O minuto seguinte e o próximo dia já serão o futuro para o qual trabalhamos. Nos momentos em que pensamos, levamos nossos filhos às escolas, atendemos aos nossos clientes, enviamos e recebemos nossas mercadorias, embalamos e fazemos nossas compras nos mercados, nesse exato momento, centenas de matérias-primas estão abastecendo os processos para produzir a energia que nos levará a executar essas e outras tarefas, além da mais nobre, é claro, a nossa vida.
É a mágica da simultaneidade e da cumplicidade, porque nós, profissionais da área de alimentos, somos os propulsores da produção e da manutenção da vida. Trabalhamos por nós e para os que mais amamos. O produto do nosso trabalho não é só o alimento, são as novas ideias, as descobertas e os sonhos que surgirão dos corpos nutridos, num movimento incessante e dinâmico, porque, a todo instante, alguém está se alimentando.
Temos leis, normas e guias que se desdobram para que cada etapa de cada processo resulte em produtos seguros e apesar disso, da nossa excelência, conhecimento e dedicação, ainda há pessoas adoecendo depois de se alimentarem. Contaminantes em níveis excessivos e proibidos, fragmentos estranhos ainda são detectados nos alimentos; até agora, pessoas morrem de intoxicação alimentar, alimentos vencidos são encontrados à venda, há vítimas de contaminação cruzada ou da falta das boas práticas de fabricação.
Centenas de pequenas operações conectam-se e se integram para entregar um produto alimentício ao consumidor. Os meios de transporte, os fabricantes de embalagens, utensílios e produtos usados nas linhas industriais incluem um número tão expressivo de pessoas que somente uma ligação muito forte entre elas poderia entregar, juntamente com o produto, a garantia da inocuidade.
Os elos da vasta cadeia da produção do alimento estreitam-se, novas etapas são introduzidas, elementos recém-desenvolvidos são incorporados e documentações são atualizadas, mas será que todas as informações foram aprendidas?
Já estudamos que todas as operações podem ser melhoradas. A melhoria contínua da segurança do alimento está no profissional de olhos vigilantes e mente observadora, na indústria comprometida e no serviço bem prestado, nas legislações e normas atualizadas, na evolução dos ingredientes, mas o futuro da segurança em alimentos está na conscientização, ou melhor, no verbo conscientizar, que denota dinâmica e envolvimento.
É preciso garantir a universalização do conhecimento, do que já temos e daquele que está por vir. Grandes dimensões territoriais e desigualdades são obstáculos para acesso e disseminação de conceitos. Nem todos conhecem as premissas básicas da higiene e da manipulação de alimentos e nem todos entendem os riscos advindos da não prática dos cuidados necessários. Desafio ainda maior é obter a conscientização, de caráter individual e particular, e até íntimo, subjetivo. Quando somos conscientes fazemos o certo em quaisquer circunstâncias, quer sejamos observados ou não, é questão de consciência mesmo.
Não é impensável a possibilidade de encontrar colaboradores uniformizados da área de alimentos, que saem dos banheiros sem lavar as mãos e retornam ao local de manipulação. Podem ser vistos estabelecimentos alimentícios com estruturas revestidas com materiais rugosos e acabamento que não atende ao padrão sanitário, sendo que as normas estabelecem que deveria ser superfície lisa, clara e de fácil higienização.
Há casos de atendentes de lojas de alimentação que anotam os pedidos e eles próprios, sem qualquer higienização, pegam os ingredientes com as mãos para colocar nos pratos. Não se sabe, também, quantas pessoas falam diretamente sobre a nossa refeição pronta, colocada nos pratos, até o momento em que ela nos é servida. Há casos de restaurantes onde a estética e decoração prevaleceram sobre os conceitos das boas práticas de fabricação. Exemplos simplistas diante da complexidade dos processos de preparação no campo, nas indústrias ou no serviço, mas a causa da contaminação pode estar nos detalhes. Desenvolver e evoluir sem esquecer o fundamental no processamento do alimento, essa é a questão.
A capacitação dos profissionais da área de alimentos é sempre um aprendizado e um exercício determinante na conscientização para a segurança do alimento. Conquistar o interlocutor, conseguir a internalização do conhecimento necessário e obter o seu comprometimento na realização das suas tarefas, em todas as esferas, todos os dias, em todas as situações, porque ele está consciente do impacto de uma falha sobre a saúde humana, isso é, no meu ponto de vista, o futuro da garantia de um alimento seguro.
Locenir Fátima Vidorette Matsui é bióloga e profissional da Qualidade. Tem mais de 20 anos de experiência na área de alimentos, atuando em grandes empresas do ramo açucareiro, com desenvolvimento, implantação e monitoramento de sistemas da Qualidade e Segurança de Alimentos. Já trabalhou no Brasil, Síria, Argentina e Estados Unidos.
Este post foi o vencedor do Concurso Cultural Food Safety Brazil 2024