Rastreabilidade: aspectos regulatórios e aplicação no processamento de leite e derivados

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A rastreabilidade é a habilidade de acessar toda e qualquer informação relacionada a um determinado lote de produto, ao longo de todo o seu ciclo de vida por meio de registros de processo. Isto inclui, mas não está limitado, a identificação de informações e resultados de análises de matérias-primas, insumos, materiais de embalagens, coadjuvantes de tecnologia. Além disso, é necessário identificar clientes e/ou consumidores que tenham adquirido o lote em questão. A implementação efetiva de um sistema de rastreabilidade não pode ser útil somente para atender a conformidade regulatória ou normativa, mas deve responder com agilidade aos problemas ligados à qualidade e segurança de alimentos. No Brasil, a exigência da rastreabilidade é um requisito compulsório definido pela legislação vigente. De fato, a rastreabilidade é exigida por normas em diversos segmentos da cadeia alimentícia e possibilita conhecer “a vida pregressa” dos alimentos e identificar os possíveis perigos à saúde coletiva a que foram expostos durante a sua produção e distribuição, sendo ainda exigidos registros de processo que identifiquem a origem das matérias-primas e insumos utilizados na produção.

Não existem requisitos legais específicos para rastreabilidade na cadeia de leite e derivados, devendo ser consideradas as normas genéricas vigentes. Trabalhos recentes relatam que  a conscientização dos produtores de produtos lácteos vem  crescendo com relação ao tema em questão. Como qualquer segmento produtivo, a aplicação do sistema de rastreabilidade em produtos lácteos e seus derivados pode ser segmentada de acordo com a posição do laticínio na cadeia de abastecimento de produto final. Nesse contexto, técnicas e metodologias devem ser desenvolvidas de forma específica para produtores de matéria-prima láctea e  unidades industriais  que processam produtos lácteos.

Na produção primária, há necessidade da implementação de registros que permitam relacionar o leite produzido com o animal e com o estabelecimento. Informações do uso de medicamentos, hormônios, ração utilizada, saúde dos animais devem ser registradas de forma a manter relação com o animal e o produto. Da mesma forma, é necessário reter dados sobre o destino do produto. Em geral são produzidos registros de nota fiscal e de carregamento relacionados aos clientes. Indústrias que beneficiam o leite são desafiadas a demonstrar a origem das matérias primas, os resultados de processo e a destinação do lote. Hoje no Brasil, procedimentos para uma rastreabilidade efetiva em produtores de leite ainda são limitadas. Muitos estabelecimentos operam de forma manual e sistemáticas de registros de informações não estão devidamente implementadas.

Laticínios que fabricam bebidas lácteas em geral, manteigas, creme, doce, entre outros, devem também ser capazes de rastrear a origem das demais matérias primas e auxiliares de processo que tenham contato direto com o produto. As principais informações a serem rastreadas nas matérias primas são: fornecedor, local de origem, composição (inclusive informações sobre substâncias alérgenas), resultados analíticos microbiológicos e físico-químicos. Registros devem ser mantidos para evidenciar resultados de monitoramento de processo, limpezas e sanitizações, não conformidades, resultados de análises microbiológicas e físico-químicas, e associar lotes de matérias primas e de embalagens ao lote do produto final. Adicionalmente, registros de processos devem ser armazenados durante toda a validade do produto. As normas ISO 9001:2015 e ISO 22000:2018, de adesão voluntária, não estabelecem período para a retenção de registros de processo. A norma BRC for Food Safety Issue 8 de 2018, também de adesão voluntária, determina que estes documentos sejam acessíveis por um período de 12 meses além do prazo de validade do produto.

Para que um laticínio recolha um lote de produtos defeituosos de forma efetiva, é necessário que o procedimento de rastreabilidade seja executado com precisão. Durante a atividade de recolhimento o foco é retirar produtos contaminados do mercado. Em alguns casos, quando o produto final já está em posse do consumidor, é preciso comunicá-lo para que não ocorra o consumo. Nesses casos o tempo de execução do procedimento de rastreabilidade e a correção das informações de registros de processo são a base para uma ação bem sucedida.  De forma geral, um recolhimento deve ser iniciado sempre que um produto lácteo representar risco à saúde do consumidor.

Finalmente, os procedimentos para rastreabilidade, recolhimento e comunicação devem ser proporcionais ao tamanho e complexidade dos processos produtivos na indústria de leite e derivados, sendo importante que sejam simples, efetivos e facilmente gerenciáveis. Esses procedimentos devem evidenciar as fases de planejamento, deixando claras as premissas e referências adotadas, descrever a execução das atividades, estabelecer métodos de avaliação e checagem do procedimento e critérios para o estabelecimento de ações corretivas e de ações para melhoria.

Autores: Léo Oliveira Lopes1, Ramon Silva1,2, Erick Almeida Esmerino1, Mônica Queiroz Freitas1, Denise Rosane Perdomo Azeredo2, Adriano Gomes da Cruz2

 1Universidade Federal Fluminense (UFF), Faculdade de Medicina Veterinária

2Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ), Departamento de Alimentos

Referências

Badia-Melis, R.,  Mishra, P., &  Ruiz-García. L. (2015).  Food traceability: New trends and recent advances. A review. Food Control, 57, 393-401 

Brasil.(2015). Resolução RDC nº 24, de 08 de Junho de 2015.Dispõe sobre o recolhimento de alimentos e sua comunicação à Anvisa e aos consumidores. Disponível em www.anvisa.gov.br

Matzembacher, D.E., Stangherlin, I.C.; Slongo, L. A., & Cataldi, R. (2017); An integration of traceability elements and their impact in consumer’s trust Food Control, 279, 239 – 253.

Maldonado-Siman, E. Godinez-Godinez, C.S., Cadena-Meneses, J.A., Ruiz-Flores, A. & Aranda-Osório, G. (2015). Traceability in the Mexican Dairy Processing Industry. Journal of Food Processing and Preservation, 37, 399-40

Mattevi, M. & Jones, J.A. (2016). Traceability in the food supply chain: Awareness and atitudes ok UK Small and Medium-size Enterprises. Food Control 64, 120 – 127

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