Em sequência ao que já apresentamos aos nossos leitores na Parte 1 do post sobre o evento “Atualidades em Food Safety VII” promovido pelo INTERNATIONAL LIFE SCIENCES INSTITUTE BRASIL, no qual foram apresentados aspectos regulatórios e analíticos associados à RDC 14, na segunda parte do evento o tema foi abordado sob a visão da indústria tanto no que se refere aos cenários que abrangem os sistemas de gestão da segurança de alimentos e qualidade, quanto às limitações e desafios do setor visando conformidade aos padrões, frente à natureza, características e particularidades dos processos fabris.
Permeando desde os modelos de certificação reconhecidos pelo GFSI aos programas estabelecidos pelo FSMA, sob a ótica dos sistemas de gestão da segurança de alimentos e qualidade assegurada, a prevenção foi a trilha escolhida para a abordagem da importância do estabelecimento de um sólido programa de pré-requisitos e a definição de controles preventivos frente aos riscos e vulnerabilidades, integrados a estes sistemas, como premissa para minimização dos riscos físicos e matérias estranhas previstas pela RDC 14 e que permitirão analisar e gerenciar os perigos e conferir confiança ao processo.
Suportados pelos sistemas e programas de Gestão da Segurança de alimentos e qualidade assegurada, citados acima, o atendimento e conformidade com a RDC 14 também possui grande dependência de integração destes aos processos tecnológicos disponíveis e que possuem grande variância e impacto considerando-se desde as características da matéria-prima, ao tipo, composição e especificações do alimento fabricado até à complexidade da linha de produção. Conforme mencionado em nosso primeiro post, de maneira positiva há uma visão de que a vigência da norma trará mais dados para embasar o processo de melhoria dos textos e provisionar o suporte à indústria. Mas esta linha do tempo ainda é longa e o desafio é agora. De maneira geral, o recado foi dado e o tamanho deste desafio é grande: buscar o desenvolvimento de novas tecnologias junto ao setor amarrado a um robusto programa de Boas Práticas de Fabricação. Não devemos contar com a indisponibilidade de soluções e sim visualizar o processo de maneira sistêmica, buscando definir pontos de estrangulamento e integração a outras medidas de controle que possam minimizar o risco de presença de matérias estranhas. Lembrando que tudo isto associado a uma análise de riscos e vulnerabilidades.
O combate às limitações das tecnologias mais usuais no controle de materiais estranhos (como por exemplo, os detectores de metais e raio-x) frente às particularidades de materiais e processos de fabricação não é um cenário recente. Para maior complexidade do tema, a abordagem da RDC 14 com relação ao tamanho de partículas consideradas objetos rígidos – 2mm (objetos rígidos) e 7mm (objetos rígidos, pontiagudos e ou cortantes) – geram questionamentos tanto no que se refere a dificuldade de distinção/classificação entre os tipos de objetos, porém principalmente com relação ao limite de tolerância, uma vez que, instituições como o FDA, comprovadamente por estudos do Conselho de Avaliação de Perigos à Saúde, estabelecem definições mais claras com relação a este limite:
Objetos rígidos ou pontiagudos ?7 mm (medidos na dimensão máxima): são considerados perigo físico potencial em alimentos;
- Objetos rígidos ou pontiagudos <7 mm (medidos na maior dimensão): possível perigo físico nos alimentos, especialmente se o grupo de risco está entre os consumidores pretendidos do produto;
- Objetos muito grandes, rápidos e facilmente detectáveis pelo consumidor antes de consumir o alimento, normalmente não representam um perigo para a saúde;
- Utilização prevista, processos que eliminam o risco e orientação de uso são considerações importantes na determinação do risco de objetos estranhos rígidos ou pontiagudos nos alimentos.
Ou seja, pelo texto acima, o FDA indica que <7 mm a definição do limite ocorre frente ao risco. E no caso da RDC 14? Restringir todos os objetos rígidos à 2mm seria uma solução? Não, pois além da possibilidade da criação de restrições devido à natureza do processo de fabricação (afinal as legislações são positivas e não devem gerar desabastecimento), existem ainda limitações tecnológicas que, com uma abordagem bastante técnica e com foco nos dois principais métodos anteriormente citados, foram explanadas com enfoque técnico sobre fatores que influenciam a eficiência de detecção.
No que se refere aos detectores de metais, de maneira bem objetiva, a eficiência do equipamento para detecção da matéria estanha, ocorre em função de:
- Tipo de transporte do produto – o melhor desempenho se dá em produtos transportados a granel ou bombeados, ou ainda em embalagens pequenas;
- Abertura do equipamento – o desempenho dos detectores de metal depende do tamanho da abertura (orifício) através do qual o produto que passa;
- Posição do produto – campo eletromagnético é mais forte perto das paredes da abertura e mais fraco no centro da abertura, desta forma, matérias estranhas são mais facilmente detectáveis ao passarem perto das paredes;
- Posição do contaminante no produto – para contaminantes ferrosos, um pedaço de arame ferroso será mais facilmente detectável quando presente com sua maior dimensão no eixo horizontal. Já para um contaminante não ferroso, sua identificação será mais fácil quando presente com sua maior dimensão no eixo vertical.
- Tamanho do contaminante – o tamanho mínimo do contaminante a ser detectado depende da tecnologia a ser utilizada e do efeito do produto sobre o potencial de detecção (quanto maior o contaminante maior a probabilidade de detecção).
- Composição do produto e características do produto – em alimentos líquidos a sensibilidade é maior quando comparada aos alimentos sólidos. No caso de produtos cárneos o potencial de detecção é influenciado pela forma de apresentação (músculo ou emulsão) e pelo conteúdo de sangue e ferro, que afetam a sensibilidade do detector. O mesmo ocorre neste sentindo para a presença do sal em alimentos, que pode gerar falsos positivos devido à condutividade elétrica. Para produtos secos e condutores, a capacidade de detecção de metais (Ries, 2014) varia conforme a tabela abaixo:
- Variação de temperatura do alimento – a variação de temperatura em um alimento pode afetar o sinal (produtos quentes podem produzir sinais diferentes de produtos frios), acarretando possivelmente em erros de leitura.
- Tipo do material de embalagem – a composição do material de embalagem pode influenciar na emissão de sinais, acarretando em erros de leitura (ex: folha de alumínio),
Leia aqui um post mais detalhado sobre funcionamento de detectores de metal e limitações de funcionamento.
Já no caso de um equipamento de Raios-x, a eficiência de detecção de matérias estranhas ocorre em função de:
Densidade do contaminante (relativa a densidade da água) – quanto maior a densidade do material, mais escura é sua representação nas imagens de raios-x, logo mais facilmente é visualizado.
- Densidade do alimento – sistemas de raios –x, de maneira geral, podem detectar quaisquer contaminantes cuja densidade (relativamente comparada a densidade da água) seja essencialmente diferente do alimento a ser verificado.
A tabela abaixo demostra a capacidade de detecção de acordo com a densidade (Ries, 2014), na qual se considera que a tecnologia de raios-x não seria capaz de detectar todos os tipos de contaminantes:
Ainda, considerando os dados acima e se comparando ambas as tecnologias, cujas limitações e impactos sobre o potencial (alto, médio, baixo e nulo) de detecção de matérias estranhas foram apresentados e discutidos, temos:
Desta forma, como síntese da visão e desafios da indústria, abordados neste evento, visando o atendimento aos requisitos da RDC 14, temos:
* Implementação de sólidos programas de pré-requisitos com foco nas boas práticas de fabricação visando a qualidade e segurança dos alimentos;
* Busca de tecnologias de detecção de matérias estranhas junto aos fabricantes e ao setor e validação dos processos de maneira coerente à tecnologia empregada;
* Conhecer efeitos adversos dos materiais e possíveis limitações sobre a tecnologia;
* Aplicação integrada de técnicas de controle relacionadas à presença de matéria estranhas;
* Busca de conhecimento para o melhor controle de matérias estranhas em alimentos.
Acima, algumas indicações das Referências Consultadas e abordadas ao longo da apresentação: