No dia 28 de novembro, o Belmond Copacabana Palace organizou o I Workshop de Segurança de Alimentos na Hotelaria, onde profissionais do setor discutiram suas experiências, sucessos e dificuldades na implantação de sistemas de Gestão de Segurança de Alimentos. A trajetória e os diferentes estágios em que os hotéis representados estão nesta caminhada foram o ponto alto do evento.
Neste post, traremos um pequeno resumo das palestras do dia, que abordaram da implantação das Boas Práticas, passando pelo HACCP, até a certificação em ISO 22000.
SEGURANÇA DE ALIMENTOS NA HOTELARIA – PROF. DR. EDUARDO TONDO
O evento foi aberto com uma palestra que falou sobre a importância da Segurança dos Alimentos e ferramentas disponíveis para seu alcance, proferida pelo Prof. Dr. Eduardo Tondo, figura já carimbada aqui no Food Safety Brazil.
Sua fala iniciou apontando que a área de Alimentos e Bebidas sempre fora vista como o “patinho feio” da hotelaria, como sendo a área que gerava custos e não trazia resultados para a empresa – o que dificultava qualquer movimento de Qualidade neste setor. Tudo mudou com o advento da Gastronomia nos hotéis, com preparações mais complexas e a atração de um público mais exigente: estava se abrindo a porta para uma consciência maior relacionada à Segurança de Alimentos.
Vários casos de surtos alimentares ocorridos em restaurantes de alta gastronomia foram citados, o que desmistifica o mito de que a Segurança de Alimentos é privilégio de empresas com alto faturamento (os leitores do blog já viram aqui minhas dicas para comer na rua e ser feliz):
- Noma, na Dinamarca, considerado o melhor restaurante do mundo em 4 edições da revista Restaurant, teve surto por norovírus em 2013 que envolveu 63 pessoas;
- Mandarim Oriental, na Inglaterra, sétimo melhor restaurante do mundo à época, também norovírus, surto com 45 pessoas em 2014 que levou ao fechamento do restaurante (um caso interessante de reincidência de fechamento de restaurante do mesmo chef);
- Kita Kamakura Saryo Gentoan, no Japão, surto com 14 pessoas em 2016 levou ao fechamento do restaurante;
- Geranium, na Dinamarca, restaurante com 3 estrelas Michelin, multado por más práticas de produção de alimentos em 2016
O professor Tondo colocou então os principias desafios enfrentados na Segurança de Alimentos da Hotelaria:
- Unir a Nutrição com a Gastronomia: fazer com que ambas as equipes sejam a mesma, e tenham o mesmo objetivo. Aqui, a troca de experiências é fundamental, pois os membros da equipe não têm tempo de reinventar a roda – precisam confiar na experiência do outro, e aprender com o time;
- Unir a Cozinha com a arte: falando sobre itens específicos, comendo carne de caça, qual a sua proveniência? E ovo de gema mole, pode?
- Ter serviços exemplares: com capacitação, discrição e gentileza.
Ainda fez um alerta importante: enquanto os gestores de restaurantes pensarem que Boas Práticas são um objetivo a ser alcançado, nunca conseguirão certificar uma norma de Gestão da Qualidade. Boas Práticas são o mínimo do mínimo e – como os leitores do blog sabem – são o maior empecilho para a implantação do HACCP. “Boas Práticas devem ser sólidas”, ressalva o professor Tondo, “mas não infalíveis. Se esperar isso, nunca se vai adiante”.
Falando em hotéis e Rio de Janeiro, impossível não mencionar o efeito Copa do Mundo. Foi elogiada a postura da Coordenação da Vigilância Sanitária da cidade, importante para disseminar a categorização dos serviços de alimentos, realizada através da RDC 10/14. O programa de categorização de restaurantes teve resultados controversos pelo país, como aponta este post.
Uma importante contribuição para a avaliação das BPF – e que pode interessar os leitores – é a priorização que esta RDC trouxe. Você já se perguntou por que todas as regras de boas práticas têm o mesmo peso? Pois o grupo que auxiliou a Anvisa a publicar a RDC 10/14 (do qual fez parte o Professor Tondo), fez uma avaliação de risco a respeito destas regras. Segundo Tondo, a ordem de priorização (ligeiramente diferente do que foi publicado) é:
- Potabilidade de água;
- Higienização de equipamentos e utensílios;
- Controle de tempo e temperatura;
- Saúde e higiene dos funcionários;
- Controle de matéria-prima;
- Demais itens da RDC 216/04.
Segundo o professor, esta categorização significou que as VISAs deixaram de focar na estrutura física dos restaurantes, para focar no processo (com o que eu concordo plenamente: de nada adianta paredes intactas se a água abastecendo a produção é imprópria para o consumo, por exemplo).
Por fim, deixou alguns recados para a plateia:
- Os novos desafios deste setor são: a implementação da ISO 22000 e o uso de base científica para tomada de decisão;
- Que os gestores sejam chatos, visitem seus fornecedores, que façam auditorias rápidas, profissionais, com relatórios emitidos o mais rapidamente possível.
IMPLANTAÇÃO DAS BOAS PRÁTICAS E GERENCIAMENTO DE SISTEMAS DE SEGURANÇA DE ALIMENTOS – EQUIPE DO BELMOND COPACABANA PALACE
O evento deu sequência com a equipe de Segurança de Alimentos anfitriã falando sobre a sua vivência. O Belmond Copacabana Palace pretende ser o melhor hotel para se hospedar e também para se trabalhar, o que ajudar a reduzir o turnover e facilita a implantação do Sistema de Gestão de Segurança de Alimentos.
Neste aspecto, Maria Carolina Minardi Guimarães, Gerente de Food Safety do Hotel, afirma que o comprometimento da Alta Direção e o refeitório dos colaboradores representam contribuições significativas, pois reforçam constantemente a mensagem de que Food Safety é a chave para o negócio. Hoje, cerca de 40% do resultado do hotel vem da área de A&B.
Sobre as sacadas da equipe no gerenciamento das boas práticas, saliento:
- A avaliação e tratamento dos registros, continuamente;
- O controle integrado de pragas, realizado de forma preventiva e com olhar especial da equipe pela alta população de Copacabana nos meses de verão;
- O manual de bolso para os stewards, com detalhes sobre utensílios e produtos para higienização, assim como os procedimentos de higienização para todos os equipamentos.
Você já viu uma matéria sobre como o Belmond Copacabana Palace faz Gestão de Segurança de Alimentos aqui. O hotel tem meta de implementar a ISO 22000 até dezembro de 2017.
IMPLANTAÇÃO E CERTIFICAÇÃO DE HACCP EM HOTÉIS – ANNA CAROLINA MAIA (OTHON HOTÉIS)
Anna Carolina falou sobre a trajetória da rede Othon para implementar o HACCP (certificado) desde 2010 – realizado por fases, após implementação sólida das Boas Práticas de Serviços de Alimentação. Parafraseando Frank Yannas, segurança de alimentos é atitude: se a pessoa na operação não quiser, a gestão não alcança nenhum lugar.
Ela salientou que, dentro da rotina corrida dos restaurantes, há que ser ter tempo para treinamento e capacitação. E que estes treinamentos devem ser bem planejados, pois os funcionários ficam entendiados – o que compromete a absorção e aplicação da informação.
IMPLANTAÇÃO E CERTIFICAÇÃO DE ISO 22000 EM UM HOTEL – FLÁVIA SCHIMIDT AIDAR (HOTEL UNIQUE)
Fechando o evento, tivemos a fala da gestora responsável pela certificação em ISO 22000 do Hotel Unique em São Paulo. Flávia nos brindou com uma palestra inspiradora, na qual compartilhou seus erros, acertos e aprendizados ao longo desta trajetória.
Flávia conta que tudo começou com a Diretoria do hotel entendendo que, se há dúvidas sobre segurança de alimentos, eles querem ter certeza. O Hotel Unique se colocou na posição de ter a segurança de alimentos como seu ponto forte, o que foi imprescindível para o sucesso da gestão.
Que, contudo, teve seus percalços, por exemplo, quando foi fazer o curso de ISO 22000 na certificadora e o ministrante era do ramo automobilístico(!). Isso também afetou o processo inicial de certificação, pois a consultoria contratada para auxiliar o hotel não tinha experiência com a complexidade de uma operação de serviço de alimentação.
Segundo ela, os principais desafios enfrentados foram:
- A dificuldade de se comparar com a indústria, devido ao número de preparos e variabilidade de produtos servidos;
- O pioneiro, que impediu que usassem outro restaurante como benchmark;
- O número de itens – mais de 3000 – para realizar análises de perigos.
Já os facilitadores:
- O envolvimento da Alta Direção;
- O envolvimento do chef de cozinha – que é figura emblemática, com peso além de seu cargo;
- O envolvimento da equipe, com realização de gincanas entre as equipes, o que favoreceu um clima de harmonia e descontração para o processo (até hoje, os colegas pedem novas gincanas).
Como o hotel já é certificado desde 2013, Flávia também falou sobre a diferença entre o período de certificação e o de manutenção de um sistema de gestão de segurança de alimentos (com o que os leitores devem se identificar):
Certificação | Manutenção |
Novidade | Turnover |
Equipe motivada | Reiniciar treinamentos (o que ela compara com o presente do Papai Noel – antes, gera a maior expectativa, depois de ganhar a criança não quer mais brincar) |
Empenho maior nas mudanças | Acomodação e demora em algumas mudanças |
Flávia terminou a palestra falando sobre um entendimento que vale para o aprendizado do Workshop como um todo: Em um restaurante, os cozinheiros são os motoristas e a equipe de segurança de alimentos é o GPS: um precisa do outro para atingir o objetivo.
Flavia
Adorei!!!! :):):):)
Cristina L
Oi, Flávia, nós que adoramos a sua presença por aqui!
Patricia Iglezias
Muito bom!! Dou aula da disciplina de Higiêne e Legislação de Alimentos em um curso de Nutrição e precisamos muito destas atualizações e troca de experiências profissionais! Parabéns pelo post.
Cristina L
Obrigada, Patrícia, e quem sabe você possa contribuir com os demais colegas, relatando a sua experiência também?
Simone Alves
Onde posso encontrar dados sobre certificações nessa área, número de hotéis no Brasil certificados, etc?
Marcelo Garcia
Olá Simone,
Neste post em o caminho: http://foodsafetybrazil.org/como-saber-se-uma-empresa-e-certificada-em-seguranca-de-alimentos/
Abraço, Juliane
Francini
Oi Cristina!
Muito bom o post! Tem programação para um segundo workshop? Se sim! Poderia informar quando?!
Grata