Aline é nossa colunista que já transitou em multinacional alimentícia e agora atua na área da qualidade de um fabricante francês de nutracêuticos – segmento fronteiriço entre alimentos e medicamentos.
Como é nossa tradição, hoje ela nos concedeu uma entrevista, encabeçada por dois colunistas.
Juliane Dias: Por que participar como voluntária de um blog de segurança de alimentos?
Devemos para as outras pessoas com quem convivemos o mínimo de respeito e cuidado. E na minha opinião, é exatamente isto que segurança de alimentos representa, mas no cenário comercial de alimentos. É o tema mais básico, mais primitivo (não estou dizendo que é um tema fácil, mas, com toda certeza é essencial).
Qualidade e Segurança de Alimentos são coisas distintas.
Se um consumidor ingerir um suco com menos aroma ou cor do que o padrão, isto é um tema de falta de qualidade.
O máximo que pode acontecer é ele ficar chateado e reclamar para alguns amigos. E não voltar a comprar da marca, claro.
Mas se ele ingerir um suco contaminado, isto é falta de segurança de alimentos. É desrespeitoso!
Na minha concepção é inadmissível imaginar que alguma criança ficou doente ou passou mal porque não fizemos o nosso trabalho direito.
E é por isso fico feliz em poder ajudar qualquer colega da área que busque a maneira correta e responsável de fabricar e vender seus produtos.
Agradeço muito ao Blog Food Safety Brazil por me conceder esta oportunidade.
Cecília Cury: Qual sua opinião sobre uma norma que obrigaria o destaque da presença de lactose na embalagem do medicamento (na linha do PL 5368/09 rejeitado em 2012 sob alegada desproporcionalidade entre custo e benefícios ao consumidor) ?
Lactose é comumente utilizada como excipiente em comprimidos. Excipiente é o ingrediente que não traz o principio ativo do medicamento, mas é necessário tecnologicamente (para comprimir, por exemplo) ou então como veículo.
A intolerância a Lactose é geralmente dose dependente. Ou seja, mesmo as pessoas com maior intolerância a lactose podem consumir produtos com baixo teor de lactose. É recomendado, inclusive, que não retirem totalmente a lactose de sua dieta, pois eliminando-a totalmente do seu consumo tornam-se cada vez mais intolerantes. A ingestão de ¼ de xícara de leite é, inclusive, recomendado para estes casos.
¼ de xícara de leite contem aproximadamente 3,125 gramas de lactose (5%).
Os comprimidos pesam, em sua maioria, aproximadamente de 200 a 600 mg (no total).
O maiores pesam, no máximo, em torno de 1g.
Se o comprimido de 1g possuir em sua composição 70% de lactose (que é um valor já bastante alto e fora do comum para uma formulação), o consumo de cada comprimido agrega 700 mg de lactose – que é um valor significativamente inferior à dose acima mencionada. Se a pessoa for extremamente sensível, precisaria ingerir 4,6 comprimidos destes do exemplo (de tamanho e porcentagem de lactose acima do padrão) para sentir desconforto.
A baixa dosagem de lactose, atrelada à presença da formulação na bula e ao fato de que toda prescrição deve ser realizada pelo médico do paciente, talvez embase a justificativa de “desproporcionalidade entre custo e benefícios ao consumidor” utilizada para o arquivamento desta PL.
No entanto, toda informação para o cliente/paciente é benéfica.
Um caso que chama atenção, é o da sacarose.
Muitos xaropes são à base de sacarose, e não há informação em destaque sobre a presença de sacarose, a não ser a própria lista de ingredientes na bula – Embora tenhamos uma parcela bastante significativa de diabéticos no Brasil. Esta informação também é presente somente na bula.
Cecília Cury: É possível afirmar que a lactose utilizada em medicamentos seja segura para quem tem alergia à proteína do leite de vaca (que nada tem a ver com a lactose, a rigor).
É uma prática comum para as indústrias farmacêuticas (respeitáveis) avaliarem (tecnicamente e nos mínimos detalhes) as especificações/características das matérias-primas utilizadas, para garantir pleno conhecimento do que está sendo adicionado no medicamento/nutracêutico/cosmético produzido.
Todavia, o conceito de alergênicos ainda é muito recente para a industria farmacêutica. Este é um tópico bastante difundido para alimentos, não para farma.
A legislação para alimentos é muito mais clara e diretiva neste aspecto, o que força a indústria de alimentos a ter mais controles sobre este tema – principalmente devido aos volumes consumidos.
Contaminantes como solventes residuais, impurezas genotóxicas, metais pesados etc são comumente considerados nas matérias-primas do nicho farmacêutico.
Ou seja, a maturidade para tratar de alergênicos ainda está acontecendo na indústria farmacêutica.
Há algumas que já trabalham com o conceito, mas não está difundido entre toda a categoria.
Silvana
Parabéns Aline pela sua entrevista e pelo seu aniversário. Paz, amor saúde e muito sucesso!
Abraços
Silvana Chaves
Aline Santana
Muito obrigada, Silvana, pelos desejos de felicidade!
Um grande abraço!