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Fraude com metanol em bebidas destiladas

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Apesar de terem estruturas químicas quase idênticas, o etanol (C2H5OH), com dois carbonos, e o metanol (CH3OH), com apenas um, são álcoois que seguem trajetórias metabólicas radicalmente distintas no organismo humano.

O metanol é convertido em formaldeído e ácido fórmico, compostos altamente tóxicos que podem provocar acidose metabólica, neurotoxicidade e cegueira irreversível. Já o etanol, embora também tóxico se ingerido em excesso, é metabolizado em acetaldeído e posteriormente em ácido acético, que pode ser integrado ao metabolismo energético, permitindo seu consumo moderado sem efeitos graves à fisiologia.

ADH (Álcool Desidrogenase)/ ALDH (Aldeído Desidrogenase)/ Em resumo: ADH = álcool  aldeído e ALDH = aldeído  ácido.

O uso do etanol por humanos remonta a milênios, com evidências arqueológicas de cervejas e vinhos na Mesopotâmia, Egito e China antiga, frequentemente integrados a rituais religiosos e celebrações comunitárias. A destilação, desenvolvida na Idade Média, permitiu concentrar o álcool em bebidas destiladas como uísque, vodca e gim, difundidas em sociedades europeias.

Ao longo da história, o consumo de etanol consolidou-se não apenas como substância recreativa, mas também como mediador social e cultural, presente em festividades, cerimônias e encontros familiares.

Por isso, o consumo moderado de etanol, definido segundo padrões internacionais como até uma dose padrão por dia para mulheres e até duas para homens, correspondendo a aproximadamente 14 g de álcool puro por dose, induz efeitos leves sobre o sistema nervoso central, como relaxamento e desinibição, sem comprometer significativamente a integridade fisiológica.

Essa diferença entre homens e mulheres reflete variações fisiológicas e metabólicas, incluindo menor volume corporal de água, menor atividade da enzima álcool desidrogenase e diferenças hormonais em mulheres, que tornam a metabolização do álcool mais lenta.

Em contraste, o metanol permanece restrito a aplicações industriais e é absolutamente incompatível com a ingestão humana.

A intoxicação aguda por etanol resulta da ingestão de doses superiores à capacidade metabólica do fígado, normalmente acima de 0,5 g/ kg em adultos. Clinicamente, manifesta-se inicialmente por desinibição, euforia e alterações na coordenação motora, evoluindo em níveis mais elevados para sedação, depressão respiratória, hipoglicemia e, em casos extremos, coma etílico. O efeito depende de fatores individuais, incluindo peso corporal, gênero, tolerância e presença de alimentos no trato gastrointestinal.

Já no caso do metanol, a ingestão de quantidades comparáveis é rapidamente letal ou causa cegueira, devido à formação de formaldeído e ácido fórmico, mostrando que a similaridade estrutural entre os álcoois não se traduz em equivalência toxicológica.

Tabela: Comparativo da toxidade entre etanol e metanol

ETANOL METANOL O que significa Observações
LD50 oral (ratos) (mg/kg) 7.000 – 10.000 mg/kg 5.600 – 7.000 mg/kg Dose letal média em animais (quanto menor, mais tóxico) Valores clássicos de toxicologia; ratos, não humanos.
Dose letal estimada em humanos 300 – 400 ml de etanol puro (4–5 g/kg) 30 – 100 ml de metanol puro (0,5–1,5 g/kg) Quantidade capaz de causar morte em um adulto médio Estimativas médias; varia com peso, sexo e tolerância.
Dose mínima para efeitos graves 0,5 g/kg já provoca intoxicação (embriaguez intensa) 10 ml pode causar cegueira permanente Primeira dose com efeitos severos Dados clássicos de intoxicação; metanol pode ser tóxico mesmo em doses muito baixas.
NOAEL (dose sem efeitos adversos observáveis) 0,25 g/kg/dia (uso crônico) Não estabelecido em humanos; qualquer ingestão pode ser perigosa Ponto de segurança relativo Valor do etanol é apenas estimativa (consumo moderado); para metanol não há nível seguro.
  • LD50 = Lethal Dose 50%) = Dose Letal para 50%” = Indica a quantidade de uma substância necessária para matar 50% de um grupo de animais de teste, geralmente roedores, em um determinado período.
  • NOAEL = Observed Adverse Effect Level = Nível sem Efeito Adverso Observado.

Sintomas e tratamento

Após a ingestão de metanol, os sintomas podem surgir em fases distintas:

  1. Fase inicial, que ocorre em até 12 horas, em que predominam manifestações inespecíficas como náuseas, vômitos, dor abdominal, tontura, fraqueza, sonolência e sinais semelhantes à embriaguez;
  2. Fase latente, entre 6 e 24 horas, em que a pessoa pode aparentar melhora, mas o organismo já está convertendo o metanol em compostos tóxicos;
  3. Fase tardia, geralmente após 12 a 24 horas, podendo se estender até 72 horas, sobretudo se houver ingestão concomitante de etanol, em que surgem complicações graves, como visão borrada, fotofobia, “pontos brilhantes” que evoluem para cegueira, além de falta de ar por acidose metabólica, agitação, confusão mental, convulsões e até coma.

A intoxicação por metanol deve ser tratada como uma emergência médica e o atendimento precisa começar o mais rápido possível, de preferência ainda antes do surgimento dos sintomas graves. O objetivo inicial é impedir que o metanol seja transformado em formaldeído e ácido fórmico, os verdadeiros responsáveis pela toxicidade.

Para isso, utilizam-se antídotos específicos, sendo que o fomepizol é a primeira escolha, mas na ausência dele pode-se administrar o próprio etanol, que compete pela enzima álcool-desidrogenase. Essa enzima é um problema porque é justamente ela que transforma o metanol em formaldeído e, em seguida, em ácido fórmico, compostos altamente tóxicos que provocam acidose metabólica, lesões neurológicas e danos irreversíveis à visão.

Ao bloquear a ação da álcool-desidrogenase, os antídotos impedem a formação desses metabólitos perigosos, mantendo o metanol inofensivo até que seja eliminado do organismo.

Além disso, aplica-se bicarbonato de sódio intravenoso para corrigir a acidose metabólica e ácido fólico ou leucovorina para favorecer a conversão do ácido fórmico em substâncias menos nocivas.

Nos casos mais graves, quando há alterações visuais, acidose severa ou altos níveis de metanol no sangue, a hemodiálise é indicada, pois remove rapidamente tanto o metanol quanto seus metabólitos. O tratamento pode durar de 24 a 72 horas, dependendo da evolução clínica, e deve ser iniciado imediatamente após a suspeita de ingestão, sem esperar a confirmação laboratorial.

A rapidez é essencial: quanto mais cedo o paciente recebe o antídoto e o suporte adequado, maiores são as chances de sobrevivência e menores os riscos de sequelas permanentes, como a cegueira.

Custos e rotas de fraude

O metanol é obtido principalmente a partir do gás natural, por meio da síntese do gás de síntese (CO + H2) em reatores catalíticos, podendo também ser produzido a partir de carvão ou biomassa, dependendo da disponibilidade de matéria-prima. Essa produção em escala industrial, combinada com seu uso como matéria-prima na fabricação de formaldeído, ácido acético, resinas, metilaminas e combustíveis, proporciona economia de escala e contribui para preços mais competitivos.

No caso do etanol, embora possa ser sintetizado por três vias principais, fermentação de açúcares, hidratação do eteno e redução de acetaldeído, na prática industrial quase toda a produção mundial se dá pela fermentação. Esse processo utiliza açúcares provenientes de cana-de-açúcar, milho ou outras matérias-primas vegetais, sendo economicamente viável, sustentável e historicamente consolidado. As demais rotas químicas existem, mas são restritas a nichos específicos ou regiões com abundância de eteno derivado do petróleo.

Em contrapartida, o etanol destinado ao consumo humano exige fermentação controlada, purificação rigorosa e certificação sanitária, para atender a padrões de qualidade alimentar, o que aumenta consideravelmente seu custo e torna sua comercialização mais regulada.

Por isso, do ponto de vista econômico, o metanol apresenta custo significativamente inferior ao etanol no mercado internacional, principalmente devido à sua produção industrial em larga escala e à ampla aplicação química. Em setembro de 2025, o preço médio do metanol gira em torno de US$ 0,35/ litro, dependendo da região, com valores mais baixos observados na América do Sul e Ásia, enquanto o etanol apresentava preços médios globais em torno de US$ 0,72/ litro, com variações significativas entre os países.

Essa diferença de preço reflete não apenas os custos de produção e purificação, mas também os requisitos legais e sanitários associados ao consumo humano, tornando o metanol economicamente atraente para adulteração ilícita de bebidas alcoólicas.

A vantagem econômica do metanol, associada à facilidade de acesso por vias ilegais com objetivo de adulteração de combustíveis, prática recentemente registrada no Brasil, torna o metanol um insumo provável e disponível para a adulteração de bebidas alcoólicas.

Além de seu baixo preço, a semelhança química e sensorial com o etanol permite que o metanol engane consumidores desprevenidos, criando risco extremo de intoxicação aguda, incluindo, como já citado, cegueira e morte, evidenciando a necessidade de fiscalização rigorosa e rastreabilidade em toda a cadeia de produção e distribuição de bebidas alcoólicas.

Há suspeitas de que as mesmas rotas utilizadas para adulterar combustíveis no Brasil também sejam empregadas na adulteração de bebidas destiladas, muitas vezes vendidas em lojas de conveniência nos mesmos postos de combustível que funcionam como canais de distribuição. Dessa forma, a raiz do problema da adulteração está associada ao crime organizado, que explora essas redes logísticas para maximizar lucro, colocando em risco a saúde pública e dificultando o controle das autoridades.

Fraudes com metanol em bebidas resultam da combinação de ignorância sobre os tipos de álcool, ganância pelo lucro e evidente má-fé.

Essas suspeitas, de forma objetiva, derivam da Operação Carbono Oculto, deflagrada em agosto de 2025, que identificou a importação ilegal de metanol pelo PCC para adulteração de combustíveis, revelando o desvio de grandes volumes para destilarias clandestinas e falsificadores de bebidas alcoólicas, e comprovou o uso de rotas logísticas controladas por facções criminosas, reforçando a ligação entre a adulteração de combustíveis e o risco à saúde pública.

Casos registrados

As bebidas destiladas são as principais impactadas pelo mercado ilegal. De acordo com dados da Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD), levantados em pesquisa encomendada ao Euromonitor, calcula-se que 33% do mercado total brasileiro de uísque seja ilegal; 27% para vodca; 18% para cachaça; 15% para gim; e 7% para outros destilados. Justamente o mercado ilegal abre a possibilidade de riscos de contaminação.

Entre agosto e setembro de 2025, foram registrados no Brasil casos de intoxicação por metanol, com destaque para São Paulo, onde pelo menos 10 casos foram confirmados e 29 estão sob investigação, com uma morte confirmada e quatro outras mortes sob apuração. Em Pernambuco, há até 4 casos suspeitos, com duas mortes em investigação.

As investigações já revelaram que imóveis na zona norte de São Paulo e em cidades da Grande São Paulo, como Barueri e Americana, funcionavam como pontos de envase e armazenamento clandestino. Nesses locais, garrafas usadas de marcas conhecidas eram compradas ou recolhidas, reenchidas com destilados adulterados, possivelmente contaminados com metanol, e depois rotuladas e lacradas para revenda. Até o momento, mais de 7 mil garrafas foram apreendidas e ao menos 15 suspeitos foram presos.

As autoridades sanitárias e policiais, com apoio do Ciatox de Campinas e do Sistema de Alerta Rápido (SAR), investigam a origem do metanol e rastreiam a distribuição das bebidas adulteradas.

A ingestão de bebidas adulteradas com metanol ocorreu em cenas sociais de consumo alcoólico, incluindo bares, e com diferentes tipos de bebida, como gim, uísque e vodca.

Em São Paulo, as investigações levaram à interdição de pelo menos seis estabelecimentos que comercializam bebidas destiladas, localizados nos bairros dos Jardins, Mooca e Itaim Bibi, além de unidades em São Bernardo do Campo e Barueri. As bebidas apreendidas foram encaminhadas ao Instituto de Criminalística para análises toxicológicas e documentoscópicas, com o objetivo de confirmar a presença de metanol e rastrear a origem da contaminação.

Em resposta, o Ministério da Justiça e Segurança Pública emitiu recomendações urgentes aos estabelecimentos, incluindo encaminhamento imediato de consumidores sintomáticos para atendimento médico, acionamento do Disque-Intoxicação (0800 722 6001) da Anvisa e comunicação à Vigilância Sanitária, Polícia Civil, PROCON e, quando aplicável, ao Ministério da Agricultura e Pecuária.

O recente surto de intoxicação por metanol em São Paulo configura um caso típico de fraude alimentar (food fraud), motivada por interesses econômicos ilícitos. Essa prática envolve a adulteração intencional de produtos alimentícios com substâncias não autorizadas para aumentar volume, reduzir custos ou enganar consumidores, visando lucro financeiro.

Casos semelhantes ocorridos em outros países

  • 1986, na Itália, o “Escândalo do Vinho ao Metanol” resultou em 23 mortes e dezenas de pessoas com cegueira permanente, afetando diversas regiões e aproximadamente 60 empresas vinícolas, com repercussões globais na confiança dos consumidores.
  • 2009, em Bali, Indonésia, pelo menos 25 pessoas morreram após consumir bebidas adulteradas;
  • 2010, na China, vinhos adulterados com metanol levaram ao fechamento de vinícolas e prisão de seis responsáveis;
  • 2013, no distrito de Azamgarh, Uttar Pradesh, Índia, cerca de 39 pessoas morreram e dezenas ficaram cegas ou hospitalizadas pelo mesmo tipo de contaminação;
  • 2016, na ilha grega de Zante, uma jovem de 22 anos ficou cega e sofreu insuficiência renal após ingerir vodca adulterada;
  • 2016, em Irkutsk, Russia, mais de 70 pessoas morreram após consumir uma loção de banho perfumada com extrato de boyaryshnik (espinheiro), que foi erroneamente rotulada como contendo etanol, mas na verdade continha metanol. O problema já começa por ter ingerido um cosmético;
  • 2022, no estado de Gujarat, Índia, pelo menos 42 pessoas morreram e quase 100 foram hospitalizadas após consumir bebida adulterada com metanol;
  • 2023, no Brasil, o CIATox da Unicamp registrou o que considerou os casos mais graves de intoxicação por metanol no Brasil até então. Após consumo de álcool combustível por pessoas em situação de rua, 14 pacientes foram atendidos e 11 faleceram;
  • 2025, na região de Leningrado, também na Rússia, pelo menos 25 pessoas morreram após consumir vodca falsificada vendida por cerca de US$ 1,00 a garrafa. A bebida foi encontrada com níveis letais de metanol e várias pessoas foram presas pela produção e distribuição do álcool adulterado.

Esses incidentes evidenciam a necessidade urgente de medidas eficazes de fiscalização e controle na cadeia de produção e distribuição de bebidas alcoólicas. Em países como Itália e Rússia, após surtos de intoxicação, foram implementadas medidas como certificação de origem das bebidas, fiscalização intensificada, monitoramento fronteiriço e campanhas educativas para alertar consumidores sobre os riscos de produtos adulterados.

Cuidados e controle

No Brasil, a identificação de que o metanol utilizado na adulteração de bebidas alcoólicas pode ter origem em importações fraudulentas destinadas à adulteração de combustíveis, especialmente por facções criminosas como o PCC, reforça a necessidade de esforço conjunto entre órgãos de segurança pública, vigilância sanitária e setor privado.

O rigor na rastreabilidade do metanol na cadeia de suprimentos, incluindo fiscalização em portos, controle aduaneiro e monitoramento de rotas de contrabando, é fundamental para identificar e combater a origem e a distribuição ilegal da substância.

Além disso, os consumidores devem permanecer atentos a sinais de adulteração, como preços muito abaixo da média de mercado, ausência de selo fiscal ou lacres de segurança, adquirindo produtos apenas em estabelecimentos legalizados.

Associados à adulteração de bebidas com metanol, é essencial implementar políticas públicas integradas visando uma articulação entre órgãos de segurança, vigilância sanitária, entidades setoriais e programas educacionais para a sociedade civil. É indispensável criar um ambiente seguro, reduzir incentivos econômicos à fraude e prevenir intoxicações graves ou fatais.

Leia também:

  1. Fraudes históricas no vinho;
  2. Food Fraud: dados históricos;
  3. Cachaça boa é a cachaça segura;
  4. Food Fraud: a perigosa realidade da fraude de alimentos;
  5. OMC publica guia sobre comércio ilícito de alimentos e fraude alimentar.

Referências dos casos citados

Itália – Disponível em: https://www.tenutalamacchia.com/en/scandalo-del-metanolo/. Acesso em: 30 set. 2025.

Bali, Indonésia (2009) – Disponível em: https://www.reuters.com/article/lifestyle/bali-warns-against-drinking-local-spirit-after-deaths-idUSTRE5521VW/. Acesso em: 30 set. 2025.

China (2010) – Disponível em: https://www.thespiritsbusiness.com/2013/10/toxic-alcohol-kills-at-least-40-in-india/. Acesso em: 30 set. 2025.

Índia – Azamgarh, Uttar Pradesh (2013) – Disponível em: https://www.thespiritsbusiness.com/2013/10/toxic-alcohol-kills-at-least-40-in-india/. Acesso em: 30 set. 2025.

Grécia – Ilha de Zante (2016) – Disponível em: https://honey.nine.com.au/latest/hannah-powell-blind-woman-drinks-methanol-holiday-greece/ddc09ede-1ed4-4d79-8f46-b08e7cb55dd5/. Acesso em: 30 set. 2025.

Rússia – Irkutsk (2016) – Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/2016_Irkutsk_mass_methanol_poisoning. Acesso em: 30 set. 2025.

Índia – Estado de Gujarat (2022) – Disponível em: https://en.wikipedia.org/wiki/2022_Gujarat_alcohol_poisoning. Acesso em: 30 set. 2025.

Brasil – CIATox da Unicamp (2023) – Disponível em: https://unicamp.br/en/unicamp/noticias/2023/08/16/ciatox-alerta-para-aumento-de-casos-de-intoxicacoes-graves-por-metanol. Acesso em: 30 set. 2025.

Rússia – Região de Leningrado (2025) – Disponível em: https://www.thesun.co.uk/news/36849514/people-dead-methanol-vodka/. Acesso em: 30 set. 2025.

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É seguro utilizar utensílios de cerâmica para servir alimentos?

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Os utensílios culinários produzidos em cerâmica estão mais presentes nos domicílios, restaurantes e outros locais destinados à alimentação. Isso ocorre pela abundância de matérias-primas naturais no Brasil, como a argila, e pela prática aumentada de produção artesanal desses utensílios. Temos grandes indústrias produtoras de cerâmica, ateliês e pessoas que praticam em casa.

Inclusive, a cerâmica produzida no Brasil, por grandes indústrias tem mercado internacional, o que também é facilitado pela disponibilidade de matéria prima e pelo aperfeiçoamento das técnicas de produção, com a incorporação de tecnologias avançadas do setor.

Agora, um questionamento que deve ser feito tanto por quem produz cerâmica como por quem compra utilitários para utilizar na alimentação é:

– este utensílio é livre de elementos tóxicos?

– ele é seguro para ser utilizado para aquecimento de alimentos, seja no micro-ondas ou em fornos convencionais?

– ele é seguro para servir diferentes alimentos, como molhos, alimentos ácidos, cremosos, líquidos?

Para responder a essas perguntas, trarei algumas informações sobre as etapas de produção de itens cerâmicos e possíveis pontos de atenção, quando pensamos em fontes de contaminação e fontes de possíveis intoxicações.

Preparação da matéria-prima

Uma informação importante é a diferença entre barro e argila. Barro é o material bruto composto por material orgânico e mistura de solo, e a argila é um dos componentes do barro.

A maior parte das matérias-primas utilizada tanto na indústria de cerâmica quanto para produção independente (em ateliês ou mesmo em casa) é de origem natural, obtida a partir da ação de ventos e chuvas que decompõem materiais rochosos, e pode ser encontrada nas margens de rios, em regiões pantanosas ou em áreas mais montanhosas.

Normalmente os materiais cerâmicos são formados após processo de moagem e com a junção de mais de uma matéria-prima argilosa, podendo também receber água e aditivos.

As argilas são compostas por silicatos de alumínio ou magnésio hidratado e outros elementos, como ferro, potássio.

Formação das peças – Modelagem

Várias técnicas podem ser empregadas para que a argila tome forma de uma peça utilitária, utilizada em construção civil ou decorativa. Quando esse processo é feito na indústria, usam-se equipamentos para obter a forma desejada e quando é feito de forma independente, a modelagem pode acontecer a partir das mãos do ceramista, com ou sem o auxílio de equipamentos. Esse é um dos motivos para que a prática possa ser executada individualmente.

O processamento térmico é de fundamental importância para obtenção dos produtos cerâmicos, pois dele depende o desenvolvimento das propriedades finais destes produtos. Esse tratamento compreende as etapas de secagem e queima.

Secagem

Finalizada a etapa de modelagem, quando já temos as peças na forma final, precisamos que elas passem por um processo de secagem, para secar a água que ainda existe no material. Essa etapa é importante para evitar rachaduras ou defeitos na peça.  É um processo lento e gradual, portanto finalizada a modelagem, a peça ainda demorará alguns dias para ser submetida ao forno para a queima. A duração dessa etapa depende do local onde a peça se encontra, da umidade e da temperatura da região onde foi produzida, quando pensamos em práticas em ateliês ou residenciais.

Queima

Quando a peça apresenta aparência “seca”, ela já pode ir para a etapa de queima, em forno, em temperaturas mais altas, entre 800°C a 1700°C, etapa também conhecida como sinterização. Nessa etapa o material muda suas características, e as peças adquirem rigidez e resistência mecânica pela fusão de componentes da massa.

Esmaltação e decoração 

Alguns materiais cerâmicos podem ser utilizados logo após essa primeira queima, mas se pensarmos em utensílios culinários, eles precisam de uma camada a mais, conhecida como esmalte.

Isso porque a argila é porosa, portanto, não é de fácil e segura higienização após contato com alimentos. tornando-se uma possível fonte de contaminação.

A fase de esmaltação consiste em aplicar materiais especiais que derretem em altas temperaturas e formam uma camada vítrea, com a finalidade de impermeabilizar, proteger e/ou decorar.

Esmaltes ou vidrados são misturas de matérias-primas naturais e produtos químicos ou compostos vítreos que uma vez aplicados à superfície de um material cerâmico e após altas temperaturas (nova queima) formarão uma camada semelhante ao vidro, fina e contínua. Essa camada é impermeável quando constante, e tem importância por aumentar a resistência mecânica do utensílio. É crucial que essa camada seja íntegra e contínua, pois se houver uma rachadura ou trinca, por exemplo, forma-se uma área de contato com a argila e voltamos a ter a possibilidade de contaminação do alimento.

Os esmaltes (vidrados) são obtidos a partir de matérias-primas naturais e de produtos da indústria química.

  • Entre as matérias-primas naturais, estão: quartzo, areia do mar, quartzito, caulim, lepidolita, espodumênio, ambligorita, feldspato, calcita, fluorita, talco, dolomita e zirconita.
  • Entre os produtos químicos, estão: borax, ácido bórico, carbonato de sódio, nitrato de sódio, carbonato de potássio, nitrato de potássio, óxidos de chumbo, carbonato de cálcio, carbonato de bário, carbonato de magnésio, carbonato de lítio, carbonato de estrôncio e óxido de zinco.

Para conferir coloração aos esmaltes, são adicionados corantes e a sua formulação também é importante do ponto de vista toxicológico.

Do ponto de vista de segurança de alimentos, os esmaltes aplicados são de suma importância, uma vez que podem ser compostos por elementos químicos com potencial perigo à saúde humana, como chumbo, cádmio e em alguns casos, o cromo hexavalente.

Todo material que entra em contato com alimentos deve ser cuidadosamente desenvolvido para não se tornar uma possível fonte de intoxicação para as pessoas, transferindo substâncias de potencial tóxico para o alimento, seja durante o consumo, armazenagem ou mesmo aquecimento. Para ter essa segurança são realizados testes de migração, nos quais o alimento e o material de contato são submetidos a situações que simulam a produção de alimentos e então os possíveis resíduos tóxicos são mensurados.

Segundo a Resolução n° 27/1996, os artigos de cerâmica, vidro ou metal que contenham algum tipo de revestimento/decoração cerâmica (esmaltada ou vitrificada) na face de contato com o alimento ou bebidas devem atender aos limites de migração total e migração específica de chumbo e cádmio. A norma também prevê que materiais cerâmicos porosos não podem estar em contato com alimentos.

A migração específica identifica e quantifica certos elementos químicos que podem estar presentes e serem extraídos de artigos cerâmicos, caso façam parte da sua composição. No caso do chumbo e cádmio, os limites da Resolução 27/1996 são estabelecidos para 3 categorias de objetos, conforme explicado na tabela abaixo:

Tabela 1 – Limites máximos de migração específica de chumbo e cádmio em materiais cerâmicos, vidro ou material esmaltado ou vitrificado.

Chumbo (Pb) Cadmio (Cd)
Categoria 1 – objetos não preenchidos ou com profundidade máxima de 25 mm 0,8 mg/dm2 0,07 mg/dm2
Objetos que podem ser preenchidos 4,0 mg/kg 0,3 mg/kg
Utensílios de cozinha com capacidade superior a 3 litros 1,3 mg/kg2 0,1 mg/kg

Com todas essas informações, aqueles que pretendem fazer sua própria cerâmica ou comprá-la de artesãos devem observar se a peça está esmaltada, se possui rachaduras, trincas e qual esmalte foi utilizado. Os fornecedores de esmalte têm fichas técnicas com informações sobre toxicidade.

Se o utensilio foi produzido de forma correta, respeitando as etapas de queima, sinterização, fechando os poros, recebeu esmaltes atóxicos, torna-se bonito e seguro para servir todo tipo de alimento e inclusive pode ser levado a fornos.

Imagem: RF.studio 

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Maniçoba, uma iguaria tradicional que pode ser mortal

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A maniçoba é um prato típico da culinária paraense, amplamente consumido na região Norte do Brasil, especialmente durante festividades como o Círio de Nazaré, a maior festa religiosa do país e uma das maiores celebrações católicas do mundo. Esta festa acontece em Belém do Pará, no segundo domingo de outubro, reunindo milhões de fiéis que acompanham a procissão em homenagem à Nossa Senhora de Nazaré, padroeira da Amazônia.

A palavra “maniçoba” tem origem na língua tupi-guarani, sendo que “mani” literalmente significa mandioca e “çoba” ou “soba” refere-se a partes da planta, como é o caso das folhas.

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O sashimi que pode ser fatal

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No Japão, o peixe baiacu, chamado de fugu, é considerado uma iguaria sofisticada e seu consumo remonta há mais de mil anos, mas foi durante a era Meiji (1868-1912) que o prato ganhou popularidade e se tornou tradicional. Não é incomum ver também fugu em cardápios na China e na Coreia do Sul.

Baiacu-tigre. Fonte: Shutterstock/Reprodução

A espécie de baiacu mais consumida no Japão é o baiacu-tigre (Takifugu rubripes), considerada a mais apreciada na culinária japonesa devido ao seu sabor delicado e textura firme. Além disso, a carne do fugu contém ácido glutâmico e ácido inosínico e, como resultado, tem mais umami do que qualquer outro peixe de carne branca.

Por um período foi proibido o consumo de fugu no Japão, porque muitas pessoas morriam ao consumi-lo sem preparações adequadas, mas apesar da proibição, seu consumo nunca foi banido, justamente por ser um peixe tradicional para o preparo de sashimis sofisticados.

Hirobumi Ito, o primeiro primeiro-ministro do Japão na era Meiji, ao visitar a província de Yamaguchi, no final do século XIX, experimentou o peixe durante uma visita à região e gostou tanto que revogou a proibição, permitindo que restaurantes especializados servissem fugu, desde que fossem preparados por chefs devidamente treinados.

A decisão do primeiro-ministro abriu caminho para que o fugu se tornasse uma tradição gastronômica no Japão, um prato apreciado até os dias de hoje.

A maior parte do fugu no Japão é consumida em Osaka, no oeste do Japão, a principal área de produção e, assim, o fugu está disponível na região a um preço acessível, como uma iguaria popular.

Efeitos da tetrodotoxina no organismo

O perigo do consumo de fugu se deve à toxina tetrodotoxina (TTx), uma neurotoxina extremamente potente que é encontrada nas gônadas, fígado, pele e outros tecidos viscerais do baiacu. Como comparação, essa toxina é cerca de 100 vezes mais letal que o cianeto de potássio.

A TTx é termoestável, ou seja, não sofre ação pela cocção ou congelamento, sendo seu nível sazonal, e as maiores concentrações são encontradas nas fêmeas em época reprodutiva.

A toxina atua bloqueando os receptores de sódio, impedindo a despolarização e a propagação do potencial de ação nas células nervosas. Esta ação ocorre nos nervos periféricos motores, sensoriais e autonômicos, tendo ainda ação depressora no centro respiratório e vasomotor do tronco encefálico.

Sintomas da ação da tetrodotoxina

Sintomas iniciais (10 – 45 minutos após ingestão) Sintomas intermediários Sintomas graves
  • Formigamento nos lábios e língua;
  • Dormência no rosto e extremidades;
  • Tontura e fraqueza muscular.
  • Náuseas, vômitos e diarreia;
  • Perda de coordenação motora;
  • Dificuldade para falar e engolir.
  • Paralisia muscular severa;
  • Insuficiência respiratória;
  • Parada cardiorrespiratória, levando à morte em casos mais severos.

A intoxicação por tetrodotoxina não tem antídoto específico. O tratamento é apenas por controle de sintomas, incluindo ventilação mecânica em casos de insuficiência respiratória até que o corpo elimine a toxina naturalmente, o que pode levar várias horas.

Anualmente, o Japão registra entre 20 e 50 casos de intoxicação por fugu. A taxa de mortalidade varia conforme o período analisado: há 20 anos estava em torno de 6%, mas houve uma redução e atualmente gira em torno de 3%, justamente devido à conscientização sobre os riscos associados e às regulamentações mais rigorosas para liberação de certificação para chefs.

Treinamento rigoroso para preparo do fugu

No Japão, apenas chefs certificados podem preparar o fugu. Para tanto, passam por um treinamento rigoroso e provas para garantir que saibam remover as partes venenosas do baiacu com segurança.

O fugu pode ser preparado em fatias finas, cru ou cozido, sendo que o sashimi de fugu é servido com molho ponzu, rabanete daikon ralado, wasabi, laranja amarga ou frutas cítricas sudachi.

A técnica tradicional de preparo consiste em fatiar o fugu tão finamente que as fatias se tornam translúcidas, prato chamado de usuzukuri.

Os chefs que desejam se especializar para preparar e servir o fugu precisam obter uma certificação, cujo processo requer um treinamento com duração de dois a três anos, incluindo estudo teórico e prático, com uma prova ao final que contempla três etapas:

  1. Prova teórica: Conhecimento sobre as espécies de fugu, anatomia e toxicidade;
  2. Teste prático: Habilidade de remover corretamente as partes tóxicas do peixe;
  3. Degustação final: O próprio chef deve provar seu próprio fugu preparado, garantindo que o processo foi realizado corretamente.

Apenas os chefs que passam nesses testes recebem licença para preparar e servir fugu em restaurantes certificados.

Principais instituições de treinamento de fugu no Japão

  1. Escritório de Bem-Estar Social e Saúde Pública de Tóquio: Órgão responsável pela regulamentação da certificação em Tóquio, encarregado da supervisão de exames e licenciamento de chefs especializados em fugu.
  2. Associação Osaka Fugu: Associação que regula e certifica o preparo do fugu em Osaka, uma das cidades onde o peixe é mais consumido e que oferece treinamentos, exames e certificações para restaurantes e chefs.
  3. Associação Fugu do Japão: Associação nacional que promove padrões de segurança e consumo de fugu e atua na fiscalização e educação de profissionais do setor gastronômico.
  4. Escola de Culinária de Tóquio: Uma das principais escolas de culinária de Tóquio que oferece cursos para chefs com o propósito de licença para preparar fugu .

Consumo de baiacu no Brasil

Existem pelo menos 20 espécies de baiacu no Brasil, algumas com maior concentração de TTx, outras com menor. As espécies mais comuns encontradas no litoral brasileiro são o baiacu-arara (Lagocephalus sp) e o baiacu-pintado (Sphoeroides sp).

No Brasil há poucos dados registrados sobre casos de intoxicação pelo consumo de baiacu, em parte pelas subnotificações, e em parte, por não ser um peixe tão tradicional na culinária brasileira. Mas há relatos:

  • JS, uma criança de 1 ano e 11 meses de idade, em 2010, no distrito de São Lourenço, município de Goiana, Estado de Pernambuco, ingeriu as vísceras de baiacu (Sphoeroides testudineus) com batata doce preparadas pela avó, foi levada para o hospital após sintomas de sudorese fria, fraqueza muscular progressiva, até parada cardiorrespiratória e morte;
  • Magno Sérgio Gomes, um homem de 46 anos, em 2024, em Aracruz, no norte do Espírito Santo, ingeriu o baiacu, ficou mais de um mês internado, não resistiu e morreu;
  • Luis Carlos Fonseca, Elinete Fonseca e Antônio Denilde, todos da mesma família, em 2024, na Vila Alto Pindorama, em Salinópolis, no nordeste do Pará, ingeriram baiacu e morreram.

O consumo de baiacu pode ser fatal e requer preparo apropriado, que consiste na remoção precisa das partes onde a toxina se encontra no peixe. Deve-se evitar também que, durante a manipulação, a toxina contamine outras partes. Na dúvida, sem a certeza de saber como proceder a limpeza e preparo do baiacu, seu consumo deve ser evitado.

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Segurança de Alimentos na fabricação de polpa de tomate concentrada

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A segurança de alimentos é um dos pilares fundamentais na indústria de alimentos, especialmente na produção de polpa de tomate concentrada, um produto amplamente utilizado como base para molhos, temperos e pratos industrializados. Devido ao seu alto teor de umidade, pH relativamente baixo e contato direto com o ambiente e equipamentos, a fabricação da polpa exige rígidos controles de qualidade, sanitização e rastreabilidade para garantir a inocuidade do produto final.

Perigos associados à produção de polpa de tomate

Durante as etapas de recebimento, lavagem, moagem, concentração térmica, envase e armazenamento da polpa de tomate, diversos perigos podem comprometer a segurança do alimento:

  • Perigos biológicos

– Presença de microrganismos patogênicos como Salmonella spp., Clostridium botulinum, Listeria monocytogenes e bolores toxigênicos.

– Contaminação cruzada devido a superfícies mal higienizadas ou água contaminada.

  • Perigos químicos

– Resíduos de agrotóxicos nos tomates crus.

– Lubrificantes ou produtos de limpeza em contato com a linha de produção.

– Migração de metais pesados ou contaminantes de embalagens inadequadas.

  • Perigos físicos

– Presença de fragmentos de vidro, metais, pedras ou plásticos.

– Falhas nos sistemas de peneiramento ou detecção de corpo estranho.

Boas práticas na produção

Para controlar esses perigos e assegurar a inocuidade do alimento, é essencial implementar Boas Práticas de Fabricação (BPF) e Programas de Pré-Requisitos (PPRs) bem definidos:

– Seleção e recebimento rigoroso da matéria-prima: avaliação da qualidade dos tomates, rastreabilidade e análise de resíduos químicos.

– Lavagem eficiente com água potável e sanitizantes, reduzindo carga microbiana inicial.

– Processo térmico adequado (pasteurização/concentração): deve ser validado para garantir destruição microbiana sem comprometer a qualidade sensorial.

– Controle do tempo e temperatura nas etapas críticas.

– Manutenção e higienização periódica de equipamentos e utensílios.

– Treinamento contínuo da equipe sobre higiene pessoal e procedimentos operacionais padronizados (POPs).

Controle de Pontos Críticos (APPCC)

Na produção de polpa de tomate concentrada, o sistema APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle) comumente identifica alguns pontos críticos, como:

– Tratamento térmico (tempo e temperatura): para inativação de Clostridium botulinum e outros patógenos.

– Selagem e integridade das embalagens: prevenir recontaminações pós-processamento.

– pH e atividade de água (Aw): monitoramento para garantir que esteja inibido o crescimento microbiano.

Imagem gerada por I.A. – ChatGPT

Conformidade com normas e certificações

A segurança da polpa de tomate deve estar alinhada com padrões nacionais e internacionais, como as normas da Anvisa e os padrões do Codex Alimentarius.

Em síntese, a fabricação de polpa de tomate concentrada requer uma abordagem preventiva e sistemática para garantir sua segurança. Desde a seleção dos tomates até o armazenamento do produto final, o cumprimento rigoroso de normas, o uso de tecnologias apropriadas e a capacitação da equipe são indispensáveis para garantir um alimento seguro, estável e em conformidade legal.

Por Maria Bearzotti

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Morte de equinos por ração contaminada atinge 4 estados brasileiros

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Segundo dados publicados pelo Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), em 23 de julho subiu para 284 o número de óbitos de equinos após consumo de ração contaminada. Os casos vêm sendo investigados desde o recebimento da primeira denúncia no final de maio deste ano.

Há relação entre os animais que vieram a óbito e o consumo de ração de uma empresa que está sob investigação. Os animais são de diferentes estados brasileiros: Minas Gerais, São Paulo, Rio de Janeiro e Alagoas.

Em todas as propriedades investigadas, os equinos que adoeceram ou vieram a óbito consumiram ração da mesma empresa. Os outros animais das mesmas propriedades, que não consumiram a ração e vivem no mesmo ambiente, não apresentaram qualquer sintomatologia relacionada à intoxicação.

Amostras da ração foram coletadas e analisadas pelos laboratórios de defesa agropecuária e foi detectada a presença de alcaloides pirrolizidínicos (AP), que são substâncias muito tóxicas para os animais.

Esses AP podem causar doença aguda ou crônica, sendo que a crônica é mais comum e está relacionada ao consumo de doses bem baixas desses alcaloides por períodos longos de tempo. Isso ocorre porque mesmo pequenas quantidades podem gerar alterações neurológicas e hepatóxicas, levando os animais a óbito. Concentrações maiores do contaminante na ração podem causar casos agudos, o que parece estar acontecendo. A concentração dos AP nas plantas e a quantidade ingerida estão diretamente relacionadas à sintomatologia dos animais.

Na literatura científica há descrição de casos de intoxicação por ingestão de AP em bovinos, suínos, caprinos, ovinos, equídeos, e até em humanos.

A investigação aponta que a contaminação ocorreu por falha no controle da matéria-prima, uma vez que havia resíduos de plantas do gênero Crotalaria, que são uma das plantas que podem gerar os AP. Além do gênero Crotalaria, os gêneros Senecio, Heliotropium Echiumque também podem gerar essas substâncias.

Plantas do gênero Crotalaria são conhecidas popularmente no Brasil por “chocalho”, “guizo-de-cascavel”, “chocalho-de-cascavel”, “chocalho-de-cobra”, “feijão-de-guizo” ou “xique-xique”. Inclusive há descrições do seu uso em sistema de rotação de culturas, controle de helmintos e fixação de nitrogênio no solo. Nesse caso, é possível que plantações destinadas à fabricação de ração para animais domésticos possam ser acidentalmente contaminadas por sementes ou outras partes de plantas do gênero Crotalaria.

Quando essas plantas são colhidas juntamente com as culturas destinadas à produção de ração, ou quando há mistura acidental durante o processamento, seus resíduos podem entrar na composição final da ração.

A falta de um rigoroso controle de qualidade na seleção e análise da matéria-prima pode facilitar a ocorrência de contaminação.

O controle de AP em rações envolve a adoção de medidas preventivas e práticas de controle de qualidade durante o processo de produção. Isso inclui:

  • a seleção cuidadosa das matérias-primas – selecionar ingredientes da ração provenientes de áreas com baixa incidência das plantas que produzem AP e implementar práticas de manejo que evitem o crescimento dos gêneros produtores de AP próximo a área de cultivo de plantas que serão usadas em ração
  • a avaliação da contaminação por plantas produtoras desses alcaloides – durante o processo de produção, implementar testes, avaliações visuais para seleção dos ingredientes das rações
  • realizar testes laboratoriais para garantir a ausência ou níveis seguros desses compostos na ração final, por exemplo, com análises que usam cromatografia gasosa ou cromatografia líquida. Estas análises devem ser incorporadas nos setores de controle de qualidade das indústrias de ração.

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Perigos químicos na indústria de atomatados: quais são e como controlar

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A segurança de alimentos na indústria de atomatados (molhos, extratos e polpas de tomate) envolve o controle rigoroso de diversos perigos, entre eles os perigos químicos, que representam um risco significativo à saúde do consumidor. Esses perigos podem estar presentes em diferentes etapas do processo produtivo e devem ser identificados, controlados e monitorados conforme os princípios do sistema APPCC (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle).

Fontes comuns de perigos químicos na indústria de atomatados

– Resíduos de agrotóxicos e pesticidas

Tomates contaminados por pesticidas além dos limites máximos permitidos (LMR) podem comprometer a segurança do produto final. É essencial que os fornecedores adotem boas práticas agrícolas (BPA) e que sejam realizadas análises laboratoriais periódicas.

– Contaminação por metais pesados

Pode ocorrer por meio da água de irrigação, solo contaminado ou equipamentos corroídos (ex: chumbo, mercúrio, cádmio). A análise da matéria-prima e da água utilizada na produção é fundamental.

– Lubrificantes e produtos de limpeza

Uso inadequado ou vazamento de lubrificantes não alimentares em equipamentos pode levar à contaminação do alimento. Produtos de limpeza e sanitização também podem deixar resíduos químicos se não forem adequadamente removidos durante o enxágue.

– Migração de contaminantes de embalagens

Substâncias químicas presentes em embalagens (como ftalatos, BPA e solventes de tintas) podem migrar para os alimentos. É necessário usar embalagens seguras e aprovadas para contato com alimentos.

– Aditivos e ingredientes não autorizados ou fora do padrão

O uso indevido ou em excesso de conservantes, corantes e outras substâncias pode representar riscos químicos. Todos os aditivos devem estar em conformidade com as normas legais e devem ser usados conforme as Boas Práticas de Fabricação (BPF).

Medidas preventivas e de controle

  • Homologação e controle de fornecedores: Garantir que os tomates e ingredientes utilizados venham de fontes confiáveis e que apresentem laudos de análise.
  • Monitoramento de resíduos químicos: Realização de análises laboratoriais periódicas para pesticidas, metais pesados e aditivos.
  • Controle dos produtos químicos de uso industrial: Armazenamento, rotulagem e aplicação devem seguir normas rígidas de segurança.
  • Treinamento dos colaboradores: Conscientização sobre o manuseio seguro de produtos químicos e procedimentos em caso de acidentes.
  • Rastreabilidade e recall: Sistemas eficazes de rastreamento e recolhimento de produtos em caso de contaminação química.

Por Maria Bearzotti

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Evolução do Controle de Pragas na visão Food Safety

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Da precariedade à excelência: responsabilidade e sustentabilidade

Esse texto trata da relação entre desequilíbrio ambiental e o surgimento de pragas urbanas. Mostra que pragas são  consequência da má gestão dos espaços, e não apenas vilões a serem exterminados.

Aqui, defendemos que o controle eficaz depende menos de químicos e mais de capacitação técnica, estratégia, prevenção e manejo ambiental. A solução está em ambientes cuidados por profissionais preparados para agir preventivamente.

Colocando a praga no seu devido lugar

Pragas são consequência de um ambiente desequilibrado. Aumento da atividade e ocupação de pessoas e negócios sobre territórios resultam em duas respostas da fauna existente, conforme artigos científicos apontam: a) algumas migram; e b) outras se adaptam.

Entre a fauna adaptada ao ambiente impactado, algumas espécies alcançam um nível de dispersão e proliferação que chega a ocasionar contaminações prejudiciais à saúde das pessoas, bem como prejuízos a estruturas e risco de deterioração em insumos. Esses recebem a alcunha de “pragas” ou “vetores”. Xingamento justo em função dos sérios prejuízos econômicos e riscos à saúde das pessoas, desde os tempos bíblicos.

Embora ratos, pombos, baratas, traças, escorpiões e tantos outros sejam normalmente classificados como vilões, essencialmente são apenas animais adaptados oportunistas. Penetram em ambientes nos quais há oferta de acesso, alimento, água e abrigo.

O desconhecimento é o verdadeiro vilão

Matem todos!! Seria esse o grito insurgente das pessoas (e gerentes) mais afetadas. E embora o extermínio seja a estratégia mais difundida, com resultados eficientes a curto prazo, nenhum praguicida é capaz de isolar o ambiente definitivamente. A tal “redoma mágica” que afasta pragas não existe, mas podemos indicar alternativas para atenuar o risco sanitário e econômico.

Portanto, o desconhecimento e ou o amadorismo é, sem sombra de dúvida, o maior fator de crescimento e afetação das pragas na saúde das pessoas e existe a figura pitoresca do “Zé Bombinha” ou empresas controladoras atrasadas, que chegam lá com “o veneno nas costas”. Isto é uma ameaça à saúde, ambiente e até ao próprio segmento controlador, conforme já apontado em artigos anteriores deste blog. Afinal, muitas pessoas e empresas percebem um nivelamento precário dos controladores profissionais.

Reconheça a necessidade de convergência

Seja em empreendimentos com baixo impacto, ou em grandes instalações industriais, é necessário adotar medidas sustentáveis ambientalmente, que por um lado afastam atividades migratórias das pragas, e por outro lado resultam em menos ações químicas para contenção dos invasores. O que queremos afirmar é: ambientes com bom nível sanitário, destinação correta de resíduos, manejo de flora periférica, recebimento adequado de insumos e mobilização do time interno impõem pouca atuação química e menor risco de contaminações.

Em uma pequena lanchonete, em um complexo industrial pet food, ou em um abatedouro de aves, cada empreendimento pode ter pouca ou nenhuma intervenção química e manter proteção contra pragas, se houver um manejo ambiental bem dimensionado. Por isso não transfira toda a responsabilidade à empresa controladora.

O padrão “Zé Bombinha” contagia

Já pude presenciar situações desconfortáveis quando operações industriais mal dimensionadas produziram infestações de moscas em cidades, formação de focos de mosquitos transmissores, invasão por ratos, colonização de jardins ou galerias com escorpiões, enfim, descuidos ambientais com expressivos impactos na comunidade e produtividade do empreendimento. Todas situações contornáveis com planejamento e correção baseada na adoção de estratégias sanitárias, ambientais e uma pitada de metodologias químicas.

Uma empresa controladora de pragas atenta precisa relatar ao estabelecimento quais são os condicionantes ambientais que aumentam vulnerabilidade a pragas, entretanto é frequente percebermos profissionais controladores realizarem apenas inspeções em armadilhas e aplicação de defensivos, sem exercer sua missão de vigilância do ambiente e identificação ativa dos indícios de pragas. Um simples alerta sobre vegetação elevada, acúmulo de resíduos, vazamentos, ou acessos mantidos abertos já seria suficiente para evitar grandes contaminações.

Ignorar essa visão é um erro comum entre gestores industriais, que privilegiam o fluxo produtivo, em detrimento de medidas para acentuar food safety e qualidade. É o “Zé Bombinha” sendo reproduzido em um tipo de “Zé Indústria”. Todos perpetuando a precarização como modelo.

Capacitação  + Tecnologia = Sustentabilidade

Cada vez mais o time de ESG nas indústrias, bem como empreendedores mais alinhados às tendências sustentáveis, buscam alternativas transversais. Exemplos disso são os projetos privados para controle de mosquitos transmissores, que podem ser contratados por um empreendimento industrial, ou por pequenos empreendimentos comerciais, com inequívoco impacto à comunidade próxima. São estratégias que eliminam milhares de mosquitos sem nenhuma gota de inseticida.

Outras iniciativas envolvem o emprego de estratégias para destinação responsável de resíduos e replantio de vegetação nativa em áreas sem destinação. Tudo a ver com pragas, meio ambiente e responsabilidade social.

Mais um comportamento crescente é o emprego de formulações inseticidas multimoléculas com métodos de tratamento tipo “spot spray”, que direciona o agente químico de alta performance a poucos locais realmente contaminados, reduzindo a cultura de quase “lavar” o ambiente com dezenas de litros de calda inseticida. Também existe o manejo de resistência, pela rotação de moléculas. E os equipamentos aplicadores têm sido cada vez melhor balanceados, deixando o controle profissional de pragas urbanas menos parecido com uma aplicação agrícola.

Inteligência Artificial, legislação e formação técnica

Recursos de IA já estão empregados em alguns modelos de armadilhas luminosas, calibradas para identificar a atividade de insetos voadores com precisão e agilidade, sinalizando ao gestor de food safety, em tempo real, cada novo risco percebido. Mapeamento de iscas raticidas também começam a envolver recursos de IA, realidade ainda distante para a maioria das instalações industriais, mas certamente uma luz no fim do túnel.

O PL 1367/2022, em tramitação desde 2016, será o novo Marco Regulatório para o controle de pragas no Brasil, reforçando a visão já apontada pela ANVISA. A atualização da legislação poderá contribuir para aumentar a excelência da atividade empresarial e proteção à população brasileira.

Ainda existe uma lacuna que pode aprimorar a visão de sustentabilidade nas empresas controladoras: a formação do profissional controlador. Felizmente no Brasil começam a surgir iniciativas que preparam o trabalhador do controle de pragas com excelentes propostas acadêmicas. Entretanto, a maioria das empresas controladoras ainda investe pouco na educação profissional, resultando em trabalhadores meramente repetidores das diluições químicas e revisores de armadilhas.

A contrapartida food safety

Felizmente a cultura food safety é cada vez mais difundida, tanto na legislação quanto na prioridade de muitos estabelecimentos. Desde a consolidação do Codex Alimentarius, muitas conquistas já foram celebradas. E para perseguir esse padrão excelente, produtores de alimentos aprofundam seu envolvimento com todos os requisitos. O controle de pragas, antes muito dependente do nível de comprometimento da empresa controladora, é cada vez mais considerado um tema transversal, assimilado por todos os envolvidos no processo. Deixou de ser um “assunto lá da qualidade”.

Uma visão evolutiva

A próxima fronteira para um controle de pragas realmente convergente com a cultura food safety, capaz de assimilar todas as dimensões da responsabilidade ambiental e sanitária, está diretamente conectado com o padrão educacional dos trabalhadores. Agentes reguladores e clientes tomadores esperam esse aprimoramento profissional.

A maior limitação para responder aos requisitos dos sistemas de qualidade e segurança não está no inseticida escolhido ou no equipamento disponível. Está na expectativa de que a “lagarta zé bombinha” se transforme em uma “borboleta controladora”.

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Resíduo químico pós-CIP: o perigo que seu enxágue pode estar deixando para trás

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Na busca por eficiência e segurança nos processos de limpeza, a indústria de alimentos investe tempo, produto e energia. Tudo cronometrado, controlado, com curvas de pH registradas e protocolos bem definidos. Mas, em meio a tanta atenção, há uma etapa que ainda costuma ser tratada como um simples detalhe: o enxágue.

Enquanto os detergentes fazem o trabalho pesado — removendo proteínas, gorduras e microrganismos — o enxágue é encarado apenas como um “passo final”. E é justamente nessa simplificação perigosa que mora o risco.

O que parece uma etapa simples pode se tornar um ponto cego na segurança de alimentos, silencioso e recorrente.

O que é um enxágue insatisfatório?

É o que acontece quando resíduos químicos de etapas anteriores permanecem no sistema mesmo após a limpeza. Esses resíduos podem ser alcalinos, ácidos ou oxidantes — e ficam ali, escondidos em válvulas, dutos, tanques ou até em equipamentos de envase. Em sistemas Clean In Place (CIP), falhas de enxágue já foram identificadas como causa direta de contaminações químicas em produtos acabados.

O problema é que, em algum momento, eles saem do esconderijo. E isso tem consequências.

Quais impactos isso pode causar?

Mesmo sendo silencioso, o enxágue insatisfatório pode gerar sérias consequências:

  • Alterações no pH do produto final: resíduos alcalinos ou ácidos podem desestabilizar o equilíbrio do produto, principalmente em bebidas fermentadas ou lácteos.
  • Instabilidade em fermentações: contaminantes químicos alteram o ambiente microbiano, inibindo ou favorecendo microrganismos indesejados.
  • Danos a membranas, placas e conexões: o contato contínuo com agentes corrosivos acelera o desgaste de componentes.
  • Formação de subprodutos indesejados: como cloratos e cloritos, derivados da decomposição do hipoclorito de sódio quando mal enxaguado.
  • Não conformidades em auditorias: resíduos químicos são frequentemente identificados em análises de validação de limpeza.

É um erro que passa despercebido até gerar prejuízo. E quando aparece, já contaminou lote, danificou equipamento ou comprometeu a confiança do cliente.

Produtos mais críticos

Alguns químicos usados em sistema CIP precisam de atenção redobrada no enxágue:

  • Soda cáustica: alcalina, comumente utilizada para limpeza pesada. Pode elevar o pH do produto e é altamente irritante.

  • Ácido nítrico ou fosfórico: ácidos inorgânicos corrosivos que, quando mal removidos, promovem corrosão localizada em aço inoxidável.

  • Sanitizantes (como hipoclorito): se não forem completamente removidos, podem deixar resíduos oxidantes ou gerar subprodutos como trihalometanos e cloratos, que são potencialmente tóxicos.

Leia:  Cloratos na indústria de alimentos: impactos, regulação e alternativas

Como identificar um enxágue insatisfatório?

Não se trata de “achar” — é preciso medir e comprovar:

  • pH da água de enxágue: deve se igualar ao da água potável.
  • Condutividade elétrica: deve se aproximar da água limpa; valores altos = resíduos.
  • Tiras reagentes: identificam resíduos de soda, cloro ou peróxidos.
  • Indicadores ácido/base: mostram presença de resíduos por mudança de cor.
  • Sensores em linha: monitoram e registram pH e condutividade em tempo real.

O que a indústria pode fazer?

Ações técnicas recomendadas:

  • Estabelecer tempo mínimo de enxágue com base em testes reais.

  • Validar volume de água ideal por circuito e tipo de resíduo.

  • Instalar sensores de pH/condutividade em pontos críticos.

  • Treinar operadores para não encurtar essa etapa.

  • Correlacionar desvios de qualidade com registros históricos do enxágue.

Reflexão necessária

Desvios de pH, corrosão precoce, sabores estranhos, falhas de fermentação… Será que o problema está no produto ou no resíduo que ficou no sistema?

O enxágue é a última barreira entre o produto químico e o alimento. Quando essa etapa falha, o risco é real — e completamente evitável.

A conclusão é que o enxágue insatisfatório não dispara alarme, não para a linha, não chama a atenção. Mas ele pode ser o maior vilão silencioso da sua fábrica. Validar e monitorar essa etapa é um investimento que evita perdas, retrabalho e crises de imagem.

Não adianta ter o melhor detergente do mundo se você está servindo ele junto com o produto final.

Quer entender como qualificar seu sistema CIP de forma prática e segura? Confira também o artigo Limpeza industrial: descomplicando o processo de qualificação de CIP, uma leitura complementar essencial para quem leva a segurança de alimentos a sério.

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PFAS na indústria de alimentos: entenda os desafios e estratégias de proteção

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A segurança dos alimentos e a sustentabilidade estão no centro das preocupações do consumidor moderno e os PFAS entram nesse debate como um dos maiores desafios emergentes.

Mas afinal, o que são esses compostos e por que todo profissional da indústria de alimentos precisa estar atento a eles?

PFAS é a sigla para substâncias per e polifluoroalquiladas, uma família de compostos sintéticos criados na década de 1930, conhecidos por sua extrema resistência térmica, química e à degradação.

Essa durabilidade, no entanto, trouxe consequências indesejadas: os PFAS são hoje chamados de “químicos eternos”, pois persistem no meio ambiente e nos organismos vivos, bioacumulando-se ao longo do tempo.

Eles geralmente estão presentes em panelas antiaderentes (como as de teflon), embalagens de alimentos resistentes a gordura, roupas impermeáveis e tecidos anti-manchas, cosméticos, espumas de extintores, e muito mais.

Os PFAS podem migrar para os alimentos por diferentes rotas:

  • Materiais de processamento: selantes, anéis de vedação, tubulações e equipamentos revestidos.
  • Embalagens de alimentos: caixas de pizza, sacos de pipoca para micro-ondas, embalagens de fast food.
  • Ambiente contaminado: água utilizada na irrigação ou na produção de alimentos.

Essa exposição indireta representa um desafio crescente para a indústria alimentícia, especialmente para marcas que buscam atender a regulamentações internacionais cada vez mais rígidas.

Diversos estudos associam a exposição prolongada a PFAS com:

  1. Disfunções da tireoide
  2. Aumento do colesterol
  3. Imunossupressão
  4. Problemas reprodutivos
  5. Maior risco de câncer?

Devido à sua estabilidade química, mesmo pequenas concentrações podem trazer impactos significativos.

No âmbito de assuntos regulatórios, a pressão está aumentando para que essas substâncias sejam regulamentadas ou banidas.

União Europeia: em vigor o Regulamento 2023/915, que estabelece limites máximos de PFAS em carnes, peixes, frutos do mar e ovos.

Regulamento (UE) 2022/2388: altera o Regulamento (CE) 1881/2006, estabelecendo novos valores máximos permitidos para PFAS em alimentos.

Outras medidas

A UE também está implementando medidas para restringir o uso de PFAS em diversos produtos e setores.

Estados Unidos: a Agência de Proteção Ambiental (EPA) endureceu limites para PFAS em água potável e propõe regulamentações para alimentos.

Brasil: Em fase inicial de regulamentação, mas já há detecção de PFAS em carnes, vegetais e água mineral.

A regulamentação ainda está em desenvolvimento, com o Projeto de Lei 2.726/2023 (PL 2726/2023) propondo uma política nacional de controle.

PL 2726/2023: Este projeto de lei, que busca instituir a Política Nacional de Controle de PFAS, ainda aguarda tramitação na Câmara dos Deputados.

Agência de Proteção Ambiental (EPA): em abril de 2024, a EPA anunciou parâmetros para PFAS na água potável, estabelecendo limites legais obrigatórios.

Para empresas exportadoras, ignorar o tema pode significar perda de mercado.

Técnicas de detecção e remoção

Detectar PFAS é um grande desafio devido às baixíssimas concentrações presentes nos alimentos (em nível de nanogramas ou picogramas). As principais técnicas analíticas incluem:

  • Cromatografia líquida acoplada à espectrometria de massas (LC-MS/MS): alta sensibilidade para identificar PFAS individuais.
  • Técnicas híbridas (CLAE-ESI-MS/MS): permitem análise mais ampla e precisa.

Osmose reversa, carvão ativado granular e resinas de troca iônica: métodos utilizados para remover PFAS da água e minimizar contaminações.

Alternativas aos PFAS: um caminho sustentável

Frente às restrições, a indústria já pesquisa e testa materiais alternativos para embalagens e revestimentos:

  • Biopolímeros naturais
  • Revestimentos à base de ceras vegetais
  • Materiais compostáveis sem adição de PFAS

Inovar e substituir PFAS não é apenas uma questão de responsabilidade ambiental, mas de sobrevivência competitiva.

Como os profissionais da indústria de alimentos podem agir?

  • Auditoria de fornecedores: verificar certificações e testar embalagens e materiais em busca de presença de PFAS.
  • P&D de novos materiais: trabalhar junto a fornecedores no desenvolvimento de alternativas seguras e sustentáveis.
  • Capacitação contínua: manter-se atualizado sobre regulamentações internacionais e tecnologias emergentes.
  • Comunicação transparente: informar claramente aos consumidores e autoridades a composição dos produtos.
  • Avaliação de riscos: avaliar risco baseado na geolocalização e pesquisas de referência sobre seus produtos e seus insumos.

A presença de PFAS na cadeia alimentar é uma preocupação real e urgente. Empresas que investem agora em inovação, monitoramento e substituição de materiais estarão à frente conquistando a confiança do mercado e garantindo sua sustentabilidade no futuro.

Ana Silvia Mattos Gonçalves é engenheira de alimentos, coordenadora de Segurança de Alimentos e Qualidade e especialista em assuntos regulatórios e qualificação de fornecedores.

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