3 min leituraEstamos lá, na nossa tão tranquila vida de técnicos em alimentos.
Um dia, acordamos com a missão de implantar um sistema de segurança alimentar na fábrica em que trabalhamos.
Aqueles agraciados por trabalharem nas indústrias de suco de frutas, ovos, carnes ou laticínios podem começar com o sem número de estudos de caso, planos HACCP modelo e artigos científicos que se debruçaram sobre suas respectivas áreas.
Os pobres mortais, como eu, que trabalham em indústrias de ingredientes e aditivos, sofrem. Onde encontrar referências para os perigos das NOSSAS matérias-primas? Quem já ouviu falar de um modelo de plano HACCP para a indústria de peróxido de dibenzoíla aí levanta a mão!
Só que mesmo quem trabalha no mercado B2C precisa definir os perigos das suas matérias-primas. Que às vezes são o nitrito de sódio, a goma xantana e o dióxido de silício. Onde buscar informações?
A primeira porta de entrada são as duas compilações mais importantes para aditivos: o compêndio de especificações de aditivos alimentares do JECFA (comitê do Codex Alimentarius para avaliação de aditivos alimentares) e o FCC (compêndio da Farmacopéia americana para os padrões de qualidade e pureza de ingredientes alimentícios). A consulta às monografias do JECFA é gratuita, enquanto que o FCC está disponível através de assinaturas online ou em forma física. O FCC cobre ingredientes em geral, além de aditivos, e tende a ser uma referência um pouco menos rigorosa do que o JECFA – pelo menos na questão dos metais pesados. Na nossa experiência, o FCC parece ser o padrão adotado pela maioria dos fornecedores (o que não impede que o fornecedor atenda também ao JECFA). É importante, contudo, separar nestas especificações o que são parâmetros de qualidade do que são parâmetros de segurança alimentar.
Há perigos que dependem do processamento específico da matéria-prima, e devem ser tratados em todas elas, como fragmentos físicos e alergênicos. Para fragmentos, os níveis aceitáveis estão no momento em discussão na Consulta Pública nº 11 (Anvisa, mar/2011, já fechada), mas enquanto não é publicada, é normalmente aceita a recomendação do FDA da sessão 555.425 (Foods – Adulteration Involving Hard or Sharp Foreign Objects). A questão de alergênicos também está sendo tratada no âmbito Mercosul, então não temos ainda uma lista nacional a ser considerada (à parte do glúten e da tartrazina, que é não considerada um alergênico). Pode-se, no momento, usar a lista do Codex Alimentarius, da União Européia ou dos Estados Unidos. A lista do Codex Alimentarius está sendo usada no desenvolvimento da legislação nacional.
No mesmo caso estão os metais pesados – para aditivos o JECFA e/ou o FCC são boas fontes de consulta, porém para ingredientes há a Portaria nº 685 (Anvisa, ago/1998), que ainda está em vigor, e a sua tentativa de upgrade, ainda não oficializada, Consulta Pública nº 101 (Anvisa, out/2010, fechada). Para micotoxinas, especialmente em especiarias e outros alimentos de origem vegetal e animal de baixa umidade, foi recentemente publicada a Portaria nº 7 (Anvisa, fev/2011). Ainda temos a Resolução RDC nº 12 (Anvisa, jan/2001) para os quesitos microbiológicos (que pede ausência de Salmonella spp. até para fosfatos…).
Para aromatizantes obtidos por extração, a Resolução RDC nº 2 (Anvisa, jan/2007) estabelece limites máximos residuais dos solventes. Ainda nesta categoria, para aromas de fumaça a União Européia traz limites para hidrocarbonetos aromáticos policíclicos através da Regulação EC 2065/2003.
Enzimas possuem alguns parâmetros de segurança listados nas Especificações Gerais e Considerações para Preparações Enzimáticas pelo JECFA.
Especiarias, vegetais desidratados, proteínas vegetais e tudo o mais que seja fruto do maravilhoso mundo da agricultura deve atender aos limites de agrotóxicos permitidos para cada cultura. E não conter nada do que não é permitido. E como saber o que é permitido no Brasil? Entre em monografia por monografia de agrotóxico (atualmente são 491, thank you very much) e bom proveito! O Codex Alimentarius fez um favorzinho ao listar em 2011 os LMRs para especiarias, que normalmente não estão previstas na legislação nacional.
E não nos esqueçamos dos contaminantes que vão pintando no mundo dos ingredientes conforme a criatividade humana cresce: melamina em proteínas lácteas, Sudan Red em páprica, dioxina em ingredientes processados… Uma forma de encontrar esses perigos associados aos ingredientes (e não listados acima) é fazer uma busca num banco de dados científicos, como o Science Direct, Wiley, Pub Med ou Scielo, pelo nome do ingrediente e perigo (ou hazard).
Fácil, não?
Ah, e quando o aditivo é um conservante – e portanto tem ação direta sobre a segurança alimentar do produto a ser consumido? Isso é assunto para uma outra conversa!
3 min leituraEstamos lá, na nossa tão tranquila vida de técnicos em alimentos. Um dia, acordamos com a missão de implantar um sistema de segurança alimentar na fábrica em que trabalhamos. Aqueles […]