O programa Replace Trans Fat da Organização das Nações Unidas (ONU) é um incentivo em nível global para a eliminação de gordura trans nos alimentos até 2023. No segundo semestre de 2020, a ONU relatou que mais de 58 países já haviam determinado o seu plano de ação mediante leis que entram em vigor até o final deste ano. A gordura interesterificada tem sido a alternativa mais amplamente utilizada para eliminar ou reduzir o uso industrial de gordura trans. Mas quais são suas características e potenciais efeitos na saúde humana?
Sabe-se que o consumo de gorduras trans está cientificamente associado à doença arterial coronariana, levando ao infarto e AVC, o que causa por volta de 500 mil mortes por ano ao redor do mundo, como citado pela ONU e PAHO (Pan American Health Organization). Os ácidos graxos trans elevam os níveis de colesterol LDL, conhecido como colesterol ruim, além de reduzir o HDL, conhecido como colesterol bom.
No Brasil, a RDC 332, da Anvisa, publicada em dezembro de 2019, e alterada em junho de 2021, determinou que a partir de 1º de julho de 2021 os óleos refinados industriais não podem exceder 2g de gordura trans/100 gramas de gordura total, bem como nos alimentos destinados ao consumidor final ou aos serviços de alimentação. Segundo Anselm Hennis, diretor da PAHO, tal regulamento melhorará a saúde e o bem-estar da população. O Brasil junta-se ao grupo de países nas Américas que já eliminaram o uso de gorduras trans em alimentos: Estados Unidos, Canadá, Chile e Peru.
A substituição da gordura trans tem sido possível pelo uso de óleos refinados por processos diferentes da hidrogenação parcial ou mesmo pelo uso de outras gorduras. Alimentos ultraprocessados como biscoitos, sorvetes e margarinas têm sido fabricados com o uso de gordura interesterificada. Apesar de surgir como uma alternativa às gorduras trans, estudos apontam que a interesterificada também pode aumentar os níveis de LDL, com efeitos mais acentuados observados em indivíduos hipercolesterolêmicos do que em indivíduos saudáveis.
A Sociedade Brasileira de Óleos e Gorduras publicou recentemente um estudo sobre o impacto da gordura interesterificada (SGBOG Informa 08 Edição 2021). No processo de interesterificação ocorre um rearranjo do posicionamento dos ácidos graxos nos triglicerídeos, combinando uma gordura de alto ponto de fusão (ácido graxo saturado) com um óleo vegetal de baixo ponto de fusão (ácido graxo insaturado). O resultado é uma gordura com propriedades plásticas, isenta de ácidos graxos trans.
Apesar das informações sobre o impacto da gordura interesterificada serem limitadas, há indicações de que os efeitos negativos (como acúmulo de colesterol ruim, além do aumento de açúcar no sangue) podem estar relacionados à proporção da mistura de óleo e gordura utilizados no processo de interesterificação.
Segundo a American Society for Nutrition, o uso da gordura interesterificada é uma alternativa viável para eliminação da gordura trans, tanto pelo processo de produção (químico ou enzimático), quanto por suas funcionalidades (ponto de fusão, estabilidade à oxidação, entre outras), mas os estudos atuais ainda não determinaram com certeza os riscos à saúde, existindo lacunas importantes a serem avaliadas.
Por um lado, o setor industrial adapta seus produtos e processos sem gordura trans, e por outro, cabe aos consumidores permanecerem alertas e acompanhar os estudos referentes a todas as alternativas disponíveis.
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Humberto
Excelente abordagem. Traz o assunto à tona, mostra mais de um lado e não é doutrinário. No final, deixa a questão em aberto, convidando o leitor a se manter atento e informado.