FSSC 22000: o que muda com o guia de cultura de segurança de alimentos

3 min leitura

Foi preciso esperar pela versão 5.1 até que a FSSC 22000 apresentasse a sua visão acerca da Cultura de Segurança de Alimentos e suas expectativas em relação às organizações certificadas.

É importante que se esclareça tratar-se de um Guia, o que seguramente não possui valor de requisito. Por outro lado, é, sim, um bom avanço, uma vez que alinha a FSSC a outras normas que já haviam largado na frente. Confira o original aqui.

No documento publicado ontem (03 de novembro de 2020), a FSSC faz questão de demonstrar seu alinhamento com a posição do GFSI – que abordou o tema ainda em 2018, e recebeu tradução do nosso grupo, podendo ser conferido aqui – e seu benchmarking, voltando o foco para o compromisso das lideranças de topo (seniores). Para o GFSI (e agora também para a FSSC), os elementos da Cultura de Segurança de Alimentos que estarão no radar das principais lideranças devem incluir, no mínimo:

– Comunicação;

– Treinamento;

– Feedback;

– Medições de desempenho.

Por tanta similaridade, a publicação da FSSC mais parece uma resposta ao GFSI e ao mercado. Trata-se de uma sinalização de que, sim, este tema importa. O Guia da FSSC 22000 tem o cuidado de pautar suas expectativas a partir das questões apresentadas anteriormente como recomendações pelo GFSI. Não soa tão bem, porém, a citação clara da FSSC 22000 aos processos de auditoria. Embora obviamente trate-se de um esquema de certificação, ao menos a Cultura de Segurança de Alimentos deveria ser preservada como uma instituição imaculada, alheia ao “fazer por fazer” ou “fazer em troca da certificação”.

A partir daí o documento da FSSC 22000 vira um enorme anexo que, ainda que seja interessante e oportuno, procura orientar o leitor a encontrar paralelos entre os requisitos que já conhecemos e a visão do GFSI. O caráter e a preocupação excessiva com os processos de auditoria transformam o anexo em claras orientações aos auditores. O que está diante dos olhos de quem lê é, claramente, a forma a partir da qual esperamos que as organizações certificadas sejam avaliadas. Não é certo, porém, que as organizações certificadas e os organismos certificadores estejam prontos para construir/avaliar algo tão subjetivo. É provável que exista muitas dificuldades no início, dado que a Cultura não é um objeto concreto e nem deve ser avaliado como tal.

É uma pena que este importante documento traga um viés tão claramente voltado para as avaliações, uma vez que existe um longo caminho de construção da Cultura de Segurança de Alimentos até que ela amadureça.

Se a FSSC pretende promover todo o conteúdo lançado há dois anos pelo GFSI, vale lembrar o que já foi publicado como orientações à implementação de um Programa de Cultura de Segurança de Alimentos, pautado nas seguintes dimensões:

  • Visão e Missão: comunicam a razão de ser de um negócio e como isso se traduz em expectativas e mensagens específicas para os seus membros;
  • Pessoas: são o componente crítico de qualquer Cultura de Segurança de Alimentos. Nosso comportamento e atividades contribuem para a Segurança de Alimentos e, potencialmente, diminuem ou aumentam o risco de doenças transmitidas por alimentos;
  • Consistência: refere-se ao alinhamento adequado das prioridades de Segurança de Alimentos com os requisitos de pessoas, tecnologia, recursos e processos para garantir aplicação consistente e eficaz de um programa de Segurança de Alimentos que reforce sua cultura;
  • Adaptabilidade: se refere à habilidade de uma organização a se ajustar a modificações de influências e condições e responder dentro de seu estado atual ou se mover a um novo estado;
  • Percepção de Perigos e Riscos: diferencia a Cultura de Segurança de Alimentos da cultura organizacional como um todo. O reconhecimento de perigos e riscos atuais e potenciais em todos os níveis e funções representa um elemento chave para construir e sustentar uma Cultura de Segurança de Alimentos.

Por experiência de anos com os programas de Cultura de Segurança de Alimentos, posso afirmar que qualquer guia oficial poderá prestar bom auxílio às organizações que pretendam avançar no tema. Um guia, porém, qualquer que seja ele, deve ser visto exatamente como tal: um guia. As organizações são estruturas extremamente complexas e cada ação proposta poderá responder de formas diametralmente opostas na empresa A e na empresa B. Compete a quem conduz este processo ter a sensibilidade para os ajustes finos. Preparo e experiência são fundamentais para perceber as nuances que separam o sucesso do fracasso ao lidar com a Cultura.

Boa leitura e, lembrem-se: comentários são sempre benvindos por aqui. Será um prazer conversar com vocês.

Um grande abraço!

6 thoughts on

FSSC 22000: o que muda com o guia de cultura de segurança de alimentos

  • Gabriele

    Gostaria de saber mais sobre seu trabalho. Temos uma fabrica de massas e recheios de pastéis. Sou farmacêutica e responsável por BPF aqui na fábrica, tenho tantas dúvidas sobre como implantar uma cultura correta de Segurança de Alimentos aqui.

    Ah e o meu maior desafio além das pessoas e de ser uma empresa familiar onde tenho que ensinar boas praticas ao meu pai, por exemplo, carrego comigo um Transtorno de Déficit de Atenção, consigo aprender tudo o que é proposto, só que tenho uma dificuldade imensa de colocar em prática por falta de organização mental.

    • Cristian Roque

      Oi Gabriele! Obrigado por compartilhar conosco sua história. No nosso dia-a-dia, lidamos com empresas tão diversas que não é nada fácil encontrar uma receita pronta. Posso te garantir que você não está sozinha! Pense em quantas outras pessoas convivem com a família no trabalho e precisam falar sobre BPF com elas! Sei como é difícil, mas também sei que é possível. Experimente implementar um avanço por vez, aos poucos. E use seu DDA de forma positiva, aproveitando sua capacidade de criar coisas novas e enxergar alternativas onde os outros só vêem problemas. Um grande abraço!

  • Silvana Chaves

    Cris, abordagem perfeita! Parabéns! Penso que cada vez mais devemos traçar treinamentos e workshops sobre cultura direcionado para as lideranças, pois assim fazemos um trabalho de formiguinha com quem realmente deve assumir e apoiar o tema. Qual sua visão sobre focar esforços na construção de novo mindset das lideranças em relação à cultura de segurança de alimentos?
    Afinal muitos ainda não compreenderam o novo PDCA das normas ISO. Querem as certificações, mas fecham os olhos ao que realmente precisa ser feito para criar a cultura requerida para manter suas certificações.

    • Cristian Roque

      Sil, acabei por descobrir que muitos de nós opinamos de forma semelhante em relação a esta abordagem. Talvez porque nossas aflições sejam bastante parecidas. E, sim, a liderança é chave neste processo. Obrigado pelo seu comentário.

  • isabel

    a partir de quando o esquema 5.1 será cobrado em auditoria

    • diego

      abril/21

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