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Consumo de Conservas de Palmito: o que é realmente importante para a segurança?

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No final da década de 90, muito se falou sobre o palmito em decorrência de surtos de botulismo envolvendo seu consumo. Na ocasião, medidas foram tomadas pela ANVISA, como a liberação da RDC 18/1999, por exemplo, que esclareciam exigências e formas de inspeção para os fabricantes de conservas de palmito. Também a Portaria 304/1999 tornou obrigatória uma etiqueta de rotulagem com os seguintes dizeres: “Para sua segurança, este produto só deverá ser consumido após fervido no líquido de conserva ou em água, durante 15 minutos”.

Por conta de toda essa movimentação, as empresas fabricantes de conservas de palmito se organizaram e alguns selos de qualidade foram criados, atestando a segurança do consumo. Após todo o processo de inspeção e normatização implementado, a ANVISA entendeu ser desnecessária a advertência acima citada e revogou a portaria 304/1999 através da RDC 42/2008.

Em maio de 2015, a consulta pública 43/2015 foi aberta pela ANVISA com a principal justificativa de discutir nova proposta de Regulamento Técnico para as conservas de palmito, sobretudo considerando novas formas de embalagens disponíveis atualmente, não consideradas na versão de 1999 (RDC 17/1999). Foram recebidas 36 contribuições, disponíveis no link http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/anvisa+portal/anvisa/regulacao+sanitaria/assuntos+de+interesse/consultas+publicas/assuntos+de+interesse/consultas+publicas+encerradas/2015/2015051543.

Apesar do Brasil ser o maior produtor mundial de palmito, grande parte dessa produção ainda é extrativista e predatória. Como reconhecer então que o palmito adquirido vem de uma fonte confiável? O palmito atualmente comercializado pode ser considerado seguro? Para falar melhor desse assunto, convidamos pesquisadores da UNESP a nos conceder uma entrevista, conforme segue abaixo.

 

São eles: Carolina Carvalho*, Marina Côrrea Cortes** e Mário Galetti***.

 

Quais tipos de palmito estão disponíveis no Brasil para fabricação de conserva?

 

Basicamente:

Palmito juçara (Euterpe edulis), Palmito açaí (Euterpe oleracea), Palmito pupunha (Bactris gasipaes) e Palmito real (Archontophenix spp.), além de híbridos entre essas espécies. As três primeiras são nativas do Brasil, sendo que o Açaí e o Pupunha são oriundos da Floresta Amazônica e o Juçara da Mata Atlântica.

De forma simplificada:

– Pupunha: espécie mais vantajosa/ mais cultivado/ mais facilmente encontrado nas conservas em comercialização/ tem crescimento rápido (primeiro corte em torno dos 20 meses)/ perfilham (rebrotam, ou seja, não necessitam de replantio).

– Açaí: também perfilham, ou seja, não precisam de replantio.

– Juçara: leva cerca de oito anos para o corte/ não perfilha (a planta morre e é necessário replantio)/ inviável economicamente, porém amplamente consumido por seu sabor adocicado e sua textura menos fibrosa em relação aos demais/ principal espécie explorada ilegalmente em florestas dentro de propriedades privadas e em unidades de conservação (parques e reservas).

 

Como o palmito é contaminado pela bactéria que causa o botulismo?

 

Não só o palmito juçara como o palmito de outras palmeiras podem ser contaminados pela bactéria Clostridum botulinum, que produz uma toxina causadora do botulismo. Os esporos do C. botulinum estão amplamente distribuídos na natureza e as condições ideais para que a bactéria produza suas toxinas são principalmente a anaerobiose e pH alcalino ou próximo do neutro (4,8 a 8,5). A transmissão do botulismo pode ocorrer por ingestão de toxinas presentes em alimentos previamente contaminados e que foram produzidos ou conservados de maneira inadequada. A ocorrência de botulismo pelo consumo de conserva de palmito industrializado é rara, devido ao tratamento dado a esse produto pelas indústrias alimentícias para evitar a proliferação dessa bactéria, dentre esses: tratar as conservas com pH ácido (abaixo de 4,5), além da higienização correta do local e dos utensílios para a fabricação do mesmo.

 

A principal consideração em relação à contaminação do palmito é que, apesar do controle rígido das indústrias alimentícias, uma parcela do palmito que é consumido em restaurantes e vendido nos supermercados vem de extração ilegal. Estima-se que milhares de palmitos são extraídos ilegalmente das florestas brasileiras todos os anos. Esses palmitos são geralmente fabricados e envasilhados dentro da própria floresta em um ambiente sem higienização, com água não tratada e não obedecendo as normas do INMETRO e da ANVISA. Portanto, produtos consumidos de origem ilegal tem maior probabilidade de estarem contaminados com C. botulinum.

 

Então, como saber se esses palmitos são cultivados e produzidos seguindo as legislações brasileiras ou se são extraídos ilegalmente das matas? Para comercialização, que tipo de legalização no IBAMA deve existir?

 

É muito difícil distinguir a origem desses palmitos apenas olhando a embalagem. Os palmitos extraídos ilegalmente das florestas são vendidos de três formas: como se fossem outra espécie de palmito, com seus rótulos alterados ou vendidos de maneira ilegal para fornecedores de alimentos (restaurantes e lanchonetes). Todos os palmitos vendidos atualmente, sendo de espécies nativas ou não, precisam ter uma certificação do IBAMA e o fabricante precisa possuir alvará da vigilância sanitária. No entanto, grande parte dos palmitos que são extraídos ilegalmente possuem marca ou rótulos falsificados, dificultando ao consumidor distinguir se o produto é próprio para o consumo ou não.

 

Quais os principais fatores envolvidos na decisão de compra e consumo do palmito?

 

Eu particularmente não consumo palmito das espécies Juçara ou Açaí, apenas Palmito Pupunha porque certamente advém de plantação e extração legais.

Ao ingerir o palmito ilegal estaremos nos expondo ao risco de contaminação por C. botulinum como também incentivando a extração não regulamentada e contribuindo para a destruição das nossas florestas.

Como disse, é muito difícil diferenciar a origem desse alimento e o país ainda é bastante deficiente em termos de fiscalização, tanto na área ambiental para evitar a extração ilegal como sanitária para evitar que esses alimentos cheguem contaminados à nossa mesa.

 

Os principais cuidados na decisão de compra devem ser:

– escolher uma espécie que seguramente não foi extraída ilegalmente da mata, como por exemplo, o palmito pupunha ou palmeira real;

– não consumir palmito de origem duvidosa ou desconhecida. Optar por aquelas conservas que apresentem o número de registro na ANVISA e certificação do IBAMA;

– evitar consumir palmito na rua e em restaurantes, uma vez que é difícil saber a procedência desse alimento;

– buscar selos que atestem a qualidade do palmito e/ou marcas mais conhecidas e confiáveis.

Há novas alternativas que permitem a retirada legal do palmito e, portanto, sejam mais seguras para consumo?

 

A extração ilegal do palmito, principalmente o palmito juçara, é uma questão socioambiental. No estado de São Paulo, as áreas com maior exploração da espécie são regiões mais pobres (ex. Vale do Ribeira), onde a extração do palmito é o modo de sobrevivência de muitas famílias. Atualmente ONGs estão trabalhando com essas comunidades de palmiteiros para que explorem o palmito de uma forma mais sustentável. Além do palmito propriamente dito, é possível extrair a polpa do fruto dessa palmeira. A polpa do Juçara se assemelha muito a polpa de açaí que é muito consumida em todo o território brasileiro. Nós acreditamos que com o uso da polpa do juçara para geração de renda no lugar da extração do palmito diminuirá a extração ilegal dessa espécie. Isso reduzirá a quantidade de produtos fabricados de forma ilegal e sem obedecer as normas da vigilância sanitária na mesa do consumidor, reduzindo a probabilidade de consumir alimentos contaminados. Além disso, são necessárias pesquisas visando aumentar a produtividade dos palmitos mais saborosos para consumo, como o Juçara e o Açaí e também iniciativas governamentais (como subsídios) para o plantio de espécies nativas para o consumo. Conjuntamente, é extremamente necessário aumentar a fiscalização ambiental e sanitária e também incentivar projetos de educação ambiental e sanitária nas comunidades de palmiteiros.

 

Muito interessante, não é mesmo?

 

O blog Food Safety Brazil agradece imensamente a contribuição dos pesquisadores:

 

*Carolina Carvalho, bióloga, mestre em ecologia e evolução pela UFG e doutoranda em ecologia e biodiversidade pela Unesp. http://lattes.cnpq.br/8134949068613031

**Marina Corrêa Cortes, bióloga, mestre em biologia vegetal pela Unesp e doutora pela Columbia University, EUA. http://lattes.cnpq.br/6547567800497624. Site: Marina Corrêa Côrtes, Ecology, UNESP

 

***Mauro Galetti, biólogo, mestre em Ecologia pela Unicamp e doutor pela Cambridge University, Inglaterra.  http://lattes.cnpq.br/3431375174670630

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Alergênicos: Rotulagem, Glúten, Metodologias analíticas, Látex e Prazo RDC 26/2015 – Workshop Eurofins

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Em 27 de novembro a Eurofins conduziu o Workshop sobre Rotulagem de Alergênicos em Indaiatuba. Neste fórum houve presença de palestrantes representantes da indústria, bem como Adolfo Lutz e a própria equipe especialista da Eurofins para este tema. Houve ainda uma mesa redonda, da qual participaram dezenas de representantes da indústria de alimentos e ingredientes. Trago para vocês os pontos mais relevantes da discussão:

A representante do Aldolfo Lutz, Dr Deise, trouxe em pauta a discussão da possibilidade trazida pela RDC n26 de 02/07/2015 da alternativa de envio de informações através de documentação anexa para indústria de alimentos. Ou seja, ao invés de incluir no rótulo a informação sobre alergênicos, para indústria de ingredientes (cujo produto vai ser consumido por indústrias e não é destinado ao consumidor final), é possível enviar, ao invés disso, uma documentação (laudo) que contenha esta informação. É uma possibilidade, mas esta documentação deve ser garantida lote-a-lote. Operacionalmente esta saída pode ser mais complicada de controlar do que a rotulagem para indústria, mas ainda assim é uma alternativa e deve ser avaliada caso-a-caso.

Trouxe ainda o tema de que na construção desta norma o tema do Glúten como alergênico foi reavaliado. De modo que o entendimento é de que Glúten não se classifica na lista de alergênicos, mas sim da de produtos que ocasionam intolerância alimentar*. Por este motivo, o Glúten não consta atualmente na lista de alergênicos.

*Relembre a diferença entre Alergia e Intolerância alimentar aqui no blog.  .

Os especialistas da Eurofins trouxeram informações sobre metodologias pata detecção de alergênicos e validação de limpeza. Como é de conhecimento, há no mercado três principais metodologias para análise de alergênicos:

ELISA (Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay): metodologia antígeno-anticorpo que contempla na extração de proteínas da amostra e análise por colorimetria (absorbância);

PCR ou Cadeia Polimerase: metodologia que contempla extração de DNA e detecta sequencia de DNA indicativo de espécies alergênicas;

LC MS/MS (Cromatografia Líquida Acoplada à Espectrometria de Massas): metodologia inovadora, que contempla digestão enzimática da proteína em aminoácidos e depois em íons e avaliação de íons correlacionados a substâncias alergênicas.

O mais importante quando falamos de metodologia analítica para análise de alergênicos é reforçar que cada metodologia tem um grupo de alergênicos que consegue detectar, além de ser mais bem aplicada para alguns grupos de produto e possuir limite de detecção. Por isso, para que a empresa decida adequadamente qual método usar para um teste de validação é imprescindível consultar o laboratório previamente, informando as características de produto e processo. Somente assim a melhor escolha de método de análise é possível.

Um tema discutido pelo grupo foi que infelizmente ainda não há aprovado no mercado metodologia para detecção de látex, de modo que as empresas precisam controlar este alergênico através de outras medidas de seu Programa Interno de Gestão de Alergênicos.

O Food Safety Brazil já falou sobre escolha de métodos de análise de alergênicos em http://artywebdesigner.com.br/qual-o-melhor-metodo-para-analises-de-alergenicos/.

Os representantes da indústria e das associações trouxeram entre outros temas a discussão sobre a dificuldade de atendimento do prazo (JUN/16) considerando o trabalho necessário em todos os elos da cadeia e as ações das associações junto a ANVISA pela renegociação deste prazo.

Mais uma vez a Eurofins fomenta produtivas discussões no mercado alimentício e o Food Safety Brazil agradece o convite de poder participar do fórum!

 

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Porque sulfito não foi considerado alergênico na RDC26/15?

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No portal da ANVISA, sobre Perguntas e Respostas sobre Rotulagem de Alimentos Alergênicos onde menciona o sulfito, a agência deixa claro que possui outras ações regulatórias em andamento que contemplam medidas para auxiliar na prevenção de intolerâncias alimentares e outras doenças. A revisão dos regulamentos de rotulagem geral e de alimentos para fins especiais, previstas na Agenda Regulatória Biênio 2015-2016, permitirão o aperfeiçoamento dos requisitos de rotulagem de constituintes relacionados a intolerâncias alimentares e outras doenças (ex. lactose, sulfitos, tartrazina, outros aditivos alimentares, substâncias relacionadas a erros inatos do metabolismo). Assim, os sulfitos são compostos à base de enxofre utilizados com funções tecnológicas em diversos alimentos (aditivos alimentares) e que podem provocar reações idiossincráticas em indivíduos sensíveis. Portanto, essas substâncias não são consideradas alergênicas e não podem ser declaradas como tal.  Entretanto, as empresas podem destacar voluntariamente a presença de sulfitos em alimentos desde que essa informação esteja em consonância com os princípios gerais de rotulagem estabelecidos na RDC n. 259/2002.

Segundo esta revisão sobre o assunto, um avaliação da exposição aos sulfitos conduzida pelo JECFA, que utilizou os limites máximos que estão sendo propostos para sulfitos no âmbito da Norma Geral Codex para Aditivos Alimentares, em conjunto com os dados de ingestão de alimentos fornecidos por alguns países, concluiu-se que frutas secas, geleias, sucos de frutas e vinhos são as principais fontes da ingestão de sulfito (WHO, 2000). Observou-se, ainda, que o consumo desses alimentos poderá resultar em valores de ingestão acima da Ingestão Diária Aceitável (IDA = 0,7 mg/kg peso corpóreo/dia, expressa como SO2), quando o nível residual de sulfitos nesses alimentos se aproximar do limite máximo permitido (WHO, 2000).

Então, como lidar com sulfito na formulação quando só um componente possuiu uma quantidade limítrofe de sulfito (por ex.: açúcar)? É necessário, portanto, que se realizem estudos que forneçam dados da quantidade de sulfitos presente em alimentos que mais contribuem para a sua ingestão, de forma a possibilitar estimativas de exposição mais próximas do real.

tabela_sulfito_2

 

tabela_sulfito_2_cont

tabela_sulfito_continua

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Completando o raciocínio já abordado no post  Sulfitos: importância na indústria alimentícia e seus possíveis malefícios à população, vale a pena considerar para quais os alimentos que tem maiores teores de sulfito (açúcar, por ex.) e com o fato de que ele pode ser eliminado com alguns processos (por ex: suco de uva fica meses embaixo do sol em tanques mumificado em sulfito e depois na extração à vácuo (ou pasteurização a baixa pressão) pode baixar a níveis aceitáveis no produto final (limite máximo de tolerância 10mg/Kg segundo Anexo 1 – Codex Stan 1-1985 revisão 1991 e a Directiva 89-2003).

Há relatos de que em alguns indivíduos sãoperigosamente sensíveis à pequenas quantidades de sulfitos em comidas e medicamentos broncodilatadores. Os sintomas podem incluir constrição dos brônquios, choque, perturbações gastrointestinais, edema de anAio e sensações de formigamento. Assim, os sulfitos devem ser ingeridos com precaução por pessoas com asma.

Sua empresa o considera na Política de Alergênicos?

3 min leituraNo portal da ANVISA, sobre Perguntas e Respostas sobre Rotulagem de Alimentos Alergênicos onde menciona o sulfito, a agência deixa claro que possui outras ações regulatórias em andamento que contemplam medidas […]

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