Entrevista – Cadeia de suprimentos de especiarias, seus riscos e como se prevenir

4 min leitura


O caso da contaminação de especiarias e da gestão de fornecedores no exterior é velho conhecido do blog. Já tratamos deste assunto aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.

Recentemente, tivemos a rica oportunidade de entrevistar o Sr. João Fogacci, que possui larga experiência no mercado internacional de especiarias, tendo visitado os principais centros produtores para selecionar fornecedores e adquirir produtos. Veja abaixo a entrevista conduzida pela editora do blog, Juliane Dias Gonçalves, e a colunista Cristina Leonhardt.

Juliane: Por que é tão difícil manter um padrão de qualidade e segurança de alimentos das especiarias?

João: Isto acontece quando não se está sendo atendido por empresas especializadas, pois não conhecem estas empresas, ou não querem pagar o preço por produto processado de maneira adequada que atenda a necessária segurança e legislação.

Juliane: Há especiarias que devem nos preocupar mais do que outras em relação à segurança? Por quê?

João: Sim, a exemplo Pimentas Vermelhas e Pimentas do Reino, devido forma de plantio, forma de colheita e forma de secagem.

Cristina: Por que as pimentas são pontos de maior atenção? Como é esta cadeia de produção?

João: São produzidas em locais quente e úmido, muitas vezes secas no chão, ficando sujeitas às naturais contaminações.

Juliane: A prática de adição de outros ingredientes (ex: maltodextrina) e até mesmo areia, se dissemina nesta cadeia produtiva. Por que surgiu essa “oportunidade” e como coibi-la?

João: Outros ingredientes como Sílica (e não Areia), Maltodextrina, ou seja, ingredientes de grau alimentício aceitos pela Legislação, até podem ser acrescidos por necessidade técnica de estabilidade e para facilitar aplicação, como também para manter padrões de certos mercados e a Legislação prevê para alguns produtos.

Quando adulterações grosseiras ocorrem em locais menos evoluídos, geralmente visam suprir populações de baixo poder aquisitivo, que não tem como controlar a qualidade e já estão habituadas com produtos deste nível, que até já virou padrão por terem preços baixos.

Cristina: Sobre a adição de veículos, muitas vezes são usados, mesmo no Brasil, sem a correta menção no rótulo. Como a empresa usuária poderia se resguardar de práticas como tal? Por exemplo, existe mesmo uma flutuação de cor na pimenta preta moída conforme a época do ano, ou a variação de cinza escura para cinza claro é somente relacionada à incorporação de veículos?

João: Quando se recebe uma amostra, esta deve estar acompanhada com especificação detalhada para avaliações necessárias sobre os veículos e aditivos descritos. Por exemplo, sobre a variação de cor na pimenta do reino de cinza escura para cinza claro, pode ser decorrente do tipo de grãos que foram utilizados na moagem, isso também ocorre com cominho, coentro, louro, noz moscada, orégano e outros produtos. Também com a adição de necessários veículos que tem cor clara, tipo antiumectantes.

Cristina: Como uma empresa usuária de especiarias pode se precaver do uso de produtos de baixa qualidade? Como distinguir o joio do trigo entre os fornecedores qualificados e não tão bem qualificados?

João: Adquirindo de empresas de alimentos especializadas, certificadas e idôneas que comprovadamente já atendem grandes indústrias e que devem ser auditadas.

Cristina: Quais são as tendências mundiais no quesito descontaminação de especiarias?

João: Está sim ocorrendo a difícil tarefa de se adequar, junto às fontes produtoras, os sistemas de coleta, cultivo, colheita e secagem. Eles estão melhorando, se modernizando, com consequente melhoria na redução das contaminações. Porém, sempre haverá necessidade de uma indústria final, especializada em adequar os padrões e especificações às necessidades atuais, às modernas técnicas de controle de qualidade das indústrias, ao consumidor cada vez mais consciente e exigente, à legislação, e também ajustar os produtos aos padrões dentro dos limites factíveis – sempre buscando a segurança alimentar. Uso de processos físicos e químicos seguros de descontaminação a nível macroscópico, microscópico, microbiológico, não agressivos para saúde humana e ambiental.

Cristina: Uma mudança de perfil de  consumo de especiarias está acontecendo, com as pessoas adicionando especiarias diretamente sobre saladas que posteriormente não sofrerão tratamento térmico. Como as empresas produtoras de especiarias estão se preparando para este caso?

João: As empresas que fracionam especiarias para o consumidor final doméstico, food service e fast-food, precisam utilizar especiarias previamente reprocessadas e submetidas a tratamento de redução de carga microbiana, e não fracionar a partir das especiarias recebidas tal qual chegam das origens.

E um comentário final do Sr João Fogacci:

 Especiarias: “Se você usa tão pouco, use o melhor”.

E complemento, use o que tem mais tecnologia e segurança agregada.

 O processamento e forma de adequar as especiarias para os produtos atuais também estão se adequando aos conceitos atuais, através da engenharia de alimentos, tal qual a modernização de fórmulas e produção de maioneses, margarinas, queijos cremosos, achocolatados, embutidos. Enfim, todos os alimentos fabricados pelas indústrias a cada dia são aperfeiçoados com inclusão de aditivos de última geração.

Foto: autoria Cristina Leonhardt. Ají peruando seco naturalmente na estrada que conecta Lima a Huaraz,

João Fogacci atua no ramo de especiarias, ervas culinárias, vegetais desidratados e alternativas desde 1976. É autodidata e foi discípulo do Eng. Efroin M. Sapiro – pioneiro no Brasil em beneficiamento (moagem, desidratação, branqueamento e esterilização) de: especiarias, ervas culinárias, vegetais desidratados, caldos em tabletes e sopas desidratadas. Experiência profissional em P&D, CQ, Administrativo, Marketing, e Comercial em empresas como Ital Ind. de Temperos e Alimentos, Mc Cormic, Fuchs Gewurze. Atualmente: Representante autônomo comercial/técnico e consultor através da VFOGACCI.

4 thoughts on

Entrevista – Cadeia de suprimentos de especiarias, seus riscos e como se prevenir

  • ISABEL SILVEIRA

    Bom dia sr João, como vai?

    Agradeço ao Blog mais uma vez por nos informar sobre um assunto importante para a saúde, e que devemos tomar cuidados no uso das ervas desitratadas. Como leiga neste assunto, não imaginava os perigos ocultos em produtos deste tipo.

    Gosto imensamente de cozinhar, mas tenho muitas limitações , e espero que aos poucos, com mais treino e conhecimento , possa evoluir e oferecer preparos mais saborosos à minha família…
    Saindo do trivial alho, cebola, sal , um pouquinho de cominho já é uma aventura.
    No entanto, passei muitos anos observando minha mãe cozinhar como se fosse uma alquimista, misturando ervas frescas ou desidratadas com resultados maravilhoso de sabores e perfumes .Acredito que era um dom que ela possuía, pois a apresentação de todos os seus pratos eram de um lindo colorido , mesmo nos tempos mais difíceis.
    O sr tem conhecimento de um livro onde o foco seja a utilização das ervas?
    No filme ” O tempero da Vida” as analogias que o avô faz para o neto utilizando os temperos contidos em grandes tonéis são maravilhosas, nunca mais esqueci desta cena.
    O sr tem mesmo uma linda profissão, tomara que possa me passar uma ” colinha”!!!

    Obrigada!

    Isabel

    • joao fogacci

      Olá Isabel, boa tarde.

      Ervas culinárias frescas devem ser tratadas como as verduras, ou seja, devem ser higienizadas.

      Já as ervas secas e desidratadas, como consumidor, procuro consumir as tradicionais marcas conhecidas e disponíveis nas redes de supermercados e casas especializadas.

      Com relação a um livro sobre ervas culinárias, sugiro:

      DICIONÁRIO GASTRONÔMICO
      Ervas & Especiarias com suas receitas
      AUTOR – Nelusko Linguanotto Neto

  • Saulo Calliari

    Boa Tarde, tenho uma industria de processamento, importação e fracionamento de especiarias. Atualmente não temos esterilizadora própria e gostaríamos de utilizar. Como descobrir a melhor opção tendo em vista que operamos com 260 especiarias? Obrigado desde ja

  • Jaqueline Silva dos Santos

    Olá, tenho duvidas sobre as legislação para especiaria e tempero, uso RDC 12,14 e 42, porem para analise físico-química não sei qual utilizar, estava pesquisando achei a Resolução cnnpa 12 de 1978 não sei se é valida, pode me indicar qual esta aprovada para o momento?

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