Pode parecer sem sentido, mas um rótulo com a mensagem: “Alérgicos: sua abobrinha orgânica pode conter leite” pode ser necessário quando se fala em cultura orgânica. Considerada por muitos uma opção mais “natural” e saudável, para os alérgicos, pode trazer perigos.
A agricultura orgânica, para ser definida como tal, não utiliza agrotóxicos e adubos convencionais, sendo lançadas fórmulas alternativas compatíveis com a filosofia orgânica.
Estas alternativas são devidamente regulamentadas na Instrução Normativa Nº 007, DE 17 DE MAIO DE 1999, de onde destaco somente os ingredientes autorizados que são preocupação para os alérgicos:
“3. Meios de captura, meios de proteção e outras medidas biológicas:
Leite e derivados; e Extratos de produtos de origem animal;
Anexo II Adubos e condicionadores de solos permitidos.
Peixes e derivados;
Anexo III Meios contra pragas.
Como emulsionante: lecitina de soja não transgênica.”
Ninguém menos que a Embrapa, referência sobre práticas agropecuárias, publicou o guia “Leite de Vaca Cru para o Controle de Oídio”. O oídio é uma doença causada por fungo e é preocupante em dezenas de culturas como abobrinha, pimentão, tomate, feijão, soja, manga, abacate, caju e trigo. O leite deve ser misturado à água em concentrações que vão de 5% a 10%, dependendo da intensidade da doença, e pulverizada sobre a planta semanalmente desde o início do surgimento do fungo na plantação. A título de esclarecimento, leite fresco pode ter efeito direto contra o fungo, devido às suas propriedades germicidas; por conter diversos sais e aminoácidos, e por induzir a resistência das plantas ou controlar diretamente o patógeno; pode ainda estimular o controle biológico natural, formando um filme microbiano na superfície da folha ou alterar as características físicas e químicas.
Outra agência de pesquisa, a carioca Pesagro, prescreve para os pequenos produtores uma receita de baixo custo de um fertilizante fermentado caseiro que leva derivados de peixe e torta de soja.
Face a esta realidade, me pergunto:
Há alguma possibilidade destes insumos deixarem traços nos alimentos?
Estudos já foram conduzidos neste sentido? Por exemplo, qual é o impacto quando usadas no solo ou pulverizada diretamente no vegetal?
A cadeia primária está conscientizada a buscar alternativas não alergênicas para seus insumos?
A cadeia produtiva primária está preparada e conscientizada para comunicar o uso de tais alergênicos para os elos posteriores caso não haja alternativas?
Os consumidores, o varejo e a indústria estão atentos a este “detalhe” já que a RDC 26/15 vem a requisitar para uma rotulagem eficaz?
Bem, a RDC 26/15 não é aplicável para alimentos comercializados sem embalagem! Assim, o risco existe, mas não há obrigatoriedade de transmissão desta informação se estivermos falando de um vegetal comercializado numa feira ou mercado. A obrigatoriedade se aplica somente se o produtor de abobrinha for fornecedor de uma indústria e esta produzir um alimento embalado, como uma conserva, por exemplo.
Como já relatou nossa colega Cecília Cury, mães enlouquecem fazendo o levantamento da possível causa de alergia de seus filhos, fazendo testes, incluindo e excluindo diversos alimentos, tendo dificuldades para interpretar reações inesperadas e inconsistentes à frutas, legumes e verduras. Como imaginar que uma abobrinha poderia levar a uma resposta alérgica?
Faço minhas as palavras dela: uma abobrinha pode ser somente o laranja da história.
Daisy
Muito bom! Alerta importantíssimo!
ester cândido
Nao foi citado no texto mas as Caldas para controle de pragas são muito usadas na agricultura orgânica.
Podem ter TRIGO.Principalmente nas folhas!
Geralmente pessoas celíacas comem saladas cruas em restaurante, para evitar riscos de contaminação cruzada nos alimentos cozidos. E passa mal sem saber que o vilão pode estar na salada.Infelizmente não há estudos e testes para se comprovar a hipotese.
Marcelo Garcia
Ester, muito interessante sua contribuição. E segue nossa dúvida: até que ponto estes alergênicos permanecem no vegetal até chegar ao garfo?
Satiana Moreira
Trabalho em uma empresa que exporta produtos de açaí orgânico, inclusive temos nossa certificação orgânica, auditada pelo IBD. Será que eles fazem algum tipo de controle de pragas, ou contra o barbeiro, ou contra oura praga, que possa vir a utilizar essa calda? Vale lembrar que as associações que nos fornecem o fruto, precisam nos apresentar um plano de manejo obrigatório, mas lá não tem nada sobre isso. Agora fiquei na dúvida…
Marcelo Garcia
Na dúvida, é melhor perguntar. Juliane.
Jane
Boa tarde!
Muito interessante a matéria.
Também gostaria de saber se realmente ficam traços nos frutos dos alimentos tratados com o leite.
Temos um sítio agroecológico onde produzimos orgânicos e realmente o soro de leite (1 parte parte de leite diluido em 20 partes de agua)é indicado para pulverização em solanáceas(tomates, berinjelas, abobrinhas…. Porém o uso é indicado somente para tratamento do oídio, quando a doença existe e a aplicação é feita nas folhas, nunca nas flores ou frutos. Como temos plantio consorciado com outras espécies e rotação de culturas, quase não temos problemas com pragas e doenças nas plantas. Mesmo porque plantas são como o ser humano, quando está sadio e com a imunidade forte, quase não fica doente.
Não usamos trigo e soja por serem transgênicos. Quem leva a agroecologia a sério se preocupa com esses detalhes.
Portanto, nem todos os orgânicos são iguais.
É preciso conversar com os produtores e verificar quais são seus hábitos e como cuidam de seus canteiros.
E ainda assim, é preciso lembrar que o agrotóxico presente nos alimentos é infinitamente mais perigoso para a saúde de um modo geral.
Um abraço
Silmara Moretti
Primeiramente obrigada por sua conteibuição.
Tenho um bebe alérgico a proteina do leite e estou bem preocupada. Se não pudermos comer nem os vegetais o que comer?