7 min leitura
0

Desafios em segurança de alimentos para café destinado à exportação

7 min leitura

Estima-se que cerca de 1,4 bilhões de xícaras de café sejam consumidas diariamente no mundo, consolidando esta tradicional bebida como um dos principais commodities de exportação para muitos países. Por isso, logicamente, o mercado global de café é um dos mais importantes e dinâmicos.

Boa parte do café produzido no Brasil fica para o mercado interno, afinal temos  consumo per capita em torno de 6,4 kg/ habitante/ ano. Porém, o restante que segue para exportação é significativo, a ponto de nos colocar como líder mundial, responsável por cerca de 30% da produção global.

Para se ter uma ideia, na visão do mercado financeiro mundial, em especial nas operações de mercado de futuro, o café é uma commodity que ocupa a segunda posição entre as mercadorias com maior valor de mercado, perdendo somente, em ganhos de valor, para a tradicional e mais negociada commodity, o petróleo, ou seja, é um produto extremamente importante.

No entanto, à medida que o mercado de café se expande e evolui, além do rigor na clássica classificação pelo número de defeitos, surgem novos desafios, com os cuidados com a segurança de alimentos sendo uma exigência fundamental nos processos de exportação. Eles precisam ser gerenciados de forma eficaz em toda cadeia produtiva para destacar o produto brasileiro dos demais no mercado global.

O Brasil no mercado de café

O Brasil tem uma longa tradição no cultivo de café, sendo o maior exportador mundial e o segundo maior consumidor global da bebida. Além da importância em termos de volume, o Brasil destaca-se também na qualidade do seu café.

A produção brasileira é predominantemente composta por cerca de 64% arábica e 36% conilon (robusta), sendo que  de uma forma geral o arábica é mais complexo, encorpado, suave e, por isso, é considerado um café mais fino. Já o conilon ou robusta é considerado mais neutro, com um leve amargor, porém possui mais substâncias solúveis (açúcares e cafeína) com grande aceitação no mercado americano e europeu, sendo muito valorizado para composição de blends e pela indústria de café instantâneo.

Os cafés selecionados com baixos defeitos têm alto valor agregado, sendo muito valorizados para exportação. No Brasil também são vendidos, normalmente com nome de Gourmet ou Especial, cuja classificação é feita por entidades diferentes, e os critérios de avaliação variam:

CAFÉ GOURMET CAFÉ ESPECIAL
Associação Brasileira da Indústria de Café (ABIC) classifica os cafés gourmet, com notas de 75 a 80 pontos, possuindo qualidade superior aos tradicionais, mas inferiores aos especiais;

Brazil Specialty Coffee Association (BSCA) classifica os cafés especiais, com notas acima de 80 pontos no padrão SCA, considerando que são avaliados por especialistas e devem ter 100% de pureza dos grãos. Algumas características dos cafés especiais são:

  • Torra equilibrada que realça os sabores e aromas naturais;
  • Torra em lotes menores para preservar o sabor original;
  • Sabor e aroma distintos, com notas de frutas, flores, caramelo, chocolate, baunilha, entre outros.

 Nos últimos anos, as regiões produtoras de café especial como sul de Minas, Cerrado Mineiro e a Chapada Diamantina vêm ganhando reconhecimento internacional, sendo estes terroirs valorizados e reconhecidos pela alta qualidade e notas sensoriais do café que produz.

Em 2024 a saca do café pilado (60 kg) alcançou preço de R$ 1,1 mil em plena colheita, o melhor valor dos últimos 13 anos, mostrando o quanto o setor é atrativo.

Os café com mais defeitos também têm mercado, muitas vezes recebem uma torrefação mais enérgica justamente para disfarçar tais defeitos e são vendidos como “extra fortes”, sensorialmente apresentando um after testing de amargor. Os aromas mais nobres são perdidos no processo, como é tratado no artigo “Você está bebendo café ou sujidades torradas?“, mas é fato que existe um mercado cativo para este tipo de produto que normalmente é mais barato.

A diversificação em qualidade permite que o Brasil atenda a diferentes nichos de mercado conforme requer cada público-alvo, desde cafés gourmet  e especiais, passando por commodities em larga escala e produtos de menor valor agregado.

No entanto, para manter sua posição de liderança no mercado global, o setor cafeeiro brasileiro enfrenta desafios constantes, tanto internos quanto externos, tais como a volatilidade dos preços internacionais, a concorrência de outros países produtores como o Vietnã e as mudanças climáticas que afetam a produtividade e o valor agregado do café brasileiro.

A essas questões, somam-se os desafios logísticos e os altos padrões de qualidade e segurança exigidos pelos mercados internacionais, especialmente quando se trata da exportação do produto para os Estados Unidos e a Europa.

Desafios para a exportação de café

Desde o chamado “ciclo do café” que perdurou por mais de 100 anos, entre 1800 e 1930, no qual a cafeicultura se manteve como a principal atividade econômica do Brasil, este commodity não perdeu importância para trazer divisas ao Brasil, que atualmente produz cerca de 59 milhões de sacas/ ano (cada saca tem 60 kg), dos quais 40% ficam para o mercado interno e o restante segue para exportação. O Brasil é o maior exportador de café há cerca de 150 anos, sendo seguido pelo Vietnã.

Quanto às rotas de exportação, o Brasil e a Colômbia têm como principais destinos os EUA e a Europa, especialmente Alemanha e Itália, que distribuem o produto. O Vietnã também entra nos mesmos mercados, mas mantém foco em mercados asiáticos e ocidentais; já a Etiópia, que produz cafés exóticos, envia seu produto para a Europa e boa parte para o Oriente Médio.

O processo de exportação exige não só qualidade no produto, mas também o cumprimento de uma série de regulamentações e requisitos de normas internacionais, como por exemplo, o Rainforest Alliance para agricultura sustentável e a FSSC 22000 para food safety.

Os principais desafios para a exportação de café incluem:

  1. Rastreabilidade e certificações: países importadores, especialmente na Europa e na América do Norte, exigem que os produtos agrícolas tenham sistemas rigorosos de rastreabilidade. Isso significa que os produtores e exportadores devem ser capazes de fornecer informações detalhadas sobre a origem do café, os processos de cultivo e colheita, além das práticas de segurança adotadas ao longo da cadeia produtiva;
  2. Padrões de qualidade: para competir nos mercados internacionais, os produtores de café precisam atender a critérios de qualidade cada vez mais exigentes, o que inclui desde o sabor e aroma até a ausência de defeitos, e claro, controle sobre contaminantes químicos, físicos ou microbiológicos, sendo um dos grandes desafios atender consistentemente aos limites para micotoxinas e pesticidas;
  3. Logística e transporte: O transporte do café até os mercados consumidores é outra área crítica, considerando que a maior parte do café brasileiro é exportada por via marítima, o que exige cuidados com o armazenamento e o tempo de transporte, garantindo que o produto mantenha sua qualidade e não sofra contaminações ou deteriorações durante o trajeto;
  4. Mudanças regulatórias e/ ou normativas: As regulamentações internacionais de segurança dos alimentos estão em constante evolução. Normas como as impostas pela Autoridade Europeia de Segurança dos Alimentos (EFSA) e pela Food and Drug Administration (FDA) dos Estados Unidos exigem que o Brasil esteja em constante adaptação para cumprir os requisitos mais recentes de segurança e qualidade.

Principais riscos em segurança dos alimentos para o café

Quando se trata de segurança dos alimentos no contexto da produção e exportação de café, os principais riscos estão relacionados à contaminação biológica, química e física. Entre os riscos mais comuns, podemos destacar:

  1. Contaminação por micotoxinas: as micotoxinas, especialmente a ocratoxina A (OTA), são substâncias tóxicas produzidas por fungos que podem contaminar o café durante a fase de armazenamento. Elas são uma preocupação significativa no comércio internacional, uma vez que níveis elevados de micotoxinas podem ser prejudiciais à saúde humana e, portanto, são estritamente controladas pelas regulamentações dos países importadores;
  2. Resíduos de defensivos agrícolas: o uso inadequado de defensivos agrícolas pode resultar na presença de resíduos químicos no café. Para exportar o produto, os níveis de defensivos agrícolas devem estar abaixo dos limites máximos estabelecidos pelos países importadores, e claro, somente moléculas autorizadas para uso em café por estes países;
  3. Contaminação física: outro risco importante é a presença de contaminantes físicos como pedras, galhos ou insetos, que podem entrar no produto durante a colheita ou processamento, cuja presença é uma ameaça à segurança do consumidor e à qualidade do café exportado;
  4. Contaminação cruzada: durante o processo de produção, colheita, armazenamento ou transporte, pode haver risco de contaminação cruzada, sendo que substâncias alergênicas ou outros contaminantes podem comprometer a segurança do café. Como exemplo, se durante a safra de soja, um mesmo caminhão sem a devida limpeza for utilizado para transportar café, pode ocorrer mistura de alguns grãos que ficaram perdidos na carroceria do caminhão.

Medidas de prevenção e controles de qualidade

Nos últimos anos, o Brasil tem intensificado os esforços para mitigar esses riscos e garantir a segurança dos alimentos no setor cafeeiro. Algumas das principais iniciativas incluem:

  1. Adoção de Boas Práticas Agrícolas (BPA): a implementação de técnicas que envolvem o uso controlado de defensivos agrícolas, manejo adequado do solo e das fontes de água, colheita e pós-colheita realizadas com devidos cuidados de higiene são essenciais para minimizar os riscos de contaminação;
  2. Certificações de qualidade e segurança dos alimentos: o Brasil trabalha para a obtenção de certificações internacionais, como Rainforest Alliance, UTZ e Fair Trade, que garantem que o café produzido segue rigorosos padrões ambientais, sociais e de segurança dos alimentos, e claro, FSSC 22000 ou outras normas reconhecidas pelo GFSI (Global Food Safety Initiative) nas etapas de beneficiamento;
  3. Monitoramento e análise de micotoxinas: laboratórios certificados realizam monitoramento contínuo dos níveis de micotoxinas no café, garantindo que as exportações estejam dentro dos limites permitidos pelas regulamentações internacionais, e mais que isso, para garantir estes limites, há que se ter rigoroso controle durante armazenamento e processamento dos grãos para minimizar riscos de fungos;
  4. Sistemas de rastreabilidade: o desenvolvimento de sistemas robustos de rastreabilidade em toda a cadeia produtiva é fundamental para garantir que cada lote de café possa ser rastreado até sua origem, o que é uma exigência cada vez mais comum nos mercados internacionais, inclusive pela valorização de determinados terroirs de café.

Como visto, o Brasil ocupa uma posição de destaque no mercado mundial de café, mas enfrenta desafios crescentes para se manter competitivo, especialmente no que diz respeito à segurança dos alimentos e às exigências regulatórias internacionais.

O mercado é promissor e continua se expandindo, como representa a recente chegada de grandes players produtores de café instantâneo, como a Olam Internacional, uma empresa de Singapura e a multinacional francesa Louis Dreyfus Company, ambas instaladas no Espírito Santo, por ser uma posição logística central entre os grandes produtores do próprio Estado, mas também da Bahia e de Minas Gerais, com foco na produção de café solúvel exclusivamente para exportação via portos de Aracruz e Vitória.

A partir do dia 23 de setembro de 2024 as cotações futuras do café conilon robusta passaram a ser negociadas na Bolsa de Valores do Brasil (B3).

Investir em inovação, qualidade, boas práticas agrícolas e de produção, e claro, em sistemas de gestão de segurança dos alimentos, é essencial para garantir que o café brasileiro continue a ser apreciado globalmente, mantendo sua relevância no cenário internacional e atendendo às expectativas dos consumidores em termos de segurança e sustentabilidade.

Leia também:

7 min leituraEstima-se que cerca de 1,4 bilhões de xícaras de café sejam consumidas diariamente no mundo, consolidando esta tradicional bebida como um dos principais commodities de exportação para muitos países. Por […]

3 min leitura
0

Os desafios da crise climática para a produção de chocolate e café

3 min leitura

Para mim, chocolate e café estão entre os alimentos mais apreciados. Contudo, as mudanças climáticas estão causando transformações rápidas no ambiente global, afetando diversos setores, especialmente a agricultura. Isso pode influenciar a produção de alimentos como cacau e café, que estão entre os mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas.

A mudança climática vai além do simples aumento da temperatura média global. Outros impactos das mudanças climáticas incluem tempestades mais intensas, aumento da frequência de chuvas fortes e períodos prolongados de seca. O derretimento do gelo nos polos está contribuindo para o aumento do nível do mar. Evidências preocupantes indicam que pontos críticos podem já ter sido atingidos ou ultrapassados, levando a mudanças irreversíveis nos principais ecossistemas e no sistema climático global.

O cacau, ingrediente principal do chocolate, é cultivado principalmente em regiões tropicais como a África Ocidental, América Central e do Sul, e partes da Ásia. Suas condições ideais incluem temperaturas médias de 27°C, alta umidade e chuvas regulares. Por outro lado, o café Arábica, conhecido por sua qualidade superior, é especialmente sensível a variações de temperatura e precipitação, com temperaturas ideais entre 18°C e 23°C.

De acordo com o relatório Endangered Aisle“, as regiões produtoras de café estão sendo significativamente afetadas pelas mudanças climáticas. Isso resulta em mudanças nos padrões de temperatura e precipitação, o que pode levar a uma redução na produtividade. Além disso, a biodiversidade nessas áreas está em risco, com perda de habitats naturais e diminuição das populações de polinizadores. Estudos indicam que muitas das principais regiões produtoras de café correm o risco de perder a adequação climática até 2050.

No mesmo relatório, vemos que as mudanças climáticas também estão impactando a produção de cacau. Prevê-se um aumento de temperatura e alterações nos padrões de precipitação, o que pode resultar em queda na produtividade. A alteração no uso da terra, como o desmatamento para expansão das plantações de cacau, tem efeitos negativos nos serviços ecossistêmicos, incluindo regulação do clima e conservação da biodiversidade. Regiões como Gana e Costa do Marfim enfrentam um risco significativo de perda de adequação climática para o cultivo de cacau até 2050.

Dado que as mudanças climáticas são um ponto de destaque, inclusive em certificações de segurança dos alimentos, como, por exemplo, a FSSC 22.000, é interessante considerar esse requisito junto ao sistema de gestão de qualidade e segurança do alimentos. A empresa precisa avaliar se as mudanças climáticas são pertinentes e se os requisitos das partes interessadas abrangem questões relacionadas a este tema. Isso assegura que as questões climáticas sejam contempladas no contexto da eficácia do sistema de gestão, juntamente com outras questões relevantes.

Cabe ressaltar que, neste contexto, mudanças climáticas afetam a manipulação, processamento e comercialização de alimentos, aumentando os riscos de higiene. Doenças transmitidas por alimentos podem se expandir devido às mudanças climáticas, assim como a ocorrência de fungos toxigênicos e micotoxinas. Florações de algas nocivas, contaminantes ambientais e resíduos químicos representam outros desafios. As mudanças climáticas aumentarão a frequência e severidade de desastres naturais, afetando a segurança alimentar e hídrica.

Para mitigar os desafios impostos pelas mudanças, é essencial promover abordagens interdisciplinares que considerem os impactos ambientais, na saúde animal e vegetal, higiene alimentar e saúde pública. A aplicação e adaptação de boas práticas de higiene, agropecuárias, de produção e veterinárias são fundamentais. Além disso, implementar programas integrados de monitoramento e vigilância do ambiente e dos alimentos, revisar e ajustar esses programas conforme necessário, e fortalecer o diálogo com os consumidores sobre os riscos e medidas de controle são passos cruciais. Investir em novas tecnologias e pesquisa científica aplicada, juntamente com a colaboração internacional para o compartilhamento de dados e informações, também é vital para desenvolver soluções eficazes. A preparação para emergências e a criação de sistemas de alerta rápido são essenciais para reduzir riscos e garantir a segurança alimentar em situações críticas.

Além disso, é essencial reconhecer a importância de preservar esses cultivos fundamentais para a produção de alimentos tão apreciados como o chocolate e o café. Diante dos desafios impostos pelas mudanças climáticas, torna-se importante adotar medidas que visem a sustentabilidade e a preservação dessas culturas. A conscientização sobre os impactos ambientais e a busca por práticas agrícolas mais sustentáveis são passos importantes para mitigar os efeitos negativos sobre o cacau e o café.

Iniciativas que promovam a adaptação das práticas agrícolas às novas condições climáticas, o incentivo à diversificação de cultivos e a conservação dos ecossistemas são fundamentais para garantir a continuidade da produção desses alimentos tão apreciados. Além disso, o apoio a comunidades locais e agricultores na implementação de técnicas sustentáveis pode contribuir significativamente para a resiliência dessas culturas diante das mudanças climáticas.

Ao consumidor, cabe também um papel importante ao escolher produtos de empresas comprometidas com a sustentabilidade e a responsabilidade ambiental. Ao optar por produtos certificados que levam em consideração as questões climáticas, é possível apoiar práticas mais conscientes e contribuir para a preservação desses alimentos tão queridos em todo o mundo.

Portanto, é fundamental que governos, empresas e consumidores se unam em esforços. Somente com ações coletivas e estratégias sustentáveis poderemos assegurar que as gerações futuras possam desfrutar desses ricos sabores.

Imagem: Pexels

3 min leituraPara mim, chocolate e café estão entre os alimentos mais apreciados. Contudo, as mudanças climáticas estão causando transformações rápidas no ambiente global, afetando diversos setores, especialmente a agricultura. Isso pode […]

3 min leitura
1

Degradação da Ocratoxina (OTA) no café por emprego de temperatura

3 min leitura

Não é de hoje que se fala da presença das micotoxinas nos alimentos advindos do campo (leia aqui). Um reflexo disso é a regulação da ANVISA sobre o tema, por meio da Instrução Normativa (IN) nº 160, publicada em 1º de julho de 2022, que estabelece os limites máximos toleráveis (LMT) destes contaminantes.

As micotoxinas caracterizam-se por serem substâncias tóxicas, produzidas por algumas espécies de fungos, com potencial de contaminar alimentos e, pela ingestão destes alimentos, causar doenças que levam até o óbito de pessoas ou animais.

Hoje falaremos especificamente da micotoxina Ocratoxina A (OTA) e a sua presença no café, precisamente no café cru.

A ocratoxina A (OTA) é originária principalmente de fungos dos gêneros Aspergillus da seção Circundati e Penicillium verrucossum, podendo ter sua origem no cultivo, colheita, transporte e armazenamento dos grãos, que podem criar condições propícias para a produção da micotoxina. Discute-se muito acerca deste contaminante por ser um potencial carcinogênico para o ser humano.

A indústria cafeeira vem sentindo grande impacto com o aumento da presença da OTA na matéria-prima, que é o café cru. Conforme já mencionado, a ANVISA estabeleceu o LMT (Limite máximo tolerável) de várias micotoxinas em alimentos, incluindo a OTA. Para o café torrado e moído, o LMT da OTA é 10 µg/kg (ppb).

Como a indústria cafeeira lida com o desafio de mitigar o risco da presença deste contaminante no produto final? Pois bem, compartilho os resultados de um estudo sobre a degradação da Ocratoxina OTA presente no grão de café cru, pelo uso de temperatura no processo de torra dos grãos.

Para o estudo foram separadas 3 amostras de grãos de café cru, sendo uma amostra de café conilon (Coffea canephora) e duas amostras de café arábica (Coffea arabica) e todas foram submetidas a ensaio laboratorial. Como resultado, foi constatada contaminação de OTA nas duas amostras de arábica, sendo que o conilon estava abaixo do limite de quantificação do método (0,5 µg/kg).


Tabela 1: Resultados de contaminação de OTA no café cru

De posse dos resultado de contaminação da matéria-prima, a próxima etapa foi submeter o material ao processo normal de torra, estipulando como temperatura mínima a faixa de 200ºC a 205ºC.


Tabela 2: Tempo e temperatura aos quais as amostras foram submetidas no processo de torra (tratamento térmico)

Após a torra, foram colhidas amostras do café torrado e encaminhadas para o laboratório para realização das análises.

Os resultados foram extremamente satisfatórios, conforme pode-se verificar abaixo:


Tabela 3: Resultados de OTA após processo de torra (tratamento térmico)

A amostra de conilon permaneceu abaixo do LQ. Já para a amostra do café arábica 1, cuja contaminação inicial era de 8,78 µg/kg, constatou-se que após a submissão ao tratamento térmico de 200ºC, o valor ficou abaixo do LQ (<0,5 µg/kg). Já para o arábica 2, o resultado foi extremamente expressivo, passando de 44 µg/kg para 3,67 µg/kg, representando uma redução de 91,66% no conteúdo de OTA da amostra.

Pode-se concluir, frente ao estudo realizado, que o próprio processo de torra do café é um grande aliado das torrefações para mitigar a crescente presença das ocratoxinas no café, além das Boas Práticas Agrícolas (BPA) e Boas Práticas de Fabricação (BPF), sendo estes últimos tópicos, assunto para outro post.

Leia também:
– Controvérsia sobre acrilamida em café e rotulagem sobre câncer [link]
– Uma xícara de café na ótica dos profissionais de Food Safety [link]
– Proteste detecta quase o triplo do limite da ocratoxina A e seis vezes mais fragmentos de insetos em uma marca testada [link]

3 min leituraNão é de hoje que se fala da presença das micotoxinas nos alimentos advindos do campo (leia aqui). Um reflexo disso é a regulação da ANVISA sobre o tema, por […]

< 1 min leitura
0

Podemos consumir café nas salas anexas à produção de alimentos?

< 1 min leitura

Um tema que ainda suscita muitas dúvidas nas indústrias de alimentos e bebidas diz respeito ao consumo de café nas salas anexas ao setor de produção dos alimentos.

É realidade de muitas indústrias a criação de salas anexas dentro do setor fabril para facilitar o acompanhamento diário dos setores. São as salas de Supervisão, Garantia da qualidade, PCP, salas de reunião, manutenção, entre outras.

Esta prática do consumo do café não é recomendada devido aos riscos de contaminação cruzada pelo acúmulo de lixos ou sujidades e atração de pragas, cuja presença constitui sempre um risco à segurança dos alimentos. Entre os princípios gerais higiênico-sanitários para a produção de alimentos, a Portaria SVS/MS n° 326/1997 cita no item 4.2 que deve haver um controle e prevenção de contaminação por lixo ou sujidades.

Todo e qualquer consumo de alimentos deve acontecer em locais definidos para esta finalidade, como refeitórios por exemplo. Conforme citado no item 5.3.9 da norma já referida, estes locais devem estar completamente separados dos locais de manipulação de alimentos e não devem ter acesso direto, tampouco comunicação.

A SVS/MS n° 326/1997 define que manipulação de alimentos são as operações efetuadas sobre a matéria-prima até a obtenção de um alimento acabado, em qualquer etapa de seu processamento, armazenamento e transporte. Produção de Alimentos é o conjunto de todas as operações e processos efetuados para obtenção de um alimento acabado.

Portanto, mesmo o consumo de um singelo cafezinho nas salas anexas não é adequado e não está em perfeita conformidade com as Boas Práticas de Fabricação.

Qualquer prática de conduta pessoal que possa originar uma contaminação de alimentos nas áreas de manipulação e produção deve ser evitada. As empresas podem sim disponibilizar café, desde que seja em local apropriado para a finalidade e em intervalos definidos.

< 1 min leituraUm tema que ainda suscita muitas dúvidas nas indústrias de alimentos e bebidas diz respeito ao consumo de café nas salas anexas ao setor de produção dos alimentos. É realidade […]

< 1 min leitura
1

A controvérsia sobre acrilamida em café e rotulagem de câncer

< 1 min leitura

A acrilamida, subproduto de reações químicas em determinados processos de alimentos, tais como torrefação do café e outros, é uma substância que apresenta potencial de causar câncer. Se deseja mais informações, temos aqui no Blog Food Safety Brazil, uma série de posts sobre este tema.

Nos EUA, especificamente na Califórnia, que é o único lugar do mundo que tem legislação sobre acrilamida, ela está listada como carcinogênica de acordo com a California’s Proposition 65. Esta lei ainda exige que as empresas notifiquem os consumidores sobre produtos químicos ligados ao câncer e a outros problemas sérios de saúde.

Em março de 2018, um juiz da corte superior de Los Angeles emitiu uma decisão preliminar segundo a qual as empresas de café que não conseguissem provar de forma adequada que os benefícios de beber o café superam o risco de câncer causado pela acrilamida, deveriam então alertar os consumidores californianos que seus produtos contêm substância química carcinogênica, tornando obrigatória a rotulagem do aviso de câncer. O juiz finalizou a decisão em maio.

Entretanto, o FDA se manifestou em oposição a esta decisão. A agência observa que a acrilamida pode se formar em muitos tipos de alimentos durante preparos em alta temperatura, como cozimento, fritura, forneamento e assamento, e isto não vem descrito na rotulagem/embalagem destes. Apesar de os estudos em animais correlacionarem altas doses de acrilamida ao câncer, o FDA enfatiza que a ciência atual indica que o consumo de café não eleva o risco de câncer.

Em junho, a agência da Califórnia que administra a Proposição 65 propôs então isentar amplamente o café deste alerta de câncer.

Fonte: Revista Chemistry World

< 1 min leituraA acrilamida, subproduto de reações químicas em determinados processos de alimentos, tais como torrefação do café e outros, é uma substância que apresenta potencial de causar câncer. Se deseja mais […]

2 min leitura
4

União Europeia deverá estabelecer limites para acrilamida em 2018

2 min leitura

A acrilamida, descoberta em 2002, é um composto formado pela reação entre o aminoácido asparagina e os açúcares redutores presentes no alimento, quando este é submetido a altas temperaturas (acima de 120°C), por exemplo, ao ser frito, assado ou torrado.  Os alimentos mais implicados são cereais e derivados (pães, biscoitos, etc.), batatas e café. Há mais informações sobre o que é a acrilamida e como reduzi-la nos alimentos neste post de Juliana Levorato, neste outro post de Juliane Dias, e também no post de Cecilia Cury.

A preocupação com a redução de acrilamida nos alimentos tem como base os efeitos adversos à saúde humana que ela possui. Em 2015, a Autoridade Europeia de Segurança de Alimentos (EFSA) classificou a acrilamida como substância cancerígena. Recentemente, a EFSA solicitou com êxito à Comissão Europeia que sejam impostas medidas obrigatórias aos fabricantes de alimentos para reduzir os níveis de acrilamida nos seus produtos. A proposta ainda deve passar pelo Conselho e pelo Parlamento Europeu, mas pelos prazos, é provável que por volta de maio de 2018, já haverá alguma conclusão. A ideia é que a União Europeia estabeleça níveis máximos aceitáveis de acrilamida em certos alimentos, assim que a regulamentação seja aprovada.

Até a presente data, não há legislação estabelecida para acrilamida pelo mundo (exceto California, nos Estados Unidos), como pode ser verificado neste post de Juliane Dias.

Fabricantes de pães, cereais matinais, biscoitos, batatas fritas e café serão os mais afetados por esta regulamentação. Os estudos estão sendo conduzidos por uma avaliação de diversos resultados para medir a eficácia das medidas de mitigação que a indústria poderia utilizar, e estes níveis serão utilizados então como legalmente aceitáveis.

Curiosamente, as batatas fritas belgas estão excluídas deste regulamento. Elas passam por um processo de fritura dupla, para adquirir a crocância característica, e por este processo ser muito tradicional (existe desde 1680 e é amplamente conhecido como um produto muito típico da identidade da Bélgica), elas não serão consideradas nesta lei.

Grupos de defesa do consumidor na Europa veem este processo com bons olhos. No entanto, as federações industriais dos Estados-Membro estão preocupadas em como os produtos serão efetivamente categorizados na legislação, em especial os pães, e se será viável manter os níveis da regulamentação. A Federação Sueca de Alimentos considera que é praticamente impossível controlar o teor de acrilamida em cada pacote individual do alimento em função da “variabilidade dos níveis de acrilamida, que sempre ocorrerão”. Alguns fabricantes temem que os níveis publicados na legislação sejam descritos como sendo “impraticavelmente baixos”, sendo “virtualmente impossível atingi-los”.

Vamos aguardar o desenrolar desta regulamentação europeia, que poderá eventualmente atingir empresas brasileiras que exportam ao mercado europeu, em especial os fabricantes de café torrado. Mas a recomendação, enquanto não existe lei, é que realmente os níveis de acrilamida sejam monitorados nos produtos, e que os processos para fritar, torrar, secar ou assar sejam efetivamente controlados, evitando um “superaquecimento” ou “queima” dos alimentos. Isto serve em casa também: não deixe a torrada queimar!

Fonte:  Food Safety News

2 min leituraA acrilamida, descoberta em 2002, é um composto formado pela reação entre o aminoácido asparagina e os açúcares redutores presentes no alimento, quando este é submetido a altas temperaturas (acima […]

2 min leitura
0

Consulta pública para materiais celulósicos – filtros de café

2 min leitura

A composição das embalagens de alimentos fabricadas com celulose e dos papéis utilizados na cocção e na filtração a quente são temas de duas consultas públicas abertas pela Anvisa na última quarta-feira (5/9). As propostas de consultas públicas, que recebem contribuições durante 60 dias, buscam harmonizar a legislação brasileira com o regulamento técnico do Mercosul – um passo estratégico para o comércio na região. Atualmente, as normas para embalagens e filtros estão contidas na Portaria 177/99.

As contribuições enviadas à Consulta Pública 51, a CP 51/2012 , auxiliarão a Agência a concluir o regulamento técnico sobre os materiais, embalagens e equipamentos celulósicos que permanecem em contato com os alimentos industrializados.
A proposta traz a atualização da lista positiva de substâncias que serão autorizadas a compor as embalagens de alimentos. Exemplos destes componentes, incluídos na proposta de regulamento, são alguns tipos de agentes de colagem interna e superficial das embalagens a base de amidos, e os amidos modificados.

Já a CP 52/2012, também iniciada na última quarta-feira, irá recolher contribuições para a norma técnica a ser aplicada aos papéis utilizados na cocção e na filtração a quente, como os filtros de café. Para os filtros, submetidos a altas temperaturas, há também uma lista de componentes que podem ser utilizados em sua fabricação. Na proposta de regulamento foram incluídas, por exemplo, mais algumas opções de agentes antimicrobianos para papéis com esta finalidade.
Os textos base preparados pela Anvisa para as duas consultas públicas e os formulários padrão para encaminhar sugestões estão disponíveis no site da Agência.

Fonte e informação completa: site da Anvisa

2 min leituraA composição das embalagens de alimentos fabricadas com celulose e dos papéis utilizados na cocção e na filtração a quente são temas de duas consultas públicas abertas pela Anvisa na […]

< 1 min leitura
0

Cinética de destruição de ocratoxina na torrefação de café

< 1 min leitura

 

Kinetics of ochratoxin A destruction during coffee roasting

Mariano B.M. Ferraz , Adriana Farah , Beatriz T. Iamanaka , Daniel Perrone , Marina V. Copetti ,
Viviane X. Marques, Alfredo A. Vitali, Marta H. Taniwaki,*

Food Control 21 (2010) 872–877

In the present study, Coffea arabica was artificially contaminated with spores of toxigenic Aspergillus westerdijkiae.

The contaminated coffee was roasted in a vertical spouted bed roaster at four different temperatures (180 C, 200 C, 220 C and 240 C) and three different time periods (5, 8 and 12 min), in order to obtain more accurate results for the development of the kinetic model for ochratoxin A (OTA). Chlorogenic acids (CGA) content during coffee roasting was also evaluated to investigate the effect of the heat employed to destroy OTA in these health promoting compounds. Coffee treated with spouted bed roasting significantly reduced the OTA level from 8% to 98%. The spouted bed roasting proved to be a very efficient  procedure for OTA reduction in coffee, and its reduction depended directly on the degree of roasting.

OTA degradation during coffee roasting followed first order reaction kinetics. Using the apparent activation energy of OTA degradation and the temperature-dependent reaction rate, there was a compliance with the Arrhenius equation. This model was capable of predicting the thermal induced degradation of OTA and may become an important predicting tool in the coffee industry. The present study was also able to propose roasting conditions appropriate to destroy OTA and maintain most of the CGA at the same time.

Clique aqui para baixar.

Original gentilmente cedido pela pesquisadora do ITAL e autora Marta Taniwaki.

< 1 min leitura  Kinetics of ochratoxin A destruction during coffee roasting Mariano B.M. Ferraz , Adriana Farah , Beatriz T. Iamanaka , Daniel Perrone , Marina V. Copetti , Viviane X. Marques, […]

2 min leitura
0

Ocratoxina em café brasileiro x método de processamento

2 min leitura

 

The source of ochratoxin A in Brazilian coffee and its formation in relation to

processing methods

M.H. Taniwaki, J.I. Pitt, A.A. Teixeira, B.T. Iamanaka

International Journal of Food Microbiology 82 (2003) 173– 179

A total of 408 Brazilian coffee samples was examined during the 1999 and 2000 coffee harvest seasons for the presence of ochratoxin A (OA) and fungi with the potential to produce it. Samples came from four regions: Alta Paulista (western area of São Paulo State), Sorocabana (southwest Sa˜o Paulo State), Alta Mogiana (northeast Sa˜o Paulo State) and Cerrado Mineiro (western area of Minas Gerais State). Cherries and beans were examined at different stages: immature, mature and overripe cherries from trees, overripe cherries from the ground and beans during drying and storage on the farm. For mycological studies, the cherries and beans were surface disinfected with chlorine, plated on Dichloran 18% Glycerol Agar at 25 jC for 5–7 days and analysed for the presence of Aspergillus ochraceus and closely related species, A. carbonarius and A. niger. More than 800 isolates of fungi belonging to these species were identified and studied for the ability to produce OA using the agar plug technique and thin layer chromatography (TLC). A. niger was the species found most commonly (63% of isolates of these three species), but only 3% of them produced OA. A. ochraceus also occurred commonly (31% of isolates), and 75% of those studied were capable of OA production, a much higher percentage than reported elsewhere. A. carbonarius was found (6% of isolates) only in Alta Paulista, the hottest region studied, and only from beans in the drying yard or in storage. However, 77% of the A.carbonarius isolates were capable of producing OA. Average infection rates for cherries taken from trees were very low, but were higher in fruit taken from the ground, from the drying yard and from storage, indicating infection by toxigenic species after harvest. The average OA content in 135 samples of mature cherries from trees, overripe from trees, overripe from the ground, drying yard and storage was 0.1, < 0.2, 1.6, 2.1 and 3.3 Ag/kg, respectively. Although individual OA levels varied widely, only 9 of the 135 samples analysed exceeded 5 Ag/kg OA, with one sample of poor quality dried coffee in excess of 100 Ag/kg OA.
The causes of high contamination were investigated on the farms concerned and several critical points were found, relating both to local climatic conditions and the drying processes used.

Clique aqui para baixar.

Paper gentilmente cedido pela pesquisadora do ITAL e autora, Marta Taniwaki ao Blog Food Safety Brazil.

2 min leitura  The source of ochratoxin A in Brazilian coffee and its formation in relation to processing methods M.H. Taniwaki, J.I. Pitt, A.A. Teixeira, B.T. Iamanaka International Journal of Food Microbiology 82 […]

Compartilhar
Pular para a barra de ferramentas