O “porque sim” dos treinamentos de Boas Práticas de Fabricação

3 min leitura

Existem várias leis que regem o setor de alimentos. De todos os itens mandatórios presentes nelas, muitos não são explicados e fica à mercê do profissional interpretar o motivo.

Em alguns treinamentos que ministrei, os participantes sempre fazem perguntas relevantes a respeito do que a lei cobra. Algumas cobranças são óbvias como: por que rodapé arredondado? Para facilitar a higienização e não acumular matéria nos cantos vivos. Mas algumas perguntas fazem até o treinador pensar.

Segue lista de alguns itens já perguntados e MINHA interpretação:

POR QUE NÃO PODE USAR PERFUME?

Essa resposta pode ser simples: porque é uma contaminação química. Mas como o perfume pode chegar ao alimento? Não creio que pelo ar um perfume passado no pescoço migrará compostos para o alimento. No entanto se avaliarmos as áreas em que passamos perfume, encontraremos o motivo: o pulso! Nessa área, sim, o perfume pode migrar para o produto que está sendo manipulado! Então posso usar perfume se não passar no pulso? Não! Em uma inspeção rotineira o inspetor não vai cheirar as partes do seu corpo para saber onde aplicou o perfume, por isso é generalizado: não pode perfume! Isso também se aplica a qualquer cosmético com cheiro.

POR QUE NÃO USAR MAQUIAGEM?

Outra contaminação química. Grande parte das maquiagens são em pó. Pó de arroz, sombra e inúmeras outras que não conheço. Essas podem gerar suspensão no ar e cair no produto e mesmo em quantidades pequenas, serem acumuladas no organismo gerando uma contaminação. Algumas maquiagens como batom e outras não apresentam risco, no entando, igual ao perfume, é generalizado: não pode maquiagem!

POSSO USAR BASE NA UNHA?

Outra contaminação química e também física. Não tem diferença entre o esmalte comum e a base, ela só não tem cor. Pode facilmente descascar e cair no produto.

POR QUE NÃO PODE BARBA?

O maior problema da barba é o microbiológico e não físico. Barba não cai facilmente, é muito mais fácil cair um cílio. O fato é que em vários lugares do nosso corpo temos pelos para a proteção, eles funcionam como uma mata ciliar, como uma grade, barrando impurezas. Logo as impurezas são retidas neles. Já imaginou uma barba cheia de impurezas na área produtiva?

A BOTA DE SEGURANÇA É LIMPA?

Esse questionamento é muito pertinente, pois em algumas empresas os funcionários pisam com o sapato pessoal – contaminado no piso do vestiário e pisam com a bota – limpa no mesmo piso. Desse modo a bota de segurança não é limpa! No entanto é menos suja, tem uma carga microbiana menor do que o sapato pessoal e o mais importante: protegerá o funcionário em caso de acidentes. Vale a pena lembrar que devido ao fato de a bota de segurança não ser/estar higienizada, o piso da área produtiva também não. Isso explica por que não devemos apoiar caixas de plástico e utensílios no piso, mesmo o da área produtiva. Também é interessante alinhar com o técnico de segurança como pode ser feita a limpeza dessas botas, pois elas ficam com os funcionários um longo período. Esse questionamento provavelmente não é feito em empresas que tem um método de higienização das botas antes de entrar na área produtiva.

POR QUE OS MECÂNICOS PODEM USAR MANGA CURTA?

Para entender esse “privilégio” temos que voltar aos nossos princípios. Por que usamos as BPFs? Para a segurança dos alimentos e consequentemente a segurança dos consumidores. Ao manipular um equipamento, a manga de um mecânico pode enroscar e causar acidente, comprometendo sua segurança, não faz sentido arriscar diretamente a segurança de uma pessoa (mecânico) para garantir indiretamente a segurança de outra (consumidor). Imagine também o tamanho da contaminação biológica que ocorrerá para o produto em caso de acidente.

POR QUE NÃO POSSO COMER NA ÁREA PRODUTIVA?

Esse questionamento tem inúmeros motivos. Os que eu considero mais importantes são: porque, ao mastigar, pode cair saliva no produto e porque devemos manter o menor contato direto possível com o produto. Ao pegar um “punhado” isso não é feito com um utensílio, até porque não existe para os funcionários utensílios para degustação, dessa forma você fica tocando desnecessariamente no produto e não apenas no produto que vai comer, toca em outras unidades também. Já imaginou almoçar na casa de uma pessoa onde os ingredientes são servidos com a mão? Você comeria? Então por que o consumidor é obrigado a comer um produto no qual ficamos tocando desnecessariamente?

Existem inúmeros outros questionamentos que me ocorrem durante treinamentos, mas creio que esses são os mais interessantes.

Caso você tenha uma interpretação diferente de algum item aqui citado ou algum questionamento interessante feito por funcionários, por favor, comente para enriquecer o post. É imprescindível trocar informações.

16 thoughts on

O “porque sim” dos treinamentos de Boas Práticas de Fabricação

  • Carlos Fregati

    No caso de comer na área produtiva também levamos em consideração o controle de pragas.

    • Everton Santos

      Olá Carlos. Exatamente! Imagine um funcionário com a mão cheia de produtos derrubado um pouquinho no chão, com certeza, se o Acesso com o meio externo estiver falho ou se a frequência de higienização desse piso for pouca, vai atrair pragas para esse setor.

    • Everton Santos

      Imagine se o funcionário com a mão cheia de produtos derruba um alergênico onde não deve … São inúmeros os problemas!

  • Rachel Sales

    Boa Tarde,

    Trabalho em uma empresa de embalagens metálicas para bebidas e tivemos conhecimento que nossos concorrentes não usam touca descartável na produção. Aqui nós usamos e agora muitos funcionários vem me questionar porque precisamos usar se nossos concorrentes não usam. Você tem algum conhecimento sobre esse assunto?

    • Everton Santos

      Olá Rachel !

      Não tenho muito conhecimento em normas de produção de embalagem, mas creio que exista legislações de BPF para a produção e o uso da touca deve ser um dos itens principais. Costumo comparar as embalagens de alimentos com os pratos de nossa casa em treinamento, afinal, eles tem quase a mesma função: não são a comida, mas armazenam ela. Faça os funcionários refletirem como seria abrir um pacote de alimento e lá estar um fio de cabelo, o qual pode ter caído na produção da embalagem. Pegunte a eles se comeriam em um prato com um fio de cabelo.

      Espero ter ajudado !

  • Fabricio Pereira da Silva

    boa tarde

    tenho uma dúvida: o funcionário acessar o vestiário com calçado pessoal e fazer a troca pelo de segurança e circular no local conforme mencionado acima e não há lava-botas posteriormente; isso pode implicar em uma certificação?

    • Everton Santos

      Olá Fabrício.

      Depende da certificação. Também acho isso um certo meio de contaminação, isso pode ser eliminado delimitando um caminho para pisar com o sapato pessoal e outro para o sapato produtivo. Ou pode organizar o vestiário com a entrada com roupa pessal por um lado e a saída com a roupa produtiva do outro, o mesmo para o sapato. Dependendo do processo também podem ser aplicados tapetes higiênicos que lavam as solas, assim nada contaminado entra na área produtiva. Independente do métodod adotado é importante direcionar a atenção também para visitantes, estes não tem um sapato para a área produtiva, portanto se quer implantar esse controle de sapatos eles precisam usar um propé ou higienizar a sola antes de entrar na área produtiva. Espero ter ajudado.

  • fernanda

    Olá Fabrício, muito interessante seu post, parabéns!
    Acredito que a questão de a alimentação de integrantes de uma indústria ocorrer somente no refeitório possui três motivos principais:
    1. uma possível contaminação cruzada, o alimento que o funcionário está consumindo, ou a sua mão, pode está contaminado e vim a ser um meio de contaminar o produto em produção
    2. alergênicos, pode ser que o alimento em consumo seja alergênico, e restos desde caiam sobre o produto em produção, ou o próprio manipulador seja um vetor de contaminação, gerando uma contaminação cruzada. Há pessoas extremamente alérgicas, onde a presença de resquícios apenas desencadeiam crises
    3. Atração de insetos e pragas: no momento que o integrante consome algum produto dentro da fábrica, restos deste podem cair no chão e se tornarem alimento para pragas e insetos, criando a vertente alimento para os 4 A’s da proliferação de pragas.

    espero ter ajudado.

    • Everton Santos

      Olá, obrigado pelo comentário !

      Realmente esse questionamento tem vários motivos. O número 03, atrair pragas, creio que não deva ser encarado como um, pois independente de onde o alimento estiver, não se deve ter pragas na área produtiva. Em muitos casos o próprio processamento derruba alimento no chão, estes são mais frequentes que os derrubados pelas mãos dos funcionários. Toda via se for um barracão de caixas ou outro local que não seja a área produtiva, é interessante estabelecer uma politica de não comer ali para não atrair pragas.

  • Felipe Galli

    Boa tarde Everton, primeiro parabens pelo post e obrigado por compartilhar seus conhecimentos e experiencias.

    Estou implantando BPF e surgem diversos questionamentos, que me deixam em dúvida também rs.

    – Qual o limite para uso de antitranspirantes? deve ser sem cheiro? ou há algum grau de liberdade maior?

    – Hidratante labial é permitido?

    – Manipuladores que possuem doenças respiratórias, como rinite alérgica. Como devemos tratar? Temos que destinar para outro setor? Dependendo do grau de risco e processos que o produto vai ser submetido depois, podemos permitir?

    Obrigado

    • Everton Santos

      Olá Felipe, obrigado pelo comentário !
      A respeito do antitranspirante, o ideal é sem cheiro. Se ele tiver cheiro não vai passar para o produto, mas pode causar problemas em auditorias e fiscalizações. Costumo pedir aos funcionários que utilizem algo que não possa ser sentido ao passar por perto.
      A respeito do hidratante, enquadro ele como maquiagem, é um produto químico e se for permitido pode virar um problema, pois não vão saber dosar quanto e qual utilizar. Todavia se a pessoa passar antes do turno, a pele absorver e não deixar cheiro eu permitiria.
      A respeito da doença respiratória, devemos verificar se é contagiosa, se sim, o manipulador deve mudar de função. Se não, deve ser avaliado o risco que o processo produtivo, se houver poeira, causa a ele e concluir se ele deve ou não mudar de função.
      Espero ter ajudado !

      • Felipe Galli

        Muito obrigado!!

  • Caroline

    Boa Tarde,
    Tenho um estoque separado da area de produção de alimentos, esses colaboradores devem usar touca?
    E se caso tivesse uma produção de alimentos próxima a esse local com manipulação, todos devem usar touca, correto? A produção é esporadica.
    Muito obrigada.

    • Everton Santos

      Boa tarde. Como seria esse separado? Com barreiras físicas? Se não houver risco de cair um cabelo desses funcionários do estoque não vejo necessidade do uso. Como é essa produção esporádica? Se for no mesmo local sugiro uma higienização geral antes da produção, para eliminar o risco dos funcionários do estoque e se eles forem trabalhar ao mesmo tempo que os manipuladores de alimentos, devem usar touca e jaleco, igual a um visitante.

  • Rayane

    oi, Bom dia. podemos considerar também que tem pessoas alérgicas a perfume. Podendo espirrar e contaminar o ambiente.

  • Brendo Silva

    Ótimo conteúdo, parabéns!
    Em nossa indústria temos as barreiras sanitárias onde os colaboradores podem higienizar as mãos e botas antes de adentrar a área industrial, também temos regras que proíbem contra fluxo, impedido que colaboradores transitem por setores além do seu. Uma das justificativas é que um colaboradores pode transportar cargas microbiológicas de um setor para outro com menos contaminações.

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