. botulinum é um bacilo Gram-positivo, que se desenvolve em meio anaeróbio (sem a presença de oxigênio), formador de esporos, encontrado com frequência no solo, em ambientes marinhos e pode contaminar os alimentos. Existem sete tipos distintos do microrganismo (de A a G), que se distinguem pelas características antigênicas da neurotoxina que produzem, e que tem ação farmacológica similar. Os tipos A, B e F causam doenças em humanos, já os tipos C, D e E são quase exclusivos de animais, sendo o tipo E mais comum em peixes de água marinha.

Os esporos de C. botulinum são as formas mais resistentes entre os agentes bacterianos, capazes de tolerar altas temperaturas, além de radiações ionizantes, compostos químicos, desidratação e congelamento. A germinação dos esporos nos alimentos é promovida por condições anaeróbias (alimentos embalados, lacrados ou enlatados), e as células vegetativas produzem a toxina durante o seu armazenamento.

As toxinas botulínicas são uma das substâncias mais potentes e tóxicas da natureza, que atuam no sistema neurológico do hospedeiro, podendo ser letal. Elas são formadas por proteínas simples, solúveis em água, antigênicas, resistentes à degradação pelo ácido gástrico e por enzimas proteolíticas, estáveis em meios ácidos e em salmouras com até 26,6% de sal. Elas também são termolábeis (sensíveis à ação do calor), sendo destruídas pelo aquecimento a 80°C por 30 minutos, ou a 100ºC por 5 minutos.

 Mas como ocorre a contaminação do alimento e a ação da toxina em humanos?

Os alimentos mais comumente envolvidos em quadros de intoxicação por C.botulinum são aqueles com baixa acidez (pH > 4,5), alta atividade de água (Aa) e sem a presença de oxigênio, tais como conservas vegetais, principalmente as artesanais, produtos cárneos cozidos, curados e defumados de forma artesanal, pescados defumados, salgados e fermentados e, em alguns casos, alimentos enlatados industrializados.

Quando produzidos de maneira inadequada, usando práticas de fabricação insatisfatórias, a bactéria ou esporo pode permanecer nos alimentos, mesmo após o processamento e/ou tratamento térmico, e quando em condições ideais para sua multiplicação, ocorre a produção da toxina. Após a ingestão do alimento contaminado, a toxina ingerida chega à corrente sanguínea. Em seguida, ela é transportada aos nervos, ligando-se aos terminais pré-sinápticos dos nervos colinérgicos e interferindo na liberação da acetilcolina nas junções mioneurais. Como consequência, começam a ocorrer falhas na transmissão de impulsos através das junções das fibras nervosas. As toxinas acometem principalmente os nervos periféricos, atuando nas junções neuromusculares e provocando paralisia funcional motora.

O tempo de incubação e manifestação dos sintomas do botulismo alimentar ocorrem entre 12 e 36h, variando conforme a quantidade de toxina ingerida. O início da ação da neurotoxina botulínica provoca fadiga e fraqueza muscular. O quadro neurológico instala-se com manifestações de cefaleia, vertigem, ptose palpebral, disfagia, paralisia facial bilateral, redução dos movimentos da língua e dificuldade para sustentar o pescoço. A musculatura que controla a respiração é progressivamente paralisada, podendo provocar a morte em três a cinco dias por parada respiratória. Mesmo com a progressão da paralisia, não há alteração do nível de consciência do paciente durante a evolução do quadro. 

 Como detectar o botulismo?

O botulismo é diagnosticado por meio dos sinais e sintomas apresentados pelo paciente, bem como pela detecção e triagem da toxina no seu sangue e pelos testes complementares nos alimentos suspeitos. O tratamento exige internação hospitalar para terapia de suporte e controle das complicações, especialmente dos problemas respiratórios, e o processo de recuperação irá depender da reação do sistema imunológico na eliminação da toxina. Quanto ao tratamento medicamentoso, antibióticos não são eficazes na reversão do quadro, sendo necessária a aplicação do soro antibotulínico para neutralizar as toxinas.

Como evitar a contaminação?

O primeiro passo para evitar a contaminação dos alimentos com o C. botulinum é a adoção de Boas Práticas de Fabricação, seja na indústria ou nas conservas caseiras. Além disso, no caso de produtos de origem animal, a adição de nitrato e nitrito, associada ou não ao sal e temperaturas de refrigeração, são controles eficientes contra o desenvolvimento da bactéria, impedindo a produção da toxina. Alguns pontos também devem ser observados no processo de compra e consumo:

  • Alimentos em conserva que apresentem vidros embaçados com evidência de deterioração, alterações no cheiro e na aparência não devem ser consumidos. Salsichas e outros embutidos caseiros ou de proveniência duvidosa também devem ser evitados. Alimentos contaminados por C. botulinum nem sempre apresentam alterações sensoriais, sendo importante atenção ao comprar e/ou consumir alimentos fora de casa;
  • Conservas caseiras e produtos industrializados que não ofereçam segurança devem ser fervidos por pelo menos 15 minutos antes do consumo, para que o calor inative a toxina, caso esta esteja presente;
  • Ao preparar conservas e embutidos caseiros, certifique-se de que foram empregados todos os cuidados de higiene na fabricação e tratamento térmico adequado para destruir os esporos;
  • Conserve os alimentos em temperaturas inferiores a 10ºC;
  • O mel pode ser propício ao depósito de esporos do C. botulinum e não deve ser oferecido para crianças com menos de dois anos de idade.

 Autoras convidadas: Déborah Tavares Alves, Marissa Justi Cancella, Elisângela Michele Miguel

Leia também:

https://foodsafetybrazil.org/botulismo-e-neurotoxina-alimentar/

Referências

CERESER, N.D.; COSTA, F.M.R.; JÚNIOR, O.D.R.; SILVA, D.A.R.; SPEROTTO, V.R. Botulismo de origem alimentar. Cienc. Rural, v.38, n. 1, 2008. https://doi.org/10.1590/S0103-84782008000100049  

PEREIRA, K. A. dos S.; DE SOUZA, M. L. P.; CANGIRANA, Y. M.; KALE, V. Y. S.; DOS SANTOS, I. O. S.; DA SILVA, V. B. Principais espécies de Clostridium spp. veiculados por alimentos. Brazilian Journal of Health Review, v. 7, n. 1, p. 2215–2227, 2024. https://doi.org/10.34119/bjhrv7n1-174

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Maria Tifoide – a primeira portadora assintomática da história

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Quem não gosta de uma boa história com detetives? Quem nunca leu nada de Agatha Christie? Mas longe da ficção, existiu um detetive da vida real chamado George Soper (imagem abaixo) e é aqui que nossa história começa.
George Albert Soper foi um proeminente engenheiro civil e sanitário e epidemiologista do início do século XX. Sua investigação mais famosa levou à descoberta de Mary Mallon, apelidada de “Typhoid Mary (Maria Tifoide)”, a cozinheira que era portadora da cepa da bactéria que causa a febre tifoide, embora não apresentasse nenhum sintoma.

O que é a febre tifoide? 

A febre tifoide é uma infecção bacteriana causada pela Salmonella typhi, transmitida através de alimentos, bebidas e fontes de água contaminadas com a bactéria. A doença causa febre, dor abdominal, diarreia intensa, calafrios, fadiga intensa e até morte.

Voltando à história

Olhemos para 1906. Mary estava trabalhando em uma casa de onze pessoas em Oyster Bay, uma área tradicional de Nova York, onde a elite passava os verões. O então presidente Theodore Roosevelt havia declarado sua casa ali como a “Casa Branca de verão”. Seis das onze pessoas da casa onde Mary trabalhava adoeceram com febre tifoide e, querendo chegar ao fundo da questão, os proprietários contrataram George Soper para localizar a origem da doença em sua casa.

Originalmente, Soper acreditava que os mariscos de água doce servidos na casa eram os culpados pelo surto bacteriano. No entanto, uma investigação mais aprofundada revelou que nem todos os pacientes atingidos tinham consumido os mariscos. Então, ele teve de voltar sua atenção para outras possibilidades. Depois de mais pesquisas, Soper apresentou uma teoria interessante: seria possível alguém carregar a bactéria sem ficar doente?

Soper acreditava que estava a caminho de resolver o caso. A cozinheira Mary Mallon não só havia sido contratada na casa de Oyster Bay, mas seu sorvete de pêssego, feito com ingredientes crus, era um denominador comum entre os pacientes doentes.

A primeira morte associada ao surto de Oyster Bay acelerou o trabalho de Soper. Ansioso para testar sua teoria de que Mary poderia ser a “culpada” pela doença, Soper a localizou no início de 1907 e explicou-lhe que ela poderia estar espalhando doenças enquanto cozinhava. Ele pediu amostras de fezes, sangue e urina para provar sua teoria. Mary ficou totalmente surpresa com suas acusações e pedidos. Ela provavelmente sentiu que ele a estava acusando de ser pouco higiênica na preparação de alimentos, e a ideia de um portador de doença assintomático era ridícula para uma pessoa média na América do início do século XX . Mary expulsou Soper de sua casa, furiosa.

Mas quem era Mary???

Mary nasceu em 1869 em Cookstown (Irlanda), quando ainda soavam os ecos da grande fome que, provocada pela Inglaterra, tinha assolado o país entre 1845 e 1850. Cerca de 500.000 irlandeses morreram e um milhão de outros emigraram, especialmente para a América do Norte. Inculta e pobre, com 15 anos, em 1883, Mary partiu para os Estados Unidos para trabalhar como faxineira.

Ela aprendeu a cozinhar e em 1900 era cozinheira de uma família rica numa localidade próxima a Nova York. Curiosamente, duas semanas depois de sua contratação, os oito membros da família adoeceram por febre tifoide.

Voltando à história – Parte II

Ao vasculhar os registros de emprego de Mary nos últimos anos, Soper descobriu que os surtos de febre tifoide pareciam acompanhar a trajetória profissional dela durante anos: sete em cada oito famílias ficaram doentes, até chegarmos a 1906 que é onde a nossa história começou.

Soper entendeu que os empregadores de Mary e suas famílias provavelmente não contraíam febre tifoide devido às refeições quentes que ela preparava e servia, porque o calor tende a eliminar a maioria das bactérias. Foi então que ele identificou a verdadeira origem do problema: o sorvete e a sobremesa de pêssego da Mary (sua marca registrada!!!). Quando a polícia apareceu na porta de Mary, ela foi empurrada para dentro de uma ambulância e, a certa altura, contida.

Mary foi enviada para o Hospital Willard Parker, onde permaneceu por quatro dias até finalmente concordar em dar amostras. Os médicos encontraram grandes quantidades de bactérias tifoides e, quando questionaram Mary, ela admitiu que quase nunca lavava as mãos (já escrevemos sobre esse tópico no blog e você pode ler o conteúdo aqui).
Mary não foi autorizada a deixar a ilha, mas não foi oficialmente presa nem enfrentou qualquer tipo de acusação. Morreu aos 69 anos, ainda vivendo isolada.

Vocês podem ler as referências desse conteúdo clicando aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

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Associação entre microrganismos fúngicos e a doença de Parkinson

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A doença de Parkinson é o segundo transtorno neurodegenerativo mais comum após a doença de Alzheimer. Embora a causa exata seja incerta para a maioria das pessoas, há evidências emergentes que vinculam a doença a fatores ambientais, incluindo a exposição a bolores e leveduras.

Um exemplo ilustrativo é o estudo realizado por Arati Inamdar e Joan Bennett, da Rutgers University, publicado em 2013. Nessa pesquisa, os cientistas utilizaram moscas de fruta para investigar o impacto do 1-octen-3-ol, também conhecido como “álcool de cogumelo”, um composto volátil liberado por bolores. Os resultados, divulgados nos Anais da Academia Nacional de Ciências, indicam que este composto pode comprometer a dopamina e desencadear sintomas característicos da doença de Parkinson, sublinhando a possível conexão entre compostos biológicos e a patologia.

No Brasil, uma pesquisa relevante conduzida por Dionísio Pedro Amorim Neto na Unicamp (2024) explora similarmente a relação entre fungos e leveduras presentes na microbiota intestinal e a doença de Parkinson. Esse estudo, que revisou mais de cem artigos científicos, foca a influência desses microrganismos ou de seus metabólitos secundários na origem e progressão da doença. Os resultados apontam que tais organismos podem tanto proteger quanto induzir sintomas da doença. Amorim sugere que os metabólitos dos microrganismos intestinais podem alcançar o cérebro pela corrente sanguínea ou afetar as células do epitélio intestinal, que por sua vez podem influenciar os neurônios. Outra hipótese levantada é que as células neuroendócrinas do intestino poderiam interagir com o nervo vago e desencadear a patologia. Embora os estudos indiquem que certas espécies de Candida são mais abundantes nos intestinos de pacientes com Parkinson, e outras leveduras probióticas parecem ter efeitos benéficos, ainda existe uma lacuna significativa no entendimento da interação específica dos fungos com a doença, um tema que Amorim pretende explorar durante seu doutorado.

Esses estudos destacam a importância de garantir a segurança dos alimentos, pois microrganismos como bolores e leveduras podem estar associados a doenças cujos efeitos ainda não compreendemos completamente.

Nesse cenário, enfatiza-se a prevenção da contaminação cruzada, exemplificando o monitoramento ambiental como uma ferramenta eficaz. Manter um ambiente livre de agentes patogênicos ou tóxicos é crucial, e esse programa destaca a necessidade de adotar medidas rigorosas de higiene e vigilância constante durante o processamento de alimentos.

Um plano de monitoramento ambiental eficaz visa principalmente evitar a contaminação cruzada entre o ambiente (ar, equipamentos, colaboradores, etc.) e o produto. Ao combinar a monitorização dos alimentos e do ambiente de produção, é possível assegurar a qualidade e segurança dos alimentos. Para um plano de monitoramento eficaz, é necessária uma estruturação como a mostrada no quadro abaixo.

Etapa Descrição Completa
1. Estruturação do Plano de Monitoramento A equipe responsável deve ser multidisciplinar e ter treinamento em segurança de alimentos, com conhecimento do processo produtivo.
2. Treinamento de Equipe Equipe treinada em patógenos alimentares, avaliação de risco de patógenos alimentares e testes microbiológicos, fomentando uma cultura de segurança de alimentos.
3. Microrganismos a serem avaliados Para a adequada definição de microrganismos a serem monitorados em conformidade com o sistema de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC), é essencial considerar as condições de limpeza e as boas práticas de fabricação vigentes. Esta etapa envolve uma análise criteriosa das características dos microrganismos, tais como:
a) Identificação dos microrganismos mais comuns no processo específico.
b) Avaliação de suas condições para serem classificados como patogênicos, deteriorantes ou indicadores.
c) Determinação da capacidade de formação de biofilme pelos microrganismos.
d) Necessidade de utilização de inibidores de sanitizantes.
eCondições existentes que permitam o crescimento do microrganismo após a coleta ou possibilidade de que este fique injuriado.Além disso, é imperativo realizar uma análise de risco que considere a probabilidade de ocorrência, a severidade e o risco associado a cada microrganismo. Neste contexto, destacam-se patógenos como Salmonella spp., Cronobacter spp., e Listeria monocytogenes, bem como indicadores e deteriorantes como Enterobactérias, Bolores e leveduras, e Aeróbios Mesófilos.
4. Estruturação do zoneamento ambiental Descrição das zonas de monitoramento: Zona 01 – com superfícies de contato direto com o produto; Zona 02 – com superfícies sem contato direto mas próximas; Zona 03  – com áreas sem contato direto e não próximas; Zona 04 – com áreas distantes do processamento.

Observação: Na zona 1 não incluir patógeno, somente indicador, caso tenha patógeno somente liberar produto após resultado de análise). Foco em bactéria indicador.

5. Definição do plano de amostragem Identificação de áreas vulneráveis à contaminação, usando métodos como testes microbiológicos (placas de Petri, swabs, esponjas), métodos moleculares (PCR) e sensoriamento remoto ou coleta diferenciada do ar.
6. Ações Preventivas Implementação de controle de umidade e temperatura, ventilação adequada e rotinas de limpeza e sanitização.
7. Análise dos resultados Análise de tendências por ponto avaliado para identificar áreas que necessitam de atenção, revisão e expansão do plano conforme necessário, com atenção especial à precisão das unidades de medida.

Além das recomendações sobre monitoramento ambiental, você pode encontrar artigos como material complementar em nosso blog, incluindo:

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Desafio: identifique o patógeno responsável em 10 casos de doenças transmitidas por alimentos

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Muitas vezes banalizadas e encaradas apenas como “viroses”, as doenças transmitidas por alimentos (DTA) são corriqueiramente associadas por apenas causarem diarreias e vômitos.

Contudo, as infecções e intoxicações alimentares podem ter consequências muito mais sérias tanto a curto quanto a longo prazo. Muitas são raras e podem ser confundidas com outras doenças. Às vezes, são diagnosticadas e tratadas de forma incorreta, levando os pacientes a uma recuperação mais difícil, ou mesmo a ficar com sequelas ou ir a óbito.

Já contamos aqui no blog sobre uma DTA que foi tema de um episódio do seriado Dr. House: “Cisticercose e neurocisticercose foram até tema de seriado médico” (confira aqui). Também já relatamos no Food Safety Brazil um caso de botulismo no qual  se patinou no diagnóstico e até se realizou conduta errada por pensarem que se tratava de Guillian Barré. Releia esta história aqui: Sobrevivente de botulismo conta sua história de superação e sequelas.

Sempre me perguntei como os médicos se preparam para lidar com as DTA quando um paciente chega ao pronto socorro ou consultório. Existem treinamentos específicos?

Procurando resolver esta inquietude, encontrei essa preciosidade de 2023 na revista Medscape, voltada para o público médico, em

10 Cases of Food Poisoning: Find the Pathogen Responsible https://reference.medscape.com/slideshow/food-poisoning-6009621#1

(clique na barra colorida para acessar o link)

Os casos

Na imagem que ilustra este post, há um derramamento de pigmento da íris causado por Listeria monocytogenes.

Em outra sequência, mostra-se o caso de “um homem de 35 anos com náusea, cólicas abdominais e dor de cabeça que começou após comer peixe mahi-mahí, batata frita e espinafre salteado. Ele não teve vômito ou diarreia. No exame clínico apresentou vermelhidão (rash) na face e no tronco”. Pergunta-se então aos seguidores da revista o que fazer:

  1. Usar antibióticos para cortar a evolução da doença
  2. Espera-se sequelas neurológicas nesta condição
  3. Adequada cocção do peixe teria evitado a doença
  4. Lavagem adequada do espinafre teria evitado esta doença
  5. O curto período da doença é consistente com a ingestão de uma toxina pré-formada.

Gostaram? Eu amei. O desafio é para os profissionais da saúde, mas acredito que este tipo de conhecimento agrega a todos nós que trabalhamos com segurança dos alimentos.

Não querendo “dar spoiler”, mas dando, os casos são ricos e variados e abordam toxinas, protozoários, bactérias e vírus.

Mande para aquele seu amigo médico e ajude a reduzir o número de pacientes que sofrem por serem vítimas da “tentativa e erro” na condução do tratamento.

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Doenças transmitidas por alimentos que deixaram sequelas graves – casos reais

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