Desde a publicação da CVS 18/2008 (Estado de São Paulo) ficou sendo opcional o atendimento daquela lista de exames médicos obrigatórios da CVS 06/99 (hemograma, coproparasitológico, coprocultura, sífilis), passando a ser critério do médico selecionar quais exames são pertinentes para o exercício da função.
O que eu não conhecia era este relatório técnico da Organização Mundial da Saúde elaborado por um grupo de peritos que em 1989 (atenção para a data!) concluiu como desnecessária e ineficaz a realização de exames médicos admissionais e periódicos com a intenção de se prevenir DTA (doenças transmitidas por alimentos). O documento só valoriza as análises para inquéritos epidemiológicos.
Os contundentes argumentos foram:
– Nos casos em que se confirmou que o manipulador foi a causa raiz de um surto, ele estava em fase aguda da doença (e 48 horas depois) e portanto, trabalhando com os sintomas característicos da enfermidade. A literatura não associou casos inaparentes a surtos.
– Um único resultado negativo para Salmonella na coprocultura não é confiável, uma vez que a excreção do patógeno pode ser intermitente e um número maior de amostras deveria ser colhida para um diagnóstico seguro.
– A amostragem pode falhar: no mesmo “lote” de fezes algumas partes podem estar contaminadas e outras, não.
– Não há evidência que HIVou Sífilis (VDRL), possam ser transmitidas por alimentos
– A pesquisa de cistos parasitários é menos importante que ações de educação das pessoas em higiene pessoal
– Solicitar raio X para pesquisa de tuberculose ou swab de garganta para pesquisa de S. aureus em pessoas que não apresentam infecções não tem nenhuma eficácia para prevenir DTA.
– Curioso: foram citados casos em que as pessoas enviaram amostras de amigos ou parentes ou por dificuldades “técnicas” ou por ter certeza da condição de saúde dos mesmos e portanto ter mais chance de “passar no exame de fezes”.
Contudo, para as situações acima descritas, a Salmonella tifóide é a que sempre aparece como exceção, e portanto, deve ser considerada.
Na conclusão, o grupo recomenda que os recursos gastos com análises laboratoriais deveria ser destinado a ações preventivas e educativas para os manipuladores, ao invés de se tentar identificar portadores.
Eu fiquei surpresa com o relatório, principalmente pela data versus as práticas que conhecemos atualmente e legislações geradas após este período.
Qual é a experiência de vocês, leitores?
Para saber quais são as recomendações consideradas eficazes para prevenir surtos, não deixe de ler o post: Medidas de controle eficazes para prevenir surtos
Referência: Exames de Saúde e procedimentos gerenciais para manipuladores de alimentos
(Tradução livre): http://whqlibdoc.who.int/trs/WHO_TRS_785.pdf
Ingrid T. Akamine
Boa tarde.
Mas, qual é esse relatório da WHO?
Grata,
Ingrid T. Akamine
Marcelo Garcia
Oi Ingrid, o relatório é esse mesmo que consta no fim do post http://whqlibdoc.who.int/trs/WHO_TRS_785.pdf
FABRICIO HEITOR MARTELLI
Olá Juliane, boa tarde
O Brasil tem grandes problemas com alimentação e boas práticas na alimentação. Observamos que faltam no mercado cursos e capacitações adequadas aos funcionários para a área de alimentação, bem como a aplicação do conceito de educação sanitária à população geral do Brasil, que acabam comprando e se alimentando com produtos fora dos padrões de qualidade.
A realização de exames médicos complementares é de grande interesse sanitário, pois a falta de costumes básicos de educação sanitária traz a tona uma gama de funcionários doentes no ambiente de trabalho. Com a falta de mão de obra especializada o empresário contrata todo o tipo de pessoal para ocupar a vaga de seu restaurante ou estabelecimento de alimento. Muitas clínicas de medicina de trabalho realizam apenas um exame básico como a medição da pressão arterial e carimbam um “apto para função” no ASO. Como pode apenas esta “entrevista” atestar a saúde de um funcionário para alimentos?? Absurda esta observação levantada. No brasil faz-se necessária a pesquisa de parasitas, realização de hemograma completo e, talvez, até VDRL-sífilis. Claro que levantamos conceitos morais, no entanto, caso tivesse uma empresa de alimentos indicaria no PCMSO a realização destes exames ao menos anuais. Aqui na cidade em que trabalho encontramos, ao menos, em 30 % dos manipuladores a presença de parasitas e 1% de sífilis. Com a falta de boas práticas, alimentos fora dos padrões de qualidade vão ao prato do brasileiro. Alimentos que são expostos fora de temperatura, como uma maionese (maionese, batata e cenoura) pode levar à morte centenas de pessoas, uma vez que ela se torna um meio de cultura viável para a manifestação de parasitas que podem ser encontrados nas mãos de um manipulador sem boas práticas.
Concordo com a realização de campanhas de educação sanitária, mas atualmente o que é mais viável e colocado em prática é a realização destes exames. Pelo menos o médico do trabalho consegue traçar o melhor caminho para o monitoramento de certas doenças em funcionários da área de alimentos. Gostei muito deste post, creio que seja um dos únicos encontrados na web brasileira sobre esta temática.
Um abraço
Marcelo Garcia
Fabricio,
Obrigada por compartilhar sua vivência, em especial os dados empíricos de sua cidade, que são um bom termômetro de nossa situação. O estudo traz um contraponto com a visão atual que os exames resolvem muitos problemas, quando na verdade há limitações tanto na educação quanto na capacidade das análises laboratoriais de reduzir os riscos. Integrar as medidas e aplicá-las no momento certo talvez seja o maior desafio.
Um abraço,
Juliane
Baltasar V. Delazeri
Bom dia,
Concordo com o Fabricio quando questiona a aptidão de um trabalhador da alimentação somente com exame básico. No entanto, procurei sobre contaminação de aliementos por pessoas contaminadas por Sífilis, não encontrei, e nem é relatado como bactéria contaminante de alimentos. Sua importância está na saúde pública, não ocupacional. Em empresas do ramo alimentício são obrigadas a fornecer EPIs. Destaco o uso de luvas, se utilizadas adequadamente diminuem o risco de contaminação. Vale lembrar a importância de Procedimentos Operacionais de Higienização e Treinamentos constantes. Em suma, se a empresa obriga e fiscaliza o uso adequado de EPIs, fornece condições de trabalho que estejam de acordo com a ANVISA, treina seus colaboradores para procederem corretamente, com certeza o risco de contaminação é infinitamente menor.
Abraço.
Urzsula
Bom dia!
A SMS da cidade onde trabalho nos solicitou os seguintes exames para os manipuladores: Mantoux, hepatite, bacteriológico de secreção nasofaríngea e bacteriológico sublingual, mas conversando com outros que trabalham no mesmo ramo, inclusive com os responsáveis pelo PCMSO, nunca esses exames foram solicitados a empresas que trabalham com alimentos, uma vez que o custo destes é considerável para um grande número de manipuladores. Pelas pesquisas que tenho feito, não encontrei algo específico que exigisse os mesmos, se alguém conseguir contribuir, agradeço!
Thomaz Gimenez Junior
Olá Urzsula, sou Fiscal Sanitário no Município de Leme/SP e realmente esses exames nunca fomos orientados a solicitar e não vemos base legal para tal, porém temos que considerar que os estados e municípios podem legislar sobre esses assuntos, desta forma podemos considerar que seu estado ou município tenham legislações que exijam tais exames.
Georgia Lasse
Olá Juliane, acabei de falar com o Dr Eneo, sobre este relatório, fui pesquisar para saber mais e encontrei exatamente o que precisava aqui no blog!! Muito grata por este trabalho, que facilita nossa vida!! rssrs Eu só não consegui encontrar o post Medidas de controle eficazes para prevenir surtos!! como consigo acessa-lo!!!
Mais uma vez muto obrigada!!!
Marcelo Garcia
Georgia, que bom ter seu retorno. Pois é, precisamos escrever este post! Mas de forma isolada, publicamos muito conteúdo. Faça buscas com palavras como surtos, e principalmente cuidados, prevenção…. Juliane