No dia 6 de maio, houve uma Audiência Pública promovida pela Anvisa para debater Proposta de Resolução que dispõe sobre rotulagem de alergênicos em alimentos. Naquela ocasião, a Anvisa apresentou algumas alterações no texto que fora debatido na consulta pública, dentre as quais destacamos a inclusão do látex como mais um alergênico a ser rotulado destacadamente[1].
Esta inclusão teria sido motivada da necessidade de se regulamentar a Lei 12.849/13, que prevê que “os fabricantes e importadores de produtos que contenham látex natural são obrigados a gravar em suas embalagens advertência sobre a presença dessa substância em sua composição”.
Pelo que se sabe, tal lei teria sido fruto de pedidos feitos por profissionais de saúde, incluindo a ASBAI[2], que estava buscando tutelar os profissionais que desenvolveram alergia ao látex por conta de constante exposição a este material no exercício de sua profissão, como luvas.
Da leitura da justificativa do projeto de lei que resultou na aprovação da lei em comento (PL 5349/09), verifica-se que o legislador estava preocupado em tutelar os direitos daqueles que possuem alergia ao látex, mas o foco não era a rotulagem desta substância nos alimentos:
“Essa substância, o látex, uma borracha natural, está presente em inúmeros produtos utilizados cotidianamente por milhões e milhões de brasileiros, como luvas, balões, sondas, cateteres, pneus, etc”[3].
Atenta ao tema, a Anvisa promoveu, em 2014, uma consulta pública para debate de norma que visava à “padronização de frases de declaração de conteúdo de látex de borracha natural em rótulos de dispositivos médicos”[4].
Foram 59 contribuições em 2 meses de consulta pública e, de acordo com o Relatório de Análise de Participação Social elaborado pela Anvisa, “a maior parte dos respondentes, aproximadamente 56%, declarou representar o segmento ‘Profissional de Saúde’, seguido de ‘Empresa Privada’ e ‘Cidadão’. (…) Dos respondentes que declararam pertencer ao segmento “Profissional de saúde”, as profissões mais citadas foram: Medicina (82%), Farmácia (9%) e Enfermagem (6%)”[5].
Ainda no Relatório em questão, há a informação de que “foram recorrentes os comentários entre os profissionais de saúde sobre a importância desta informação na rotina de trabalho, o que possibilitará maior segurança de pacientes e profissionais, principalmente nos procedimentos cirúrgicos”.
Das críticas apresentadas, destaca-se a de Adriano Bueno de Sá, médico e representante da ASBAI para este assunto:
“É de suma importância que tanto os produtos médico-hospitalares (luvas, cânulas, garrotes etc) quanto os produtos de uso geral (chupetas, brinquedos, balões de festa, calçados etc) tenham identificação quanto a presença ou não do látex da borracha natural (látex) em sua composição”[6].
Por todo o exposto, tem-se que o debate sobre a regulamentação da rotulagem do látex, desde o debate no âmbito do legislativo, até a discussão do tema junto à Anvisa em nenhum momento se deu com foco na presença deste ingrediente em alimentos ou dos riscos de seu uso em embalagens de alimentos. Deste modo, o que o tema não está maduro o suficiente para ser incluído no bojo da regulamentação da rotulagem de alergênicos.
Não há dúvida de que a Anvisa precisará enfrentar este assunto, tendo como enfoque não só o látex utilizado em dispositivos médicos, mas também aquele utilizado em balões de festa, bicos de chupetas e mamadeiras, brinquedos, calçados e até mesmo em embalagens de medicamentos, alimentos, dentre outras, o que, sem sombra de dúvida, demandará avaliação mais cuidadosa por parte de todos que estão envolvidos na produção destes produtos.
Assim, apesar da inegável relevância de se tutelar a população com alergia ao látex, há que se reconhecer que o tema demanda uma abordagem distinta daquela destinada à rotulagem de alimentos mais alergênicos, tal como a Anvisa optou por fazer em relação à regulamentação do glúten, que diante da complexidade do tema, será normatizado em momento posterior, com avaliações mais específicas para este tema.
Em suma, não nos parece ser acertado que a rotulagem do látex seja incluída nesta fase do debate sobre a resolução que estabelecerá “requisitos para rotulagem obrigatória dos principais alimentos que causam alergias alimentares” pelas seguintes razões: (i) o látex não é um alimento (e a norma cuidará da rotulagem dos alimentos que mais causam alergias); (ii) o longo debate sobre a proposta de regulamentação da rotulagem de alergênicos não englobou este tema; (iii) a discussão da regulamentação da rotulagem do látex, por sua vez, não abrangeu o seu impacto na produção de alimentos, mormente no que se refere aos impactos que esta inclusão teria na questão dos materiais utilizados na produção dos alimentos e, principalmente, nas embalagens.
[1] http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/76220800484a1f8d9f02bfbdc15bfe28/AP+1-2015+-+Proposta.pdf?MOD=AJPERES, acesso em 19/05/15.
[2] http://www.sbai.org.br/secao.asp?s=51&id=757, acesso em 12/05/15.
[3] http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=114952&tp=1, acesso em 12/05/15.
[4] http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/dec52380456c04aaa0efa40bb3a02a58/Consulta+P%C3%BAblica+n%C2%B0+70+GGTPS.pdf?MOD=AJPERES, acesso em 19/05/15.
[5] http://portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/5f3151004732b29aae71bfbb1e455ac3/RAPS+13_2014+CP+70_2014.pdf?MOD=AJPERES, acesso em 19/05/15.
[6] http://formsus.datasus.gov.br/site/popup_unidade_detalhe.php?id_aplicacao=17388&id_unidade=2613284, acesso em 19/05/15.
Nathalia Gouveia Federico
Excelente avaliação!
A tão esperada regulamentação de alergênicos específica para o Brasil, ainda deixa uma sensação de burocracia e não a preocupação com a saúde.
VALERIA UCHOA
MINHA SOBRINHA TEM 8 ANOS DE IDADE ,E TEM 100% DE ALERGIA AO LATEX .POR SER UM TIPO DE ALERGIA INCOMUM NO BRASIL, O TRATAMENTO AINDA E POUCO ACESSÍVEL,CUSTANDO MUITO CARO .TAMBÉM NÃO SE VÊ EM RÓTULOS A PRESENÇA OU NÃO DO LATEX .TENHO MUITAS DUVIDAS SOBRE ESSE ASSUNTO, PRINCIPALMENTE EM SE TRATANDO DO DEVER DO ESTADO NO TRATAMENTO E NO ATENDIMENTO DESSES ALÉRGENOS EM HOSPITAIS PÚBLICOS,JÁ QUE A MAIORIA DOS PRODUTOS HOSPITALARES CONTEM LATEX .ALGUÉM PODERIA ME AJUDAR?
Cecilia Cury
Olá, Valeria.
Por ora, somente os alimentos embalados na ausência do consumidor estarão obrigados a trazer informações sobre a presença do látex (a partir de julho do ano que vem, fim do prazo de adequação).
Daisy Fortes
Cecília, página Síndrome Látex Frutas Vegetais e o grupo de mesmo nome, a cada dia mais pessoas são diagnosticadas e os pacientes não encontram médicos nem nutricionistas que saibam tratamento e dietas adequados, para isso contamos com o grupo que cresce também diariamente trazendo a tona que muito mais pessoa no Brasil tem a SLFV do que dizem, e em sua maioria não sabem nem o que comer com segurança. Estamos descobrindo juntas como lidar com tudo isso.
Kelly
Parabéns pelo post desenvolvido.
Como disse, o látex não é um alimento, não conheço nenhum produto que tenha em sua composição o látex.
Estou procurando informações com fornecedores de embalagens para verificar a aplicação do mesmo.
Por favor, você teria exemplos de peças de equipamentos, equipamentos, embalagens, vedantes e se existe algum ingrediente que contenha esta substância ?
Daisy Fortes
Frutas, castanhas, vegetais, tubérculos, muitos alimentos tem proteínas do látex. êmbolos de seringas, equipamentos de inalação, sondas gástricas, tampas de medicamentos, esparadrapos…mais de 300 mil artigos possuem látex.
Daisy Fortes
Embora considerado por muitos como látex apenas a seiva da seringueira, muitos alimentos possuem proteínas do látex, daí a reação cruzada com frutas, castanhas, vegetais e outros, que faz do látex um perigo constante na vida de pessoas com Síndrome Látex Frutas Vegetais. A contaminação por manuseio dos alimentos com luvas de látex na fabricação e processamento, bem como de colas nas embalagens está provada é pode ser fatal nestes casos. Por ser uma síndrome nova, pessoas com SLFV já tem desafios muito além das demais alergias alimentares pois nem mesmo dieta e cuidados a seguir são ainda de conhecimento de médicos ou nutricionistas, e a maioria não consegue se manter livre das crises graves que incluem anafilaxias constantes, como no meu casos que chegavam a 5 por mês.Êmbolos de seringas, garrotes, equipamentos de inalação, esparadrapos, a simples necessidade de atendimento de urgência, tudo é muito complicado, o que tem levado diversos estado dos EUA e do mundo a excluírem de vez o látex do uso hospitalar e das indústrias de alimentos. Diante disto, qualquer informação na rotulagem que possa ser obrigatória se faz de extrema importância.