2 min leitura
6

A maturação e a qualidade microbiológica de queijos

2 min leitura

Os microrganismos são um componente essencial de muitas variedades de queijo e desempenham um papel fundamental durante sua fabricação e maturação. A microbiota desejável é constituída pelas bactérias do ácido lático e são transferidas para a massa do queijo pelo leite cru ou adicionadas na forma de cultura starter. As principais estirpes são: Lactococcus lactis, Streptococcus thermophilus, Lactobacillus helveticus e Lactobacillus delbrueckii. Esses microrganismos são responsáveis pelo desenvolvimento de ácidos durante a maturação do queijo, processo em que a cultura starter, juntamente com a flora secundária, promove uma série complexa de reações bioquímicas que desenvolvem o sabor e a textura.  Esta flora secundária é composta por misturas complexas de bactérias, leveduras e bolores.

As bactérias do ácido lático também produzem bacteriocinas, que são peptídeos ou proteínas antimicrobianos naturais, que junto das modificações físico-químicas levam à eliminação de bactérias indesejáveis no queijo. Além disso, a atuação de enzimas originadas do próprio leite e do agente coagulante tornam o ambiente adverso à sobrevivência de patógenos, fundamentais para a segurança microbiológica do queijo. Os principais microrganismos patogênicos encontrados no queijo são: Salmonella spp., Escherichia coli, Listeria monocytogenes e Staphylococcus aureus. Estes microrganismos são eliminados do leite por meio da pasteurização.

Porém, quando se utiliza leite cru para a produção de queijo a eliminação dos patógenos ocorre através da maturação. Durante a maturação, as principais alterações físico-químicas que controlam o crescimento de microrganismos em queijos ocorrem em função do conteúdo de água, da concentração de sal e do pH. A perda de água é natural durante a maturação do queijo, de modo que a redução da umidade acontece junto ao aumento da concentração do sal no queijo. Por sua vez, a acidez do queijo cresce em função da produção de ácido lático pelas bactérias láticas, diminuindo o pH. Estes fatores levam a uma diminuição na atividade da água, contribuindo para o controle microbiológico.

Ao longo da maturação, o controle da temperatura e da umidade relativa são de extrema importância para a redução da microbiota indesejável. Sabe-se que estes fatores são agentes condicionantes que tornam o desenvolvimento da flora desejável ou indesejável do queijo viável. Essas condições junto com o tempo de maturação são necesssárias para que cada tipo de queijo tenha sua característica. Esse controle torna o processo de maturação caro pois demanda, em geral, instalações especiais.  Devido a isso, muitos produtores acabam comercializando seus queijos antes do tempo adequado de maturação. Este fato representa um risco à saúde do consumidor.

A maturação de queijos é muito complexa, sendo influenciada tanto pela composição e qualidade do leite, como também pelas condições do processamento. É, portanto, um processo fundamental na fabricação de queijos de leite cru, capaz de melhorar sua qualidade microbiológica, mesmo quando existe a presença de patógenos. Este processo envolve mudanças físico-químicas, microbiológicas e bioquímicas que resultam no desenvolvimento das características finais do produto e garantem que o queijo seja um alimento com qualidade microbiológica adequada.

Referências:

BRENNAN, N. M. et al. Bacterial surface-ripened cheeses. In:Cheese: chemistry, physics and microbiology. Academic Press, 2004. p. 199-225.

BERESFORD, T. P. et al. Recent advances in cheese microbiology. International Dairy Journal, v. 11, p. 248–256, 2001.

2 min leituraOs microrganismos são um componente essencial de muitas variedades de queijo e desempenham um papel fundamental durante sua fabricação e maturação. A microbiota desejável é constituída pelas bactérias do ácido […]

2 min leitura
0

Maturação do queijo pode reduzir patógenos

2 min leitura

Consumir queijo fabricado a partir de leite cru parece assustador, não? Mas você sabia que a maturação do queijo (ou cura) pode contribuir para torná-lo um alimento seguro?

Foi esse o tema da pesquisa de doutorado realizada pela veterinária e professora Karina Ramirez Starikoff, com o título “A avaliação da inativação do Mycobacterium bovis durante a maturação de queijo parmesão contaminado artificialmente”.

O gênero Mycobacterium é composto por bactérias causadoras da tuberculose que podem acometer o homem e também os animais, como os bovinos. A tuberculose bovina ainda é uma doença presente nos rebanhos do Brasil. Considerada uma zoonose, quando o animal é diagnosticado positivo, deve ser sacrificado, pois a doença pode ser transmitida aos outros animais e pessoas que entrarem em contato com material contaminado, ou por exemplo, beber o leite cru contaminado ou derivados fabricados com esse leite.

A pesquisadora acompanhou a redução da carga bacteriana durante o processo de cura do queijo. A cura ou maturação é um processo que provoca alterações bioquímicas e desidratação do queijo. Este processo, quando devidamente respeitado, diminui o desenvolvimento bacteriano e contribui para tornar o alimento seguro para o consumo.

Doze litros de leite pasteurizado foram contaminados com M. bovis e adicionados de outros ingredientes, como coagulante e substâncias para sabor e ácido lático. Após a salga em salmoura, o queijo produzido, de mais ou menos 1 kg, foi reservado em ambiente com temperatura controlada a 18°C. A maturação foi acompanhada até 63 dias após a fabricação.

O laboratório foi adaptado para simular todas as etapas de fabricação do queijo, mas em escala menor. E também garantir a segurança na manipulação do micro-organismo patogênico. Os descartes dos resíduos dos testes também exigiram cuidados especiais: após a fabricação e análise todo material utilizado era devidamente esterilizado.

A conclusão do trabalho indicou que a duração do processo de maturação influencia o tamanho das populações sobreviventes de M. bovis e B. abortus, e que o encurtamento da duração do amadurecimento pode não garantir um declínio nos níveis de patógenos para níveis seguros.

Quer ter acesso ao trabalho completo? Clique nos artigos abaixo. 

Decline in Mycobacterium bovis and Brucella abortus populations during the maturation of experimentally contaminated parmesan-type cheese

Influence of milk fat in the resistance of Mycobacterium fortuitum to slow pasteurization

Tese e Dissertação estão disponíveis aqui

A autora da pesquisa, Karina Ramirez Starikoff, é Médica Veterinária e Professora da Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS. Mestre e Doutora pela Universidade de São Paulo – USP na área de Epidemiologia Experimental Aplicada às Zoonoses. Tem experiência na área de Inspeção de Produtos de Origem Animal e Microbiologia.

2 min leituraConsumir queijo fabricado a partir de leite cru parece assustador, não? Mas você sabia que a maturação do queijo (ou cura) pode contribuir para torná-lo um alimento seguro? Foi esse o […]

3 min leitura
1

Os desafios da cadeia do queijo Minas artesanal

3 min leitura

A produção de Queijo Minas Artesanal tem reconhecida importância cultural, social e econômica para o estado de Minas Gerais, a ponto de ter uma legislação conflitante com a legislação nacional, que não permite a fabricação de queijos a partir de leite cru. Apesar da pressão dos produtores para legalização da produção e a expansão das áreas que permitam a produção de queijo com leite cru, existem pontos críticos que estão longe de ser sanados.

A experiência de cadastramento e fiscalização de queijarias artesanais nas regiões historicamente reconhecidas – Serro, Canastra, Cerrado, Araxá e Campo das Vertentes, cada um com seu terroir característico – mediante treinamento em Boas Práticas de Fabricação, monitoramento do controle sanitário do rebanho, queijaria com adequações básicas, atingiu menos de 1% das unidades produtoras ao longo da última década. São 234 queijarias cadastradas (segundo o IMA) e estima-se 30.000 produtores (EMATER-MG) nas regiões citadas. Grande parte destes produtores demonstra que atendendo as premissas básicas cobradas no cadastramento e respeitando-se o prazo legal de maturação é possível garantir a segurança da produção artesanal e obter um queijo diferenciado de potencial valor agregado. Apesar do investimento na adequação das queijarias e da adoção de boas práticas, esses produtores continuam enfrentando a concorrência das queijarias clandestinas que a fiscalização, por deficiências de infra-estrutura e pessoal, não consegue coibir.

            Do outro lado da cadeia, a demanda por queijos artesanais frescos ou de baixa maturação (meia cura) ainda é maior que a demanda por queijos maturados. Boa parte dos consumidores, por costume e desconhecimento dos potenciais riscos à saúde, prefere o queijo branco, sem maturar. O grande público ainda não descobriu o flavor característico desenvolvido durante a maturação dos diferentes queijos artesanais. Os processos bioquímicos e a redução da atividade de água que ocorrem durante a maturação seriam a garantia de inocuidade do queijo. A observação de um prazo adequado de maturação pode inibir o desenvolvimento de microrganismos patogênicos, porém não elimina toxinas que possam ter sido produzidas, o que remete à importância dos procedimentos que evitam a contaminação inicial. A atual definição do tempo ideal de maturação dos diferentes queijos artesanais está baseada em poucos e esparsos estudos, e está na pauta de um grupo de trabalho liderado pelo Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA) e que reúne instituições de pesquisa do estado e federais para ampliar as bases científicas dos efeitos da maturação e regulamentar a atual lei estadual dos queijos artesanais (Lei n° 20.549). A expectativa dos produtores é que tempo de maturação possa ser reduzido, entretanto diante das condições de produção os pesquisadores não estão tão otimistas.

            O leite cru é sabidamente um excelente meio de cultura e potencial veículo de uma extensa lista de microrganismos patogênicos. O Brasil ainda carece de dados epidemiológicos que possam atribuir o impacto do consumo de produtos lácteos não pasteurizados na saúde pública. Muitos produtores de queijos artesanais apresentam queijarias precárias, deficiências em procedimentos básicos e higienização, ausência de cloração da água, manejo de ordenha e controle sanitário do rebanho insatisfatórios. Esse quadro associado à reduzida capacidade de fiscalização e ao consumo de queijo artesanal fresco ou meia cura configuram uma grande ameaça ao patrimônio que representa o queijo Minas artesanal. Um único surto atribuído aos queijos artesanais, além das consequências imediatas à saúde pública, pode representar um duro golpe ao trabalho de todas as instituições que apóiam o trabalho de produtores sérios que investiram e acreditam no desenvolvimento da cadeia do queijo Minas artesanal.

 Daniel Arantes Pereira
Professor/Pesquisador
Instituto de Laticínios Cândido Tostes
Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais – EPAMIG

3 min leituraA produção de Queijo Minas Artesanal tem reconhecida importância cultural, social e econômica para o estado de Minas Gerais, a ponto de ter uma legislação conflitante com a legislação nacional, […]

Compartilhar
Pular para a barra de ferramentas