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Validação e Verificação: o que você realmente precisa saber na prática do APPCC

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Nas indústrias de alimentos e rações, é muito comum a confusão entre os termos validação e verificação, especialmente no contexto da Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) e de suas medidas de controle — sejam elas PPR (Programas de Pré-Requisitos), PPRO (Programas de Pré-Requisitos Operacionais) ou PCC (Pontos Críticos de Controle).

Este artigo tem como objetivo diferenciar esses dois conceitos, frequentemente aplicados de forma incorreta, à luz das principais referências normativas internacionais: Codex Alimentarius CXC 1-1969 (versão 2023), ISO 22000:2018 e GMP+ FSA.

Partimos da premissa: o que é validação?

O Codex Alimentarius (CXC 1-1969, 2023) define validação de medidas de controle como:

“Obtenção de evidências de que uma medida de controle ou combinação de medidas de controle, se adequadamente implementada, é capaz de controlar o perigo para um resultado específico.”

Em outras palavras, a validação busca comprovar, com base em evidências concretas, que a medida de controle é eficaz para o fim proposto. Essas evidências podem ser obtidas de diversas fontes:

  • Artigos e publicações científicas;
  • Legislações e normas aplicáveis;
  • Dados de fabricantes de equipamentos;
  • Estudos e testes conduzidos internamente pela própria empresa.

Assim, validar significa demonstrar tecnicamente que uma medida de controle é adequada e capaz de eliminar ou reduzir um perigo a níveis aceitáveis.

Por outro lado, ainda segundo o Codex (2023), verificação é definida como:

“A aplicação de métodos, procedimentos, testes e outras avaliações, além do monitoramento, para determinar se uma medida de controle está operando conforme pretendido.”

Percebe-se que, neste caso, a medida de controle já foi validada. A verificação, portanto, tem como propósito confirmar se o sistema está funcionando conforme planejado, acompanhando e avaliando os resultados do monitoramento.

Já a ISO 22000:2018 reforça e aprofunda esses conceitos, sendo que para validação, a norma define:

“Obtenção de evidências de que as medidas de controle (ou combinação delas) são capazes de controlar eficazmente o perigo significativo à segurança dos alimentos.
Nota: A validação é realizada no momento em que uma combinação de medidas de controle é projetada ou sempre que houver alterações nas medidas implementadas.”

E complementa com uma diferenciação clara entre as três atividades principais:

  • Validação: aplicada antes da atividade, fornece informações sobre a capacidade de atingir o resultado pretendido.
  • Monitoramento: aplicado durante a atividade, fornece dados para ação em tempo real.
  • Verificação: aplicada após a atividade, fornece informações para confirmar a conformidade.

Para verificação, a ISO 22000 define:

“Comprovação, por meio de evidências objetivas, de que os requisitos especificados foram atendidos.”

Para o GMP+FSA, os termos são encontrados no documento S 9.4 – Suporte para aplicação do HACCP – que também diferencia claramente os dois conceitos, sendo a validação encontrada no item 3.12.1:

“Antes de implementar o Sistema APPCC, a empresa deve determinar se o sistema pode funcionar no ambiente operacional. As medidas de controle, incluindo programas de limpeza ou detectores de metais, devem ser avaliadas quanto à sua adequação para controlar os riscos. Isto é conhecido como validação.”

E a verificação está no item 3.12.2:

“Após a configuração do Sistema APPCC, a verificação de seus elementos deve ocorrer periodicamente (pelo menos uma vez ao ano).
A verificação utiliza informações adicionais para testar se o sistema continua eficaz e é utilizado conforme o planejado.”

Considerando os conceitos, vamos entender na prática como se dá a diferenciação: imagine um laticínio onde a etapa de pasteurização foi identificada como PCC após a condução de uma análise de perigos.
A empresa definiu que o leite deve ser pasteurizado à temperatura de 74°C por 18 segundos, com uma vazão de 25.000 L/h, para controlar perigos microbiológicos.

Nesse sentido, a validação do PCC foi realizada e para garantir que esses parâmetros sejam eficazes, a empresa pode recorrer a:

  • Publicações científicas;
  • Especificações do fabricante do pasteurizador;
  • Testes internos demonstrando redução ou ausência de microrganismos após o tratamento térmico, cumprindo os parâmetros elencados.

Após validar o processo, a empresa deve estabelecer um plano de monitoramento, como por exemplo: quem, quando e como os parâmetros serão controlados. Os dados coletados devem ser verificados periodicamente, seja por meio de análises críticas, auditorias internas, reclamações de clientes ou tendências de resultados, para confirmar se a medida de controle continua eficaz.

E qual a frequência e momento de aplicação de cada uma das etapas?

Um dos pontos-chaves na diferenciação prática é o momento e a frequência de aplicação:

• Validação: ocorre antes da implementação da medida de controle e deve ser revisitada sempre que houver mudanças significativas em produtos, processos, equipamentos ou informações técnicas que possam impactar o controle.

• Verificação: ocorre após a implementação, em intervalos regulares, para assegurar que a medida de controle validada mantém sua eficácia.

As normas internacionais Codex Alimentarius, ISO 22000 e GMP+ FSA são coerentes na definição e complementares quanto à distinção entre validação e verificação.

Em síntese, podemos concluir que:

Validação: garante que uma medida de controle é adequada e eficaz para controlar um perigo.

Verificação: confirma, ao longo do tempo, que essa medida continua funcionando conforme o esperado.

Compreender e aplicar corretamente esses conceitos é essencial para a robustez de qualquer sistema de segurança de alimentos ou de rações, agregando confiança aos processos e produtos entregues ao mercado.

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Norma da ABNT para APPCC: NBR 17183:2024 – Parte III: 7 princípios

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Nesta última postagem da série, vamos abordar os 7 princípios da metodologia proposta pela norma da ABNT para APPCC NBR 17183:2024.

A primeira postagem, sobre elementos introdutórios e etapas preparatórias da organização para implementar o APPCC, pode ser acessada aqui. A segunda, sobre as 5 etapas preliminares, está aqui.

Princípio 1 (Etapa 6) – Análise de perigos

É definida a necessidade de uma análise de perigos documentada, com base no fluxograma e outros dados técnicos levantados pela equipe. Essa etapa divide-se em três subetapas, sendo a primeira a “identificação dos perigos associados a cada passo do processo e das medidas de controle a estes perigos”. Para isso, a equipe deve considerar as etapas de processo do fluxograma, ingredientes e materiais de contato, para identificar os perigos biológicos, químicos e físicos que podem ser previstos ou aumentar até um nível inaceitável. Também deve ser estabelecido o nível aceitável para cada perigo.

A etapa seguinte, de “avaliação de perigos,” consiste em determinar se a eliminação, redução ou prevenção do perigo é essencial e se, portanto, este deve ser considerado no plano APPCC. A norma define que essa avaliação deve ser feita conforme o “risco, considerando a severidade de seus efeitos adversos para a saúde e a probabilidade de sua ocorrência. Similar à ISO 22000:2018, o termo “perigo significativo” é empregado na subetapa seguinte

Por fim, na “determinação das medidas de controle”, deve-se determinar as medidas de controle para prevenir, eliminar ou reduzir os perigos significativos. É prevista a possibilidade de uso de mais de uma medida de controle para o mesmo perigo, um perigo ser controlado por mais de uma medida de controle ou a necessidade de mudanças no processo. Devem ser apresentadas as justificativas de inclusão ou exclusão de um perigo potencial.

Princípio 2 (Etapa 7) – Determinação dos prontos críticos de controle

Para determinação dos PCC, a norma cita a possibilidade de uso de uma árvore decisória ou outra ferramenta equivalente. No Anexo C são disponibilizados 2 modelos de árvores decisórias.

Para registro das etapas 6 e 7 é disponibilizado um modelo de formulário no Anexo A.

Princípio 3 (Etapa 8) – Estabelecer os limites críticos e as tolerâncias para cada PCC

Para cada PCC, a equipe APPCC deve definir e documentar os parâmetros e justificativas dos limites críticos. É recomendado que sejam escolhidos limites que possam ser medidos de forma rápida e fácil e, no caso de serem baseados em dados subjetivos (ex. avaliação visual, análise sensorial etc.) deve haver instruções, especificações e capacitações documentadas.

Princípio 4 (Etapa 9) – Estabelecer um sistema de monitoramento para cada PCC

Para cada PCC, deve ser estabelecido, mantido e documentado um sistema de monitoramento pela equipe APPCC, de forma que qualquer desvio seja detectado a tempo de controlar os perigos. Devem ser considerados fatores como: adequação do sistema de monitoramento ao respectivo limite crítico; responsável com conhecimento, treinamento e autoridade para tomada de ações corretivas, que deve assinar ou endossar os registros gerados; frequência de monitoramento, com considerações sobre processos contínuos ou não; descrição no caso de monitoramento por medições ou observações. Assim como no Codex Alimentarius, são fornecidas orientações sobre análise de tendência para detectar desvios do limite crítico antes que estes ocorram.

No Anexo B é fornecido um exemplo de formulário para determinação do monitoramento de um PCC.

Princípio 5 (Etapa 10) – Estabelecimento de correções e/ou ações corretivas

A equipe APPCC deve estabelecer um procedimento documentado para as correções no caso de desvio de cada PCC e, caso necessário, para tomada de ações corretivas, com indicação de responsabilidades pela disposição do produto inseguro ou inadequado e registros. Outras orientações são dadas sobre registros das ações, práticas na tomada de ação corretiva, análise de eficácia e necessidade de retirada se necessário.

Princípio 6 (Etapa 11) – Estabelecer procedimentos de validação, verificação e revisão

Validação: as medidas de controle para os perigos significativos devem ser validadas antes de sua implementação e após mudanças. Se necessário, as medidas devem ser modificadas e reavaliadas. Deve ser mantida documentada a metodologia e evidências da validação. A sistemática indicada é similar à da ISO22000:2018. Também é mencionada a possibilidade de uso dos guias de validação do Codex Alimentarius.

Verificação: deve-se estabelecer um sistema de verificação que especifique os métodos, frequência, responsáveis e dados para todos os procedimentos de APPCC, incluindo registros de monitoramento e ações corretivas. São indicadas verificações que devem ser realizadas regularmente e a necessidade de manter registros dessas atividades.

Revisão do sistema APPCC: a alta direção deve assegurar a revisão do sistema APPCC, com base em um cronograma e entradas mínimas, com finalidade de avaliar sua eficácia e identificar melhorias. Não é indicada uma frequência mínima obrigatória, porém indica-se a necessidade de revisão completa no caso de falhas maiores nas atividades de verificação. Os resultados das revisões devem ser incorporados nos processos e devem ser mantidos registros das atividades de verificação.

Procedimento de verificação: verificação a ser realizada após a implementação do sistema APPCC, para garantir seu funcionamento efetivo, bem como revisões periódicas ou no caso de alterações. São indicadas metodologias e exemplos de verificações que devem ser realizados, bem como considerações sobre responsabilidades e frequência.

Princípio 7 (Etapa 12) – Estabelecer procedimento de conservação de registros e documentação

São determinados controles que a organização deve estabelecer e manter para controle da documentação, como acesso à informação, responsabilidades por modificação e aprovação, distribuição de cópias e controle de obsoletos; bem como de registros relacionados ao APPCC, como tempo de retenção de no mínimo a vida útil do produto e disponibilização para verificação por auditorias ou autoridades. São indicados os registros mínimos que devem ser mantidos.

Nessa série de postagens foi abordada a metodologia definida na norma da ABNT para APPCC NBR 17183:2024, sendo possível observar similaridades e diferenças entre as metodologias definidas no Codex Alimentarius e na ISO 22000:2018.

Imagem em destaque gerada por IA

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