Entendendo o inimigo
Nojo é a primeira emoção primitiva e universal que temos. Ela se caracteriza por repulsa e afastamento de algo que causa repugnância.
Roedores urbanos encabeçam, junto com as baratas, o título de seres nojentos da sociedade. Sua associação com esgoto e lixo os conecta à sujeira e contaminação.
A história relembra o impacto dos ratos e suas pulgas na Peste Negra. Entre 1347 e 1351, uma das pandemias mais mortais matou cerca de 25 a 30 milhões de pessoas, um terço da população europeia.
Hoje, relatos de vítimas de leptospirose nos mantêm alertas. Além disso, a presença de ratos traz danos financeiros, elétricos, estruturais e contaminação de alimentos. Na indústria, sua presença é especialmente indesejável e prejudicial.
Não romantize
Ratos estão muito presentes em nosso cotidiano e inspiraram o entretenimento, com personagens como Topo Gigio, Tom & Jerry, Ligeirinho, Remy (Ratatouille), Pink & Cérebro, Mestre Splinter, Pikachu, Stuart Little, Mickey e Minnie. No cinema, também aparecem em cenas sombrias e de suspense. Ratos deixaram de ser vistos apenas como vetores de doenças, são animais tão assimilados culturalmente que foram transformados até em inspiração criativa.
Ok, sabemos que ratos não são “fofos” e seguramente estão entre as pragas que mais geram demanda por novos serviços para as empresas especializadas.
O romantismo está na crença de que esses invasores urbanos podem ser controlados apenas usando fórmulas mágicas, como porta-iscas, placas de cola, gaiolas e ultrassom.
Combater ratos é muito mais que isso.
Aprendendo a pensar como um deles
O controle de roedores é mais comportamental e biológico do que químico; vai além de iscas ou colas potentes. Um controle efetivo envolve duas abordagens:
1 – Saber onde instalar a isca ou armadilha;
2 – Identificar e eliminar ACESSO e ABRIGO.
Armadilha sozinha não elimina a infestação
Há tantos casos de sucesso e fracasso no controle de roedores que renderiam um livro ou uma série. Os êxitos são poucos, enquanto os fracassos abundam em publicações on-line, mostrando danos irreversíveis a marcas e até vidas perdidas por leptospirose.
Era o ano de 2005 e pude acompanhar de perto uma indústria pet food no interior do Rio de Janeiro, que seguiu rigorosamente o controle clássico com porta-iscas, armadilhas e portas fechadas, mas em poucas semanas sofreu uma infestação de ratos, que roeram cabos e causaram danos em dezenas de embalagens do produto acabado. Onde eles erraram?
A análise mais especializada revelou uma estratégia de controle orientado apenas para ratazanas e camundongos, ignorando os ratos de telhado, que desciam das estruturas, causavam danos e retornavam ao telhado para se reproduzir.
O tratamento inusitado
- Iscas e armadilhas no telhado;
- Isolamento das aberturas existentes.
Foi um ponto de vista desconcertante para a empresa controladora contratada, que não tinha clareza sobre os hábitos e biologia dessa espécie.
Parece ilógico, não é?
A empresa controladora, que deveria ser especializada, falhou em identificar a espécie invasora e os sinais de infestação. Incapazes de reconhecer fezes, pegadas, material roído e gordura dos ratos, a equipe de qualidade decidiu substituir a empresa. “O Jerry venceu”.
Duas semanas depois, a infestação tinha sido reduzida expressivamente. Em 30 dias, só havia lembranças dos dias sombrios.
Lições aprendidas
Controlar pragas em locais com abundância de alimentos é diferente de uma simples dedetização. Algumas empresas destacam-se pela formação dos trabalhadores, participação ativa do Responsável Técnico, auditorias e análises de tendências. No entanto, isso não é comum. Muitas empresas de controle de pragas aparentam ser profissionais nas redes sociais, mas carecem de atualização e base técnica operacional em toda a cadeia de trabalho.
Essa observação não está relacionada ao tamanho das empresas. Existem controladoras de pragas menores altamente capacitadas, enquanto grandes players, muitas vezes, vendem serviços como commodities, sem a devida atenção técnica.
É imperativo: gestores de qualidade devem se comprometer com adequações ambientais para eliminar vulnerabilidades estruturais. Empresas de controle de pragas precisam pensar como ratos para eliminá-los, porque iscas e armadilhas sozinhas não evitam novas infestações.
Pensar como um rato e ser disciplinado
Vale a máxima que já apresentamos antes: não relativize nem romantize a necessidade de aprendizado e aprimoramento constantes. Porque as pragas não mentem. Se faltar essa disciplina, o “Jerry sempre vai vencer”, porque ele tem disciplina em aprender como sobreviver nesta terra. Pense nisso.
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LUCIA SCHULLER
quem escreveu esse artigo não parece ser profissional de controle de pragas, porém fez uma análise muito interessante sobre a ralidade do controle de ratos. O controle desses animais exige estratégia e adoção de muitas outras medidas não padronizadas que focam na sua expulsão do local infestado. Muito interessante. Parabéns ao autor.
Flavio Quadra
Olá Lucia. Uma honra merecer seu tempo de leitura e comentário. Realmente o texto foi publicado em uma linguagem bem direcionada a profissionais de qualidade, afastando um pouco da abordagem que nós controladores de pragas sempre usamos. Já encontrei com você na EXPOPRAG algumas vezes e tenho grande admiração por sua trajetória profissional. Fique sempre à vontade pra comentar, e se perceber algum ponto de vista divergente da sua prática, pode mandar aqui. A Food Safety Brazil é um canal que acolhe múltiplas opiniões. O objetivo de todos nós é produzir alimentos seguros.