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Solda higiênica: o que é e como avaliá-la na indústria de alimentos

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A solda higiênica, também chamada de solda sanitária, é um tipo de união metálica utilizada em tubulações, tanques, válvulas e equipamentos em que há contato direto com alimentos ou bebidas. Seu principal objetivo é garantir que não haja pontos de acúmulo de resíduos, contaminações ou dificuldades de limpeza, mantendo assim a segurança dos alimentos.

Ela é frequentemente usada em sistemas onde o contato direto com alimentos é inevitável, como processamento de laticínios, bebidas, carnes e também em linhas de produtos farmacêuticos e cosméticos. Para ser considerada sanitária, a solda deve ser perfeita em termos de acabamento e integridade, de modo a evitar pontos de falha onde contaminantes possam se acumular.

Diferentemente das soldas comuns, a solda higiênica precisa apresentar:

  • Superfícies lisas e contínuas, sem rebarbas ou cavidades;
  • Ausência de trincas, poros ou descontinuidades;
  • Acabamento interno e externo polido, conforme as especificações sanitárias (geralmente até Ra 0,8 m de rugosidade);
  • Alinhamento preciso entre as partes unidas, sem degraus internos.

Exemplo de solda higiênica polida em tubulação de aço inox AISI 316 usada na indústria de alimentos

Por que a solda higiênica é crítica na indústria de alimentos?

Qualquer falha em uma solda pode se tornar um ponto de risco microbiológico. Um pequeno poro pode permitir o acúmulo de resíduos e biofilmes, comprometendo a limpeza e desinfecção, mesmo com CIP (Cleaning in Place). Isso pode levar à contaminação cruzada, deterioração do produto e até recall.

Equipamentos como vasos e tubulações utilizados na fabricação higiênica de produtos alimentícios são frequentemente fabricados em aço inoxidável austenítico (por exemplo, tipo AISI-316). A soldagem é o método usual de conexão das várias partes componentes de uma planta, sendo fundamental que as soldas reflitam as qualidades higiênicas do material base o mais próximo possível.

A filosofia de design de uma planta higiênica segue três linhas centrais:

  1. O produto deve fluir livremente pela linha e não estagnar;
  2. A linha deve ser limpa e permitir a destruição de microrganismos;
  3. O conteúdo da linha deve ser protegido do ambiente externo.

Consequentemente, as soldas também devem atender a esses requisitos. Soldas deficientes podem contribuir para vários problemas de higiene, como retenção de produto em frestas, outras áreas mortas ou superfícies rugosas, que podem ser difíceis ou impossíveis de limpar no ciclo usual de limpeza em linha (CIP).

Problemas comuns em soldas

Vários tipos de defeitos comuns em soldas podem atuar como fontes de problemas microbiológicos devido à limpeza inadequada e retenção de produto:

  • Desalinhamento: Pode ser causado por montagem incorreta antes da soldagem ou desajuste nos diâmetros ou espessuras, introduzindo um degrau na parede ou no furo, o que pode reter produto.
  • Trincas: Trincas que penetram na superfície de contato do produto podem alojar material. O tipo mais comum é a “trinca central”, que corre ao longo do metal de solda, geralmente causada por um espaço muito amplo durante a preparação da junta.
  • Porosidade: A presença de poros na solda pode comprometer a integridade da união e dificultar a limpeza.
  • Oxidação: A oxidação excessiva pode ocorrer pelo uso de temperaturas elevadas durante a soldagem, comprometendo as propriedades higiênicas do material.

Como avaliar soldas higiênicas na prática?

A avaliação de soldas higiênicas envolve critérios visuais, dimensionais e funcionais. Veja os principais métodos:

1 – Inspeção Visual

  • Deve ser feita por um profissional qualificado.
  • Busca-se uma superfície uniforme, sem respingos, poros, trincas, cavidades ou sobreposição de material.
  • A solda deve ser contínua e sem sinais de oxidação (cor azulada, amarelada ou preta indica superaquecimento).

2 – Rugosidade (Ra)

  • Medida com rugosímetro.
  • Para superfícies em contato com alimentos, a rugosidade interna deve ser de Ra 0,8 µm (alguns casos exigem 0,6 µm).
  • Quanto menor a rugosidade, mais fácil é a limpeza.

3 – Teste de Penetração por Líquido (PT)

  • Usado para identificar trincas superficiais invisíveis a olho nu.
  • Consiste na aplicação de um líquido penetrante seguido de revelador.

4 – Videoscopia (borescope ou boroscópio)

  • Inspeção interna de tubulações soldadas.
  • Ideal para locais de difícil acesso, onde o acabamento interno da solda deve ser perfeito.

5 – Radiografia Industrial (RX)

  • Avaliação da integridade interna de soldas, identificando poros, inclusões e trincas.
  • Muito usada em soldas de alta criticidade, mas de custo elevado.
  • A avaliação das soldas higiênicas deve ser feita com base em uma série de critérios técnicos que assegurem a funcionalidade e segurança da instalação. Além de uma inspeção visual detalhada, também são utilizados testes mais específicos para garantir que a solda atenda aos padrões de segurança de alimentos.

Critérios de aceitação (exemplos práticos)

Tipo de Defeito Aceitável? Observação
Rebarba ou saliência Não Pode reter resíduos alimentares
Poros ou crateras Não Indicam penetração incompleta ou contaminação
Cor azul/amarela na solda Não Indica oxidação por superaquecimento
Alinhamento irregular Não Causa zonas mortas e acúmulo
Superfície polida e lisa Sim Ideal para limpeza e sanitização

Boas práticas na execução da solda higiênica

  • Usar soldagem TIG (GTAW), preferencialmente com gás de purga para proteção interna;
  • Garantir que o soldador seja qualificado para soldagem sanitária;
  • Realizar controle do calor para evitar oxidação;
  • Executar treinamentos periódicos e qualificação contínua da equipe.

A solda higiênica é muito mais do que estética, ela é essencial para garantir a segurança dos alimentos e o cumprimento das normas sanitárias.

A inspeção regular e o uso de critérios técnicos objetivos contribuem para manter a integridade do processo produtivo e evitar riscos à saúde pública.

Além disso, a qualificação contínua dos soldadores, o uso de técnicas avançadas de soldagem e inspeção são fundamentais para manter os elevados padrões exigidos pelas indústrias alimentícias.

O cuidado com a solda higiênica não é apenas uma questão de qualidade do alimento, mas de responsabilidade sanitária.

Aproveite esse momento de leitura e explore outras postagens do blog sobre solda higiênica:

  1. Solda sanitária: vamos conversar?
  2. Os perigos que envolvem as soldas na indústria de alimentos
  3. Perigo de corrosão a partir de soldas em equipamentos de aço inoxidável
  4. Por que a solda TIG é a mais indicada para a indústria de alimentos?

Ana Sílvia Mattos Gonçalves é engenheira de alimentos, coordenadora de Segurança de Alimentos e Qualidade e especialista em assuntos regulatórios e qualificação de fornecedores.

Referências:

AISI Steel Products Manual, Stainless and Heat Resisting Steels (1974)

EHEDG Doc 9, Welding stainless steel to meet hygienic requirements

4 min leituraA solda higiênica, também chamada de solda sanitária, é um tipo de união metálica utilizada em tubulações, tanques, válvulas e equipamentos em que há contato direto com alimentos ou bebidas. […]

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Passo 1 da Manutenção da Qualidade: TPM e Segurança dos Alimentos

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Hoje darei continuidade ao tema Manutenção da Qualidade, que é um dos pilares da metodologia TPM – Manutenção Produtiva Total. Vamos entender como este pilar pode auxiliar a qualidade e a segurança dos alimentos.

O Pilar de Manutenção da Qualidade envolve ações voltadas para garantir que os equipamentos operem em condições ideais, de forma a preservar a qualidade original dos produtos. Seu objetivo principal é alcançar o “zero defeito”, eliminando retrabalhos, reprocessos e qualquer desvio em relação às especificações estabelecidas.

Se os equipamentos operam em condições ideais, a probabilidade de ocorrências que impactam a segurança dos alimentos é consequentemente minimizada. Pense nos pontos críticos de controle, nos detectores de metais, nas contaminações em processos… Muitos problemas acontecem devido à ineficiência dos equipamentos e processos e atuar de forma preventiva com o pilar de MQ é estratégico.

O principal objetivo do pilar MQ de TPM é alcançar o “zero defeito”

Em TPM, a manutenção da qualidade é o estágio de maior autonomia e prevenção quando falamos em qualidade (veja mais no artigo: “Níveis de maturidade em Manutenção da Qualidade e sua relação com a segurança dos alimentos”).

Conhecida por ser uma metodologia baseada em etapas a serem seguidas, o pilar MQ é constituído de 10 passos.

Passo 1: Determinação da situação atual 

No primeiro passo são estruturadas as informações a respeito de históricos de não conformidades e etapas do processo envolvido. Nesse passo o objetivo é entender e determinar a situação atual, onde as energias serão investidas, quais os maiores problemas, quais os históricos, como os equipamentos se comportam e influenciam na qualidade dos produtos, que características e defeitos podem ocorrer.

Sendo assim, é fundamental uma boa base e histórico relacionados a:

  • Reclamação de consumidores;
  • Defeitos de qualidade;
  • Não conformidades
  • Quaisquer outras fontes de entrada relacionadas a problemas de qualidade.

Essas fontes de dados podem ser encontradas e compiladas por meio de tabelas, planilhas de controles, relatórios de sistemas. Essa estruturação auxiliará a construção de uma árvore de perdas da qualidade ou um gráfico de Pareto como, por exemplo, no modelo abaixo.

Considerando os tipos de defeito, criticidade e frequência, uma linha “piloto” é determinada para que seu processo seja mapeado. Linha piloto é o nome dado à seleção de uma linha ou processo onde iniciaremos as atividades dos pilares de TPM. É uma forma de investir energia e esforços em um processo ou linha iniciais e depois os resultados positivos obtidos podem ser replicados. Além disso, a linha piloto representa o equipamento ou processo chave da empresa e a atuação neste sistema terá reflexos mais positivos para o negócio.

Uma vez mapeada a linha piloto, devem ser analisadas todas as suas partes e os componentes envolvidos na fabricação do produto.

Ainda nesse mesmo passo, uma tabela com os potenciais modos de defeitos é construída baseada nos processos mapeados. Vejamos um exemplo abaixo:

Aqui, durante a construção da tabela, uma mentalidade de segurança dos alimentos pode enriquecer sua construção,  listando os perigos, pontos críticos, vulnerabilidades, pontos de contaminação, históricos de não conformidades.

Esse primeiro passo é justamente focado no entendimento e determinação da situação atual, como o próprio nome já diz. Todos esses dados serão fonte de entrada para a elaboração da Matriz QA, tema para um próximo post. É muito importante a coleta dos dados, para que sejam confiáveis e possam nortear um bom trabalho no pilar MQ.

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Leia mais:

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Influenza Aviária no Brasil: o que o consumidor e a indústria precisam saber após o foco em Montenegro (RS)

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Em maio de 2025, foi confirmado o primeiro foco de Influenza Aviária de Alta Patogenicidade (IAAP) em aves comerciais no Brasil, especificamente em uma granja de matrizes pesadas no município de Montenegro, no Rio Grande do Sul.

A ocorrência foi detectada após a notificação de mortalidade elevada pela empresa integradora em 11/05/2025. O Serviço Veterinário Oficial (SVO) realizou a interdição da granja, coleta de amostras e envio ao LFDA-Campinas, com confirmação positiva no dia 15/05/2025. Lembramos que, em 21 de julho de 2024, foi notificada a ocorrência de um foco da doença de Newcastle (DNC) em frangos de corte no município de Anta Gorda, Rio Grande do Sul. A DNC é outra doença aviária, uma das Síndromes Respiratórias (SR) que fazem parte do Programa Nacional de Sanidade Avícola (PNSA).

A resposta ao surto foi imediata e seguiu rigorosamente o Plano Nacional de Contingência para IAAP, incluindo o abate sanitário das aves remanescentes, descarte de ovos férteis relacionados ao foco e início dos processos de desinfecção e vigilância. Foram delimitadas zonas de contenção em um raio de 3 km (perifoco) e de vigilância até 10 km, com instalação de barreiras sanitárias permanentes e visitas técnicas a propriedades rurais nas áreas afetadas.

Como medida preventiva adicional, o MAPA determinou a destruição de todos os ovos férteis (incubados ou não) enviados, nos 28 dias anteriores ao foco, a incubatórios localizados no Rio Grande do Sul, Paraná e Minas Gerais que tiveram vínculo epidemiológico com a granja infectada. A rastreabilidade permitiu rápida identificação e controle dos materiais potencialmente contaminados.

Do ponto de vista da saúde pública, é importante destacar que não há risco para o consumo de carne de frango ou ovos devidamente inspecionados. A Influenza Aviária não é transmitida por alimentos, especialmente considerando que as aves doentes são removidas ainda nas granjas e que há rigorosos controles de inspeção ante e post mortem nos abatedouros brasileiros.

O maior impacto imediato está na esfera comercial. Como medida cautelar, foi decretado estado de emergência zoossanitária por 60 dias na região de Montenegro e suspensa temporariamente a certificação sanitária internacional para a exportação de carne de aves à China e a outros países que exigem regionalização em casos de IAAP. As restrições afetam tanto produtos in natura quanto subprodutos de origem animal.

As principais medidas de prevenção envolvem vigilância ativa, notificação imediata de mortalidade anormal em aves (acima de 10% em menos de 72 horas), controle rígido de biosseguridade nas granjas e ações coordenadas entre os serviços estaduais, federais e privados. O Brasil segue adotando uma postura transparente e técnica na condução do caso, o que é essencial para garantir a confiança dos mercados e da população no sistema de defesa sanitária nacional.

Outros posts já publicados pelo blog sobre este assunto que você pode acessar e ler:

Gripe aviária como risco potencial em alimentos

Gripe aviária: o que é preciso saber

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Diferenças regulamentares entre os queijos autoral, artesanal e industrial

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Uma pergunta que recebo com frequência é: “por que os queijos que produzimos em indústrias, chamados de “industriais”, precisam seguir padrões rígidos com relação a rotulagem e processos produtivos e os queijos autorais ou artesanais têm rótulos com informações diversas e processos produtivos não regulamentados?”

Algumas definições que podem auxiliar no entendimento:

Queijos Autorais: são produtos que refletem a personalidade e criatividade do produtor, podendo ter características únicas. 

Queijos Artesanais: são produzidos de forma tradicional, com receita e processo que apresentam características próprias, tradicionais, regionais ou culturais. 

Nos dois casos, a rotulagem deve obedecer às regras tanto do MAPA quanto da ANVISA. A rotulagem é imprescindível como forma de trazer informações e segurança para quem irá consumir o produto.

São informações obrigatórias para produtos industriais, artesanais ou autorais:

– Identificação com a denominação do queijo;

– Lista de ingredientes – obedecendo a ordem decrescente, por quantidade, dos ingredientes utilizados;

– Informação nutricional, atendendo às normas da ANVISA com relação à quantidade de nutrientes por porção do produto e por 100 g;

– Presença ou ausência de glúten

– Informação sobre presença de alergênicos e derivados

– Carimbo do órgão fiscalizador – SIF ou SIE ou SIM

– Identificação do fabricante/produtor – dados completos do produtor e local onde o queijo é produzido

Selo Arte/Selo de queijo artesanal, se aplicável

– Lote e validade

– Informação sobre presença de lactose, se aplicável

A Portaria 531/2022 do Ministério da Agricultura, estabelece  os requisitos para concessão dos selos de identificação artesanal ARTE e Queijo Artesanal pelos órgãos de agricultura e pecuária federal, estaduais, municipais e distrital, além de definir os padrões de numeração e logotipos dos selos de identificação artesanal. Esta norma também institui o Manual de Auditoria do processo de concessão de selos de identificação artesanal.

Além da rotulagem e concessão dos selos, a Lei nº 17.453/2021 dispõe sobre a manipulação e o beneficiamento de produtos de origem animal, sob a forma artesanal, bem como sobre sua inspeção e fiscalização sanitária, no Estado de São Paulo.

Tudo isso mostra que na teoria os queijos artesanais e autorais também são regulamentados, fiscalizados e seguem critérios de rotulagem e registro. O que pode gerar questionamentos é se a fiscalização efetivamente acontece. Os estabelecimentos são visitados e realmente os processos são verificados pelos órgãos responsáveis? Os rótulos fora do padrão são questionados pela Vigilância Sanitária e recolhidos dos pontos de vendas?

Entendo que existe a norma e ela precisa ser cumprida. Quando isso não acontece, as penalidades previstas devem ser aplicadas, assim como nos queijos industriais.

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O futuro inteligente da indústria de alimentos: a Inteligência Artificial está transformando tudo

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O blog Food Safety Brazil já escreveu excelentes textos sobre o impacto revolucionário das IAs na produção de alimentos, como “A inteligência artificial revolucionará a segurança de alimentos” e “Integrando inteligência artificial aos processos de controle de qualidade: oportunidades e desafios”. Agora, permita-me discorrer ainda mais sobre este assunto, que merece ser cada vez mais informado e debatido pelos profissionais da indústria de alimentos.

Sabemos que a busca por alimentos mais seguros, saudáveis e rastreáveis nunca esteve tão intensa. Cada vez mais exigentes, consumidores querem transparência total sobre o que consomem. E a indústria de alimentos precisa responder rapidamente, inovando em segurança, eficiência e competitividade.

É nesse cenário que a Inteligência Artificial (IA) deixa de ser promessa para se tornar realidade, uma revolução silenciosa, mas que está redefinindo processos, produtos e a maneira como lidamos com a segurança dos alimentos.

"Inteligência Artificial e robôs otimizando a segurança de alimentos em ambiente industrial automatizado"
Foto gerada por I.A. por Humberto Cunha

Como a Inteligência Artificial atua na indústria de alimentos?

Inteligência Artificial é a capacidade de sistemas computacionais aprenderem, analisarem grandes volumes de dados e tomarem decisões de forma autônoma. Na prática, ela já está transformando toda a cadeia alimentícia em diferentes frentes:

  • Treinamento imersivo com realidade virtual (VR) e aumentada (AR)

Funcionários são treinados em ambientes simulados para aprender, de forma prática e segura, boas práticas como higienização de mãos, armazenagem correta de alimentos e ações de resposta a surtos alimentares.

  • Chatbots e assistentes virtuais

Essas ferramentas estão melhorando o atendimento a consumidores e colaboradores, respondendo às dúvidas, alertando sobre produtos contaminados e identificando ingredientes alergênicos rapidamente.

  • Análise preditiva com Big Data

Com o uso de IA e Big Data, é possível prever contaminações, monitorar fornecedores e aumentar a rastreabilidade, prevenindo grandes crises e recalls.

  • Robôs e sensores inteligentes

Em supermercados e indústrias, robôs já monitoram temperatura, detectam prateleiras desorganizadas e até realizam limpezas automatizadas em áreas críticas, reduzindo a transmissão de patógenos.

Casos reais de sucesso

Tractian — A empresa, parceira de gigantes como Coca-Cola, Danone e JBS, desenvolveu sensores inteligentes que monitoram moinhos, misturadores e extrusoras, detectando falhas antes que causem paradas inesperadas.

Detecção precoce de patógenos — Grandes frigoríficos já utilizam IA para identificar bactérias como Listeria monocytogenes em imagens microscópicas, prevenindo surtos.

Previsão de falhas em equipamentos — Fábricas de laticínios usam IA para prever falhas e evitar perdas financeiras e riscos sanitários.

Análise preditiva de recalls — Supermercados cruzam dados de fornecedores e consumidores com IA para antecipar recalls de produtos.

NotCo — A startup chilena criou o Giuseppe, uma IA capaz de desenvolver versões vegetais de alimentos tradicionais, como a NotMayo e o NotCheese. O sucesso foi tanto que Jeff Bezos investiu US$ 30 milhões no projeto.

Gastrograph AI — A startup usa algoritmos genéticos para criar sabores personalizados, considerando fatores como idade, etnia e classe social dos consumidores.

Kellogg’s e Givaudan — Ambas utilizam IA para melhorar marketing e desenvolver produtos que atendem exatamente ao paladar dos consumidores.

Carne sintética: um exemplo revolucionário

Um dos avanços mais emblemáticos é a produção de carne cultivada. O processo começa com a extração indolor de células musculares de bois ou frangos, que são cultivadas em biorreatores com nutrientes. Com o apoio da IA, as condições de crescimento são monitoradas e ajustadas em tempo real, produzindo fibras musculares que resultam em carne com aparência, textura e sabor muito próximos da original — sem abate animal.

O futuro da indústria de alimentos é inteligente e colaborativo

A inteligência artificial não vai substituir os profissionais de qualidade e engenharia de alimentos. Pelo contrário: ela vai potencializar seu trabalho, oferecendo dados mais rápidos, decisões mais assertivas e processos muito mais eficientes.

Para essa transformação acontecer de forma segura e sustentável, será essencial:

  • Investir em capacitação e treinamento contínuo
  • Criar regulamentações inteligentes e atualizadas
  • Formar parcerias estratégicas com empresas de tecnologia

O futuro da indústria alimentícia será mais conectado, mais inteligente e profundamente colaborativo. A IA será a grande aliada — desde que utilizada com ética, responsabilidade e foco em qualidade.

Empresas que investirem agora em tecnologia, cultura de dados e inovação terão vantagem competitiva nos próximos anos.

Prepare seu negócio para um futuro mais seguro, eficiente e sustentável!

Ana Silvia Mattos Gonçalves é engenheira de alimentos, coordenadora de Segurança de Alimentos e Qualidade e especialista em assuntos regulatórios e qualificação de fornecedores

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Como foi o 14º Food Safety Brazil Meeting: “Lubrificantes em foco: segurança dos alimentos e sustentabilidade”

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No mês de abril aconteceu nosso 14º Food Safety Brazil Meeting, com um recorde de mais de 400 inscritos. As discussões foram riquíssimas e as perguntas dos participantes enriqueceram ainda mais o nosso evento.

Para quem não assistiu, basta acessar esse link para assistir ao evento e conhecer o nível de detalhes das informações e esclarecimentos disseminados pelas palestrantes Vanessa Amaral e Lilian de Araújo Miakawa. Lilian é da Fuchs e muito bem representou Raúl Colombo Díaz.

Vanessa, colunista do Food Safety Brazil, que traz sempre textos muito esclarecedores (podem ser acessados aqui), introduziu o assunto com autoridade, falando da relevância dos lubrificantes nos processos de alimentos e embalagens. Ela destacou  como o APPCC deve levantar esse perigo, identificando possíveis pontos de contaminação das linhas e produtos, além de como os requisitos das normas internacionais abordam o tema dos lubrificantes nos processos de alimentos.

A multidisciplinaridade desse levantamento foi enfatizada, e essa pluralidade de competências pode ser evidenciada também no nosso público, que contou com indústrias de alimentos dos mais diversos segmentos, além de pessoal de engenharia e manutenção. Contarmos também com representantes da Agência Nacional do Petróleo, que não só assistiram o conteúdo, mas participaram ativamente do nosso chat e deram suporte a diversas dúvidas das certificações e registros de lubrificantes no Brasil, o que demonstra o alcance do 14º Food Safety Brazil Meeting.

Na sequência, Lilian de Araújo Miakawa (já temos textos sobre uma excelente palestra dela em um evento de segurança de alimentos, que podem ser acessados  aqui e aqui), nos trouxe detalhes dos lubrificantes, suas certificações e registros, além de substâncias destes produtos que são estudadas em relação à saúde do consumidor (como é o caso de MOSH, MOAH e PFAS). Ela apresentou pesquisas sobre os níveis aceitáveis e seus efeitos à saúde nas diferentes categorias de lubrificantes, incluindo as classificações destes produtos em relação ao contato direto ou não com os alimentos.

A possibilidade de uso de lubrificantes sintéticos e os avanços na fabricação dos lubrificantes com maior segurança para os consumidores também foi discutida. Lilian apresentou ainda uma imagem didática da cadeia produtiva de alimentos com seus diversos elos, direcionando quando é necessário ter lubrificantes food grade, para contato direto ou não com alimentos. Ela enfatizou a necessidade de uma boa gestão da prevenção de contaminação cruzada quando do uso de mais de uma classificação em uma mesma empresa, desde o armazenamento até o correto uso e treinamento de pessoal envolvido.

Além disso, citou as falhas grotescas que muitas vezes existem nas empresas: a lista de lubrificantes com o setor de compras é diferente dos lubrificantes usados pelo pessoal responsável pela atividade, sendo ainda diferente dos que estão no estoque, muitas vezes obsoletos e sem nenhuma gestão de armazenamento e descarte. O custo aproximado por ano de um produto em estoque também foi evidenciado, reforçando a necessidade de uma boa gestão neste tema.

Interessante como precisamos pensar além da segurança de alimentos e gerenciar outros pontos, como ela muito bem mencionou em relação à sustentabilidade. Questões ambientais e custo-benefício foram apontados como parte desta gestão em relação à seleção e aprovação dos produtos.

O evento foi um sucesso e todos ficamos muito felizes em mais uma vez contribuir com o universo da segurança de alimentos em um nível tão elevado.

Que venham os próximos eventos!

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Segurança de Alimentos em Jogos Olímpicos

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Com uma trajetória profissional rica e diversificada, nosso entrevistado de hoje é Geidemar Oliveira. Ele vem consolidando ao longo dos anos conhecimento em várias áreas da farmácia, gestão empresarial e especialmente em segurança de alimentos nos Jogos Olímpicos e em grandes eventos.

Sua dupla formação acadêmica, no Brasil e em Portugal, e suas experiências profissionais internacionais em grandes eventos permitiram-lhe desenvolver uma visão abrangente e estratégica dos setores farmacêutico e alimentício e contribuir para o sucesso dos eventos.

Os grandes eventos esportivos têm um papel central na sociedade moderna, como momentos de competição e ocasiões que promovem a união, a celebração e o orgulho nacional. Desde a antiguidade até os dias de hoje, são marcos significativos que transcendem as barreiras culturais e linguísticas.

Garantir a segurança dos alimentos para atletas de alto nível, que dedicam suas vidas para o esporte, é extremamente crítico nestes eventos, pois surtos podem impactar diretamente o quadro de medalhas.

FSB: Geidemar, por favor, conte-nos como começou sua carreira e como surgiram as oportunidades para trabalhar nos Jogos Olímpicos?

R: Comecei a carreira trabalhando como farmacêutico RT em farmácias e drogarias, depois em produção na indústria farmacêutica. Saí do Brasil para estudar a área dos alimentos e tive a oportunidade de trabalhar com consultorias na área de nutracêuticos. 

Voltei ao Brasil após 11 anos, atuei em auditorias em laboratórios de análises clínicas e, em seguida, com cozinhas industriais de grandes volumes de produção, como responsável por food safety (Gerente de Qualidade). 

Em 2015 fui presenteado com a oportunidade de ser parte de todo o planejamento da área de alimentos e bebidas para os Jogos Olímpicos Rio 2016. Entrei e não saí mais dos grandes eventos. Ainda faço algumas auditorias e consultorias no mundo dos alimentos, porém o foco realmente são os grandes eventos.

FSB: Como foram suas experiências na organização de grandes eventos esportivos? Qual sua função para garantir a segurança de alimentos de atletas e comissões técnicas?

R: Nos últimos anos tive o prazer de participar de grandes projetos esportivos, gastronômicos e artísticos. Neste momento estou como Head da área de Alimentos e Bebidas no planejamento dos Jogos Panamericanos Júnior Assunção 2025.

Este evento acontecerá em agosto e contaremos com mais de 4.000 atletas de 41 países. O objetivo é sempre garantir uma alimentação segura, cumprindo os requisitos nutricionais, étnicos, culturais e religiosos necessários.

Além dos atletas, temos que planejar a alimentação de 3.500 voluntários, 550 empregados diretos do Comitê Organizador, oficiais técnicos, imprensa e todos os dignitários e autoridades dos comitês olímpicos envolvidos neste megaevento.

Todas estas operações têm como um dos pilares a Segurança dos Alimentos. As operações são desenhadas e definidas segundo os conceitos da ISO 22000 e os princípios de HACCP.

Isto tem um peso muito grande na escolha das empresas que prestam os serviços e os fornecedores e é a base também de todos os treinamentos necessários para garantir que os manipuladores de alimentos estejam aptos para suas funções.

Um ponto muito importante, talvez dos mais relevantes, é trabalhar a quatro mãos, Comitê Organizador e empresa fornecedora de alimentos. Cada vez mais tenho a certeza de que só assim evoluímos e podemos de verdade falar em Segurança dos Alimentos.

Outro conceito que é amplamente trabalhado são os alergênicos, desde a mitigação da contaminação cruzada até a identificação adequada em todas as preparações que as necessitem. 

Em resumo, as equipes que tive o prazer de liderar têm como missão planejar sempre com o olhar em Food Safety, durante todas as etapas.

Outros eventos de grande impacto em que pude trabalhar com conceitos de Food Safety foram o TomorrowLand Brasil 2024, os Jogos Panamericanos Santiago 2023, onde tivemos mais de 8.000 atletas participantes, Copas América de Futebol 2019/2021 no Brasil e 2024 nos EUA. 

Também teve grande relevância o Riyadh Season na Arábia Saudita em 2019, com a participação de alguns dos restaurantes eleitos os melhores deste ano. 

FSB: Qual evento foi mais impactante em sua carreira?

R: Com certeza foram os Jogos Olímpicos do Rio em 2016. Um grande aprendizado sobre os conceitos do mundo do esporte, seu dinamismo, operações de números absurdos. No dia de pico na Vila dos Atletas chegamos a servir mais de 70.000 refeições.

FSB: Quais conselhos daria para quem gostaria de atuar nesta área?

R: Primeiro de tudo é gostar muito de adrenalina, não existe nada de estático, muito pelo contrário. Costumo brincar que as mudanças acontecem até nas próprias mudanças.

Gostar de trabalhar com pessoas e ter a capacidade de formar uma grande equipe, com conhecimento diversificado e focada nas entregas dentro dos padrões necessários. 

Ter conhecimentos sólidos do alimento seguro dentro de toda a cadeia produtiva, da fazenda ao prato. Muita empatia, compromisso e não ter medo de desafios.

Agradecemos ao Geidemar por compartilhar sua experiência conosco. Certamente é uma trajetória que inspirará nossos leitores!

Quer saber mais sobre segurança de alimentos em grandes eventos? Leia:

A (in)segurança dos alimentos em grandes eventos: casos reais

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Como “colar” os treinamentos em segurança dos alimentos no cérebro?

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É comum ouvir, de profissionais de segurança dos alimentos, que as organizações fazem esforços para treinar seus times de trabalho, mas depois, em poucos meses, ou mesmo semanas, os empregados esquecem os temas abordados nos treinamentos e deixam de seguir normas, regras e parâmetros técnicos.

A eficácia dos treinamentos sobre segurança dos alimentos depende diretamente da maneira como a informação é repassada, para que seja processada e retida pelos colaboradores.

Uma abordagem eficaz para maximizar o aprendizado e a retenção de conhecimento é baseada na teoria da neurociência, que propõe que o cérebro humano é composto por três estruturas distintas que evoluíram em diferentes fases da história humana: a teoria do cérebro trino.

Esta teoria baseia-se numa simplificação do cérebro humano, desenvolvida por Paul MacLean na década de 1960. Segundo ele, cada uma das três estruturas do cérebro (reptiliano, límbico e neocórtex) desempenha um papel fundamental na motivação e no aprendizado, e ativá-las de maneira estratégica pode tornar os treinamentos mais envolventes e impactantes.

O cérebro reptiliano, a parte mais primitiva, surgiu há cerca de 500 milhões de anos em receptores e funções básicas de controle, como respiração, corações cardíacos e instintos de sobrevivência. Posteriormente, há cerca de 250 milhões de anos, com os primeiros mamíferos, surgiu o sistema límbico, responsável pelas emoções, memórias e vínculos afetivos e sociais. Por fim, o neocórtex, que começou a se desenvolver há cerca de 2 milhões de anos nos primeiros hominídeos, tornou-se uma região mais complexa, possibilitando raciocínio abstrato, linguagem e criatividade, sendo o grande diferencial da espécie humana.

A teoria dos três cérebros propõe que o cérebro humano, portanto, é composto por três camadas evolutivas que trabalham em conjunto, mas possuem funções e motivações distintas:

  1. Cérebro Reptiliano (Cérebro Primitivo): Responsável por funções instintivas, como sobrevivência, reflexos automáticos e comportamentos de rotina;
  2. Sistema Límbico (Cérebro Emocional): Relacionado às emoções, sentimentos, memórias e conexões sociais;
  3. Neocórtex (Cérebro Racional): Responsável pelo pensamento lógico, análise crítica e aprendizado consciente.

Compreender esses três níveis é essencial para desenvolver treinamentos eficazes, pois cada um deles precisa ser ativado para garantir que o conhecimento seja absorvido e aplicado de maneira duradoura.

Ao integrar estratégias que ativem os três cérebros, os treinamentos sobre segurança dos alimentos se tornam mais eficazes, garantindo maior retenção do conhecimento e aplicação correta das normas e procedimentos.

Assim, as empresas podem construir uma cultura de segurança dos alimentos forte, reduzindo riscos e garantindo a qualidade dos produtos.

Estratégias para motivar cada cérebro em treinamentos sobre segurança dos alimentos

Cérebro reptiliano/ primitivo

O cérebro reptiliano tem um papel importante na conscientização sobre riscos e no desenvolvimento do senso de urgência, essenciais numa abordagem de tomada de ações em casos de desvios em critérios de controle nos PPROs (Programas de Pré-Requisitos Operacionais) e em limites críticos nos PCCs (Pontos Críticos de Controle), assim como na contenção de não conformidades que exijam ações rápidas e/ ou emergências.

O estímulo ao cérebro primitivo pode ser obtido ao:

  1. Utilizar exemplos reais de riscos: Demonstrar situações de contaminação dos alimentos e seus impactos gerados como doenças e morte de consumidores, estimulando um senso de urgência, tomada de ação e necessidade de mudança de comportamento;
  2. Treinamento prático e repetitivo: Como esse cérebro responde bem a rotinas e hábitos, a prática contínua de protocolos de segurança dos alimentos ajuda a internalizar requisitos de Boas Práticas de Fabricação e rotinas de higiene;
  3. Criar regras claras e objetivas: Procedimentos bem estruturados e repetitivos são assimilados mais facilmente por essa parte do cérebro.

No entanto, se apenas o medo do risco for explorado, os colaboradores podem não compreender a real importância das boas práticas.

Sistema límbico

A influência do cérebro límbico é perfeita para treinamentos que objetivam estimular ações positivas, introduzir novos conceitos, aumentar engajamento com programas de segurança dos alimentos.

O estímulo ao cérebro límbico pode ser obtido ao:

  1. Criar um ambiente motivador: O uso de histórias, depoimentos e exemplos de sucesso pode despertar emoções e fortalecer a conexão dos colaboradores com a importância da segurança dos alimentos;
  2. Reforço positivo e reconhecimento: O cérebro emocional responde bem ao reconhecimento, então premiar boas práticas ou elogiar comportamentos corretos pode aumentar o engajamento;
  3. Treinamento em equipe e interativo: Simulações, dinâmicas em grupo e atividades que envolvam colaboração incentivam conexões sociais e tornam o aprendizado mais significativo. Treinamentos por gamificação ajudam muito a estimular emoções.

Contudo, o engajamento emocional isolado pode gerar entusiasmo momentâneo, mas sem aprendizado prático.

Neocórtex

O raciocínio lógico do neocórtex é fundamental nas tomadas de decisões que exigem uma cognição mais elaborada, por exemplo, compreensão de cálculos de letalidade usados para determinar o Fo em esterilizadores, ações sistêmicas preventivas a riscos e planos de ação com tarefas cronológicas em comitês de gestão que envolvem comando de ações e execução de tarefas.

O estímulo ao cérebro lógico pode ser obtido ao:

  1. Explicar o “porquê” das regras: Apresentar dados científicos, estatísticas sobre contaminação e surtos de doenças transmitidas por alimentos, assim como fazer uso de exemplos práticos de ações que resultam em redução de riscos, ajudam na compreensão lógica da importância da segurança dos alimentos;
  2. Oferecer desafios e resolução de problemas: Casos práticos onde os colaboradores precisam identificar falhas e sugerir soluções estimulam o pensamento crítico;
  3. Usar multimídia e tecnologia: Vídeos, infográficos e simulações digitais ajudam a tornar o conteúdo mais dinâmico e compreensível.

No entanto, treinamentos que abordam apenas o lado racional (neocórtex), sem ativar o emocional e o instintivo, podem ser esquecidos rapidamente.

Com base na teoria do cérebro trino, para que um treinamento efetivamente “cole”, ou seja, tenha efeitos mais duradouros, não se perdendo facilmente com o tempo, é preciso envolver três fatores: instinto, emoção e lógica.

Planeje bem os treinamentos. O artigo “Técnicas de treinamento na Indústria de Alimentos” apresenta diversas abordagens que podem ser utilizadas.

Um bom treinamento trará os componentes técnicos que precisam ser repassados de forma clara, objetiva e suficientemente detalhada, mas faz isso envolvendo emocionalmente os participantes, num momento agradável, descontraído e alegre, e não apenas com slides maçantes repetidos sem entusiasmo. Também é importante o componente primitivo, alertando os riscos de não cumprir procedimentos apropriadamente, seja para o produto ou para o próprio profissional e sua carreira.

Emoções “ruins” também são válidas para acionar a parte límbica do cérebro. Assim, treinamentos que exploram problemas reais e ocorridos em outras organizações de forma impactante sobre a vida das pessoas também ajudam a reter conhecimento.

Para que os treinamentos sejam eficazes, é necessário considerar como o cérebro humano processa e retém informações. Ao ativar o cérebro reptiliano, o sistema límbico e o neocórtex de forma equilibrada, os treinamentos se tornam mais motivadores, engajadores e eficientes, garantindo que as requisitos em segurança dos alimentos sejam internalizados e aplicados no dia a dia, culminando ao final, na criação de uma cultura organizacional sólida e comprometida com a segurança dos alimentos.

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Trend do Macarrão: quando a brincadeira pode virar risco (e como evitar)

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Tendências de consumo e comportamento social têm ganhado cada vez mais atenção na área de Segurança de Alimentos, especialmente quando se manifestam em práticas coletivas, informais e altamente compartilhadas nas redes sociais. Essas tendências, como a “trend do macarrão”, revelam hábitos emergentes, novas formas de interação com o alimento e, por vezes, riscos à segurança de alimentos que escapam do olhar comum.

A chamada “Trend do Macarrão” — onde colegas de trabalho, amigos ou familiares se reúnem para montar e compartilhar uma única receita, cada um levando um ingrediente — oferece um exemplo oportuno e atual para refletirmos sobre como a cultura alimentar contemporânea pode impactar diretamente a segurança dos alimentos, especialmente quando a informalidade e a descontração se sobrepõem a cuidados básicos de higiene e manipulação.

Sabe aquela ideia de juntar os amigos, cada um levando um ingrediente, e preparar na hora do encontro um super macarrão coletivo? É cena de pura alegria: descontração, risadas, garfadas e quase sempre muito queijo derretido. Mas… e se essa mistura de sabores também estiver trazendo, sem querer, um combo de microrganismos perigosos?

Preparar alimentos em grupo virou uma forma deliciosa de criar memórias — e dá para entender o porquê: é uma maneira gostosa (em todos os sentidos) de se conectar com quem a gente gosta. Mas há um detalhe importante que quase nunca entra na conversa: a informalidade da situação — falar em cima da comida e a conservação e transporte dos ingredientes de forma não controlada — que pode acabar abrindo a porta para uma festinha de bactérias.

A informalidade da trend pode acabar abrindo a porta para uma festinha de bactérias.

Neste artigo, vamos mostrar os riscos que podem estar escondidos nesse tipo de preparação coletiva, tomando como exemplo a “Trend do Macarrão”. Vamos falar sobre contaminação cruzada, conservação e transporte inadequado de alimentos, gotículas de saliva e como garantir que tudo isso aconteça com o máximo de segurança — sem perder o clima leve e divertido do momento.

A origem do risco: ingredientes que vêm de todo lado

A ideia do macarrão compartilhado é simples: cada um leva um ingrediente e todo mundo monta o prato junto, filma e posta nas redes sociais. Só que, na prática, isso significa misturar alimentos de várias origens, com diferentes níveis de cuidado. Alguns ingredientes chegam prontos, outros crus, alguns bem quentes, outros quase gelados — e, muitas vezes, tudo fica ali, esperando, à temperatura ambiente.

Essa condição é um prato cheio para a contaminação cruzada e a multiplicação de microrganismos como:

  • Salmonella, que pode estar presente em carnes, ovos e molhos mal preparados e conservados;
  • Listeria monocytogenes, resistente até em temperaturas de geladeira;
  • Staphylococcus aureus, que vive nas nossas mãos e pode contaminar a comida com facilidade.

Transporte e conservação: o que a gente não vê (mas pode sentir depois)

Muitas vezes, os ingredientes são levados em recipientes comuns, sem refrigeração ou aquecimento adequados. Parece um detalhe pequeno, mas faz toda a diferença. Se o alimento fica entre 5°C e 60°C por mais de duas horas, ele entra na chamada zona de perigo — ideal para a proliferação de bactérias.

E o mais traiçoeiro: nem sempre a comida contaminada tem cheiro ruim ou aparência estranha. Às vezes, ela parece ótima — até começar a causar sintomas horas depois.

A fala que contamina pelas gotinhas que nem sempre conseguimos ver

Quem nunca ficou animado(a) montando um prato em grupo? É risada pra cá, opinião sobre o molho pra lá, e todo mundo falando seu nome e o ingrediente em cima do recipiente. Só que essa empolgação também libera microgotículas de saliva, que podem carregar bactérias e vírus diretamente para os alimentos — e causar doenças, especialmente se forem só levemente aquecidos ou se já estiverem prontos para consumo.

Quando o corpo reage: sintomas comuns de uma intoxicação alimentar

Mesmo com todo o cuidado, às vezes a contaminação passa despercebida — e os sintomas aparecem depois, quando a festa já acabou. Os sinais de uma possível intoxicação alimentar geralmente surgem entre 6 a 48 horas após o consumo do alimento contaminado, dependendo do tipo de microrganismo envolvido.

Os sintomas mais comuns são:

  • Dor abdominal ou cólicas;
  • Diarreia (às vezes intensa e com muco);
  • Náuseas e vômitos;
  • Febre leve a moderada;
  • Cansaço ou fraqueza generalizada;
  • Desidratação (em casos mais graves ou prolongados).

Em crianças, idosos e pessoas com imunidade baixa, esses quadros podem evoluir com mais rapidez e gravidade, exigindo atenção médica. Por isso, mesmo em encontros informais, é importante lembrar que um pequeno descuido pode ter consequências reais para a saúde.

Alimentos alergênicos e contaminações intencionais: riscos muitas vezes invisíveis

Num encontro informal, onde cada participante leva um ingrediente e há troca livre de utensílios e superfícies, o cuidado com alimentos alergênicos deve ser redobrado. Leite, ovo, trigo, soja, castanhas, entre outros, estão entre os ingredientes mais comuns e também entre os que mais causam reações alérgicas graves — inclusive anafilaxia.

Por isso, se algum integrante do grupo tem alergia alimentar conhecida, é fundamental que isso seja comunicado com clareza e antecedência a todos os participantes. Também é essencial evitar o uso cruzado de utensílios e superfícies — um simples contato pode ser suficiente para causar uma reação.

Compartilhar informações sobre alergias é um cuidado com a vida do outro — e demonstração de respeito e responsabilidade coletiva.

Além disso, vale mencionar que encontros em que os alimentos passam por várias mãos ou são manipulados em locais de acesso amplo podem se tornar vulneráveis à contaminação intencional — seja por brincadeiras de mau gosto ou má fé. A prevenção passa por atenção ao ambiente, supervisão dos ingredientes e cuidado com quem manipula os alimentos. Em qualquer situação, a segurança de alimentos depende da confiança, comunicação e vigilância compartilhada.

Como tornar essa trend mais segura (e ainda deliciosa)

A boa notícia? Com pequenas mudanças, dá para manter o espírito da trend sem colocar ninguém em risco. Olha só:

  • Combine antes: organize quem leva o quê e oriente para que os ingredientes perecíveis sejam transportados em bolsas térmicas ou gelo.
  • Fique de olho na temperatura: alimentos frios devem ficar abaixo de 5°C; os quentes, acima de 60°C.
  • Separe talheres de servir e de comer: evite mergulhar o mesmo garfo da boca na panela que todo mundo vai usar.
  • Evite falar sobre a comida (literalmente): cubra os alimentos e, se possível, monte o prato em um espaço ventilado. Se for gravar a brincadeira, opte em não falar sobre o alimento o nome e o ingrediente em uso; edite-o depois incluindo legendas com essas informações com uma música engraçada ao fundo.
  • Cozinhe bem: carnes, ovos e molhos com leite e derivados precisam ser cozidos e mantidos em temperaturas seguras.
  • Sirva em porções individuais: monte o prato bonito para foto, mas depois distribua as porções para cada um. Nunca consumir de forma compartilhada a partir de um único recipiente.

A “trend do macarrão” é sobre união, afeto e diversão. E cuidar da segurança dos alimentos é só mais uma forma de demonstrar esse carinho.

Na próxima vez que for montar um macarrão coletivo com sua galera, lembre-se: prevenção é um tempero que não pode faltar. Se curtiu esse conteúdo, compartilhe com quem vai cozinhar em conjunto — e bora espalhar essa trend de forma mais segura e consciente.

Diogo Ximenes é técnico em alimentos pela UFRPE, graduado em administração de empresas e pós-graduado em engenharia de alimentos. Com 17 anos de experiência na área de Qualidade e Segurança de Alimentos, é auditor líder FSSC 22000 e classificador oficial de açúcar pelo MAPA. É especialista no processamento de cana-de-açúcar para alimentos e bebidas, incluindo açúcar, cachaça e aguardente. Atualmente ocupa o cargo de Supervisor de Qualidade e Segurança de Alimentos em indústria sucroenergética em Pernambuco. 

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Desinsetização: o inseto saiu, mas já está na hora de você voltar?

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Como definir um critério objetivo e seguro para saber quando reocupar uma área após a desinsetização

O dilema

Quando a desinsetização é inevitável, surge a pergunta que ninguém gosta de ouvir, mas todo mundo precisa responder: qual é o tempo seguro para reocupar o ambiente? Seis horas? Oito? Doze? Ou será que esse número é só mais um mito de corredor?

Voltemos ao começo

Fundamento 01

Vamos tirar o elefante da sala: controle de pragas não é sinônimo de pulverizar veneno. Quem ensina sabe e quem esqueceu, precisa reaprender. A legislação é clara: controle de pragas é um conjunto de ações permanentes que blindam o ambiente antes que a contaminação apareça. Limpeza, organização, manutenção e isolamento são o verdadeiro exército nessa batalha. Se isso não faz parte da rotina do estabelecimento, o problema não são as pragas. É a mentalidade e consciência, hoje chamados de “mindset”.

Fundamento 02

Em instalações bem geridas, sejam de alimentos, fármacos, embalagens, grãos ou químicos — a tendência é clara: menos praguicida, mais inteligência. Aplicações pontuais, espaçadas e planejadas são resultado de uma cultura de segurança de alimentos com manejo ambiental em perspectiva. Afinal, todo inseticida carrega, além do efeito desejado, riscos ambientais e sanitários. Quem não entende isso vive de apagar incêndios, não de prevenir contaminações.

Fundamento 03

Agora, voltamos ao dilema: quando é inevitável usar defensivos, qual é o prazo real de reentrada? Seis horas? Doze? Os gestores em indústrias, restaurantes, supermercados, escolas, academias etc. se arrepiam só de ouvir. Sempre alguém pergunta: “Tem como ser mais rápido, chefe?”. E a resposta educada é: não, se quiser fazer direito. Isto está  evidenciado em estudos científicos.

Gestores responsáveis aceitam que o tempo de reentrada não é capricho. É necessidade.


A boa notícia

Atualmente, os inseticidas são formulados com rigor: moléculas mais seguras, adjuvantes menos agressivos. O lado amargo da história? Mesmo assim, o tempo de reentrada continua longo. Esse número não nasce do achismo, mas de testes sérios feitos por quem entende do assunto — fabricantes e ANVISA. Planejar-se é sempre mais barato do que remediar.

Eliminando “outras pragas”

Hora de falar francamente: há empresas controladoras de pragas nas quais o responsável técnico é só um nome no papel. Não orienta, não supervisiona, não aparece. O resultado? Profissionais controladores despreparados, aplicando produtos sem entender o que estão fazendo. O prejuízo dessa economia é alto — e quem paga é sempre o cliente.

A regra é clara

Os rótulos continuam lá: “6 horas”, “12 horas”, “24 horas”. E ignorar isso é receita para problema. Estratégia é o caminho:

  • AÇÃO 01 – Fracionamento – Empreendimentos com mais de uma edificação podem receber aplicação inseticida em dias diferentes do mês. Exemplo: área de fábrica na primeira quinzena, e área de estoque, cozinha, almoxarifado na segunda quinzena.
  • AÇÃO 02 – Dobradinha com manutenção preventiva – Empreendimentos que seguem um plano periódico de manutenção conciliam as interrupções para revisão em equipamentos e sistemas para o mesmo dia quando se realiza a desinsetização.
  • AÇÃO 03 – Aumentar intervalo em áreas mais protegidas – Ambientes pouco expostos a contaminações, em função de climatização, isolamento e ausência de histórico de pragas podem receber intervenções com inseticidas em intervalos ampliados (60 ou 90 dias), desde que os ambientes mais expostos a contaminações como depósitos, docas, tubulações, vestiários etc. mantenham a rotina para tratamentos a cada 30 dias.
  • AÇÃO 04 – Adoção de métodos spot – Algumas formulações inseticidas agregam novas técnicas tipo SPOT, com aplicação ultra localizada, sendo possível seu emprego inclusive em ambientes com presença de pessoas. Nesse caso, a critério do Responsável Técnico, um tratamento pode ter eficiência com mínimo tempo de reentrada, mas este é um caso que precisa ser cuidadosamente formalizado.

Mais dois fundamentos

E você precisa assegurar que o o parceiro controlador contratado siga essas premissas:

Fundamento 04: Praguicidas são ferramentas técnicas, e só profissionais certificados devem usá-las, com supervisão habilitada.

Fundamento 05: Inseticida doméstico e agrícola? Fora do jogo.

É uma questão de consciência e postura

Empresas que lidam com alimentos, insumos, saúde e grande circulação de pessoas precisam mais que prateleiras ou pátios limpos: precisam de COMPROMISSO. Essa visão tem sido apregoada neste canal, como fica evidente nos artigos A, B e C. Não existe atalho que compense a falta de consciência e responsabilidade. Fazer o certo sempre custa menos do que consertar o errado.

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