O consumidor não deve imaginar a rotina de um médico veterinário inspetor sanitário. Diariamente são detectadas lesões de carcaças e vísceras que justificam a condenação total ou parcial do produto. Isso visa gerar um produto inócuo, garantindo a segurança dos alimentos. Essas lesões supracitadas podem ser causadas por afecções microbiológicas (colibacilose, salpingite, etc) ou também por tecnopatias (escaldagem excessiva, má sangria, etc).
Certa vez em meu trabalho, a equipe da Inspeção Federal detectou um fígado tamanho gigante, chamado HEPATOMEGALIA. Em todo meu tempo de serviço nunca havia presenciado essa anomalia tão exacerbada. Ao realizarmos uma necropsia mais detalhada, descobrimos que a causa da patologia era devido uma agenesia vesical total, isto é, ausência da formação da vesícula biliar.
A vesícula biliar é uma estrutura responsável por estocar bile, que por sua vez é responsável pela emulsificação de lipídeos. Devido à dieta extremamente calórica, com elevado teor de ácidos graxos na ração, esta ave passou a exigir maior atividade do fígado, resultando na hipertrofia do órgão. Abaixo é possível visualizar o fígado com a patologia.
Figura 1 – HEPATOMEGALIA EM FRANGO.
Fonte: Arquivo Pessoal.
Observe que o fígado atingiu dimensões semelhantes ao da carcaça, algo muito raro de se ver. Também podemos identificar uma pigmentação amarelada multifocal no parênquima hepático, provavelmente uma infiltração gordurosa.
Embora a Portaria nº 210/98 do MAPA não traga especificamente qual o destino do produto para casos de hepatomegalia, o RIISPOA na Seção V Art. 242 diz: “Fica a critério da Inspeção Federal resolver sobre os casos não previstos para a inspeção post-mortem, levando-se ao conhecimento da autoridade superior”. Como o julgamento é visual e não laboratorial, poderíamos nesse caso condenar as vísceras e liberar a carcaça para consumo, uma vez que a mesma não apresentou alterações organolépticas como cor, odor e tamanho. As vísceras estariam condenadas não pelo fato de apresentarem risco microbiológico ao consumidor, mas por estarem sensorialmente inapropriadas.
O médico veterinário inspetor no uso de sua atribuição legal e formação, aplica seus conhecimentos para garantir um alimento seguro à população, identificando e corrigindo qualquer não conformidade pertinente às suas funções.
- RIISPOA (Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal).
- MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).
Créditos de imagem: DF Rural.