No último dia 12 de março a Board of Stakeholders do FSSC 22000 lançou uma nova lista de decisões, tema que foi inclusive discutido aqui semana passada.
Dentre as novidades, chamou atenção a Decisão #5:
“A ISO publicou um adendo na ISO 22000: 2018 em 24/02/2024 para incluir o requisito de mudanças climáticas na cláusula 4.1 e na nota da cláusula 4.2. Estas atualizações devem ser incluídas nas auditorias FSSC 22000 v.6.”
1. Entendendo o adendo da ISO
Esta decisão foi baseada em um adendo da ISO (International Organization for Standardization) da Suíça, lançado no mês passado, que você pode ler integralmente aqui. Ele sugere que o tema mudanças climáticas (falaremos mais sobre isso no tópico 2 deste post) seja incluído nos capítulos 4.1 e 4.2.
Seguem abaixo os tópicos da ISO nos quais este adendo sugere que as modificações sejam realizadas:
4.1 Compreender a organização e o seu contexto
A organização deve determinar questões externas e internas que sejam relevantes para o seu propósito e que afetem a sua capacidade de alcançar o(s) resultado(s) pretendido(s) do seu Sistema de Gestão de Segurança de Alimentos.
Adicionado:
A organização deve determinar se as mudanças climáticas são uma questão relevante.
4.2 Compreendendo as necessidades e expectativas das partes interessadas
A organização deve determinar:
– as partes interessadas relevantes para o Sistema de Gestão de Segurança de Alimentos.
– os requisitos relevantes destas partes interessadas.
– quais destes requisitos serão abordados através do Sistema de Gestão Segurança de Alimentos.
Adicionado:
Nota: As partes interessadas relevantes podem ser requisitos relacionados com as mudanças climáticas.
De acordo com a própria ISO, neste adendo, “a intenção é garantir que as questões das Mudanças Climáticas sejam consideradas pela organização no contexto da eficácia do sistema de gestão, além de todas as outras questões. Estas declarações adicionais em cada norma de sistema de gestão garantem que este importante tópico não seja esquecido, mas considerado por todas as organizações na concepção e implementação do sistema de gestão.”
Vou elucidar um pouco melhor este assunto “mudança climática”, para ajudar na compreensão deste requisito.
2. Mudanças Climáticas e Segurança de Alimentos
De acordo com a ONU, mudanças climáticas são alterações de longo prazo nas temperaturas e nos padrões climáticos. De acordo com esta mesma fonte, “essas mudanças podem ser naturais, devido a mudanças na atividade do sol ou a grandes erupções vulcânicas. Mas desde 1800, as atividades humanas têm sido o principal motor das alterações climáticas, principalmente devido à queima de combustíveis fósseis como o carvão, o petróleo e o gás.”
O gráfico abaixo, apresentado pela BBC, demonstra claramente como essas mudanças ocorrem. Ele mostra a média de temperatura na Terra em cada ano desde 1939, com um claro aumento, inclusive com destaque para valor recorde em 2023.
Fonte: What is climate change? A really simple guide (BBC)
O impacto das Mudanças Climáticas na Segurança de Alimentos é um assunto relativamente recente, e é discutido pela FAO no seu paper Climate change: Implication for Food Safety (2008).
Exemplos práticos comprovados que têm relação direta ou indireta com mudanças climáticas são:
- Aumento de ocorrência de micotoxinas em milho nos EUA e em regiões de clima temperado
- Aumento da ocorrência de parasitas em peixes e plantas de água doce
- Detecção de novas espécies de fungos toxigênicos na Europa
- Aumento na incidência de mastite em vacas
- Aumento na presença de Salmonella em aves
- Aumento do número de casos de Vibrio em frutos do mar
- Aumento de casos de metais pesados
Tal assunto já mereceu dois ótimos posts neste blog (leia aqui e aqui), por isso recomendo a leitura, e não vou ampliar mais a discussão aqui.
Para quem ainda quer mais informações, sugiro que leia os artigos Climate Change and Emerging Food Safety Issues: A Review e Climate change and food safety: A review. Também há textos curtos de entidades relevantes que valem uma olhada: Climate change and food safety (EFSA), Climate change and food safety (GCH Alliance) e How is climate change affecting the safety of our food? (FAO).
3. OK, mas como eu implemento este requisito?
Para a cláusula ‘4.1 – Compreender a organização e o seu contexto’, a organização, ao levantar questões internas e externas que impactam a Segurança de Alimentos, deve avaliar se no contexto das atividades que ela realiza as Mudanças Climáticas podem gerar impacto. Por exemplo: em um fabricante de óleo de milho instalado em país de clima temperado, incluir como questão externa relevante “aumento do número de casos de micotoxina devido a mudanças climáticas” faz sentido. Resumindo, a organização precisa entender seu contexto e fazer um estudo para avaliar se há algum impacto. Caso haja, inclui-se isso. Caso não haja, não é necessário inventar para atender requisito. Estas questões internas e externas são entradas para a Análise de Riscos e Oportunidades da cláusula 6.1. No exemplo dado acima, uma ação necessária, eventualmente, pode ser aumentar o número de análises do milho adquirido.
Para a cláusula ‘4.2 – Compreendendo a necessidade de partes interessadas’, a ideia é parecida. Ao levantar requisitos de partes interessadas, deve-se abrir a possibilidade de incluir assuntos relacionados a mudanças climáticas.
Vale lembrar que está definido um prazo curtíssimo para adequação: 01/04/2024.
Aguardemos mais novidades da FSSC 22000. O Food Safety Brazil está sempre de olho!