Segurança do corante dióxido de titânio está sendo questionada

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No Brasil e no mundo, o dióxido de titânio, também conhecido como INS 171 ou E171, é usado como aditivo alimentar. Por ser disponível, barato, extremamente branco e brilhoso, ele é amplamente adicionado como corante em confeitarias, produtos lácteos e molhos brancos. 

Seu uso é regulamentado pelos órgãos reguladores em diversos países. No Brasil, a ANVISA autoriza seu emprego em alimentos, pois aparentemente este aditivo é seguro para consumo humano. Contudo, a sua real segurança é controversa, principalmente por ser adicionado em tamanho nanométrico, ou seja, com uma de suas dimensões menor do que 100 nm. A estimativa é de que pelo menos 36% do TiO2 presente nos alimentos seja em nanoescala.

A toxicidade de nanopartículas em geral já foi discutida em um post anterior. Para este caso específico, nos últimos 15 anos, diversos estudos avaliaram seus possíveis efeitos tóxicos. Os estudos in vitro evidenciaram efeitos deletérios em células humanas.  Em modelos in vivo, diversos autores reportaram danos no organismo de animais após exposição aguda. Dentre estes danos, verificaram o surgimento, em ratos, de injúrias no fígado e no coração, resposta inflamatória exagerada no cérebro, dano ao DNA em células de diferentes tecidos e danos e redução na resposta imune.

Já que os estudos científicos sugerem possíveis efeitos tóxicos das nanopartículas de dióxido de titânio, como é possível que seu uso ainda seja liberado? Primeiramente, os resultados obtidos usando modelos animais in vitro e in vivo não podem ser extrapolados para os seres humanos. Além disso, a regulamentação é para o uso de micropartículas de dióxido de titânio e não prevê o uso como nanopartículas, ou seja, este ainda é um caso omisso.

A boa notícia é que, recentemente, um estudo francês publicado no jornal Scientific Reports da Nature, editora internacional de grande relevância acadêmica, usando um modelo in vivo e com exposição alimentar equivalente à dos humanos chegou a conclusões semelhantes aos demais estudos, reforçando a controvérsia da segurança no consumo deste aditivo. Como resultado, os ministros franceses da Economia, Saúde e Agricultura, solicitaram à Agência Nacional de Segurança Sanitária da Alimentação, Ambiente e Trabalho da França (ANSES) uma reavaliação da segurança do dióxido de titânio, cujo resultado deverá ser publicado até março deste ano.

Bem, parece que um primeiro passo foi dado para a solução da questão do uso de nanopartículas de dióxido de titânio em alimentos. Resta a dúvida se, em caso de mudança da regulamentação do uso deste aditivo na França, o Brasil vai reavaliar a sua regulamentação. Estaremos acompanhando!

Para mais detalhes do estudo:

BETTINI, Sarah, et al. Food-grade TiO2 impairs intestinal and systemic immune homeostasis, initiates preneoplastic lesions and promotes aberrant crypt development in the rat colon. Scientific Reports, 7, 2017.

Demais referências

BU, Qian et al. NMR-based metabonomic study of the sub-acute toxicity of titanium dioxide nanoparticles in rats after oral administration. Nanotechnology, v. 21, n. 12, p. 125105, 2010.

DUAN, Yanmei et al. Toxicological characteristics of nanoparticulate anatase titanium dioxide in mice. Biomaterials, v. 31, n. 5, p. 894–899, 2010.

 JIN, Taiyi; BERLIN, Maths. Chapter 57 – Titanium. In: NORDBERG, Gunnar et al (Org.). Handbook on the Toxicology of Metals. 4. ed. San Diego: Academic Press, 2015. p. 1287-1294.

KOENEMAN, Brian A. et al. Toxicity and cellular responses of intestinal cells exposed to titanium dioxide. Cell Biology and Toxicology, v. 26, n. 3, p. 225–238, 2009.

LANKOFF, Anna et al. The effect of agglomeration state of silver and titanium dioxide nanoparticles on cellular response of HepG2, A549 and THP-1 cells. Toxicology Letters, v. 208, n. 3, p. 197–213, 2012.

LARSEN, Soren  et al. Nano Titanium Dioxide Particles Promote Allergic Sensitization and Lung Inflammation in Mice. Basic & Clinical Pharmacology & Toxicology, v. 106, n. 2, p. 114–117, 2010.

LIU, Shichang et al. Oxidative stress and apoptosis induced by nanosized titanium dioxide in PC12 cells. Toxicology, v. 267, n. 1–3, p. 172–177, 2010.

PERIASAMY, Vaiyapuri Subbarayan et al. Identification of titanium dioxide nanoparticles in food products: Induce intracellular oxidative stress mediated by TNF and CYP1A genes in human lung fibroblast cells. Environmental Toxicology and Pharmacology, v. 39, n. 1, p. 176–186, 2015.

SAQUIB, Quaiser et al. Titanium dioxide nanoparticles induced cytotoxicity, oxidative stress and DNA damage in human amnion epithelial (WISH) cells. Toxicology in Vitro, v. 26, n. 2, p. 351–361, 2012.

SHENG, Lei et al. Nano-sized titanium dioxide-induced splenic toxicity: A biological pathway explored using microarray technology. Journal of Hazardous Materials, v. 278, p. 180–188, 2014.

SHIN, J. A. et al. Nanosized titanium dioxide enhanced inflammatory responses in the septic brain of mouse. Neuroscience, v. 165, n. 2, p. 445–454, 2010.

SHUKLA, Ritesh et al. ROS-mediated genotoxicity induced by titanium dioxide nanoparticles in human epidermal cells. Toxicology in Vitro, v. 25, n. 1, p. 231–241, 2011.

SYCHEVA, Lyudmila et al. Investigation of genotoxic and cytotoxic effects of micro- and nanosized titanium dioxide in six organs of mice in vivo. Mutation Research/Genetic Toxicology and Environmental Mutagenesis, v. 726, n. 1, p. 8–14, 2011.

THURN, Kenneth et al. Endocytosis of titanium dioxide nanoparticles in prostate cancer PC-3M cells. Nanomedicine: Nanotechnology, Biology and Medicine, v. 7, n. 2, p. 123–130, 2011.

TOMANKOVA, Katerina et al. Cytotoxicity, cell uptake and microscopic analysis of titanium dioxide and silver nanoparticles in vitro. Food and Chemical Toxicology, v. 82, p. 106–115, 2015.

WEIR, Alex et al. Titanium Dioxide Nanoparticles in Food and Personal Care Products. Environmental Science & Technology, v. 46, n. 4, p. 2242–2250, 2012.

20 thoughts on

Segurança do corante dióxido de titânio está sendo questionada

  • Caroline Piovesan

    Boa noite!

    O uso do dióxido de titânio em uso em pigmentos utilizado na produção de embalagens também está sendo questionado?

    • Alessandra Barreto

      Dentro do recorte de estudos usados para embasar o post, não há referencia sobre o dióxido de titânio em embalagens apenas enquanto aditivo no alimento. Então, o questionamento é específico quanto ao uso como aditivo. Porém, é de se questionar seu uso enquanto componente de embalagens e filmes uma vez que há possibilidade de dissociação e “contaminação” do alimento.

      • Isabella Cristina

        Ola Alessandra,
        gostaria de saber se o dioxido de titanio que vem, por exemplo, em suplementos vitamínicos que compramos em farmacias também estão dentro deste questionamento.
        Grata,
        Isabella

        • Alessandra Barreto da Silva

          Prezada Isabella, obrigada pelo seu contato. Eu usei diversos estudos sobre exposição oral do dióxido de titânio, que não especificam a destinação do aditivo mas apenas deixam claro a exposição alimentar. Apesar de que nenhum dos estudos menciona especificamente este aditivo nos suplementos vitamínicos, caso sua adição seja também em escala nanométrica, sem dúvida este uso é questionável uma vez que há a exposição oral. Somente uma avaliação específica (caracterização do aditivo no suplemento) poderia indicar se é ou não adicionado em nanoescala.

  • a. l. albarelli

    Alessandra…
    Saudações. Congratulações pelo seu trabalho. Qualidade incontestavel!
    A. L. Albatelli
    Médico

    • Alessandra Barreto

      Prezado A. L. Albatelli, obrigada pelo cumprimento. O reconhecimento é a melhor recompensa. Fique a vontade para fazer qualquer pergunta pois responderei com prazer!

  • NicolauNiveasoft

    Autora ja tem opinião formada contraria quando escreve. Isto é muito triste pois em um assunto tecnico, quimico, biologico deveria ser neutra, baseando apenas nas evidencias.
    Quer ver?
    “A boa notícia é que, recentemente, um estudo francês publicado no jornal Scientific Reports da Nature, editora internacional de grande relevância acadêmica, usando um modelo in vivo e com exposição alimentar equivalente à dos humanos chegou a conclusões semelhantes aos demais estudos, reforçando a controvérsia da segurança no consumo deste aditivo”
    Ué, por que isto seria uma boa noticia? Por que tem ideologia contraria a químicos em alimentos? Estava esperando esta informação e achou? isto a torna boa?
    Isto é uma má noticia para todos.

    Grandes chances de apagar o comentário, editar o texto e seguir escrevendo… mas pelo menos se questione sobre ser parcial em assuntos tecnico.

    • Marcelo Garcia

      Muito obrigada por participar, Nicolau. Não apagamos comentários de nossos leitores, a menos que sejam ofensivos, de baixo calão, manifestem preconceito, difamação, o que não é o caso.
      No Food Safety Brazil temos colunistas com opiniões muitas vezes diametralmente opostas do universo de alimentos e suas questões polêmicas. Publicamos todas as versões, desde que estejam de acordo com a temática do blog (segurança de alimentos) e respeitem os critérios internos de editoração. Primamos pela exposição de toda a informação possível, verdadeira e de qualidade. Se determinado estudo faz um colunista celebrar, é a opinião dele, que pode ter o apoio ou não do leitor, se entusiasmar ou não com o fato. Desse modo, respeitamos e sabemos que nossos leitores são críticos e preparados e que tem sua própria visão sobre os conteúdos, da mesma forma que nossos colunistas.”

      Juliane Dias, editora-chefe

    • Daniel

      A boa notícia amigão, é que poderemos realmente saber se essa porcaria faz mal ou não!! Sua preocupação deveria ser com o assunto é não com a postura da autora. Se o site é sobre segurança alimentar e você só está prestando atenção no que não interessa ou é analfabeto funcional ou tem algum interesse no de mais uma porcaria empurrada pela indústria para diminuir seus custos. Aí, questiono sua parcialidade, como fez com a autora.

  • Arnaldo F

    Sou radicalmente contrário aos abusos da indústria alimentícia pós-Segunda Guerra Mundial.

    Claramente optou-se por uma lógica de mercado onde “o que é bom é o que vende” (como hoje na cultura, principalmente na música) e não o que nutre, o que alimenta.

    A rigor, podemos mesmo questionar o rótulo de indústria “alimentícia”, dado que a alimentação em si toma um lugar cada vez mais secundário.

    A indústria vem adotando simulacros químicos de sabor, cor, textura, aroma etc. que vão ao encontro do gosto das massas, embotando o paladar e criando um desserviço tanto nutricional quanto gastronômico.

    Gosto muito da postura da cozinheira midiática Rita Lobo que diz: “Se o rótulo tem um monte de palavras que lembram a aula de química, não compre, não coma, é imitação de comida!”

    MAS sou obrigado a concordar com o Nicolau, do comentário acima. Também me causou estranheza o “boa notícia” diante da descoberta de indícios da toxicidade do dióxido de titânio.

    Uma postura infantil da autora do texto, que assim demonstra (por um verdadeiro ato falho) estar em uma cruzada mais ideológica que científica.

    Elementos químicos são usados há séculos, milênios, nos alimentos (alguns ultra nocivos, como chumbo em pó) e não podemos fechar os olho ao fato de que hoje reclamamos literalmente “de barriga cheia”.

    Ao contrário do atual senso-comum, absolutamente todos os índices dizem que estamos melhor nutridos hoje que há 200 anos. Não apenas a expectativa de vida aumentou brutalmente, como a altura média das pessoas também. As armaduras medievais de jovens cavaleiros de 30 anos não caberiam no pré-adolescente médio de hoje. A estatura média dos adultos na Europa era de 1,60 m., se tanto.

    Enfim, a indústria alimentícia teve e tem, sim, um papel importante na melhoria geral da nutrição e do desenvolvimento físico dos seres humanos. Inclusive, algumas doenças da velhice são muito mais presentes hoje pelo simples fato de que as pessoas agora vivem para desenvolvê-las.

    Antes a maioria das pessoas morria jovem, sem tempo para desenvolver doenças degenerativas.

    Nada disso justifica o atual abuso da indústria, fique claro. Precisamos estancar esse louco, irresponsável e ganancioso uso de pesticidas, conservantes, umectantes, espessantes, edulcorantes, corantes etc. cada vez mais inorgânicos e tóxicos.

    Pior: o Brasil é o paraíso do vale-tudo industrial. Um exemplo em mil: os edulcorantes (adoçantes) artificiais são cada vez mais usados em produtos “comuns” (não diets), substituindo o açúcar, indicando que a produção química está se tornando mais barata – mesmo no Brasil!! – que a da sacarose (nosso açúcar de cana).

    É cruel: os ricos (e bem informados) migram para o (caro) açúcar orgânico não refinado, enquanto a massa mergulha (sem saber, pois não lê as letrinhas minúsculas dos ingredientes) em produtos adoçados com aspartame, sacarina monossódica, ciclamato etc.

    Enfim, não vamos comemorar más notícias para a química, porque ela não é radical e necessariamente ruim. Mas que temos um caminho enorme para enquadrar (e eliminar) a poderosíssima química ruim, lá isso temos.

  • Eduardo

    Bom dia, quem trabalha diretamente com o TI02. Tem algum direto sobre ele ? Tipo insalubre ?

  • Maria Eduarda De Alencar Dias

    Olá, estive pesquisando sobre alguns pigmentos e encontrei um pigmento que usa Dióxido de Titânio e Mica, mas não para consumo alimentício. Gostaria de saber se o risco que vocês estão expondo é exclusivamente sobre a ingestão, ou se em contato com o corpo ele pode causar danos. Agradecida desde já.

  • emilio rugai

    falaram de Tio2 nos alimentos mas ele é largamente empregado na poduçao de farmacos quase todo comprimido usa TI O2. PERGUNTO: PORQUE É TAO USADO ?qual vantagem? qual efeito em nòs?
    agradeço à atençao

    • Juliane Dias

      Oi Emilio,
      Posso responder em relação à indústria de alimentos: ele é um corante branco, que dá uma aparência leitosa aos produtos e isso pode ser atraente para o consumidor. Em relação aos efeitos, a priori como todos os aditivos permitidos, é considerado seguro, mas sempre novos estudos são realizados.
      Juliane

  • vivianny sousa

    Olá, trabalho com o dióxido de titânio para sabonetes cold process, existe algum perigo desse produto no caso da não ingestão e sim apenas uso tópico?

  • Caroline Silveira

    Olá!
    Existe alguma certificação que as empresas que vendem dióxido de titânio precisam tirar antes de fornecer o produto para utilização como corante alimentício? Vi que dióxido de titânio pode ser utilizado para mais fins e queria saber se a ANVISA ou algum outro órgão controla essa distribuição.

  • Antony

    Em alguns esmaltes se usa o TIO2 como corante branco, este esmalte é usado em pratos e utilitários que usamos com alimentos. Se fala muito dos esmaltes a base de chumbo. Quer dizer que o TIO2 provavelmente é tóxico como o chumbo?

  • Eduardo

    Sou alérgico ao dióxido de titânio e sofro muito com isso, de um simples M&Ms , passando por diversos cosméticos e produtos de higiene pessoal, até a grande maioria dos medicamentos, muitos utilizam o dióxido de titânio, eu pessoalmente torço pela sua proibição em todo o mundo.

  • Angelo Góes

    Devo declarar o corante dióxido de titânio na rotulagem frontal como corante natural ou inorgânico ? É obrigatório a declaração?

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