Diferenças regulatórias em alimentos entre Chile e Brasil

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Mesmo tão perto, podemos ser tão diferentes. Começando com uma análise das diferenças culturais de cada país, o Brasil é um país tropical, com clima em geral quente e uma diversidade de fauna e flora gigantesca. O povo é alegre e receptivo, num total aproximado de 213 milhões de habitantes. Em relação à alimentação, podemos encontrar durante todo o ano diversos tipos de frutas e outros vegetais, que também podem variar de acordo com a região. Em relação aos alimentos industrializados, em sua maioria, encontram-se produtos de origem brasileira para consumo interno e alguns desses alimentos são exportados, principalmente carnes bovinas, carnes de aves, soja e outros vegetais. No Brasil, encontram-se produtos alimentícios importados, mas geralmente não são acessíveis à grande maioria da população devido aos preços elevados, resultado dos altos impostos para entrada e comercialização, o que reforça o consumo e o desenvolvimento das marcas brasileiras e a competição interna.

O Chile é um país de estações do ano bem-marcadas e com temperaturas extremas entre frio e calor. A vida aqui também é por estações, inclusive o que se come, as frutas, os vegetais e os costumes, de acordo com o clima. É um país separado por Cordilheira dos Andes, Deserto do Atacama, Patagônia e Oceano Atlântico, com um total aproximado de 19 milhões habitantes (10% do que possui o Brasil). Por outro lado, o Chile possui diversos “Contratos de Livre Comercio” com outros países, que possibilitam a chegada de produtos importados, principalmente alimentícios, de todo o mundo, em preços acessíveis, considerando os baixos custos de impostos e facilitando o acesso da população a produtos de qualidade e de diversos países diferentes. O Chile, como o Brasil, também é um país exportador, sendo o maior exportador de frutas do hemisfério sul e o maior exportador do mundo de frutas como blueberry, cerejas, uva de mesa e ameixas, além de pescados como salmão, vegetais como abacate e –  é claro  – o vinho!

Aprofundando as diferenças relacionadas às regulações entre ambos os países, em relação às embalagens de alimentos, por exemplo, o Chile possui, desde 2016, uma lei estrita sobre a rotulagem nutricional dos alimentos. A “Ley de Etiquetados de Alimentos No 20.606” determina que em todos os rótulos de alimentos são obrigatórios os selos de advertência na parte frontal da embalagem, que devem indicar ao consumidor excesso de compostos que podem estar relacionados com a obesidade e outras doenças não transmissíveis, a parte de proteger as crianças da exposição a produtos que podem ser prejudiciais à saúde. A lei obriga a informar os selos de: alto em açúcar, gorduras saturadas, sódio e calorias, valores que são calculados por 100g ou 100 mL de alimento com referências de valores máximos. Essa lei tem 3 etapas e o principal objetivo é diminuir gradativamente a quantidade máxima de cada composto em 100g/mL, com atualização dos limites máximos em cada etapa. No caso das empresas que importam produtos para o Chile, elas devem considerar incluir na etiqueta do alimento esses selos, quando aplicáveis, que podem ser diretamente impressos na arte da embalagem ou considerar uma etapa de inclusão de adesivos preparados internamente ou em um fornecedor terceirizado.

Imagem 1: Tipos de selos “ALTO EM” que se deve usar no Chile quando o alimento supera os limites estabelecidos para calorias, açúcares totais, sódio e gorduras saturadas

Já no Brasil, somente em 2020 a Anvisa aprovou as normas sobre rotulagem nutricional nos produtos embalados (RDC nº 429/2020, IN nº 75/2020), que regulamentam o uso de selos de advertência com excesso de açúcar, gordura saturada e sódio, e também especificam critérios adicionais na tabela nutricional, como açúcares adicionados. Os prazos de implementação variam dependendo do tipo / porte da empresa, entrando em vigor em 9 de outubro de 2022. Portanto, as empresas devem estar atentas à implantação desta rotulagem e se preparar em relação aos consumidores, considerando que muitas vezes, eles podem se assustar ao comprar um produto que se vende como saudável, mas que contém altos índices de açúcar, o que antes somente podia se evidenciar por uma revisão detalhada da tabela nutricional ou nem assim. Além disso, é necessário considerar que o consumidor atual é muito mais exigente e conectado. A falta de preparação das empresas para a implantação destas normas pode gerar diminuição de vendas. Isso pode afetar o status da marca, o que ocorreu com diversos negócios aqui no Chile, como por exemplo, cereais matinais, que de um dia ao outro passou a levar selos de advertência, confundindo o consumidor que acreditava que o produto era “saudável”. Na preparação para implementação das normas, recomenda-se que as empresas revisem suas formulações, comunicações com o consumidor e proposta / projeção da marca.

Imagem 2: Tipos de selos “ALTO EM” que serão usados no Brasil quando o alimento superar os limites estabelecidos para calorias, açúcares totais, sódio e gorduras saturadas

Outra diferença nas regulações refere-se aos planos de amostragem de microbiologia. Em uma análise simples de parâmetros microbiológicos em produtos de chocolates, por exemplo, no Chile utiliza-se a normativa RSA “Reglamento Sanitario dos Alimentos” DTO. N° 977/9 que solicita para análises microbiológicas somente o microrganismo Salmonella (em 50g, com um n=5).

Já no Brasil utilizava-se somente a  RDC 12/2001, mas houve sua revogação e substituição pela  IN N° 60/2019 que incorporou novos riscos, contribuindo para um detalhamento mas rigoroso sobre as categorias de produtos e solicitando novas análises microbiológicas. No blog Food Safety Brazil, esse assunto foi comentado no post A RDC 331/2019 e a IN 60/2019 entraram em vigor em 26 de dezembro de 2020. E agora?

De acordo com essa instrução, para chocolates maciços há necessidade de analisar Salmonella (25g, n=5) e adicionalmente Enterobactérias. Também determina que, se são chocolates com recheios, deve-se incluir análises de Bolores e Leveduras e dependendo do tipo de recheio, como perecível, deve incluir análises de Estafilococos coagulase positiva. Com essa pequena comparação, para uma categoria somente, podemos concluir que a norma brasileira atualizou-se e atualmente inclui novos microrganismos, além de ser mais detalhada em relação a categorias e diferenciação dos itens de alimentos, comparada com a RSA Chilena.

Essa comparação vale somente para as vendas internas de cada país. Considerando que ambos os países são exportadores, a gama de legislações pode aumentar, sendo necessária uma gestão robusta para área de regulatórios com objetivo de facilitar a visualização, otimizar processos e reduzir custos e retrabalho.

Finalmente podemos concluir que independentemente da distância física, da cultura, da quantidade de habitantes ou de regulações, podemos ser similares em alguns aspectos e diferentes em outros. O mais importante é poder compartilhar os conhecimentos entre ambos os países, e assim aprimorar e atualizar o gerenciamento da qualidade em nosso continente. Por que não pensar que em algum momento possa haver uma padronização em nível de continente latino-americano? Seria incrível poder simplificar toda a gestão regulatória e de qualidade para as empresas, para os profissionais da área e para os outros países que desejarem exportar para nós!

Sarah Arcuri Eluf Kindermann é Factory Quality Manager em Nestlé Chile S.A

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