SWOT, PESTEL e Cultura: tríade estratégica da segurança de alimentos

Profissionais da indústria alimentícia realizando análise estratégica com gráficos SWOT e PESTEL ao lado de uma linha de produção, representando a conexão entre contexto organizacional e segurança dos alimentos.
5 min leitura

Entenda por que o contexto da organização é mais estratégico do que parece

Quando falamos sobre certificações de segurança de alimentos, como a FSSC 22000, SQF etc. é comum que os olhos se voltem diretamente para as Boas Práticas, controle de perigos ou programas de pré-requisitos. No entanto, um dos pontos mais estratégicos e muitas vezes subestimado está logo no início da norma: a análise do contexto da organização.

Esse requisito é essencial para que a empresa construa um Sistema de Gestão de Segurança dos Alimentos (SGSA) que seja sólido, eficiente e conectado à realidade da operação e do mercado. Em outras palavras: sem entender onde sua empresa está inserida, é impossível gerenciá-la com eficácia.

Se a cultura da segurança dos alimentos não está conectada ao seu negócio, algo está fora do lugar

O que é o “Contexto da Organização”?

Segundo a ISO 22000:2018, a empresa deve:

  1. Identificar fatores externos e internos relevantes para seu propósito e que impactam a capacidade de alcançar os resultados esperados do SGSA.
  2. Entender as necessidades e expectativas de partes interessadas (clientes, órgãos reguladores, funcionários, fornecedores etc.).
  3. Monitorar e revisar essas informações periodicamente.

Isso inclui desde mudanças regulatórias até desafios operacionais e culturais. O objetivo é permitir que a empresa tome decisões baseadas em riscos e oportunidades reais, mantendo o sistema sempre ajustado à sua realidade.

Uma análise superficial pode gerar um sistema de gestão que:

  • Trata problemas genéricos, não os reais.
  • Não responde adequadamente a mudanças no mercado.
  • Ignora partes interessadas que influenciam diretamente a segurança dos alimentos.
  • Gera ações desconectadas da estratégia de negócio.

Já uma análise robusta permite:

  • Antecipar riscos e preparar planos de ação eficazes
  • Aproveitar oportunidades e inovar com segurança
  • Tomar decisões estratégicas baseadas em dados reais
  • Alinhar toda a organização com a cultura de segurança dos alimentos

Como fazer uma análise inteligente e não apenas burocrática?

Conecte a análise ao negócio

Não trate o tema como uma tarefa isolada. Relacione o contexto ao propósito, aos produtos e ao posicionamento da sua empresa. Um contexto mal definido leva a decisões erradas no controle de perigos, programas pré-requisitos e até gestão de crises.

Exemplo: Uma empresa que exporta para a Europa deve incluir legislações internacionais (como o Regulamento CE 178/2002) no contexto, mesmo que isso não esteja explícito nos requisitos locais.

Integre com a cultura de segurança dos alimentos

A cultura influencia diretamente o sucesso do SGSA. Uma análise inteligente considera:

  • Grau de maturidade cultural
  • Comportamento da liderança
  • Clareza na comunicação sobre riscos
  • Envolvimento da equipe em práticas preventivas
  • A comunicação interna entre setores
  • O engajamento da equipe na rotina de controles
  • O histórico de falhas e como elas são tratadas

Identifique riscos e oportunidades reais

Transforme a análise de contexto em decisões estratégicas:

Situação Identificada Risco Potencial Oportunidade Potencial
Alta rotatividade de pessoal Falhas na execução de controles Redesenhar processo de onboarding
Nova legislação sobre alergênicos Risco de não conformidade Investir em diferenciação de produtos
Demanda por alimentos plant-based Perda de mercado se não inovar Lançar nova linha funcional

Documente e atualize

Não basta fazer uma vez e esquecer. A ISO exige monitoramento e revisão contínua. Utilize:

  • Reuniões estratégicas periódicas
  • Indicadores (turnover, reclamações, recall, tempo de resposta)
  • Relatórios de auditorias e inspeções

Ferramentas práticas para entender o contexto da sua organização

I. Análise SWOT (Forças, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças)

Ajuda a mapear fatores internos (pontos fortes e fracos) e externos (ameaças e oportunidades).

Exemplo prático:

  • Força: equipe qualificada em APPCC
  • Fraqueza: alta rotatividade de operadores
  • Oportunidade: novo mercado consumidor com foco em produtos naturais
  • Ameaça: novas exigências regulatórias internacionais

II. Análise PESTEL

Permite explorar o ambiente externo com mais profundidade:

  • Político (legislação, estabilidade)
  • Econômico (inflação, poder de compra)
  • Social (mudanças nos hábitos de consumo)
  • Tecnológico (automação, rastreabilidade digital)
  • Ecológico (sustentabilidade, uso da água)
  • Legal (novas normas e regulamentações)

III. Matriz de Partes Interessadas

Identifica quem impacta — e é impactado — pelo sistema de gestão. Exemplos:

Parte Interessada Interesse/Expectativa
Clientes Alimentos seguros, confiáveis
Órgãos reguladores Conformidade legal
Fornecedores Parcerias estáveis
Funcionários Ambiente seguro e capacitação
Comunidade Sustentabilidade e responsabilidade social
O SGSA começa antes da produção.
O SGSA começa antes da produção

Como aplicar na prática?

Aqui vai um passo a passo direto para colocar esse requisito em ação:

  1. Monte um time multidisciplinar (qualidade, produção, manutenção, compras, RH)
  2. Reúna dados concretos (auditorias, indicadores, reclamações, tendências de mercado)
  3. Utilize ferramentas como SWOT, PESTEL e Matriz de Partes Interessadas
  4. Documente tudo com clareza. Pode ser em planilhas, relatórios visuais ou mapas mentais
  5. Atualize a análise sempre que houver mudanças internas ou externas significativas

A análise do Contexto da Organização vai muito além de um requisito normativo. Ela é a base para construir um sistema de gestão realista, forte e sustentável. Ignorar esse ponto é como montar um quebra-cabeça sem olhar a imagem da caixa: você até pode montar algo, mas dificilmente será o que realmente precisa.

Para quem atua na indústria de alimentos, entender o contexto organizacional é entender o negócio como um todo, com suas vulnerabilidades e potencial de crescimento. E é justamente esse entendimento que fortalece a confiança do consumidor, a reputação da marca e a competitividade no mercado.

Referências para análises: 

ABIA – Associação Brasileira da Indústria de Alimentos: publica relatórios de tendências, panorama econômico e dados de exportação/importação. Útil para identificar ameaças e oportunidades externas.

Euromonitor International / NielsenIQ / Mintel – Fornecem análises de consumo, comportamento do consumidor e tendências em alimentos. São fontes de inteligência de mercado.

SEBRAE – Inteligência Setorial: Alimentos e Bebidas – Oferece estudos sobre o setor no Brasil com foco em micro e pequenas empresas. Excelente para identificar fraquezas e oportunidades.

IBGE – Pesquisa Industrial Anual e Pesquisa da Indústria de Transformação – Trazem dados econômicos e de produção para a indústria alimentícia brasileira.

SENAI / FIESP / EMBRAPA Alimentos – Publicam análises e diagnósticos sobre produtividade, inovação e sustentabilidade no setor de alimentos.

ANVISA (Brasil) / FDA (EUA) / EFSA (Europa) – Suas publicações, guias e alertas fornecem dados para o mapeamento de ameaças regulatórias e sanitárias.

MAPA – Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Publica normas e diretrizes para determinados setores de alimentos. Pode influenciar diretamente o contexto legal e regulatório.

UNIDO – United Nations Industrial Development Organization – Projetos sobre segurança de alimentos e desenvolvimento industrial sustentável. Aborda questões externas como comércio internacional, cadeia logística e regulação ambiental.

ISO/TR 22398:2013 – Guidelines for exercises and testing for continuity and contingency plans – Útil na análise de ameaças que impactam a continuidade dos negócios, como desastres naturais ou falhas em fornecedores.

Food Safety Management: A Practical Guide for the Food Industry – Yasmine Motarjemi – Oferece uma abordagem prática sobre ferramentas de análise estratégica em segurança de alimentos.

Gestão da Segurança de Alimentos – Mario Sergio Telles – Livro nacional com exemplos aplicados à indústria brasileira, incluindo ferramentas de análise de riscos e contexto organizacional.

Ana Silvia Mattos Gonçalves é engenheira de alimentos, coordenadora de Segurança de Alimentos e Qualidade e especialista em assuntos regulatórios e qualificação de fornecedores.

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