O uso dos serviços de uma consultoria na implantação de um sistema de gestão em segurança dos alimentos pode catalisar o processo dando-lhe velocidade, justamente porque consultores devem ter a experiência de já terem implantando outros sistemas de gestão. Assim, eles já aprenderam com acertos e erros o que dá certo e o que dá errado, e espera-se que saibam como evitar redundâncias, saibam como economizar tempo, e como tal, uma boa consultoria tende a dar retorno sobre o investimento (ROI).
Mas como escolher características de uma boa consultoria?
Primeiramente, uma boa consultoria em Food Safety não trará “pacotes prontos”, uma vez que cada empresa tem seu próprio contexto. Podemos fazer uma analogia:
“Uma boa consultoria é como um bom alfaiate, toma suas medidas, entende suas necessidades e costura a roupa que lhe ficará mais confortável, esteticamente adequada, enfim, sob medida.
Já o mau alfaiate é aquele que faz para você uma roupa baseada no molde padrão que usou nos últimos clientes, e que no final, não o vestirá bem, gerará incômodo e deselegância, ou sobrará pano, ou ficará apertada.”
Algumas consultorias podem trazer soluções que só agreguem burocracia e não valor ou segurança dos processos. Estas trabalham com “pacotes prontos” ao estilo “control C control V” adaptando empresas a seus procedimentos, e não ajustando procedimentos para serem os mais adequados para as empresas em termos de gerarem o mínimo de burocracia com o máximo de resultados. No final, existe um grande risco de ter-se construído elefantes brancos, com procedimentos pouco práticos, que exigem rotinas inadequadas ou que deixam de considerar aquelas que são relevantes a um determinado negócio.
Um sistema de gestão em segurança dos alimentos não é um amontoado de documentos, de papéis, mas uma forma de a empresa trabalhar seus processos em prol de obter alimentos seguros, e isso envolve um aculturamento que vai do chão de fábrica até as cadeiras mais altas que tomam as últimas decisões.
Por tudo isso, um bom mapeamento de processos é fundamental para uma personalização, na qual cada empresa é única, portanto, requererá um sistema de gestão adequado à sua medida, pois cada uma tem seus próprios riscos que devem ser controlados, assim como sua própria forma metodológica e técnica de controlar tais perigos ou mantê-los em níveis aceitáveis, o que variará de acordo com as tecnologias adotadas, os processos existentes, os fornecedores que utiliza, o grau de instrução e competência dos times internos, a concepção da planta industrial, etc.
Mesmo empresas de um mesmo segmento, que produzem itens semelhantes, são diferentes, uma vez que possuem diferentes culturas organizacionais e formas de trabalho. A identidade corporativa é única em cada empresa, e tudo isto implicará na forma como um sistema de gestão em segurança dos alimentos deverá ser desenhado e construído.
Outro erro comum que pode ocorrer é as consultorias venderem pacotes “all incluse”, levando além dos procedimentos semi-prontos, consultores juniores para fazerem “toda documentação do sistema de gestão” sem usar uma equipe interna multidisciplinar da própria empresa.
Isso é fatal e normalmente se obtém como resultado sistemas frágeis, ou com pouco engajamento das equipes da própria empresa, ou a empresa no pós-auditoria não terá a menor ideia de como conduzir o que foi montado, pois não adquiriu o know how necessário que só se obtém participando efetivamente da construção do sistema de gestão em food safety. Cuidado também com consultorias que focam muito mais a documentação que a construção de rotinas de processos seguros.
O melhor legado que uma boa consultoria pode deixar para uma empresa é a formação e qualificação de uma equipe multidisciplinar competente, capaz de tratar temas como GMP, MIP e HACCP, além de gestão de crises, e claro, o mapeamento, controle e validação de processos pela perspectiva da produção de alimentos efetivamente seguros.
Já ouvi de colegas que “implantar sistemas de gestão em segurança de alimentos é fácil, o difícil é mantê-los”, e afirmo, isso é uma bobagem.
Esta fala só existe em empresas que nunca implantaram de verdade seus sistemas de gestão em segurança dos alimentos, uma vez que parte da implantação é justamente capacitar pessoas para sua condução. Portanto, isso só ocorre se a empresa “comprou um pacotão pronto”, frágil, e que tende a durar pouco, e a empresa invariavelmente voltará a operar sua rotina como as pessoas faziam antes, ou seja, sem uso do potencial do sistema de gestão e com falhas que podem permitir a presença de contaminantes nos produtos que processa. Mas se a empresa passou por uma efetiva transformação preparando seus processos e times internos, a manutenção do sistema de gestão tende a ser muito suave, pois os processos estarão bem sedimentados e as rotinas que o sustentam já farão parte do trabalho diário.
Uma boa consultoria, então, além de montar um sistema de gestão sob medida, faz isso com apoio das equipes internas, num trabalho de auxiliar a condução, dar velocidade, pela experiência acumulada em direcionar ações evitando redundâncias e procedimentos que testadamente tendem ao fracasso (atalhos). Isto é feito de forma suave, para que com o fim da consultoria o sistema de gestão implementado continue rodando dentro da organização como um acontecimento natural, pois a rotina das pessoas foi ajustada e adaptada ao sistema de gestão sem traumas. Mais que isto: as pessoas perceberam ganhos em suas tarefas e rotinas com a nova forma de trabalho, assim, aceitam, gostam e querem trabalhar dentro do escopo do sistema de gestão.
Acima de tudo, um bom sistema de gestão em food safety implantado reduzirá custos de não qualidade, de produtos rejeitados, de reclamações de clientes, os riscos de processo judiciais de consumidores que encontram contaminantes, e a exposição negativa da marca em redes sociais.
O objeto do trabalho de uma consultoria focada em food safety não é uma certificação, mas garantir que uma empresa seja efetivamente capaz de produzir alimentos seguros, portanto, livres da presença de potenciais contaminantes com a minimização dos riscos químicos, físicos ou biológicos.
A certificação não deve ser um objetivo, mas uma consequência natural de um sistema de gestão, e quando bem implementado com uma base sólida e eficaz de rotinas de GMP, MIP e planos de HACCP, ficará fácil se adaptar a qualquer norma, seja FSSC 22000, BRC, IFS ou outra qualquer.
Consultorias não devem ser escolhidas pela perspectiva do preço, mas do custo x benefício. Comece pelo currículo dos auditores, avalie não só formação acadêmica, mas principalmente onde já atuou, que sistemas já implantou, pois um consultor precisa, acima de tudo, ter know how. Cuidado com armadilhas, consultorias que mostram o currículo de um consultor sênior na hora de vender o serviço, mas depois enviam juniores, alguns inclusive que vão aprender em sua empresa e não ensinar.
O grande legado de uma boa consultoria, mais que a montagem e ajuda na certificação de um sistema de gestão, é deixar equipes bem preparadas para mantê-lo, tocá-lo adiante, pois sistemas de gestão são orgânicos e mutáveis de acordo com circunstâncias como novos riscos que surgem ou novas tecnologias que possam ser usadas. Estes sistemas precisam ser adaptáveis às mudanças internas e externas, e as equipes devem estar preparadas para identificar estes momentos de necessidade de adaptação e ter conhecimento para realizá-los.
Juliane Dias
Marco Túlio,
Sábias palavras. Idealmente a certificação deve ser mesmo a consequência de um sistema robusto, mas ainda há muitas empresas que só querem “passar” na prova. Por causa disso, muitos empresários/gestores não sabem escolher bem a consultoria para condução da implementação e buscam preço e a promessa de rápida velocidade ou garantia de certificação.
Juline
Marco T Bertolino
Verdade Juliane, ainda há alguns desavisados que acreditam que um sistema de gestão pode ser “comprado de uma consultoria”, quando a consultoria tem o papel de facilitador de um processo de transformação e aculturamento, claro, junto a redesenho e estruturação de processos e análise de riscos.
Rafael Araújo
Muito bom esse artigo!!!
Agregar valor, essa é a função de qualquer sistema de Gestão, e o certificado é apenas o resultado obtido depois de sólidas quebras de paradigmas e melhorias desenvolvidas nos processos.
Obrigado, Mestre pelas sábias palavras!!
Marco Túlio Bertolino
Oi Rafael, exatamente isto, seu comentário resumo a ideia proposta no artigo.
Vitor Szpakowski
Oi Marco.
O artigo expressa exatamente o que percebemos. Muitas empresas que tão somente buscam serem homologadas como fornecedor de algum grande cliente (qual consultor nunca foi questionado sobre a possibilidade de enviar um manual de BPF por e-mail mesmo – “nem precisa vir aqui na empresa”, dizem alguns “gestores” dessas industrias.
Por outro lado, liderei algumas implantações de programas de segurança em alimentos em que os resultados obtidos puderam ser mensurados na redução de perdas e custos. A certificação foi somente uma agradável e merecida consequência.
Bom artigo. Abraços!
Vitor
Marco Túlio Bertolino
Você colocou um ponto que gosto muito, sistemas de gestão serem mensurados na redução de perdas e custos. Claro que food safety buscamos acima de tudo segurança, alimentos inócuos em termos de contaminantes, mas um com sistema de gestão reduz custos de não qualidade, assim se paga, mas só se efetivamente for implementado de verdade em todas as esferas da organização, a fim de efetivamente prover resultados.
Marco Túlio Bertolino
É isso aí Vitor. E quando a organização não entendeu bem o propósito de seu SGSA, cabe a nós profissionais da área orientarmos, mostrarmos os benefícios de um bom sistema de gestão, e também, os problemas de fazer algo superficial.
Beatriz Del Fiol
Túlio, muito bem colocado! Infelizmente é o que o mercado tem buscado, e tem muita gente se aproveitando disso ou simplesmente se adaptando ao que o mercado quer para poder sobreviver. É assustador! Dá uma boa roda de conversa.
Marco Túlio Bertolino
Pois é Beatriz, cabe a nós que atuamos na área darmos o correto rumo e orientar as organizações.
Marco T Bertolino
Sem dúvida, o tema passa por empresas que efetivamente querem uma bom e verdadeiro sistema de gestão, e que portanto, querem passar por uma transformação positiva com ajuda de uma consultoria; tem as que acham que podem comprar um certificado porque “um cliente está exigindo”; tem as que querem fingir que tem um sistema de gestão e contratam quem finge que implantou…rs. O tema é longo, passa por conhecimento técnico, know how e acima de tudo, ética profissional, em saber “vender”, neste caso, não só o que o cliente quer, mas o que precisa, especialmente porque muitas vezes o cliente que busca uma consultoria em food safety não está preparado tecnicamente para saber o que precisa, ou o que efetivamente é um sistema de gestão.
Marilia Serra
Ótimo artigo!
Sem dúvida a implantação de um sistema de gestão vai muito além dos documentos..
A capacitação das pessoas é uma das chaves do sucesso desse processo que envolve na verdade uma mudança de cultura. Por isso é importante fazer com que o time entenda seu papel no contexto da segurança de alimentos da empresa.
Marco T Bertolino
Perfeito Marília, ter claro os papéis e responsabilidade do time que suportará o sistema de gestão é fundamental.
Natália Cavalcante Cintra de Macedo
Ótimo artigo, uma consultoria não deve apenas trazer resultados imediatos como uma certificação, deve ter resultados duradouros para a garantia da segurança alimentar.
Parabéns.
Fabiana Vicente
Ótimo artigo! Perfeita a analogia com o trabalho de um alfaiate. Existem alfaiates e “Alfaiates”!!!! O papel do consultor é contribuir para a transformação da organização e além de seu know how, a ética profissional é imprescindível para resultado é para a conscientização do cliente com relação ao real propósito da implantação de um SGSA.
Marco Túlio Bertolino
Muito obrigado Fabiana!!!
Rarina Ferro
Perfeito, Marco! As empresas, infelizmente, visam custos e tempo. Esquecem da qualidade do serviço que irá receber. Ótimo artigo!
Marco Túlio
Oi Rarina, só colocaria que as empresas visarem custos e tempo é importante, empresas precisam se competitivas e enxutas, e claro, tem como objetivo final, justamente, o lucro, pois é ele que paga o risco do investimento de um empreendedor. Contudo, cabe aos consultores e consultorias dosarem bem os serviços que vão oferecer, não oferecer soluções milagrosas, não fazer contro C control V de de um sistema para outros, e coisas assim. Este artigo tem o foco justamente em consultorias que querem ganhar espaço no “preço”, e para isso, oferecem consultores pouco experientes e serviços pouco confiáveis.