Num processo industrial de produção de alimentos e bebidas, muitas vezes é necessário medir e monitorar para, com base nos resultados obtidos, tomar ações a fim de manter os processos sob controle, seja para garantir características organolépticas como controlar as zonas de um forno de biscoitos objetivando obter uma determinada umidade e crocância ou para controlar um PCC como numa esterilização de água de coco num processo hot fill. Para isso, recorre-se ao uso de instrumentos de medição como termômetros, potenciômetros, medidores de vazão, barômetros, balanças e muitos outros.
Numa medição, portanto, o instrumento utilizado é uma das partes mais importantes, junto com a competência de quem executa a tarefa.
Por isso, a seleção de instrumentos de medição deve ser realizada adequadamente, pois caso seja realizada de forma imprópria, os resultados de medições obtidos podem fornecer uma informação errada, levando a tomada de decisões incorretas, e com isso, gerando produtos não conformes e até mesmo inseguros.
A escolha de um instrumento de medição tem que levar em consideração: 1) resolução, 2) a faixa de medição, 3) a precisão e 4) a exatidão necessárias para atender ao processo.
E é claro, não se deve esquecer os 5 cuidados com instrumentos de medição para garantir que estarão plenamente aptos no momento do uso.
1 – RESOLUÇÃO
A resolução é o valor de uma divisão de um instrumento de medição, portanto, é a menor indicação que pode ser observada no instrumento. Por exemplo: se em em um termômetro, a indicação do valor medido é realizada de 1°C em 1°C, a resolução do termômetro é de 1°C.
Para que a variabilidade de um processo possa ser observada é necessário que a resolução do instrumento de medição seja adequada.
Por isso, se tentarmos utilizar o termômetro citado anteriormente para medir um processo de 50 +/- 1°C, poderíamos ter um sério problema de confiabilidade no resultado e um alto grau de risco de obter medições erradas, pois este termômetro apenas mediria 49°C, 50°C e 51°C, não percebendo as variações de +/- 1°C.
Essa seria uma informação pouco útil e que não nos permite medir a variação requerida no processo.
Por outro lado, com um termômetro com resolução de 0,1°C poderíamos medir muitos pontos a mais: 49,1°C, 49,2°C, 49,3°C, 49,4°C,49,5°C, 49,6°C, 49,7°C, 49,8°C, 49,9°C, 50,0°C, 50,1°C, 50,2°C, 50,3°C, 50,4°C, 50,5°C, 50,6°C, 50,7°C, 50,8°C, 50,9°C, 51,0°C, ou seja, mais de 20 resultados possíveis e uma informação útil para conhecermos a variação do processo.
É recomendável, por isso, que a resolução do instrumento de medição seja de 1/ 10 da tolerância do processo. Assim, para o exemplo utilizado, temos uma tolerância do processo de +/- 1°C e a resolução recomendada seria de 1/10 = 0,1°C.
2 – FAIXA DE MEDIÇÃO
A faixa de medição é aquela que um instrumento é capaz de medir com um nível de precisão informado pelo fabricante, correspondente ao intervalo entre a carga máxima e mínima.
A carga máxima (Max) é a capacidade máxima de pesagem de uma balança, enquanto a carga mínima (Mín) é o valor da carga abaixo do qual os resultados das pesagens podem estar sujeitos a um erro relativo excessivo, acima de 5% da carga.
A seleção do instrumento de medição com a faixa de medição adequada é essencial para medirmos com um nível de erro e precisão adequados.
Para exemplificar, vamos supor que na formulação de um produto seja necessário adicionar 10 g de um determinado conservante e que se utilize uma balança com indicação de 3 kg, porém cujo fabricante informe que a faixa de medição vai de 0,02 a 3 kg, conforme descrito na etiqueta/ tag da placa de identificação do equipamento a seguir.
Temos, então, que o fabricante da balança garante uma precisão dentro da faixa de 20 g até 3kg. Contudo, abaixo da faixa de 20g o erro relativo pode ser considerado significativo, assim não seria apropriada para medir 10g.
É recomendável que o valor a ser medido esteja entre 10% a 90% da faixa de medição do instrumento, por isso, para medir os 10g, deve-se buscar uma balança cuja faixa de medição seja, então, de 0,2 a 200 g.
3 – PRECISÃO
Precisão de medição é o grau de concordância entre indicações ou valores medidos, obtidos por medições repetidas, no mesmo objeto ou em objetos similares, sob condições especificadas.
A precisão de medição é geralmente expressa numericamente por características como o desvio-padrão, a variância ou o coeficiente de variação, sob condições especificadas de medição.
As “condições especificadas” podem ser, por exemplo, condições de repetibilidade, de precisão intermediária ou de reprodutibilidade.
A precisão de medição é utilizada para definir a repetibilidade de medição, a precisão intermediária de medição e a reprodutibilidade de medição.
4 – EXATIDÃO
Já a exatidão de medição é o grau de concordância entre um valor medido e um valor verdadeiro de um mensurando.
A exatidão de medição não é uma grandeza e não lhe é atribuído um valor numérico, então uma medição é dita mais exata quando fornece um erro de medição menor.
A figura a seguir exemplifica a diferença entre exatidão e precisão, na qual várias medidas são feitas e os resultados plotados. Considerando que o centro do alvo seja o valor convencional de certa grandeza e que os pontos pretos sejam as medições realizadas, quanto mais próximo do centro do alvo, mais exata é a medição.
Pode-se observar que a precisão não é uma medida única, mas está associada a um processo ou conjunto de medidas.
Normalmente, em qualquer conjunto de medições realizadas pelo mesmo instrumento no mesmo componente, as medições individuais são distribuídas em torno do valor médio e a precisão é a concordância desses valores entre si.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
- Quando for escolher instrumentos de medição, segundo as necessidades de cada processo, levando em consideração os riscos, considere uma análise crítica para avaliar se o instrumento atende plenamente as necessidades, considerando de forma balanceada a resolução, a faixa de medição necessária, assim como a precisão e a exatidão do instrumento;
- Lembre-se de que esta análise leva em consideração um determinado instrumento de medição para um determinado monitoramento de processo, portanto, se o equipamento por algum motivo estiver inviável e for ser utilizado um outro, esta análise crítica precisa ser refeita, para avaliar se o novo instrumento também atende plenamente às necessidades do processo.
Não deixe de ler também:
- Requisitos e exigências da etiqueta de calibração na indústria de alimentos.
- Qual a diferença entre calibrar, verificar e ajustar?
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Antonio Marcos Duarte Rodrigues
Gostei muito do conteúdo dessa publicação, gostaria apenas de apresentar uma informação que coletei da mitutoyo.
vocẽs comentaram que “é recomendável, por isso, que a resolução do instrumento de medição seja de 1/ 10 da tolerância do processo. Assim, para o exemplo utilizado, temos uma tolerância do processo de +/- 1°C e a resolução recomendada seria de 1/10 = 0,1°C.” Realmente ela considera 1/10 o equipamento IDEAL ou recomendável conforme vcs mencionaram. Além disso, considera também como aceitável um instrumento de medidas que meça até 1/5 da tolerância admitida.
Marco Túlio Bertolino
Exatamente, obrigado por seu comentário.
Bruno Samuel dos Santos
Boa tarde! Parabéns pelo artigo, muito bem elaborado, dinâmico e objetivo.
Trabalho monitorando laboratório de metrologia, dando suporte em especial para o setor de usinagem. (Dimensional).
Estou sendo penalizado por um auditor no caso, no critério de seleção de instrumentos, onde o mesmo está insistindo em considerar a incerteza do instrumento e o critério de aceitação, ao invés da RESOLUÇÂO do instrumento, no ato da seleção, com base na tolerância de projeto, (EX: ±0,05mm) conforme metodologia descrita no seu artigo.
Em qual norma e/ou literatura, eu encontro a descrição desse conceito de boas praticas para seleção de instrumentos.
Desde já agradeço.
Marco Túlio Bertolino
Metrologia & Instrumentação: Metrologia e Incerteza de Medição – Edição nº 43. 2023 ∞ ISSN 2179-1732 – Álvaro Messias Bigonha Tibiriçá e Alexandre Martins Reis – CEAD – UFV