O blog já fez outros posts sobre insetos como alimentos e eles podem ser lidos aqui, aqui e aqui. Os insetos comestíveis têm atraído muito interesse ocidental nos últimos anos devido às suas vantagens nutricionais e ambientais. Entretanto, os consumidores continuam com certa aversão a uma classe de itens que não é tradicionalmente considerada comida. Provavelmente, porque o foco esteja frequentemente no nojo desse alimento. O objetivo deste post será trazer informações sobre essa tendência não tão nova assim.
TENDÊNCIA
Na 11ª edição europeia do Sustainable Food que ocorreu em Amsterdã no mês de julho de 2019, o senhor Mohrmann, presidente de uma empresa que cria insetos, disse que a tendência vegana está ajudando sua empresa pois os insetos estão fazendo a ponte entre esses dois mundos. Mohrmann afirma que os insetos possuem a mesma qualidade de proteínas que a carne, e essa criação pode ser tão sustentável como a agricultura orgânica. Segundo ele, até veganos estritos, que realmente estão do lado do bem-estar animal, têm consumido insetos como alimento pois acreditam que esta é uma solução melhor do que usar tanta terra para outros animais. Para Mohrmann, devemos explorar o potencial da proteína sustentável de insetos em produtos alimentares “reconhecíveis” e ele acredita que “se você deseja tornar os produtos aceitáveis, é necessário produzi-los em larga escala.” A produção de insetos é altamente adequada para a agricultura vertical, explicou, o que permite à empresa produzir mais proteína por metro quadrado. “O processo de alimentação automatizado permite uma distribuição de alimentação otimizada durante o ciclo de crescimento e elimina o desperdício de alimentos.”
SEGURANÇA DE ALIMENTOS
Ao desenvolver alimentos/rações a partir de insetos comestíveis e ingredientes à base de insetos, questões relacionadas à segurança de consumidores e saúde animal devem ser identificadas e mitigadas (por exemplo, microbiana, riscos químicos, toxicológicos e alergênicos). A Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) é um sistema preventivo adotado pela Comissão do Codex Alimentarius, pois há incidências de problemas com a segurança de alimentos em todo o mundo ligados ao consumo de insetos. Por exemplo: a síndrome de ataxia que pode ocorrer após o consumo do bicho-da-seda (Anaphe venata) é particularmente comum no sudoeste da Nigéria na estação das chuvas. O período de ampla disponibilidade de larvas coincide com a ocorrência da ataxia (prejuízo da capacidade de executar movimentos voluntários coordenados sem problemas). Evidências apontam a ocorrência em pessoas mal nutridas que são marginalmente deficientes em tiamina (vitamina B1) porque consomem uma dieta monótona de carboidratos contendo glicosídeos cianogênicos que se ligam à tiamina. Uma exacerbação sazonal da deficiência de tiamina a partir de tiaminases presentes em alimentos sazonais (como o bicho-da-seda) pode causar ataxia. É necessário um tratamento térmico completo para desintoxicar a enzima na lagarta para torná-la aceitável como fonte segura de proteínas de alta qualidade.
Devido à ampla aceitabilidade e consumo das larvas de Cirina forda (Westwood – Lepidoptera: Saturniidae) na Nigéria, foi realizado um estudo toxicológico sobre eles. A administração oral do extrato bruto das larvas foi tóxica para os ratos, entretanto o procedimento de ebulição e secagem ao sol das larvas eliminou possíveis neurotoxinas. Após serem fervidas e secas, as lagartas de mopane armazenadas podem ser propensas a fungos, diminuindo seu valor nutricional. Para manter a qualidade, as lagartas devem ser secas rapidamente e uniformemente após a colheita e o processamento e subsequentemente armazenados em local fresco e seco. Estudos mostraram que uma etapa de aquecimento é suficiente para a inativação de Enterobacteriaceae; no entanto, a formação de esporos, provavelmente introduzidas no solo, sobrevivem a esse tratamento.
PRESERVAÇÃO E PROCESSAMENTO
Como a maioria das espécies comestíveis de insetos é coletada na natureza, elas estão disponíveis sazonalmente, a menos que métodos de preservação permitam armazenamento por períodos mais longos. Algumas espécies de insetos nos países asiáticos são preservados por conservas, incluindo larvas de vespas, ninhada de formigas tecelãs, pupas de bicho da seda, insetos gigantes da água, grilos e gafanhotos. No entanto, a maioria das espécies oferecidas no mercado é vendida na hora. Assim sendo, muitos estão disponíveis apenas no início da manhã. A vida útil pode ser prolongada mantendo-os refrigerados ou podem ser vendidos fritos como alimentos prontos para consumo. Larvas de formiga tecelã e pupas de insetos vendidos nos mercados da Tailândia são colocados no gelo. Espécies de lagarta em países tropicais geralmente passam por algum processamento antes de serem vendidas no mercado. Por exemplo, no norte da Zâmbia, o processamento de lagarta para armazenamento a longo prazo em casa ou para venda envolve as etapas a seguir: (a) evisceração de lagartas vivas logo após serem coletadas do folhagem de plantas hospedeiras; b) assar as lagartas evisceradas sobre brasas, provenientes de fogueiras nas florestas, até que os adornos do corpo das cerdas e da espinha sejam queimados e endurecidos; (c) secar ao sol as lagartas assadas até ficarem crocantes; e (d) embalar as lagartas secas ao sol em sacos ou outro material.
O processamento de insetos comestíveis em produtos de consumo convencionais parece incentivar a entomofagia, como foi mostrado no Quênia, onde cupins e moscas de lago (Chaoboridae e Chironomidae) foram assados, cozidos no vapor e processados em bolachas, muffins, salsichas e pão com carne. Já nozes de sorgo e bambu misturadas com lagartas foram consideradas um alimento enriquecido com proteínas adequado para crianças de dez anos ou mais.
O processamento influencia o conteúdo nutricional dos insetos. Fracionar a lagarta aumentou o conteúdo e a digestibilidade das proteínas brutas, enquanto o cozimento as reduziu.
Portanto, métodos de processamento precisam ser investigados para promover a comercialização de insetos. No mundo ocidental, é provável que a aceitação do consumidor esteja associada ao desenvolvimento e implementação de uma estratégia de processamento apropriada (por exemplo, extração, purificação, e usando proteína de inseto como aditivo alimentar). Em seguida, as características da proteína precisam ser determinadas, por exemplo, solubilidade, estabilidade térmica e capacidade de gelificar, formar fibras, emulsificar e espuma, e as propriedades sensoriais precisam ser estabelecidas também.
Fontes:
Vegan-trend-boosts-potential-for-insect-protein-in-food-products?
Potential of Insects as Food and Feed in Assuring Food Security
Insects as food: Exploring cultural exposure and individual experience as determinants of acceptance
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