Um gestor da qualidade de uma fábrica de beneficiamento de castanha de caju em uma cidade nordestina contou-me uma história do início de sua carreira. Ele encontrara, na região, como esperado, mão de obra intensiva, predominantemente feminina e manual. Logo de cara teve que enfrentar um hábito assustador: certas funcionárias em período menstrual deixavam um rastro de seus fluidos menstruais nas paredes e portas do banheiro.
Isso muito dizia sobre a cultura, tanto da empresa, quando da comunidade que ali vivia. Na época o relato me chocou, mas é uma história que já tem mais de 20 anos. Porém, um novo “causo” que escutei recentemente me trouxe um novo olhar sobre o tema.
Nesta nova situação, houve uma contaminação microbiológica em ovos de Páscoa. Para quem conhece o processo, ele também é bastante manual, sobretudo nas etapas finais. Analisada a causa raiz, constatou-se falha de higienização de mãos de uma funcionária do envase no período de sangramento.
Resolvi então elaborar um material educativo que deve ajudar os gestores e tomadores de decisão que não menstruam a enxergarem um ponto crucial e talvez pouco comentado, por ser um tabu em pleno 2025: a higiene íntima da mulher no trabalho.
Claro que também serve às decisoras que menstruam, pois apesar de saberem muito bem como temos que gerenciar a questão, é fato que poucas empresas têm ducha higiênica ou outros recursos para favorecer as boas práticas de manipulação de alimentos, aqui consideradas no conjunto “asseio pessoal e higiene das mãos”.
Importância da ducha higiênica para as funcionárias
Hoje são três os métodos mais adotados para gerenciar os fluidos. Essa situação é enfrentada mais ou menos da seguinte forma, todos os meses, quando não há ducha higiênica dentro da cabine do banheiro:
Assim, podemos ver que mesmo para quem toma cuidado, há desafios naturais para se evitar a contaminação cruzada de maçanetas e portas do banheiro, assim como de torneiras (acionadas por toque manual) e do entorno da pia. Uma mulher saudável a priori não teria carga patogênica em seus fluidos menstruais, mas na eventualidade de ser portadora ou doente, seria uma bomba para o processo. E independentemente disso, os fluidos são um ótimo meio de cultura para qualquer outra bactéria que cruzar o caminho.
Todos os métodos requerem trocas frequentes, especialmente no pico do ciclo. Em alguns casos, estamos falando a cada duas horas. Portanto, o risco de contaminação das mãos e do entorno do banheiro e até da área de processo pode ser de algumas vezes em um turno. Recursos como ducha higiênica e sabão ajudariam a prevenir o espalhamento destes fluidos. Claro que este item, em especial a manopla do chuveirinho, teria que entrar no cronograma diário de higienização do banheiro e a equipe de limpeza deve ser devidamente treinada.
Pequenas ações
Procurei por casos vinculando oficialmente fluidos menstruais à contaminação de alimentos. Não encontrei e também não vi recomendações específicas de boas práticas explícitas sobre o tema. Em meu ponto de vista, porém, este não é um tópico que deva ser menosprezado na educação dos manipuladores de alimentos.
Que tal começar começar com uma ação simples de comunicação no banheiro:
“Está naqueles dias? Capriche na lavagem das mãos”.