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Técnicas para treinamento na indústria de alimentos

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Muitas empresas, ao contratarem novos empregados, no momento da admissão recorrem ao chamado “treinamento de integração”. Isto é necessário, bem-vindo, mas é apenas um momento introdutório, insuficiente para que novos empregados efetivamente absorvam todas as demandas requeridas numa indústria de alimentos.

Normalmente, esse treinamento consiste em palestras com apresentação de slides abordando uma variedade de temas, como Boas Práticas de Fabricação (BPF) incluindo higiene pessoal e operacional, Manejo Integrado de Pragas (MIP), outros tópicos de segurança dos alimentos específicos da organização, além de regras gerais, direitos e deveres trabalhistas, uso do refeitório e aspectos associados à saúde e segurança ocupacional.

No entanto, esse modelo concentra uma grande quantidade de informações em um curto espaço de tempo, resultando em baixa retenção de conhecimento.

Muitas vezes, os participantes assinam uma lista de presença sem realmente absorver o conteúdo, alguns distraídos com o celular, outros cansados ou simplesmente desinteressados. Mesmo assim, algumas empresas assumem que essa abordagem é suficiente para garantir a prevenção de riscos sanitários e operacionais.

Este artigo destaca que treinamentos de integração são apenas um primeiro passo. Embora a assinatura da lista possa servir como registro de participação e referência para cobranças futuras, o verdadeiro aprendizado ocorre ao longo do tempo, com a adaptação dos funcionários aos locais de trabalho e respectivos processos, desenvolvimento de consciência sobre os temas associados à segurança dos alimentos e aplicação prática dos conceitos.

Depois de atividades de treinamento, nas quais há uma transferência de competências e conhecimento, o reforço contínuo, bons exemplos por parte dos líderes, retreinamentos e, em alguns casos, medidas disciplinares, farão parte da construção de uma curva efetiva de absorção do aprendizado, criando uma atitude voltada para a conscientização. Em seguida, derivam para a aplicação prática daquilo que foi aprendido, fomentam a criação de um comportamento individual proativo.  Só assim, disseminando ao máximo competências em segurança dos alimentos, será possível criar um comportamento coletivo que se traduza em cultura organizacional.

A indústria alimentícia contabiliza numerosos incidentes devido a treinamentos ineficazes, resultando em contaminações e não conformidades. Para evitar esse cenário, as empresas devem abandonar métodos ultrapassados que não desenvolvem habilidades essenciais e nem promovem uma cultura de segurança dos alimentos proativa, investindo continuamente na capacitação de seus times, e mais, sempre avaliando se as ações tomadas foram eficazes.

As empresas devem enxergar o treinamento e o desenvolvimento de funcionários como um investimento estratégico, e não apenas como uma exigência burocrática para atender requisitos normativos.

Após qualquer treinamento, é essencial dedicar tempo e esforço para garantir que a equipe realmente pratique os conceitos aprendidos. A educação diária e a criação de uma cultura de aprendizado contínuo são fundamentais para minimizar riscos e elevar os padrões de qualidade, segurança e eficiência operacional.

Andragogia: o ensino para adultos

É fundamental compreender que ensinar adultos exige uma abordagem diferente do ensino infantil ou juvenil. Os adultos possuem experiências prévias, são mais independentes e precisam enxergar uma aplicação prática imediata para o que estão aprendendo.

A andragogia, conceito desenvolvido por Malcolm Knowles, trata do ensino de adultos e se baseia em estratégias que maximizam a aprendizagem. Diferentemente da pedagogia, que é voltada para crianças e adolescentes, valorizam-se aqui a experiência prévia, a autonomia e a responsabilidade do aprendiz pelo próprio processo de aprendizagem.

Princípios fundamentais da andragogia

  1. Necessidade de saber – Os adultos precisam compreender a relevância do aprendizado para suas vidas, tanto profissional quanto pessoal. No contexto da segurança dos alimentos, por exemplo, é essencial que eles entendam como as falhas podem impactar a empresa, seus empregos e a saúde dos consumidores;
  2. Autonomia – O aprendizado deve ser prolongado de forma independente, permitindo que os adultos tenham controle sobre o próprio processo de desenvolvimento e sejam estimulados a buscar novas informações;
  3. Experiência prévia – Conhecimentos adquiridos em empregos anteriores ou na vida pessoal influenciam a forma como novas informações são processadas e aplicadas, podendo e devendo fazer parte do aprendizado, pois adicionam novas camadas de conhecimento;
  4. Aprendizagem orientada a problemas – Os adultos aprendem melhor ao enfrentar desafios reais e situações concretas, como uma tomada de decisão diante de um produto não conforme ou uma falha em um ponto crítico de controle, desde que bem orientados.

Modelos e técnicas de ensino para adultos

Com base nesses princípios, diferentes técnicas podem ser aplicadas para tornar o ensino mais eficaz. Entre as principais estão:

I – Aprendizagem Ad Hoc

A aprendizagem Ad Hoc ocorre de maneira espontânea e não estruturada, sendo aplicada para situações específicas. No dia a dia da indústria de alimentos, pode ser usada quando um funcionário precisa, por exemplo, aprender rapidamente a higienizar um equipamento ou separar produtos defeituosos. É voltada, portanto, para tarefas simples, claras, pontuais e objetivas.

Embora útil para necessidades pontuais, a abordagem Ad Hoc não é suficiente para lidar com desafios complexos, pois pode deixar lacunas no conhecimento.

Para avaliar a eficácia em treinamentos ao estilo Ad Hoc, os instrutores podem fazer perguntas diretas sobre o conteúdo abordado, garantindo que os conceitos essenciais foram compreendidos e assimilados.

II – Treinamento On the Job

O treinamento On the Job ocorre diretamente no ambiente de trabalho e é uma forma prática e econômica de capacitação, podendo incluir:

  • Job Rotation – Rodízio de funções para que o colaborador tenha uma visão ampla do negócio;
  • Aprendizado por observação – O funcionário acompanha um colega mais experiente para aprender suas funções;
  • Shadowing (Sombreamento) – O funcionário segue um especialista durante sua rotina para compreender melhor a atividade.

Para garantir a eficácia desse modelo de transferência de competências, é fundamental que o treinamento seja bem estruturado e acompanhado por instrutores capacitados no tema que farão a instrução, e também, capazes de exercer uma pedagogia apropriada. Depois, os resultados podem ter sua eficácia avaliada pelo uso de checklists específicos que incluam os pontos chaves de uma tarefa ou processo, para que o instrutor certifique-se de que cada um está sendo atendido sem execução de erros pelo aprendiz.

É uma ótima técnica para treinar tarefas como monitoramento de Limites Críticos (LC) em Pontos Críticos de Controle (PCC) ou Critérios de Controle (CC) em Programas Operacionais de Pré-Requisitos (PPROs).

III – Aprendizagem Baseada em Problemas (PBL)

A Aprendizagem Baseada em Problemas é uma técnica que desafia os funcionários a resolver situações reais ou simuladas.

O BPL pode ser altamente eficaz na segurança dos alimentos, preparando os profissionais para tomar decisões corretas em situações críticas como gestão de emergências, destinação de produtos não conforme e recall.

Para avaliar o aprendizado, o instrutor pode aplicar um estudo de caso ao final do treinamento, permitindo que os participantes demonstrem sua capacidade de resolver problemas e garantindo que qualquer erro seja corrigido no momento, com isso, reforçando o aprendizado.

IV – E-learning e Microaprendizagem

O uso da tecnologia no aprendizado tem crescido, permitindo que os funcionários aprendam no ritmo próprio. O e-learning oferece cursos completos online, enquanto o microlearning apresenta conteúdos curtos e diretos, facilitando a absorção.

É importante escolher muito bem o material a ser utilizado em e-learning ou na microaprendizagem, pois cursos genéricos e superficiais podem não preparar especificamente os funcionários para identificar e lidar com riscos emergentes, além de se tornarem monótonos e o aprendiz fingir que assistiu, sem assistir com a devida atenção.

Para garantir a eficácia desse método, avaliações periódicas devem ser aplicadas, por exemplo, com uso de provas ao final de cada carga de aprendizado, que também podem ser feitas com uso de recursos de tecnologia.

V – Mentoria e Coaching

O modelo de mentoria conecta aprendizes a profissionais experientes, os coachings (treinadores), promovendo aprendizado pela troca de experiências e orientação personalizada. O coaching, por sua vez, auxilia o desenvolvimento de habilidades específicas e a melhoria do desempenho.

O sucesso de uma mentoria depende da qualidade do coaching, do seu real conhecimento no tema no qual fará mentoria, e das suas habilidades, tanto técnicas quanto pedagógicas.

Também é preciso levar em consideração que aprender enquanto se executam tarefas, ainda mais sob o olhar de um coaching, pode ser estressante para alguns empregados, principalmente em ambientes de alta demanda.

Neste modelo de transferência de competências, apropriado especialmente para temas mais complexos e gestão, o próprio coaching, ao final, deve avaliar se sua mentoria foi eficaz e se o aprendiz está apto ou não, para seguir com suas próprias pernas.

VI – Gamificação

O treinamento por gamificação é uma abordagem que usa elementos de jogos, como pontuação, desafios, recompensas e rankings, para tornar o aprendizado mais envolvente e motivador.

As principais vantagens da gamificação incluem o aumento do engajamento dos participantes, a melhoria na retenção do conhecimento e a criação de um ambiente mais interativo e sonoro.

Um exemplo prático é o uso de plataformas de aprendizado corporativo que premiam funcionários com medalhas virtuais, dia de folga ou brindes para aqueles que completam com melhor performance cursos ou desafios.

No entanto, esse método apresenta desafios, como a necessidade de um design bem estruturado para evitar que a competição desmotive alguns participantes, além do risco de os colaboradores focarem mais nas recompensas do que na aprendizagem em si.

Use exemplos!

O exemplo é uma das ferramentas mais eficazes para o ensino, pois facilita a compreensão e a assimilação do conhecimento ao tornar conceitos abstratos mais concretos e acessíveis.

Ao apresentar exemplos práticos, deve-se estabelecer conexões entre a teoria e a realidade, permitindo que os participantes visualizem a aplicação do conteúdo no cotidiano.

Além disso, exemplos bem escolhidos despertam o interesse, promovem o engajamento e ajudam na memorização, tornando o aprendizado mais significativo. Dessa forma, o uso de exemplos é essencial para uma educação mais clara, dinâmica e eficaz.

Alguns exemplos de como dar exemplos

  1. Se vai treinar sobre limpeza de tubulações e placas, mostre exemplos destas tubulações e placas abertas, com formação de biofilme;
  2. Se vai treinar em higiene pessoal, colete swabs de mãos, faça análises de contagem total e mostre os resultados;
  3. Se vai treinar em prevenção de carunchos, mostre produtos infestados com larvas, pupas e carunchos.

Treinamento desenhado conforme o público-alvo

Para que um programa de treinamento seja realmente eficaz, ele deve ser estruturado conforme o público-alvo. Isso significa que os conteúdos e abordagens devem ser adaptados às necessidades específicas de cada grupo dentro da organização. Dessa forma, o treinamento pode tanto desenvolver habilidades técnicas e operacionais quanto fornecer um conhecimento mais amplo, essencial para o desempenho de funções mais estratégicas.

Por motivos óbvios, as necessidades de aprendizagem variam significativamente entre gestores, líderes e funcionários da linha de frente, portando, precisam ter conteúdo programático e estratégia de abordagem diferentes.

Isso inclui uma abordagem estratégica na escolha da técnica de ensino que será utilizada, considerando que não é preciso escolher uma única. Num programa de treinamento robusto aconselha-se combinar diferentes técnicas para que sejam melhor sucedidas, devido aos efeitos sinérgicos, ao estimular diferentes partes do cérebro (não perca o próximo artigo será sobre teoria da neurociência do cérebro trino).

Treinamento para gestores

Para os gestores, a capacitação deve ter um foco estratégico, priorizando o desenvolvimento de liderança, a gestão de riscos e a compreensão sistêmica dos processos.

Além disso, é fundamental aprofundar conhecimentos sobre conformidade regulatória, padrões normativos para a indústria de alimentos, compreensão do contexto na cadeia produtiva e boas práticas de governança, garantindo que possam promover uma forte cultura de segurança dos alimentos dentro da organização.

Espera-se que profissionais na posição de gestores tenham capacidade de liderança, influência e implementação de iniciativas que fortaleçam a segurança dos alimentos em toda a empresa, incluindo conexões com fornecedores, distribuidores e clientes.

Treinamento para líderes e funcionários da linha de frente

Os líderes e funcionários da linha de frente requerem treinamentos mais práticos e direcionados à execução de tarefas operacionais.

Isso inclui, por exemplo, identificação de riscos e estratégias de resposta imediata, a resolução de problemas em situações críticas, aplicação de correções, ações corretivas e preventivas para desvios em Planos de APPCC, em critérios de controle de PPROs (Programas de Pré-Requisitos Operacionais) e limites críticos em PCCs (Pontos Críticos de Controle), etc.

Além dos aspectos técnicos, também é essencial desenvolver habilidades interpessoais , como comunicação eficaz para relatar incidentes e compartilhar informações associadas com a segurança de alimentos, desenvolver senso de prioridade, e claro, pensamento crítico e raciocínio lógico , fundamentais para avaliar situações e tomar decisões rápidas e assertivas.

Enquanto os gestores devem ser capacitados para definir estratégias e implementar melhorias de longo prazo, os treinamentos práticos garantem que os funcionários da linha de frente possam implementar procedimentos de segurança dos alimentos. No entanto, independentemente da função exercida, ações contínuas de treinamento e conscientização são essenciais para fortalecer a cultura de segurança dos alimentos dentro das organizações.

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Por que o óbvio precisa ser dito: o impacto das repetições nos treinamentos de BPF

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Se você trabalha na indústria de alimentos, já deve ter ouvido (ou dito) frases como: “De novo esse treinamento? Eu já sei tudo isso!” ou “Isso é muito básico, não precisa repetir!”. Mas a verdade é que o óbvio precisa, sim, ser dito. Várias vezes.

O impacto da repetição

Nosso cérebro tende a descartar informações que considera “rotina” ou “excesso”. A curva do esquecimento mostra que, sem reforço, esquecemos cerca de 50% do que aprendemos em apenas um dia. Em processos industriais, onde a segurança dos alimentos é um fator crítico, essa “amnésia operacional” pode ser perigosa. Pequenos deslizes podem comprometer a qualidade do produto, causar contaminações e colocar a saúde do consumidor em risco.

Além disso, a segurança dos alimentos é um tema dinâmico, com legislações atualizadas frequentemente e novos riscos surgindo conforme as tendências de consumo mudam. Estudos apontam que treinamentos frequentes reduzem a incidência de falhas operacionais e melhoram a adesão às Boas Práticas de Fabricação.

O que diz a legislação?

A legislação brasileira é clara quanto à obrigatoriedade do treinamento dos colaboradores da indústria de alimentos. A RDC 275/2002 da ANVISA determina que empresas do setor devem implementar programas de capacitação, garantindo que os funcionários conheçam as Boas Práticas de Fabricação (BPF). Além disso, normas como a ISO 22000 e os protocolos do GFSI (Global Food Safety Initiative) também exigem a educação contínua dos trabalhadores.

Ou seja, não é apenas uma questão de cultura organizacional, mas também um requisito regulatório.

Como tornar os treinamentos mais eficazes?

Se a resistência ao treinamento surge por conta da repetição, inovar na abordagem pode ser a solução. Algumas estratégias incluem:

  • Tornar interativo: sessões práticas, estudos de caso e dinâmicas aumentam o engajamento e ajudam na fixação do conhecimento.
  • Usar exemplos reais: relatos de contaminações, recalls e surtos alimentares conectam a teoria à prática, evidenciando os impactos da negligência.
  • Apostar na tecnologia: gamificação, e-learning e quizzes tornam o conteúdo mais atraente e acessível.
  • Ser breve e frequente: estratégias de microlearning (conteúdos curtos e frequentes) são mais eficazes do que treinamentos longos e espaçados, reduzindo a sobrecarga cognitiva.

Abordagens humanizadas para maior impacto

Muitas vezes, os treinamentos falham por serem excessivamente técnicos, sem considerar a experiência do colaborador. Algumas abordagens inovadoras incluem:

  • Histórias e impactos reais: mostrar exemplos de casos reais de contaminação alimentar, incluindo os impactos na saúde dos consumidores e na reputação da indústria, pode gerar maior conscientização.
  • Linguagem acessível: evitar termos excessivamente técnicos e utilizar uma comunicação mais próxima da realidade dos colaboradores.
  • Uso de multimídia: fuja do óbvio. Músicas, vídeos e dinâmicas podem tornar os treinamentos mais envolventes.

Gamificação: o aprendizado por meio do jogo

O uso de jogos nos treinamentos pode aumentar significativamente o engajamento. Algumas ideias incluem:

  • Jogo da memória: relacionando perigos e medidas de controle.
  • Palavras cruzadas: testando conhecimentos sobre BPF.
  • Quizzes interativos: com perguntas sobre boas práticas e segurança de alimentos.

Existem plataformas gratuitas que permitem criar essas dinâmicas online, tornando a experiência ainda mais interativa.

Treinamento contínuo no dia a dia

Mais do que eventos pontuais, o treinamento deve fazer parte da rotina da indústria. Algumas formas de reforço contínuo incluem:

  • Diálogos diários: pequenos bate-papos sobre segurança dos alimentos durante o expediente.
  • Sinalização visual: cartazes e lembretes nos locais de trabalho ajudam a reforçar os conceitos.
  • Ações lúdicas: dinâmicas e gincanas podem motivar os colaboradores a se envolverem mais com o tema.

Conclusão

O óbvio precisa ser dito porque nem sempre ele é lembrado. A segurança dos alimentos depende do compromisso contínuo de todos na indústria, e o treinamento regular é uma ferramenta essencial para garantir qualidade, conformidade legal e, acima de tudo, a saúde do consumidor.

Da próxima vez que um colaborador questionar por que o treinamento está se repetindo, a resposta é simples: porque assim se constrói uma cultura de segurança de alimentos sólida!

E você, como conduz os treinamentos na sua empresa? Compartilhe sua experiência nos comentários.

Imagem: Alexander Grey 

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Cuidados em segurança dos alimentos com equipes terceirizadas

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Buscando a otimização de recursos, torna-se cada vez mais comum para as organizações o uso de funcionários temporários. Equipes terceirizadas podem significar uma vantagem em muitos segmentos industriais, em especial quando há processos produtivos susceptíveis a sazonalidades, pois a terceirização pode contribuir com a flexibilidade na mobilização da mão de obra, melhorar a eficiência e dar foco no core business. Por outro lado, este tipo de recurso é também desafiador pela perspectiva da segurança dos alimentos.

A terceirização movimentou 4,3 milhões dos profissionais em 2023, o que, segundo o IBGE, representa 25% dos trabalhadores formais.

Não é preciso dizer que mesmo que recrutados via agências, os funcionários temporários precisam ser supervisionados, treinados e avaliados quanto às suas habilidades pela organização. Além disso, devem existir canais abertos para uma boa comunicação e rotinas para o monitoramento de desempenho.

Um fator a ser considerado é que como o trabalhador temporário não é um funcionário habitual da empresa, ele pode não sentir o mesmo engajamento dos outros e isso dificulta sua inclusão numa cultura Food Safety.

Entre as empresas que fornecem mão de obra terceirizada, destacam-se as de limpeza, zeladoria, segurança, obras e manutenção, call centers, entre outras.

Não se deve negligenciar o treinamento de trabalhadores terceirizados que executam tarefas indiretas ao processo produtivo principal; ao contrário, uma tarefa como limpeza ou manutenção pode impactar severamente a segurança dos alimentos.

Há que se considerar que como o trabalhador temporário tem um contrato finito, ele pode não se sentir parte da equipe e não se comprometer ao máximo com as regras da instituição e isto, é claro, pode impactar na segurança dos alimentos produzidos.

Outra questão a ser considerada é que os funcionários permanentes podem não sentir a necessidade de investir tempo na construção de trabalho em equipe com os funcionários temporários, uma vez que os temporários não ficarão lá por muito tempo. Nesta mesma linha, é preciso atenção e cautela para evitar potenciais animosidades causadas caso os funcionários permanentes vejam a força de trabalho temporária como ameaça à sua estabilidade, crescimento ou oportunidades.

Devido a erros de funcionários, produtos em condições de não conformidade podem ser gerados, e no pior caso, sair dos limites da empresa podendo causar danos à saúde dos consumidores, requerendo recalls e gerando danos à marca a longo prazo.

Estes problemas requerem responsabilidades individuais nos controles dos processos e no cumprimento de regras de BPF e higiene pessoal. Assim, a falta de engajamento ou uma desarmonia entre a força de trabalho terceirizada e a permanente podem representar ameaças críticas.

Diante do exposto, para garantir produtos seguros e contribuir com uma cultura food safety, há que se adotar estratégias para gerenciar funcionários temporários:

  1. Treinamento – Nunca se deve supor que todos terão bom senso. Deve-se treinar e garantir um treinamento eficaz. Não presuma que os terceirizados contratados já saibam algo, mesmo que pareça óbvio, é importante garantir que recebam o treinamento necessário para exercer suas funções. Para isso, um processo de integração abrangente é essencial;
  2. Avaliação de competências – Junto com o treinamento, garanta que os funcionários temporários sejam capazes de executar corretamente as tarefas. Para tal, avalie a capacidade com testes de pré-avaliação que podem incluir capacidade física, capacidade cognitiva, compreensão de leitura e escrita, julgamento situacional ou habilidades específicas da posição;
  3. Monitoramento de desempenho – Monitore o desempenho dos funcionários, tanto permanentes quanto temporários com o propósito de se certificar que ocorra um feedback alinhado com as metas e expectativas da organização em relação aos serviços sendo realizados. Considere incentivos baseados em desempenho para motivar e encorajar funcionários temporários a investirem em suas funções e aumentar a satisfação e o desempenho no trabalho;
  4. Cultura food safety – Treine as lideranças táticas e estratégicas sobre como gerenciar potenciais efeitos negativos na cultura food safety do seu local de trabalho com técnicas para garantir o trabalho em equipe com funcionários temporários. Para tanto, promova um ambiente colaborativo que seja capaz de reduzir atritos, fazendo com que todos, terceirizados e permanente, se sintam valorizados;
  5. Meritocracia – Se houver posições potenciais ou abertas para as quais os funcionários temporários possam ser elegíveis, certifique-se de que conheçam os requisitos e os incentive a buscarem a posição, passando de temporários para permanentes. Mostre que a empresa tem as portas abertas. Implemente um plano de sucessão que identifique funcionários temporários de alto desempenho que possam ser candidatos a posições permanentes dentro da instalação.

Como dica, considere que muitas organizações criam uma forma de distinguir um funcionário novo ou temporário, por exemplo, com o uso de uniformes de cores diferentes ou coletes de alerta. Este tipo de ação não é para segregá-los como uma classificação diferente, mas para ajudar os funcionários mais experientes e permanentes a identificá-los facilmente, para ajudá-los se estiverem com dificuldades em uma tarefa ou para garantir que estejam executando suas tarefas apropriadamente e considerando requisitos de segurança dos alimentos.

Orientações dos funcionários permanentes aos terceirizados devem ser realizadas por colegas de equipe de forma cortês e não de forma “policialesca”. Para isso, convém sempre que os líderes estejam usando técnicas de reforço positivo para promover camaradagem e empatia entre seus funcionários.

Incentive a liderança que atua diretamente com a força de trabalho para que mantenha um canal de diálogo aberto com todos os funcionários, sejam permanentes ou temporários, objetivando garantir que as preocupações sejam ouvidas e tratadas regularmente.

Promova uma comunicação clara e sem ambiguidades, garantindo que as expectativas, objetivos e metas para todos os funcionários sejam comunicadas de forma clara e transparente, para que ninguém fique confuso. Quando as pessoas não têm certeza de seus requisitos de trabalho, das expectativas quanto ao desempenho, elas tendem a executar tarefas de forma insegura e ineficiente.

Uma questão importante na contratação de trabalhadores temporários, quando se utiliza uma agência de recrutamento, é que haja uma permanente parceria, a fim de que tais agências entendam as políticas da organização, suas regras, demanda e cultura, para que assim recrutem da melhor forma.

As agências de recrutamento devem ser capazes de garantir que um trabalhador temporário tenha a formação mínima e habilidades para o cargo no qual serão alocados. Em alguns casos, as agências de recrutamento também podem conduzir parte do treinamento. No entanto, caberá às organizações avaliarem se estes treinamentos foram eficazes.

Como pela natureza do cargo, um trabalhador temporário terá um contrato finito, crie um mecanismo de gestão que conduza entrevistas de saída para obter feedback sobre a experiência de trabalho deles.

Essas informações podem ser valiosas e permitir que a organização corrija o curso de falhas reais ou potenciais sempre que necessário. Com isso, assim como em outros processos, melhore continuamente, especialmente neste caso. O uso de mão de obra temporária requer aprendizado e estratégias para que, com base no feedback e métricas de desempenho, seja cada vez mais bem gerenciado como um recurso valioso e seguro.

Sejam trabalhadores terceirizados ou permanentes, todos são importantes para a segurança dos alimentos. Portanto, todos devem ser treinados, capacitados e conscientizados para que executem suas tarefas devidamente e sem representar riscos.

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A arte de explicar de forma lúdica em Qualidade de alimentos

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Muitos me perguntam como mudar a cultura de uma equipe de chão de fábrica e como tornar as metodologias e normas complexas acessíveis no dia a dia de uma operação. A resposta é sempre: não é fácil, mas precisamos nos reinventar continuamente como profissionais de Qualidade e Segurança de Alimentos para garantir que as informações não apenas cheguem, mas também façam sentido para quem as recebe.

Uma grande parte da nossa atuação em qualidade são os treinamentos que aplicamos sobre boas práticas de fabricação, incluindo a limpeza dos equipamentos. Certa vez, durante um treinamento sobre a importância dessa limpeza, um colaborador me perguntou: “Rômulo, por que eu tenho que colocar os equipamentos sujos em cima de paletes de plástico limpos, em vez de diretamente no chão, já que vou limpá-los depois?”. Naquele momento, eu poderia ter sido super técnico e explicar sobre Listeria, contaminação cruzada etc. No entanto, decidi usar o método de aprendizagem reflexiva e perguntei ao colaborador: “Quando você está em casa e, após um belo jantar que preparou para sua esposa, levanta-se para lavar os pratos e panelas, você os coloca diretamente no piso da cozinha para depois decidir limpar o chão e, junto, os pratos e talheres? Você acha isso correto?” De imediato, o colaborador respondeu que não, que deveria colocá-los na pia da cozinha. E então perguntei: “E por que não pode?”. Ele respondeu: “Porque o chão é sujo e pode contaminar os pratos e talheres”. Após essa conversa, ficou fácil dialogar com ele e com o time sobre o conceito de contaminação cruzada e os riscos de os equipamentos de produção de alimentos entrarem em contato direto com o chão.

Não podemos usar fórmulas simples para explicar em todos os treinamentos, mas também nem todos os métodos são fáceis de serem adaptados à linguagem do receptor. Nós, como profissionais de qualidade, precisamos atuar de forma a traduzir o que é considerado “chato” em algo atrativo e de fácil compreensão, sem perder a essência da mensagem.

A dica que dou é utilizar situações cotidianas para explicar, tanto dentro quanto fora da empresa, para que a comunicação seja mais suave e flua de forma mais eficiente por todas as camadas da organização.

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  • Dinâmicas para uso em treinamentos de Boas Práticas [link]

 

Romulo Seixas Aliende é engenheiro químico e de segurança do trabalho, formado pela UNIFAE e UNIVAS, com trajetória destacada em grandes multinacionais como Ferrero, Danone, PepsiCo, Kerry e Coca Cola FEMSA.  Adquiriu experiência internacional significativa nos EUA, liderando operação e projetos de melhoria em sistemas de limpeza e sanitização, segurança comportamental (BBS) e gestão de crises, fortalecendo a resiliência organizacional. Atua como auditor líder de 1ª parte nas certificações FSSC 22000, ISO 14001, SA 8000, OHSAS 18001, ISO 45001 e AIBI.

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