4 min leituraLá na sua especificação de entrada de ingredientes você tem “food grade” ou “grau alimentício”, não é? Mas sabe exatamente o que define se algo é ou não grau alimentício? Quais são os outros graus que existem?
QUAIS OS GRAUS EXISTENTES?
Vamos começar pela última pergunta: certas substâncias são usadas por inúmeras indústrias ao mesmo tempo. Por exemplo: propileno glicol.
A indústria de alimentos usa como umectante, a indústria farmacêutica como solvente e a indústria química utiliza-o como matéria-prima para produção de resinas de poliéster. Faz sentido que a produção de uma resina siga os mesmos critérios que a produção de um fármaco?
Claro que não. Por isso, existem vários graus (níveis de exigência de pureza, contaminantes e processo). Os graus mais relevantes para o nosso mercado são: alimentício, farmacêutico, veterinário e técnico.
E O QUE SERIA GRAU ALIMENTÍCIO?
Grau alimentício é a característica de uma substância que foi produzida segundo as Boas Práticas de Fabricação de Alimentos e atende os requisitos de identidade e qualidade para aquela categoria, quando existirem.
Complicado? Eu explico no quadro abaixo. Vamos usar o exemplo de uma salsicha.

A salsicha tem que ser produzida dentro das regras de BPF e também atender aos requisitos de identidade e qualidade para ser chamada de salsicha e ser grau alimentício.
Se a salsicha for produzida dentro das regras de BPF, porém não atender aos requisitos: não é salsicha para alimentação humana. “Talvez poderia ser vendida para alimentação animal?” Se atender aos requisitos, porém se não tiver sido produzida sob as BPF também não é grau alimentício.
Portanto, as duas regras são SOMADAS.
Agora vamos pegar o caso do nosso amigo propileno glicol. Vamos dizer que a indústria produtora venda para a indústria química e para a indústria de alimentos. Pode?
Em teoria, sim. Desde que a produção atenda às normas de BPF para alimentos. De modo geral, o grau técnico é menos restritivo que o grau alimentício, então a empresa poderá vender para seus clientes da indústria química, sem problemas, o produto de grau alimentício.
O que não pode, infelizmente, é o mais comum entre aditivos e outros ingredientes de origem química: os lotes são testados um a um para averiguar a adequação à especificação. Apenas. Caso o lote esteja dentro das normas internacionais para alimentos – como FCC ou JECFA – então é vendido como grau alimentício.
E PODE ISSO, ARNALDO?
A regra é clara: não pode, não.
A Anvisa, que legisla sobre aditivos em alimentos no Brasil, na Portaria 540/97, diz que:
2.4 – O emprego de aditivos justifica-se por razões tecnológicas, sanitárias, nutricionais ou sensoriais, sempre que:
(…)
2.4.2 – Atenda às exigências de pureza estabelecidas pela FAO-OMS, ou pelo Food Chemical Codex.
Aí o colega vai lá no organismo que legisla sobre alimentos na FAO-OMS – que é o Codex Alimentarius – e pesquisa o que diz sobre o grau alimentício, no Codex Stan 192-1995 (tem 396 páginas, colega, boa leitura para as férias!):
3.4 Especificações para a Identidade e Pureza de Aditivos Alimentares.
Aditivos de alimentos usados de acordo com este Padrão devem ser de apropriado grau alimentício (…). Em termos de segurança, grau alimentício é alcançado pela conformidade dos aditivos às suas especificações como um todo (não meramente com critérios individuais) e através da sua produção, armazenagem, transporte, e manuseio de acordo com as BPF.
Ou seja: a empresa que quer produzir para indústria alimentícia TEM que adequar também a sua produção, armazenagem, transporte e manuseio para que o item seja considerado grau alimentício.
Não adianta separar lote. Análise de um único item da especificação TAMBÉM não garante que o item seja grau alimentício.
OK, MAS EU ANALISEI O MEU SAL E ELE ESTÁ DENTRO DA ESPECIFICAÇÃO GRAU ALIMENTÍCIO DO CODEX ALIMENTARIUS. VOCÊ ESTÁ DIZENDO QUE ELE NÃO É FOOD-GRADE?
Pode ser que sim, pode ser que não – meio caminho andado já que nas análises ele atendeu. Mas o colega lembra porque o HACCP foi criando, não? Análises de produto final não dão garantias suficientes de produto seguro.
Quer um exemplo clássico? Tente achar pelo de rato em análise de entrada. Vai fundo, colega, todo apoio!
Há várias dificuldades em detectar em análises de entrada o processo pelo qual o item passou – se por acaso ele foi coletado do chão, ou se o teto do armazém tem um furo que jorra água no meio do estoque seco, ou se há reprocesso de produto intermediário que não foi adequadamente armazenado. Este tipo de prática é uma loteria: pode ou não contaminar o lote específico – e como acontece com qualquer amostragem, a contaminação pode ou não aparecer na análise de entrada.

Ou seja: melhor prevenir do que remediar. Tem que controlar o processo, via as Boas Práticas de Fabricação de Alimentos.
POR FIM, SE É GRAU ALIMENTÍCIO, ENTÃO PODE COMER?
Será que se uma graxa é grau alimentício, dá para comer de colher, como fez o responsável pela manutenção numa auditoria (leia mais no post do Fernando aqui)?
Não, colega, não dá. Sabe por quê?
Grau alimentício meramente fala sobre o item ser adequado para o consumo humano – mas não fala em quantidade.
Exemplo fácil que todo mundo entende: o médico diz que você tem que tomar vinho todo dia. Um cálice ou um tonel inteiro?
Quantidade é tudo: no caso da graxa aí que o moço provou, a ideia é que ela não seja um COMPONENTE do alimento, e que apenas quantidades diminutas dela possam entrar em contato com ele.
Ou seja, se porventura você vier a comer um alimento com graxa, será em pequeníssima quantidade. A graxa será adequada para o consumo NAQUELA quantidade.
Ok, colega? Então, vai lá na sua especificação de entrada e dá uma olhada se consta “food grade” ou “grau alimentício”. Se não consta, boa hora para uma revisão, hein?
E você, colega da indústria química, parabéns se o seu processo já atende às Boas Práticas de Fabricação para ALIMENTOS. Se não atende, boa hora para começar a seguir este blog e se adequar.
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