Continuando a série de posts sobre autocontrole na indústria de alimentos de origem animal, vamos abordar aqui os conceitos do sistema de inspeção ligados aos programas de autocontrole.
Qual a diferença entre inspeção tradicional e inspeção com base no risco?
Na inspeção tradicional, a identificação da carne inadequada para consumo humano era definida através da inspeção post mortem de carcaças e vísceras, adotando exames de visualização, palpação e incisão para detectar anormalidades nos tecidos. Sendo assim, o resultado desta inspeção era corretivo/reativo diante de uma não conformidade, além do que a inspeção era realizada sempre da mesma forma, nos mesmos locais e na mesma frequência em toda fábrica. A coleta de amostras era a forma de garantir a qualidade dos produtos e a fiscalização era responsável pela segurança dos alimentos.
Na inspeção com base no risco, os exames tradicionais serão somados a novas técnicas que permitam observar problemas de origem microbiana que hoje são cada vez mais frequentes e não causam lesões observáveis nas linhas de inspeção. A inspeção com base no risco dá atenção maior aos pontos mais vulneráveis e atenção menor àqueles que estejam sob controle adotando postura mais preventiva que reativa. Sua base de fiscalização é embasada nos registros de monitoramento da empresa, que são verificados pelo governo e por análises laboratoriais quando necessário.
Quais são as responsabilidades da indústria e do governo no sistema de inspeção com base no risco?
– Indústria: Garantir a qualidade dos processos e produtos; possuir programas desenvolvidos, implantados, mantidos e monitorados, visando assegurar a qualidade higiênico-sanitária de seus produtos.
– Governo: Verificar o cumprimento da legislação, avaliar a implantação e a execução dos programas de autocontrole.
Quais normas norteiam a implementação dos programas de autocontrole?
Basicamente 3 legislações:
- Portaria MAPA nº 368/1997 – Regulamento Técnico sobre as Condições Higiênico-Sanitárias e de Boas Práticas de Fabricação para Estabelecimentos Elaboradores Industrializadores de Alimentos.
- Portaria MAPA nº 46/1998 – Estabelece obrigatoriedade de implantação de Sistema de Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle nos estabelecimentos com SIF
- RIISPOA Decreto 9013/2017 – Regulamento de inspeção industrial e sanitária de produtos de origem animal.
Claro que um programa de autocontrole robusto não se limita apenas a estas legislações, mas elas são a base. Podem ser usadas outras complementares a fim de deixar o programa mais consistente.
O que é verificação oficial?
- A verificação oficial com base nos autocontroles é a atividade inerente à fiscalização, sob competência do SIF local, e visa avaliar, principal e especificamente, a implementação dos programas de autocontrole por parte das empresas registradas
- A verificação é documental e in loco e varia a frequência conforme o regime de inspeção do estabelecimento que pode ser permanente ou periódica
- As inconformidades serão registradas em formulários e não isentam o SIF da tomada de outras ações fiscais quando houver necessidade
- Foco do SIF na inspeção ante e post mortem
- As não conformidades registradas devem ser respondidas de forma imediata ou mediata pelos estabelecimentos por meio de plano de ação e avaliadas pelo SIF, segundo procedimentos internos do MAPA
- A verificação oficial deve avaliar os procedimentos numa visão externa ao processo, pois a inspeção não faz parte do programa da empresa. Essa verificação deve focar as ações e o cumprimento do programa pelas empresas conforme eles foram descritos. A identificação de não conformidades pode gerar ações fiscais por parte da inspeção.
Como deve ser feita a identificação de desvios (por parte da Inspeção)?
Ao identificar um desvio, deve-se buscar saber se a empresa também o identificou. Em caso positivo, buscam-se os registros dessa identificação e das ações corretivas em andamento. Se a empresa apresentou os registros e as ações corretivas foram adequadas, registra-se o desvio, mas não como uma não conformidade, indicando na planilha que há compatibilidade entre os achados da inspeção e os da empresa.
Caso o desvio não tenha sido identificado pela empresa ou esta não apresente os registros ou ainda se as ações corretivas não foram iniciadas ou não forem adequadas, deve-se avaliar a extensão e a gravidade do desvio para determinar se e qual ação fiscal será tomada. Se foi identificada perda de controle (desvio grave com impacto em saúde pública ou nos interesses dos consumidores, ou ainda um desvio recorrente e que a empresa tem visível dificuldade em corrigir, deve-se lavrar os termos de apreensão ou suspensão (ação cautelar para impedir o agravamento da não conformidade) e ainda um auto de infração para notificar a empresa das sanções às quais ela está sujeita.
Caso não seja identificada perda de controle por parte da empresa, registra-se a não conformidade e exige-se a correção em plano de ação.
A definição de perda de controle é uma área “cinzenta” de muita discricionariedade. Muitas vezes o que é perda de controle para um auditor não é para outro. Tudo depende da gravidade e extensão do desvio, histórico da empresa e da atitude para solucionar e corrigir o problema.
O que são Áreas de Inspeção e Unidades de Inspeção?
- Áreas de Inspeção
- Seção ou setor com seus equipamentos, instalações e utensílios incluindo forro, paredes, piso, drenos e outras estruturas eventualmente presentes.
- Unidades de Inspeção
- Subdivisão de uma área de inspeção que compreende o espaço tridimensional onde está inserido o equipamento, instalações e utensílios, limitada por parede, piso e teto, levando-se em consideração o tempo necessário para realização da inspeção visual das superfícies. Uma AI pode ser constituída por várias UI e sua divisão depende de critérios técnicos que podem variar de acordo com a planta do estabelecimento.
É necessário lembrar que os conceitos aqui apresentados são a base para os programas de autocontrole verificados pelo MAPA, possuem base no CODEX e outras legislações internacionais. Muitos conceitos são semelhantes, porém pode haver pequenas variações no seu entendimento.
A seguir apresento alguns links utilizados para a construção destes posts:
http://iris.paho.org/xmlui/bitstream/handle/123456789/34152/perspectivaanalise-por.pdf?sequence=1
https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1111408/1/final9146.pdf
https://www.maxwell.vrac.puc-rio.br/6062/6062_3.PDF
https://www.manutencaoemfoco.com.br/rbm-manutencao-baseada-em-riscos/