1) Que autocrítica o Ministério da Agricultura tem feito dos processos de inspeção de produtos de origem animal nos últimos anos? Estamos no caminho certo?
R. Inicialmente, gostaria de destacar que o termo “autocrítica” levanta uma questão muito importante que é a capacidade do Serviço Público desenvolver indicadores e métricas de auto-avaliação que captem o impacto das ações na vida dos cidadãos. Em outras palavras, os indicadores, por exemplo, devem medir a redução da exposição dos consumidores aos perigos químicos (resíduos de antibiótico, etc.) ou biológicos (bactérias patogênicas) veiculados pelos alimentos em decorrência das ações de inspeção, em vez de medir o número de fiscalizações realizadas num determinado período – o que não representa um indicador adequado de desempenho da instituição. A falta de instrumentos efetivos de mensuração de desempenho poderá inviabilizar uma avaliação criteriosa e a identificação de necessidades de melhorias.
Portanto, reconhece-se que, embora o Ministério tenha obtido alguns avanços nós últimos anos, é preciso modernizar a gestão implantando um modelo voltado para resultados, rever os processos de inspeção e implantar indicadores e métricas que permitam orientar a adoção de melhorias no Sistema.
Essa modernização da gestão tem que se ajustar às atribuições do Ministério e dos serviços de controle de alimentos em particular, os quais apresentam características operacionais que os diferenciam de outros órgãos públicos. O MAPA não gera benefícios diretos aos cidadãos (não produz alimentos), é uma instituição indutora do desenvolvimento, de melhorias dos processos de produção, da implantação de estratégias de gerenciamentos da produção de alimentos seguros, do ponto de vista da saúde pública. Portanto, as estratégias de gestão não devem se basear apenas nos procedimentos de inspeção ou fiscalização, mas, devem focalizar também as fragilidades dos processos de produção de alimentos, apoiando as cadeias produtivas na busca de soluções técnicas que assegurem a qualidade sanitária dos alimentos oferecidos à população.
2) Em relação à gestão, quais são as necessidades mais destacáveis do MAPA?
Recentemente, foram diagnosticadas as principais necessidades do MAPA, quais sejam:
- Reforçar o foco do MAPA no atendimento às necessidades da sociedade;
- Legitimar e aprimorar o desdobramento do planejamento de médio e longo prazo;
- Definir planos de ação para garantir o alcance das metas previstas no Plano Plurianual, nos Planos Operativos, e demais instrumentos de registro e viabilização de ações;
- Implementar/aprimorar sistemáticas de acompanhamento dos resultados (planejado X realizado), dos planos de ação e dos programas;
- Integrar processo de gestão estratégica, planejamento, orçamento e desenvolvimento e gestão de pessoas;
- Aumentar a produtividade dos processos e da estrutura organizacional – capacidade de entrega/realização;
- Reestruturar os processos de gestão de pessoas, contemplando, entre outros a revisão do plano de carreiras e de meritocracia para os servidores;
8. Criar um novo processo decisório baseado em instâncias, alçadas e comitês internos.
Com base nesse diagnóstico, o MAPA pretende priorizar frentes de trabalho que possibilitem a criação de condições gerenciais indispensáveis para a melhoria e inovações continuas da qualidade dos serviços prestados à sociedade brasileira, à melhoria da utilização do orçamento sem redução dos serviços prestados e à valorização do servidor público. O modelo de gestão (Projeto de Arquitetura Organizacional) a ser utilizado, envolve os seguintes pilares:
- Pessoas – competências institucionais; competências humanas; dimensionamento de pessoas; capacitação; plano de carreira;
- Tecnologia – integração de sistemas; desenvolvimento de sistemas;
- Informação – gestão do conhecimento e informação; documentos técnicos; documentos de expediente; segurança da informação; carta de serviço;
- Processos – mapeamento, aprimoramento e implementação;
- Estrutura Organizacional – elaboração de nova estrutura e regimentos internos;
Esses pilares organizacionais desenvolvidos proporcionarão: processos de trabalho racionalizados e informatizados, contribuindo para a eliminação da sobreposição de esforços e recursos, e diminuição do tempo de resposta dos processos; especialização adequada dos servidores, baseadas nas competências requeridas para cada processo; arquitetura/estrutura organizacional menos burocrática e aderente aos processos de serviço; integração dos processos que compõem a Gestão Institucional (planejamento estratégico, planejamento setorial, orçamento, execução orçamentária) do MAPA; melhoria na qualidade e agilidade dos serviços prestados à sociedade e ao agronegócio; transparência e impessoalidade; direcionamento do trabalho para o alcance de resultados.
3) O que trabalhos tem sido feito para assegurar transparência e melhoria nos processos de gestão do MAPA?
Com relação à transparência, estão disponíveis no sítio do MAPA (internet), de forma clara e sistematizada, informações relacionadas às suas áreas de competência: política agrícola, cooperativismo, desenvolvimento sustentável, assuntos afetos as áreas animal e vegetal, entre outros.
Cabe destacar que, preocupado com o atendimento aos seus clientes e cidadãos, sobretudo visando garantir o acesso à informação e o pleno exercício da cidadania, o MAPA foi um dos primeiros Ministérios a cumprir o que determina a Lei de Acesso à Informação (Lei n.º 12.527/2011), tendo instituído e inaugurado o Serviço de Informação ao Cidadão (SIC) e a abertura da página de “acesso à informação” no inicio do mês de abril.
Além disso, está em fase final a reestruturação da Secretaria-Executiva, que prevê a criação de uma área específica para acompanhamento da gestão interna, envolvendo a instituição de práticas de controle, conformidade, gerenciamento de riscos, acompanhamento de custos e de resultados, além da formação de um núcleo de produção de informações de apoio à gestão.
Quanto à melhoria dos processos, estão sendo desenvolvidos trabalhos de mapeamento utilizando a Cadeia de Valor dos Macroprocessos do Ministério, elaborada com base nos assuntos da área de competência do MAPA, consoantes disposições da Lei Nº 10. 683, de 28 de maio de 2003. Essa atividade trará ao MAPA padronização de conceitos e organicidade das ações, o que é fundamental para uma melhor gestão.
4) Comparado com outros órgãos análogos, como por exemplo o USDA, como nosso Ministério é visto lá fora?
R. O USDA, a partir da década de 1980, iniciou uma revisão dos procedimentos de inspeção, os quais vêm evoluindo com o passar do tempo, provocando uma profunda mudança no modelo do Sistema de Inspeção de Carnes dos Estados Unidos.
Gradativamente, o USDA afasta-se do chamado modelo tradicional, caracterizado pela aplicação de técnicas sensoriais de inspeção rotineiramente aplicadas por servidores públicos, independente dos riscos à saúde púbica implicados nos processos de produção. Por outro lado, O USDA introduz estratégias baseadas nos riscos que efetivamente ocorrem nos processos de produção e induz a cadeia de produção a aplicar métodos proativos de controle dos perigos à saúde coletiva.
A inspeção tradicional alinha-se ao modelo burocrático ortodoxo de gestão pública, caracterizado por estrutura organizacional mecanicista, hierarquizada, verticalizada e rígida. Os procedimentos de inspeção com base no risco alinham-se à Gestão Pública para resultados porque as atividades são planejadas com base em alvos pré-definidos, onde o resultado alcançado é mais importante que o procedimento de controle utilizado.
Além disso, já foi demonstrado que essas mudanças do modelo de gestão/inspeção, além de otimizarem a aplicação dos recursos públicos, ampliam a proteção dos consumidores frente aos perigos veiculados pelos alimentos.
Esse Sistema de Inspeção, inicialmente implantado nos Estados Unidos, recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Agência para Agricultura e Alimentação da ONU (FAO), está sendo implantado em vários países como Canadá, Estados-membros da União Européia, Austrália, Nova Zelândia, China, Japão, Rússia e etc.
Embora o Brasil tenha alcançado a liderança mundial nas exportações de carne, a nossa permanência nesta liderança vai depender da nossa capacidade de fazer os ajustes necessários no Sistema de Inspeção, ampliando as garantias relacionadas com a inocuidade dos alimentos.
5) O FDA, com o ato de Modernização da Legislação de Alimentos, decidiu “percorrer o mundo” auditando várias fábricas exportadoras brasileiras. Como isso foi visto pelos nossos Ministérios? Este assunto repercutiu também no MAPA?
R. As auditorias dos países consumidores nos serviços veterinários dos países produtores não é um fato novo. A novidade está no foco dessas auditorias: até meados dos anos de 1990, todos os estabelecimentos exportadores eram visitados e as eventuais restrições eram impostas individualmente aos estabelecimentos que demonstravam deficiências em seus controles; na atualidade, o foco das auditorias é a capacidade gerencial dos serviços veterinários, voltando-se muito mais para resultados (expressos em Nível de Proteção dos Consumidores aos perigos veiculados pelos alimentos) do que para os procedimentos de inspeção. Assim, eventuais restrições encontradas são impostas ao Sistema de Inspeção como um todo porque eventuais falhas são consideradas sistêmicas.
A legislação do FDA adota os mesmos fundamentos da legislação do USDA (inspeção com base no risco).
6) Que novidades as empresas podem esperar em relação a novas diretrizes legais?
R. O Ministério pretende conduzir uma ampla revisão da legislação, normas, diretrizes e etc., focalizando os riscos dos processos de produção. Para isso, pretende-se aplicar os conceitos da Análise de Risco associados às ferramentas de Gestão.
Toda a legislação, norma, diretriz, etc., preparada pelo Ministério da Agricultura, antes de ser submetida à consulta pública ou ser publicada, será validada usando-se a ferramenta denominada de “Indicadores Balanceados de Desempenho” (do inglês, “Balanced Scorecard” – BCS). Para isso, a Norma (diretrizes e etc.), na perspectiva da sociedade, deve permitir identificar claramente o valor público que será gerado; na perspectiva dos clientes/beneficiários, o segmento atendido e o valor agregado; na perspectiva dos processos internos, os requisitos que devem pautar os procedimentos de inspeção e controle dos alimentos; e na perspectiva da aprendizagem e crescimento, as competências que precisam ser desenvolvidas para que os objetivos sejam alcançados.
Diretor de Agronegócios do Banco do Brasil desde 2007. Graduado em direito pelo Centro Universitário de Brasília, MBA em Altos Executivos pela USP/FIPECAP. Funcionário do Banco do Brasil desde 1982. Representou o BB na câmara consultiva do café da BM&F, na câmara Setorial do Arroz no Ministério da Agricultura, Abastecimento e Reforma Agrária, na câmara setorial do Cacau, no conselho fiscal da Brasilprev, no Conselho Técnico do Centro de Inteligência do Café – CIC. Representante do BB na câmara temática do Seguro do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, no conselho superior do Agronegócio, COSAG da Fiesp, Federação da Indústria de São Paulo, no conselho de Agronegócio, – CONSAGRO, no Conselho Nacional de Política Agrícola – CNPA e na subcomissão de CréditoRural da Febraban.
Ana Claudia Frota
Usar Balanced Scorecard para avaliar propostas de leis, normas e diretrizes vai ser bacana demais!! Tem tanta coisa estranha por aí…ótima iniciativa!!
Fernando
Excelente entrevista, com perguntas extremamente pertinentes. Parabéns pela iniciativa!
marco aurelio sander
teremos ou não concurso para ffa em 2012?
Consuelo
A idéia é ótima, no entanto a indução que será provocada nas empresas a aplicar métodos proativos de controle dos perigos à saúde coletiva dependerá da maior rigidez do governo em adotar sanções severas em casos de detecção destes perigos ( a exemplo do que é feito nos EUA)
Pelo modelo atual de inspeção existe uma falsa impressão que a empresa controla seus processos e também pelo lado do Fiscal que inspeciona, uma falsa idéia que fiscaliza.
O processo de inspeção deve ser baseado em análise de risco feita pelo governo de forma urgente, priorizando saúde pública .
JAIME COSTA E SILVA
Realmente a iniciativa é válida, oportuna e de bom alvitre, porém tem que ser de decisão concisa , prática de curto prazo e desburocrratizada, pois temos exemplos de inciativas que emperraram na burocracia e muitas engavetadas por interesses “obscuros”, haja vista a revisão de nosso RIISPOA.
JAIME COSTA E SILVA
Realmente a iniciativa é válida, oportuna e de bom alvitre, porém tem que ser de decisão concisa , prática de curto prazo e desburocrratizada, pois temos exemplos de inciativas que emperraram na burocracia e muitas engavetadas por interesses “obscuros”, haja vista a revisão de nosso RIISPOA.
Marco Antonio do RS
Muito boa a entrevista, tiro um trecho para representar meu pensamento : é preciso modernizar a gestão implantando um modelo voltado para resultados, rever os processos de inspeção e implantar indicadores e métricas que permitam orientar a adoção de melhorias no Sistema.
Clovis
Gostei da entrevista, seja pelas perguntas, seja pelas respostas.
Porém não sou tão otimista quanto a isso virar realidade tão logo, pois entre as cabeças pensantes do MAPA e as mãos que colocariam em práticas essas ideias temos, temos um corpo de fiscais federais que não insistem no modelo ultrapassado.
Clóvis
http://www.clovisgoncalves.com.br