O Food Safety Brazil sempre traz traduções de materiais excelentes para estudo na área de segurança de alimentos. Selecionamos temas relevantes do capítulo “Hygiene Requirements in Food Service” (Requisitos de Higiene para Serviços de Alimentação) do livro “Handbook of Hygiene Control in the Food Industry, Second edition” (Manual de Controle de Higiene na Indústria de Alimentos, segunda edição), editado por H. L. M. Lelieveld, John Holah. Dividimos a série de posts de acordo com os temas do capítulo. Este post, parte 6 da série, fala sobre as etapas de limpeza e desinfecção para food service e o que está por trás dessas tarefas aparentemente tão básicas e rotineiras.
Para ler outras partes já publicadas da tradução deste capítulo, consulte:
“Tradução: Requisitos de Higiene para Serviços de Alimentação – Parte 1: Riscos de Contaminação”
“ Tradução: Requisitos de Higiene para Serviços de Alimentação – Parte 3: Barreiras”
Parte 6: Etapas de limpeza e desinfecção
A limpeza e a desinfecção são etapas essenciais e fazem parte de um serviço de alimentação lucrativo. Além de atender aos requisitos legais, essas etapas trazem outros benefícios:
– Impedem o crescimento de microrganismos. Assim, é possível reduzir o risco de intoxicação alimentar e deterioração dos alimentos produzidos no estabelecimento.
– Removem todos os vestígios de alérgenos para prevenir a contaminação cruzada de um produto para outro.
– Reduzem o risco de contaminação por material estranho e, assim, evitam reclamações de clientes.
– Removem resíduos que possam fornecer alimento ou abrigo para pragas e prevenir infestações.
– Garantem um ambiente de trabalho agradável, seguro e atraente, que incentiva o trabalho eficaz e reduz o risco de acidentes para funcionários e clientes.
– Promovem uma imagem favorável para o cliente e auxiliam até mesmo o marketing do negócio, criando uma boa reputação no mercado, especialmente se as áreas de preparação de alimentos forem visíveis para o cliente.
– Evitam danos ou redução na eficiência de equipamentos e serviços, o que ajuda na redução de custos de manutenção.
A limpeza é essencialmente uma função de gerenciamento e o processo físico de remoção de sujeira é apenas o estágio final. A principal responsabilidade nessa atividade é garantir que as instalações sejam higienizadas de forma eficaz. Isso não só faz sentido do ponto de vista econômico, mas também é uma exigência legal. Fingir os padrões da boca para fora não é suficiente. Todos os envolvidos em uma empresa de alimentos devem estar pessoalmente comprometidos em garantir que padrões satisfatórios sejam alcançados.
Produtos de limpeza adequados e metodologias de aplicação devem ser fornecidos e os padrões necessários devem ser claramente definidos, comunicados de forma eficaz e reforçados pela gerência. A equipe deve ser motivada, instruída, supervisionada e controlada.
O processe de limpeza é definido como “aplicação sistemática de energia a uma superfície ou substância, com a intenção de remover a sujeira”. Para a definição apresentada, quatro fatores são reconhecidos sobre energia:
- Energia mecânica ou cinética, incluindo remoção manual, limpeza e escovação, limpeza automática (abrasão física) e lavagem com jato de pressão (abrasão por fluido).
- Energia química usada para decompor sujidades para torná-las mais fáceis de remover e para suspendê-las em solução para facilitar o enxágue.
- Temperatura ou energia térmica para aumentar a velocidade de limpeza e ajudar a remover óleos e gorduras acima do ponto de fusão.
- Tempo – quanto maior o tempo de limpeza, mais eficiente é o processo.
A eficácia de toda a operação de limpeza depende de escolher o produto correto, aplicá-lo na temperatura, tempo e concentração ideais e usá-lo com o equipamento correto.
Produtos de limpeza adequados
O meio de limpeza usual é a água, a qual dissolve certos resíduos e forma uma solução que pode ser enxaguada. Porém, a água pura não é eficiente na dissolução de muitas das sujidades comumente produzidas nos serviços de alimentação. Assim, para melhorar a eficiência da água e para neutralizar o efeito de impurezas na água, outros produtos, como por exemplo, os detergentes, são adicionados. Detergentes são produtos químicos (ou misturas de produtos químicos) feitos de sabão ou substitutos sintéticos, com ou sem aditivos, que são usados para remover gordura ou outras sujeiras. Os detergentes podem apresentar dois tipos de ação, dependendo da composição e do tipo de substância ou sujeira sobre a qual estão agindo. Durante o processo, acontecem reações químicas, nas quais um constituinte do detergente reage com a sujeira, e transformações físicas, onde um constituinte do detergente ajuda a penetrar, remover e dispersar a sujeira de uma superfície (como, por exemplo, a remoção e emulsificação de gorduras de uma superfície por meio do uso de um detergente neutro). Os detergentes manuais usados no setor alimentício devem ser atóxicos, não contaminantes, não corrosivos, de enxágue livre, solúveis em água e não devem formar espuma em água dura. Além dos detergentes neutros, os detergentes alcalinos quebram as proteínas por meio da ação de íons hidroxila, gorduras saponificáveis e, em concentrações mais elevadas, podem apresentar ação bactericida. Bases fortes, geralmente hidróxido de sódio (soda cáustica) apresentam alto grau de saponificação e ruptura de proteínas, embora sejam corrosivas e perigosas para os colaboradores. Analogamente, bases fracas são menos perigosas, mas também menos eficazes. Os detergentes alcalinos podem ser clorados para auxiliar na remoção de depósitos proteicos, mas o cloro em pH alcalino não é um biocida eficaz. Os ácidos têm baixa detergência, embora sejam muito úteis na solubilização de carbonatos e minerais, incluindo sais de água dura e depósitos proteicos. Tal como acontece com as bases, quanto mais forte for o ácido, mais eficaz ele será, embora, além disso, os ácidos mais fortes sejam mais corrosivos para equipamentos e colaboradores. A escolha primária de um produto químico depende da sujeira que queremos eliminar. No entanto, outros fatores devem ser considerados, como a compatibilidade da superfície a ser limpa com o tipo de detergente (detergentes altamente alcalinos podem causar corrosão em metais moles), o método de aplicação e questões de segurança no trabalho, adequação para uso com o abastecimento de água do local, tempo disponível para a operação e compatibilidade com outros produtos químicos utilizados. Ou seja, a seleção pode ser simplificada pela seguinte lista de verificação: tipo de sujidade, superfície onde o produto será aplicado, circunstâncias de uso e segurança.
Temperatura
A temperatura pode ser crítica para o desempenho químico dos produtos. Geralmente, quanto mais alta, melhor. No entanto, o calor pode desnaturar o produto químico ou fixar proteínas. Nesse caso, aplicações mornas ou frias devem ser usadas inicialmente. Com a introdução de produtos de biotecnologia, temperaturas mais baixas são recomendadas e é sempre aconselhável ler as instruções de uso do fabricante antes do uso.
Armazenamento, dosadores e aplicadores
Os produtos químicos de limpeza e desinfetantes devem ser armazenados separadamente dos alimentos. Os produtos químicos devem ser armazenados nas embalagens originais e usados antes do prazo de validade, que geralmente está escrito no rótulo ou no recipiente. Produtos incompatíveis devem ser mantidos separados. Se disponíveis, dosagens controladas são mais indicadas. Quando disponível, a preferência deve ser por equipamentos automáticos. Os produtos não devem ser misturados porque podem se neutralizar, formar produtos químicos muito corrosivos, produzir gases tóxicos ou aquecer rapidamente, causando ebulição ou explosão. Dosadores e aplicadores são usados para fornecer ou controlar produtos químicos.
Tempo de ação
Os produtos químicos devem ter tempo suficiente para agir. Esse período normalmente é conhecido como tempo de contato. Superfícies verticais podem não permitir tempo de contato suficiente devido ao escoamento. Métodos alternativos de limpeza, como aplicações repetidas ou imersão, podem ser usados para estender o tempo de contato. As tentativas de remover a sujeira antes que a reação química seja concluída resultam em quantidade considerável de trabalho extra.
Equipamentos
Padrões consistentes e elevados de limpeza só serão alcançados se as ferramentas de limpeza forem especificamente fabricadas para uso no setor alimentício. A escolha correta é essencial para evitar a recontaminação de uma superfície limpa (com sujeira ou bactérias) ou, no caso de uso de escovas, contaminação por meio das cerdas. A qualidade e limpeza das ferramentas que entram em contato com superfícies de contato direto com alimentos são particularmente importantes. As ferramentas devem ser feitas de materiais seguros para alimentos, como polipropileno de alta densidade, poliéster e rilsan, que são resistentes a agentes de limpeza ácidos e alcalinos e resistirão à esterilização por calor repetidamente até 130°C. Madeira e cerdas naturais devem ser evitadas e escovas gastas devem ser substituídas sempre. As cerdas de cor azul são frequentemente indicadas, pois são mais facilmente detectadas se ficarem soltas. O estabelecimento deve garantir que as ferramentas sejam limpas com eficácia e que não haja esconderijos para o acúmulo de resíduos ou bactérias.
O uso de ergonomia no projeto de limpeza de serviços de alimentação minimiza a fadiga dos operadores responsáveis, melhora a segurança e resulta consistentemente em padrões mais elevados.
As cores diferentes permitem o uso setorizado de acordo com a categoria de alimentos para evitar contaminação cruzada, como superfícies de contato com alimentos e superfícies sem contato com alimentos, alimentos crus e alimentos prontos para o consumo ou alimentos contendo diferentes alérgenos e tipos de alimentos, por exemplo: carne, peixe e produtos frescos.
Os panos variam desde têxteis duráveis de alta resistência até tecidos com alta absorção e relativamente baixa resistência mecânica. O papel descartável é comumente utilizado em vez de panos. O esfregão comum ou de soquete não deve ser utilizado em áreas de produção de alimentos. Os esfregões torcidos e o esfregão com cabeça destacável, que podem ser lavados e fervidos, são muito mais apropriados. Os esfregões devem ser bem limpos após o uso e depois deixados para secar. Baldes podem ser de náilon de alta densidade ou polipropileno com alças de aço. Baldes de uso doméstico devem ser evitados.
Desinfecção
A desinfecção é o estágio final de um programa de limpeza e desinfecção de dois estágios e reduz a viabilidade de microrganismos que permanecem nas superfícies após a fase de limpeza a um nível que é seguro para a produção de alimentos. A desinfecção é realizada por calor ou produtos químicos. No entanto, é importante lembrar que, no geral, as etapas mais importantes são a limpeza e o enxágue. A etapa de desinfecção por si só ou após uma limpeza inadequada fornecerá resultados microbiológicos insatisfatórios.
A aplicação de calor é o meio mais confiável e eficaz de destruir microrganismos, embora possa não ser o mais praticável, especialmente para superfícies. O método costuma ser usado em máquinas, como máquinas de lavar louça, onde, após um procedimento de lavagem a aproximadamente 60°C, é realizado um enxágue final com temperatura da água maior que 82°C e um tempo de contato variável de 1 a 15 segundos. Os desinfetantes químicos adequados para uso em serviços de alimentação são limitados àqueles que, quando usados corretamente, não serão fontes de contaminação química na comida, equipamento ou equipe. Os tipos de desinfetantes químicos incluem oxidantes e não oxidantes desinfetantes.
Agentes de liberação de cloro, predominantemente hipoclorito de sódio, são os desinfetantes oxidativos mais comuns, que destroem bactérias pela oxidação de proteínas e outras partes essenciais da estrutura de bactérias, vírus, leveduras e fungos. Eles são normalmente fornecidos em soluções contendo 6–14% de cloro disponível e devem ser diluídos entre 100 e 500 ppm para desinfecção de superfície típica. No entanto, dependendo da quantidade e tipo de sujidade, pH, tempo de contato, temperatura e organismos ou esporos presentes, uma concentração de até 10.000 ppm de cloro disponível pode ser necessária para garantir a desinfecção, como por exemplo, para a descontaminação de derramamentos corporais do cliente (sangue e vômito). Depois de um tempo de contato de 5 min, resíduos de hipoclorito devem ser enxaguados das superfícies. Além disso, eles nunca devem ser usados em conjunto com produtos de limpeza ácidos devido à produção de cloro gasoso. Ocasionalmente, compostos peróxidos, como ácido peracético, podem ser usados.
Os compostos de quaternário de amônio são os desinfetantes não oxidativos mais comuns. Com características catiônicas, eles são seguros, não corrosivos, estáveis, têm pouco odor e são bactericidas. Isolados, eles têm uma faixa estreita de atividade e não são tão eficazes quanto os hipocloritos contra bactérias, vírus e fungos Gram negativos. A eficácia pode ser significativamente melhorada pela incorporação de um sequestrante como parte de uma formulação bem construída com detergente não iônico e ingredientes alcalinos. Os desinfetantes anfotéricos exibem propriedades bactericidas, são de baixa toxicidade, relativamente não corrosivos, insípidos e inodoros. Eles são, entretanto, relativamente caros, de alta formação de espuma e inadequados para uso com máquinas e sprays de alta velocidade.
Em locais com necessidade de limpeza e desinfecção leves em áreas essencialmente “secas”, o uso de um spray / toalete à base de álcool é particularmente útil. Esta é normalmente uma mistura de álcool, compostos de quaternário de amônio ou anfotéricos, e possivelmente aditivos detergentes suaves, formulada para fornecer uma boa desinfecção em ambientes pouco sujos, sem o uso de água. Para o uso, é necessário ter cuidado devido à inflamabilidade dos álcoois.
Esta tradução é mais um trabalho colaborativo e totalmente voluntário realizado por colegas e leitores aqui do blog, que unidos fazem o tema da segurança dos alimentos mais descomplicado. Você também pode participar do grupo de tradutores voluntários. Entre em contato com redacao@foodsafetybrazil.org.
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